Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 1
IMAGINAR NOVOS MUNDOS AGORA: COSMOPOLÍTICAS E RACIALIDADE
IMAGINANDO NUEVOS MUNDOS AHORA: COSMOPOLÍTICA Y RACIALIDAD
IMAGINE NEW WORLDS NOW: COSMOPOLITICS AND RACIALITY
Juliano GADELHA1
e-mail: jjulianogadelha@outlook.com
Como referenciar este artigo:
GADELHA, J. Imaginar novos mundos agora:
Cosmopolíticas e racialidade. Rev. Cadernos de Campo,
Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-
2419. DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372
| Submetido em: 17/08/2023
| Revisões requeridas em: 08/10/2023
| Aprovado em: 03/11/2023
| Publicado em: 22/12/2023
Editores:
Profa. Dra. Maria Teresa Miceli Kerbauy
Prof. Me. Mateus Tobias Vieira
Profa. Me. Thaís Caetano de Souza
1
Escritor e pesquisador multidisciplinar. Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Artes da Universidade
Federal do Ceará, Mestre em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Bacharel em Ciências
Sociais pela mesma universidade.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 2
RESUMO: Este ensaio crítico interpela os sentidos de cosmos, vida e política da modernidade
colonial para uma compreensão de processos cognoscíveis e sensíveis de luta por existência no
mundo tal como o conhecemos. A discussão teórica segue a proposição de conceitos por meio
da imaginação radical negra e uma crítica às concepções de sujeito e sujeição. A metodologia
implica os estudos sobre racismo e colonialidade para uma cosmopolítica atenta aos modos
racializados como a governança gere o presente, o passado e o futuro nas sociedades.
PALAVRAS-CHAVE: Cosmos. Fuga. Governança. Mundo. Vida.
RESUMEN: Este ensayo crítico interroga los significados de cosmos, vida y política de la
modernidad colonial para comprender los procesos cognoscibles y sensibles de la lucha por la
existencia en el mundo tal como lo conocemos. La discusión teórica sigue la proposición de
conceptos a través de la imaginación radical negra y una crítica de las concepciones de sujeto
y sujeción. La metodología implica estudios sobre el racismo y la colonialidad para una
cosmopolítica atenta a las formas racializadas en que la gobernanza gestiona el presente, el
pasado y el futuro en las sociedades.
PALABRAS CLAVE: Cosmos. Escape. Gobernanza. Mundo. Vida.
ABSTRACT: This critical essay interrogates colonial modernity's meanings of cosmos, life,
and politics in order to understand the knowable and sensible processes of the struggle for
existence in the world as we know it. The theoretical discussion follows the proposition of
concepts through the black radical imagination, and a critique of the conceptions of subject
and subjection. The methodology involves studies on racism and coloniality for a cosmopolitics
that is attentive to the racialized ways in which governance manages the present, the past and
the future in societies.
KEYWORDS: Cosmos. Escape. Governance. World. Life.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 3
Introdução
Este ensaio crítico parte do princípio de imaginação radical negra
2
que não consiste em
uma escola de pensamento, tampouco em uma metodologia de ensino que convoque os
conhecidos parâmetros kantianos
3
de comprovação e os hegelianos
4
de justificação para
fundamentação teórica. A ideia de radicalidade vem de como é possível imaginar outramente a
formulação de nossas categorias de entendimento sem necessariamente nos desprendermos de
nossas vivências. O atributo de negra vem de que foram intelectuais, artistas e grupos de
movimentos sociais contra o racismo anti-negro que elaboraram as primeiras obras dessa
espécie plural de imaginar mundos a favor das vidas tornadas negras em tentativas múltiplas
de fugir dos mesmos paradigmas que garantem a anti-negritude continuar em execução na
academia, nas artes e na política. Uma obra extremamente marcante dessa empreita é Freedom
Dreams: The Black Radical Imagination
5
de Robin Kelley em que o autor narra sua experiência
como intelectual e militante negro que encontra no desejo de liberdade não um modo direto de
se fazer visível e compreensível ao racismo, mas uma maneira de imaginar outramente a luta
antirracista. Mas como essa qualidade de capacidade sensível e cognitiva se torna possível para
nós, gentes marcadas como negras? Este ensaio traz a tentativa de evidenciar isso. Para tanto,
ele invoca outas manifestações de mundo que nos permitem repensar alguns paradigmas sobre
raça.
2
Neste ensaio, as designações identitárias-políticas de negro(s)/negra(s) e a demarcação de negritude que bifurca
os sentidos costumeiros do que seria ou não seria humano são sempre utilizadas em destaque para enfatizar a
pluralidade dessas vidas matizadas pela raça e a sua impossibilidade de resgate ontológico dentro de qualquer
contexto ainda marcado pela ficção racial.
3
Kant (1974) defendia que os conhecimentos sobre a moral, a ética e a política partem da experiência, mas que
existe um conhecimento que seria transcendental e que marcaria a própria experiência, de maneira que o trabalho
científico seria sempre como esse primeiro conhecimento se manifesta em nossas vidas, enquanto a filosofia
refletiria sobre as profundezas do próprio transcendental, o que permitiria ao filósofo chegar numa razão pura. O/A
cientista sempre terá como meta a comprovação de uma força que permite a coisa existir como coisa ou, caso
contrário, a coisa não existe. Esse fantasma kantiano da comprovação atravessa tempos e locais sendo manifestado
inclusive nas ciências sociais e nos estudos culturais que acreditam terem se livrado de uma razão pura. O que
Mbembe (2018) demonstra muito bem em sua crítica da razão negra.
4
Hegel (2016) retoma a questão kantiana da razão como sendo a identidade do ser e do objeto, formulando um
princípio de humanidade que coroa a razão como marcador do humano. Aqui, a questão não se detém em
comprovar uma capacidade transcendente das coisas, mas sobretudo justificar (leia-se tornar a coisa passível de
racionalização) para que ela possa assumir existência, a de ser consciente ou a de objeto (aquilo passivo a outras
consciências). É nessa filosofia que as ideias são objetos que não precisam da comprovação na materialidade direta
da vida social para serem justificadas. Essas ideias precisam apenas terem coerência. Esta coerência viria da
autoconsciência (Selbstbewusstsein) que não se resume a uma consciência da pessoa sobre si. A razão não estaria
no campo de um pensamento que não se encontra no mundo que o próprio pensamento tenta compreender, mas
numa capacidade imanente do pensamento que se faz objeto e fenômeno, e como tais indissociáveis da justificação
de seus movimentos.
5
KELLEY, Robin. Freedom Dreams: The Black Radical Imagination. Boston: Beacon Press, 2002.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 4
Spillers (2003) fala de até onde nossas abordagens contra o racismo ainda se
movimentam dentro de um quadro de entendimento ontológico e epistemológico que garante
que este mesmo racismo se reinvente como crítica e até diálogo com os mesmos fins em
desautorizar a produção de conhecimento das pessoas negras. A autora nos alerta para sempre
colocarmos nossos paradigmas sob suspeita ou, caso contrário, tendemos novamente a cair nas
armadilhas de um conhecimento que sempre nos produziu como os outros da ciência, aqueles
cujos pensamentos e ações só podem ser entendidos como objetos de pesquisa que necessitam
sempre de um arcabouço branco para validação. É nesse ponto que a imaginação radical se
distancia dos tradicionais estudos negros, costumeiramente presos nas mesmas ferramentas
conceituais que os oprimem, porque ela não intenta fazer crítica estrutural reencenando as
gramáticas que sustentam o mundo tal como conhecemos que é anti-negro.
Faz parte da imaginação radical negra trazer os cotidianos marcados pelo racismo e
fazer dali uma quebra com o mundo tal como conhecemos, compondo uma nova imaginação
política agora. Por “agora” compreenda a duração contra a flecha do tempo em que todos os
tempos são possíveis. Não se trata de propor estudos localizados de como um determinado
grupo racializado vive num contexto cultural sob o peso de certas opressões estruturais. Trata-
se de como a gente marcada pela raça como negra fazemos disso um campo infinito de
possibilidades para garantir nossa existência num mundo queo nos reconhece como seres de
direito à existência digna. A imaginação negra tem experimentado de infinitas e radicais
maneiras a formulação de conceitos, a criação de poéticas e a proposição de outros modos de
vida para pessoas negras que as permitam em sua crítica atravessar as estruturas de poder rumo
a novos mundos. Daí o caráter futurista dessa imaginação que faz das suas formulações uma
recusa aos modos convencionais de fazer ciência e filosofia, sem negar a importância de
imaginar outramente o científico e o filosófico. Aqui, essa tarefa imaginativa começa pela
crítica à concepção de sujeito
6
que tem guiado movimentos sociais diversos em busca de
reconhecimento da autonomia de seus membros e de suas membras nas sociedades. Ocorre que
pouco temos questionado até onde essa categoria nos permite ultrapassar os velhos e novos
modos de sujeição. Segue-se a essa atenção uma série de formulações críticas como rotas para
imaginarmos uma nova cosmopolítica, ou seja, uma nova composição de nossas vidas com
todos outros e todas outras viventes do planeta sem reencenar o fundamento da propriedade e
sua ação mais perversa, a expropriação total do outro, que é o fundamento da escravidão.
6
Uso a palavra sujeito em itálico para ressaltar sua incapacidade de inclusão das diferentes posições de raça, classe,
gênero, sexo, sexualidade, dentre outras, que modos de existir não normativos vivenciam.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 5
Os sujeitos atribuidores da civilização a outros mundos, os não-civilizados ou mal
civilizados, que necessitariam serem convencidos a se unirem em um mesmo projeto de mundo,
que seria exatamente o projeto das sociedades civilizadoras: eis a faceta do projeto colonial que
se reinventa e se atualiza via práticas discursivas, às quais se apresentam como plurais,
dialógicas, democráticas, salvacionistas, dentre outras definições que passam longe de um
efetivo processo de reparação histórica com outros povos, cujo direito à ontologia humana
7
foi
a princípio negado. Ocorre que, se por um lado, os mundos espoliados pela colonização foram
quase completamente saqueados pela última metade do milênio, por outro, o mundo dos sujeitos
criadores dessa modernidade apresenta sinais cada vez mais evidentes de ruína da sua
cosmopolítica, que não somente os guiou em seus respectivos autoprojetos de civilização, mas
que também foi a responsável pela própria empreita colonial que segue em seu devir-mundo
8
quebrando as divisões Norte e Sul nesses tempos de quem, segundo suas próprias reviravoltas
no baú das heranças ontoepistêmicas
9
de modernidade e humanidade, não se acha mais
moderno
10
ou mesmo humano.
Na verdade, o processo civilizador europeu e a colonialidade se tornaram um só mesmo
projeto. E o mais perigoso: trata-se de um projeto de múltiplas dimensões, espacialidades e
localidades. A colonialidade, em sua pluralidade, se faz agora em devir-mundo uma vez que
seus modos de governança (leia-se os aparatos, as técnicas, as estéticas, as partilhas, as
linguagens e os desejos que unem as finanças, a política e a ficção racial)
11
estão por todos os
7
Princípio filosófico que a respeito do sentido abrangente do ser torna possível compreender as múltiplas
existências, partindo de uma concepção de humano desimplicada do próprio mundo. Esta é a herança
heideggeriana da ontologia que esqueceu que a própria contingência do humano é marcada social, cultural, moral
e politicamente, de modo que o humano não é uma categoria ontológica universal como já nos revelou os estudos
de Spivak (1999) e Warren (2018).
8
Além de afirmar determinados modos de ordenar o mundo, a colonialidade também produz sentidos de mundos
que ainda estão por vir, uma vez que ela é móvel e estratégica, movendo-se por processos socioculturais e
históricos sem se prender ao tempo e ao espaço de uma localidade específica. É no porvir que a colonialidade se
atualiza como novo, como vanguarda, como (re)invenção de maneiras terrivelmente criativas. Eis que seus novos
mundos retornam sempre como um Mundo do Mesmo.
9
Segundo Spivak (1999), a ontologia sempre guiou os parâmetros da produção de conhecimento e a reflexão sobre
essa produção a epistemologia , de modo que não existe uma epistemologia transparente, ou seja, não marcada.
É nesse sentido que falo de heranças ontoepistêmicas para aludir o que herdamos de determinadas formas de
compreensão do mundo e de formulação das categorias de entendimento.
10
Aqui, as noções de moderno partem do entendimento de que uma dimensão espaço-temporal foi determinada
como moderna ou modernidade via concepções e valores econômicos, sociais, culturais, políticos, morais e,
sobretudo, raciais. Trata-se da concepção de modernidade como herança colonial que se reinventa como plural
para dar cabo da diferença do mundo, dos intermináveis outros que essa modernidade constrói de tempos em
tempos ao sabor de localidades diversas.
11
Embora o conceito de governança seja plural na filosofia política, eu o utilizo para acionar que a governança
não se resume a modos de governo. Ela consiste em uma aliança móvel e estratégica entre o capital, a política e a
raça que atravessa e é atravessada por modos de governo diversos no mundo.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 6
lados. E para piorar as coisas, há os chamados problemas geofísicos do planeta, que não dizem
mais somente a respeito da existência dos coletivos (mais que) humanos na Terra, o que gera a
sensação de que logo o céu cairá para todos os mundos terranos
12
. Se o céu já caiu para outras
gentes, por que somente agora os sujeitos supremacistas estão preocupados com a queda? Ora,
a queda que eles temem é a daquilo que identificam como o mundo deles, porque outros mundos
eles trataram de derrubar, nada mais óbvio e mesquinho. Daí porta vozes de certos mundos
virem em diversas frentes assombrar novamente outros mundos. A velha tática colonial! O que
mudou foi o formato das caravelas, agora nos moldes da democracia neoliberal, dos pacotes
econômicos e políticos internacionais, das maneiras mais profundas de sentir e
expressar/desempenhar as coisas. É nestas últimas maneiras que, por exemplo, temos o que
denomino de “futurismo reprodutivo artístico”.
O “futurismo reprodutivo artístico” consiste nos modos de governança nas artes, ou seja,
nas estruturas de poder-dominação que se manifestam nas maneiras cognitivas, sensíveis e/ou
estéticas do campo das artes e que são atualizações das estruturas coloniais, classistas,
cisheterofuturistas
13
e racistas, dentre outras marcações de poder-diferença da vida (mais que)
social
14
. Essas manifestações ocorrem porque não existe a arte como campo autônomo de um
lado e os modos de governança do outro, e sim porque as artes fazem parte dos modos como
nos organizamos, pensamos, sentimos, desejamos e interagimos com outros viventes que são
marcados pelas arquiteturas cognoscíveis e sensíveis que também sustentam a própria
governança. É nessa composição com mundos que as artes precisam elaborar sentidos e ações
que permitam evitar a manifestação das estruturas de dominação que antecedem e sucedem a
própria construção das obras ou poéticas. Digo evitar não no sentido de negar que artes estão
atravessadas por essas estruturas, mas que, na impossibilidade mesma de negá-las, possam-se
traçar caminhos de descolonização da matéria e do sensível. Então o “futurismo reprodutivo
12
Faço alusão à “queda do céu”, a partir da profecia de David Kopenawa sobre os fins de mundos em que a Terra
não é somente o planeta Terra (KOPENAWA; BRUCE, 2015). Os mundos terranos são múltiplas dimensões que
pelos princípios de espaço, tempo e forma adquirem cosmologia. Esses mundos são composições que ordenam os
sentidos como entendemos a localidade, a duração e a definição das coisas e dos seres com a Terra.
13
Do princípio que ordena os futuros segundo a heterossexualidade e a cisgeneridade compulsórias. O
cisheterofuturismo trata de um conceito que criei para informar que as normatividades de gênero, sexo e
sexualidade produzem futuridade.
14
Todas as formas de poder produzem diferenciação entre pessoas, coisas e instituições. A ideia de poder-diferença
serve para marcar que nem sempre a diferença é o que escapa dos modos de dominação, como quis o pós-
estruturalismo de Deleuze e Parnet (1998) ao conceberem a diferença como linha de fuga. Esta filosofia francesa
toma a fuga em referência ao plano das representações, esquecendo que os diagramas de poder são tanto molares
quanto moleculares, ou seja, que esses diagramas são tanto representativos quanto intensivos, de maneira que nesta
filosofia a fuga está contra a representação e não contra a lógica geral que permite tanto a instância como o devir.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 7
artístico” não se resume às questões de modos de produção capitalizados ou outros modos de
produção presos às imaginações da economia-política; ele assume esferas, muitas vezes, sutis
de como um futuro normativo (sexual, religioso, geracional etc.) vem sendo mantido até por
meio daquilo que acreditamos ser a mais pura subversão das coisas ou acreditamos ser uma
partilha honesta com outras formas de vida. Daí a importância da postura anticolonial em artes,
pois esta não nega a importância do fazer arte, não exclui as possibilidades de negociações das
pessoas que fazem arte (curadores, artistas, críticos/críticas de arte etc.) com o mercado
curatorial, expositivo, laboratorial estético e outro desse campo nas sociedades capitalistas. A
crítica anticolonial, em suas diversas possibilidades, propõe a abolição dos modos de fazer arte
ainda reféns da governança.
toda espécie de sujeito extrativista a propor a paz e a unidade entre os mundos que
a própria modernidade outrora repartiu entre modernos e não-modernos. Os primeiros, como
sempre, pensando no bem de todas gentes e por todas gentes tendo eles mesmos como
totalidade. O que acaba por mostrar que por gentes eles percebem somente a si próprios. O
projeto colonial da salvação é o de que os sujeitos, os supostos modernos por excelência,
estariam cientes de que teriam que lidar com certa condição:
[...] a condição de que eles reconhecessem a existência de uma verdadeira
guerra ali onde enxergavam apenas uma questão de política e de
‘‘ressocialização’’ de delinquentes ontológicos (os não-modernos)
(VIVEIROS DE CASTRO; DANOWSKI, 2014, p. 121).
Mas a colonialidade por estas bandas nunca foi uma questão de ressocialização, mas de
extermínio dos povos indígenas e de escravização, em especial de gentes pretas de origens
africanas. A pedra no sapato dos modernos da Europa e de seus descendentes brancos do lado
de cá é que agora nós, gentes racializadas das américas e das outras terras por eles invadidas e
saqueadas, para os quais nunca fomos seres modernos, queremos nossa parte nessa tal
modernidade. Queremos assinalar que não somos responsáveis pela devastação da Terra, cujos
efeitos os modernos e toda sua modernidade causaram e impuseram a todas humanidades, mas
que exigimos direitos à educação, à saúde, à economia e outras coisas mais que os jogos
políticos e econômicos por eles comandados dizem nos ofertar e não ofertam. Ao contrário do
que possa vir a pensar alguma teoria acerca do Antropoceno, como a fábula antropogênica de
Tsing (2021) que busca alianças mais que humanas, não haverá paz entre nossos mundos e eles
porque aprendemos que essa separação entre nós e eles nos é benéfica à medida que
conseguirmos fugir deles, que sacamos e devolvemos a lógica separatista que desune o humano
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 8
do universo e que não reconhece como nós todos e todas fazemos parte de tudo o que existe em
infinitude e sem o princípio de propriedade.
Quando interpelo a modernidade, não estou em busca da inclusão (impossível) ao
mundo deles, uma vez que este mundo está marcado pelas distinções hierárquicas produtoras
de expropriação, espoliação e massacres de todo tipo que são todas sustentadas por maneiras
de pensar, agir e sentir ocas em sabedorias do “em comum”
15
. Na minha cosmovisão
16
, a
separação de tudo que reconhecemos como humano com outros viventes não existe. Separação
esta que é uma das composições dos modos de pensar coloniais. O que não significa que
proponho uma cosmopolítica da homogeneidade, mas sim uma cosmopolítica do
reconhecimento das singularidades pelos emaranhamentos entre todas maneiras de estar em
vida. Porém, uma vez que eles produziram o que atualmente nos chega como governança, esta
última me atinge a golpes diários com os quais sou separado deles o tempo todo via exploração,
violências e, sobretudo, na aquisição de direitos a uma vida vivível.
Venho de linhagens afro (descendentes de povos sudaneses) e indígenas (povos
Janduins, Jenipapos, Canindés e Paiacus) que no nordeste brasileiro que me deram concepções
de futuro e de estar vivo não mapeáveis por nenhum futurismo reprodutivo da governança. Este
último futurismo, em sua ideia de um mundo por vir como salvação para todos os mundos, nos
tenta fazer reféns de uma nova dívida, a dívida pela salvação do planeta que encontra nos
turbulentos fenômenos climáticos supostas justificativas para isentarem gentes de seus
extermínios para com outras gentes, mantendo a lógica assimétrica dos poderes por uma falsa
simetria, a simetria que todos e todas nós somos responsáveis pela devastação do planeta. Ora,
sempre estivemos comprometidos e comprometidas com a nossa mãe Terra, pois quem a
devasta é o sujeito colonial que fez de sua governança um agenciamento com o não-humano
causador de mais e mais fins de mundo. Essa cartada da dívida busca amenizar as assimetrias
entre mundos, de modo que os sujeitos proponentes dela não estão preocupados em pensar um
futuro simétrico para todos os mundos terranos, e sim em pôr a responsabilidade de uma série
de assimetrias de poder em uma simetria da culpa, que diz que todos os seres da Terra
15
Estar em comum significa dizer que estamos implicados e implicadas uns com os outros e umas com as outras
em uma teia cósmica infinita.
16
Conceituo cosmovisão como as percepções e sensações com as forças invisíveis que compõem cosmologias e
cosmogonias.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 9
responderão pelos males do planeta. Sim, nós responderemos pelo que acontecer com o planeta.
Mas, cada gente responderá de sua posicionalidade
17
.
Para justificar o grande plano da governança, eles invocam nada menos que certas
teorias das redes e não elas, mas especialmente elas, para dizerem como todas gentes, em
certas medidas, estão conectadas entre si, conectadas com outros coletivos e com as demais
forças do planeta. Óbvio que essa conexão existe, mas além das conexões cósmicas que
experenciamos, existem emaranhados de poder e desigualdade. O problema é que certa
invocação das redes visa surtir o efeito de que não haveria qualquer espaço para “purificações”
(LATOUR, 1994, p. 16) que evidenciem os verdadeiros agentes responsáveis por alguns males.
quem convenientemente se esqueça que esses espaços de purificação foram e continuam a
serem traçados, quando tratamos do consumo de certos bens e usufruto de determinadas
qualidades de vida. Os supostos donos da modernidade logo sabem muito bem onde alocar as
minoridades quando buscam consumir os bens legítimos separando-se do resto do mundo. Na
hora de negar direitos a outras gentes, a assimetria é a lei. O cinismo epistemológico e o
descaramento político andam de mãos dadas nas teorias que não se atêm ao fato dos fluxos das
redes. Longe de equilibrarem os mundos, apontam cada vez mais as suas assimetrias. Invoco
Haraway e Kunzru (2000, p. 36):
A tecnologia não é neutra. Estamos dentro daquilo que fazemos e aquilo que
fazemos está dentro de nós. Vivemos em um mundo de conexões e é
importante saber quem que é feito e desfeito.
Mas, se tudo está junto e misturado, o que me permite traçar algum nós frente a um eles
senão as velhas assimetrias de poder que se atualizam pelos novos acoplamentos que vão desde
as tecnologias informáticas cotidianas, passando pelo agribusiness até as guerras disparadas via
mínimos comandos dos comuns
18
? Nós, as vidas que de fato sempre viveram em simetria com
os cosmos
19
e, embora continuemos perseguidas e mortas, denunciamos o truque dos sujeitos
17
Talvez desnecessário dizer que cada grupo se encontra posicionado estruturalmente pela sociedade. A ideia de
posicionalidade corresponde à marcação que o grupo ou a gente pertencente a ele ocupa na estrutura social.
18
Denomino de mínimos comandos dos comuns as estratégias de apropriação de ideias, sentimentos, corpos e
coisas via a reinvenção de suas causas e seus efeitos no campo do cotidiano como maneiras microfísicas do poder
em continuar a ordenar os modos como nos relacionamos e compartilhamos uns com os outros e umas com as
outras.
19
Concebo a noção de cosmos de maneira plural, uma vez que existem diferentes cosmologias como sendo
sistemas simbólicos, afetivos e materiais sobre/com o que seria o mundo. No entanto, cada sistema carrega um
ordenamento das coisas e dos seres, sustentando concepções a respeito da criação do mundo cosmogonias que
voltam como princípios ordenadores dos sistemas cosmológicos, e que são os princípios que sustentam muitas das
visões da gênese do universo.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 10
que se mantêm hegemônicos, pretensamente universais e estáveis, porém super preocupados
com seus intermináveis outros. Não queremos o império de sujeira da colonialidade, mas
desejamos o direito e o prazer de estarmos vivas no planeta. O que muitas de nós exigimos
dessa modernidade que nos assombra é o direito de viver, que ela mesma diz promover e não
cumpre, ou cumpre para poucas vidas.
No meu caso particular, faz anos que aprendi a ser negligente com a lógica de
produtividade da governança que marca nossos passos por uma espécie de eterno retorno às
cartografias da conquista e da expropriação. Produzo apenas o que me possibilita prosperidade
implicada (a ascensão minha e de outros e outras viventes do planeta), afinal somos todos/todas
constituintes do cosmos em seus mais diversos mundos. Isso não corresponde a fazer recurso à
visão racista de que seríamos selvagens. O que quero tornar entendível para outras cosmovisões
é que somos a manifestação do universo. Quem repartiu e delimitou os modos de nos manifestar
e/ou manifestar o cosmos separando este do humano foi a brancura colonial. Não sou um ser
em mistura simpática com o mundo, mas estou em comum com ele, de modo que nós dois
somos capazes de nos manifestar um no outro, mantendo nossas singularidades e recompondo
a infinitude da matéria. Estamos vivos pelo em comum, e isso não é uma homogeneidade. Com
toda essa aprendizagem ancestral, tenho lutado para matar o desejo de conhecimento que não
reconhece o outro, desvencilhar-me de quem vive da imaginação sitiada pelo Mundo do
Mesmo
20
, fugir de quem faz dos modos de ensinar/aprender mais um modo de captura,
esvaziamento e objetificação de nossas vidas. Tudo isso consiste nos meus projetos de
conhecimento. O projeto apocalíptico de destruir o mundo tal como o conhecemos, ou seja,
destruir a metafísica que sustenta a governança como propõe Warren (2018) e o projeto de adiar
o fim dos nossos mundos de vida como ensaia Krenak (2019) não virão pelas mãos dos sujeitos
da supremacia racial, que é a figura corporificada pela humanidade eleita para existir pela
própria governança, ainda que tais sujeitos advoguem essas causas
21
. De maneira próxima,
esses dois projetos, que não são excludentes um do outro, se tornam difíceis de serem
20
Não conceituo o Mundo do Mesmo como sendo apenas um mundo de representações e estratificações de toda
ordem como no pós-estruturalismo francês. O Mesmo não se contrapõe ao que convencionamos como diferença,
pois constitui as maneiras convencionais de lidar com ela por ordenamentos sensíveis, perceptivos e reflexivos do
que seja semelhanças e singularidades, representações e forças não-representáveis, racionalidades e
irracionalidades, dentre outras coisas. O Mesmo faz parte do mundo tal como o conhecemos. Assim, o Mundo do
Mesmo corresponde a como o mundo tal como o conhecemos se reinventa mantendo suas antigas arquiteturas
coloniais.
21
As teorias do fim do mundo carregam diferentes pressuposto cosmológicos e cosmogônicos, de maneira que
devemos ter atenção sobre qual mundo estamos falando e, sobretudo, quais motivos determinados grupos
defendem para o fim de certo mundo e outros partem para adiar os fins dos outros mundos.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 11
engendrados por aquelas de nós, minoridades raciais, que ainda se movem presas ao desejo
colonial que captura toda potência de estar vivo/viva sempre forjada à revelia dos ímpetos do
consumir-matar.
Se podemos cortar a governança para poder viver é porque as logísticas que não separam
mais o capital da política e da raça não flutuam ilesas sobre/em nós. O corte diz de interromper
algum fluxo ou desvirtuá-lo. Somos vidas que atravessam essas logísticas e são atravessadas
por elas. Mas temos capacidades de adaptações e os poderes da transformação e do improviso
radicais. A governança insiste estar em nós, mas podemos cortá-la. Isso que chamo de
guerrilhas. Toda essa espécie de guerrilha é um trabalho de fazer falhar uma ou várias injunções
das estruturas de poder. A guerrilha não é sinônima das guerras estruturadas pelo mundo,
embora ela se faça em aprendizagem com tais guerras. Se fugimos, o fazemos porque fomos e
estamos sendo vidas forjadas numa constante violência da qual sempre estamos a bolar alguma
linha de escape. Porém, a fuga não corresponde a meramente esquivar-se das estruturas de
dominação. A fuga se torna operante porque também a criamos no que somos forjadas social,
cultural e psicologicamente em modos de existir com o mundo que não foram totalmente
colonizados. É na fuga que consumidas apresentamos maneiras de não termos nossas vidas
consumidas, que morrendo tramamos como escapar da morte, que lutando também nos
preocupamos com autocuidado e com outras maneiras de ter prazer em viver. A fenda da ferida-
colonial é profunda e se torna ingênua a visão de que vamos fechá-la. O nosso voo é dentro
mesmo do abismo que é o mundo que nos foi imposto. Nós, gentes racializadas comprometidas
com o antirracismo, por exemplo, não operamos por uma negação do esquema racial como se
ele fosse então desaparecer, e sim por fazer a sua política perversa falhar. Matar o esquema
branco da supremacia racial corresponde a um exercício de voo que diz de como habitamos o
mundo, de como estamos não mais caindo pela fenda, embora a queda seja constante. Em suma,
diz de como aprendemos a voar alto por baixo, desmanchando a lógica fundo-superfície.
Se insistimos em confrontar os planos futuristas da governança por meio de
contrarrespostas (a velha lógica binária de embate), elas podem anular os modos não
reconhecíveis de estar vivo ou viva ainda não alcançados por ela. Aprendi com o massacre de
nossas gentes que devemos atravessar as semiologias da guerra para outro lugar, um lugar da
prosperidade que se torna possível pela manutenção da vida. Se ficarmos na luta dialética, o
possível dela virá institucionalizar o jogo comum das raças. No colorismo negro, por exemplo,
preto versus branco, muitas vezes, acaba na institucionalização de um jogo comum em que os
sujeitos brancos sairão sempre à frente, quando as gentes pretas participantes do jogo se mantêm
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 12
presas à imagem do espelho branco. Contudo, importante observar que as marcações entre preto
e branco desse colorismo não correspondem às designações de preto e branco das populações
indígenas. No entanto, quando as ancestralidades de uma pessoa, como no caso da minha, estão
constituídas pelas composições do negro africano
22
e do indígena sul-americano
23
, o que é algo
comum em todo Brasil, mas que se manifesta de maneira preponderante nas pessoas
racializadas do nordeste do país, em especial as nascidas no Ceará e na Paraíba, ser uma
pretitude geralmente envolve uma complexidade na qual nossa autoafirmação no mundo não
cabe em certas cadeias da dualidade da ficção racial, embora estejamos constantemente
marcadas por tais cadeias.
Precisamos não esquecer que somos gentes marcadas pela raça e apontar a branquitude
de quem nos marcou e nos oprime, mas necessitamos estar cientes de que nós, gentes marcadas
como outras da brancura colonial, sabemos, em nossas vidas tornadas outras e por elas, alguma
coisa sobre possibilidades e somos constantemente tomadas por aquela branquitude como a
condição de possibilidade da produção de conhecimento dela. Ao que quero chegar é no fato
de que é na contingência secreta que as gentes em fuga reservam vida. o sujeito branco
colonial sofre do terrível mal de se achar singular, quando fala da singularidade das gentes não-
brancas. A condição dessa singularidade branca parece ser os mundos não-brancos. Trata-se de
um jogo de poder em que, ao mesmo tempo, o sujeito da supremacia racial se posta como
universal, pois seria ele o representante do status plenamente humano do mundo, e também se
reconhece como autêntico ou específico ao diagnosticar a sua peculiaridade em relação ao
restante dos povos. O problema é que esse diagnóstico é feito pelos jogos de poder, exclusão,
expropriação e negação de autonomia daqueles povos que passam a ser construídos como os
outros. Trata-se, então, de uma singularidade da ordem das fantasias do poder que tem
efetividade nas camadas estruturais, institucionais e comportamentais da sociedade.
Fazer a branquitude pensar a sua singularidade frente a vidas não-brancas sem fazer
estas últimas capturadas pela primeira é um passo para que a supremacia racial se perceba como
também situada em locais de existência específicos, que dizem sobre quem tem e quem não tem
poder, segundo os modos de governar o mundo. É preciso, sim, reconhecer que somos seres
22
A minha linhagem paterna está marcada pelos povos sudaneses africanos, em especial os da Nigéria, Daomé e
Costa do Marfim de onde veio uma das minhas avós. Na linha do tempo de concepção do meu pai, José Aldeni
Gadelha, a minha avó, Maria Alice da Silva, uma mulher negra retinta, concebeu seu filho com José da Costa
Gadelha, um homem branco de origem judia sefardita da Argélia.
23
A minha linhagem materna é oriunda dos povos Janduins e Paiacus em processo de fuga com outros povos
indígenas pelo Ceará e vizinhanças.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 13
marcados e posicionados estruturalmente, porque nenhuma plenitude e quebra das cadeias da
dualidade serão alcançadas se não estivermos atentos e atentas a como o Mundo do Mesmo nos
atravessa e nos constitui em algum nível. Todavia não somos refém das localidades e nem
espero as respostas dos sujeitos coloniais para seguir adiante com minha vida. A espera dessa
contrarresposta tão comum nos embates sobre racismo impede que continuemos as nossas
fugas, e é pelo que traçamos na fuga que nos mantemos gentes vivas. Os nossos possíveis não
dependem das respostas dos sujeitos privilegiados pela brancura colonial. É mais devolver o
mal-estar do racismo para eles e fugir em uma espécie de feitiço do que esperar fazer parte de
uma grande pedagogia do racismo. O que devolvemos é a logística de opressão e não os seus
produtos. Caso contrário, voltaríamos ao embate reativo direto. A nossa fuga diz de sabermos
estar e não estar nos jogos da governança, enfeitiçando o seu próprio fetichismo.
Resgato o meu futuro pelas possibilidades de fugir por dentro mesmo dos comandos
sem me servir de matéria para as fantasias coloniais de quem se posiciona via privilégios como
a maioria. Uma fuga somente passível de ser imaginada pelo corpo e pelo espiritual, pois a
imaginação fugitiva não se encontra flutuando na mente, ela está dentro das tecnologias que
engendramos com outros mundos e contra o Mundo do Mesmo. No caso das visões sobre como
elaborar neste plano novos mundos, não proponho simples capacidades reflexivas das
abstrações de sujeitos. Estou falando de efetivar moradia, educação, saúde, formas de cura e
cultura em suas cocriações
24
com organismos, máquinas, algoritmos, imagens, sons etc. Estou
falando, sobretudo, a respeito do crime (no sentido da quebra do ordenamento da governança)
para com essas tecnologias e suas organizações. O crime sempre informa sobre a falha da
regularidade delas, da enganosa acessibilidade a elas, da garantia democrática não garantida
por elas, da capacidade delas de supostamente gerarem vida quando muitas matam outras vidas
etc. Nesse sentido, o crime é uma rota de fuga. E porque se morre em sua esmagadora maioria,
não é uma fatalidade.
A imaginação fugitiva é totalmente corporificada em sentido de acoplamentos de gentes
com outras gentes e com vários mundos sem o princípio da propriedade, mas com vários
sentidos de alinhamentos vitais. Um corpo que (re)imagina toda uma vida aquém e além das
vidas existentes como normais e mesmo daquelas ditas anormais não por falta de oferta de
24
Não concebo a criação como fruto do “ego”, mas como um processo complexo e implicado que envolve diversos
seres e forças que conseguem se desligar das armadilhas do mundo tal como o conhecemos. Em razão disso,
quando falo que criamos algo, estou na verdade dizendo que criamos em comum, ou seja, cocriamos com alguma
coisa outra coisa que, por sua vez, continua ou permite continuar o processo por múltiplas direções e partilhas não
coloniais.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 14
novas designações, e sim porque a rota de fuga está acoplada a toda uma outra trama, a de forças
não localizáveis pelas normatividades que são as exímias e perversas designadoras de
comportamentos. E mais: a questão nunca é exclusivamente sobre o visível dos corpos, pois
pensar que tudo deve partir das formas (visíveis) do corpo no mundo e centralizar a vida na
matéria corporal é uma das fantasias da racialização. Daí, lidar com as marcações de gênero,
sexo e sexualidade das gentes insolentes ao cisheterofuturismo, que reduz estas pessoas ao
visível dos seus corpos, ser um grande problema, antes de todos os outros problemas que isso
envolve e que resulta em falhas para entendermos essas gentes nas suas lutas por mundos
habitáveis. Um exemplo de erro muito comum é o de resumir essas vidas como dissidentes,
quando na verdade elas possivelmente são insolentes à própria dissidência.
Ao que quero chegar é que parece haver uma política em andamento paralela às
tecnologias de controle e estimulação, uma política que não se contrapõe diretamente à Norma
(leia-se a semiologia prática e discursiva da governança) nem a acata tão nitidamente,ois
qualquer uma dessas duas atitudes resistir e acatar seria reconhecer o poder normativo e
novamente legitimá-lo via dissidência ou simplesmente via enfrentamento. A fabricação de
mundos habitáveis, no sentido mais fundo do que a visão butleriana de vida habitável
25
, é algo
que passa inevitavelmente por alguma rota clandestina, clandestina às próprias gentes
clandestinas. As clandestinidades traçam as rotas pelas quais se torna possível viver suas vidas
insolentes de serem vividas sob a lógica do Mesmo. Essa lógica não consiste em um contrário
da diferença, mas onde a própria diferença vem sendo posta como tal pelas mesmidades das
coisas. Se uma política de não reconhecimento para com a Norma que não passa pelo
confronto direto com esta última, é nessa política e por ela que todas gentes, em suas vibrações
clandestinas, depositam e irradiam suas capacidades inventivas de gerar novos mundos,
ultrapassando todo este Mundo do Mesmo que as persegue. Política não mais como campo
comum de tensão entre forças, mas como estratégias de vida não localizáveis pelos olhos dos
poderes supremacistas. o se deixar localizar por esses poderes sem tê-los ainda como
25
Butler (2006) compreende que nossa visão de humano designa vidas habitáveis e vidas não habitáveis, estas
últimas sendo todas aquelas marcadas pela dissidência, porque os próprios requisitos de humanidade foram
negados aos grupos dissidentes. Lutar por uma vida vivível no mundo que normatiza, segrega, adoece e mata uma
série de vidas consiste na visão política da autora por uma vida habitável. Butler acredita em um novo caminho
para o humano: “Há um certo caminho novo do humano que se com o fim de iniciar o processo de refazer o
humano. Posso sentir que sem certos traços reconhecíveis não posso viver, mas também posso sentir que os termos
pelos quais sou reconhecida convertem minha vida em inabitável. Esta é a conjuntura da qual emerge a crítica
como um questionamento dos termos que restringem a vida com objetivo de abrir a possibilidade de modos
diferentes de vida” (BUTLER, 2006, p. 16-17, tradução própria).
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 15
referentes ou referências para a não localização. E, talvez, política nem seja mais a palavra
adequada para tudo isso.
Ultrapassar as fantasias da sujeição
Sair da fantasia de desejar a herança moderna da polis e de seus sujeitos da existência
26
consiste em uma operação de desmistificação. A mistificação não é um mero efeito de verdade
de alguma mentira coletiva, ela é uma efetividade constrangedora, ela existe e tem agência
normativa. Com essa compreensão, me permito entender o limite que compreende as
insolências como resistências frente ao poder das sociedades. A ideia de resistência não
raramente restringe as questões das minoridades à visões dos humanismos legitimados pelo
poder das estruturas, como se nossas lutas fossem para restituição de uma humanidade
legitimada pela brancura cisheterofuturista que nunca nos pertenceu, esquecendo que muitas
minoridades nunca quiseram tal humanidade ou simplesmente abdicaram de lutar para ter a
humanidade dos hegemonismos, uma vez que esta última simplesmente não atende às
demandas de quem se encontra em outras posições no mundo. Temos nossas próprias maneiras
de autonomia, cooperação, dever, trabalho, prazer, criatividade etc. ainda que estejamos
negociando com o Mundo do Mesmo.
Acredito na força do que não resiste pelos ativismos políticos, e que assim mesmo foge.
Reimagino mundos não pelos diagramas de poder, mas constantemente por impossibilidades
de não ser comum aos diagramas, ainda que os diagramas persistam no mundo. Do fracasso de
abolir o diagrama, experiencio as condições de possibilidade de acessar outras dimensões não
localizáveis pelo Mundo do Mesmo. Isso tudo acontece quando trato sempre de encontrar uma
outra camada de vida, quando manifesto com outras gentes e forças que os nossos campos de
energia, de onde irradiamos outras imaginações possíveis, não são comuns com os projetos do
futurismo reprodutivo, pois essas imaginações não pertencem nem a um dentro deste mundo,
tampouco a um fora.
26
Em alusão aos limites de Foucault (2013) sobre a autonomia do sujeito que o autor tentava conferir em resgate
de uma nova estética da existência. Os sujeitos da existência são todos aqueles detentores do status plenamente
humano do mundo. Ainda que entre si eles estejam hierarquizados, eles podem resistir ao poder, podem abraçá-lo
ou enfrentá-lo com as possibilidades de um jogo estrutural de luta que lhes assegura o pertencimento ao campo da
humanidade. Ocorre que gentes racializadas, transgenderizadas e outras cuja humanidade lhes foi negada não
constituem sujeitos da existência, pois são os inexistentes sociais que, muitas vezes, até abdicaram de lutar por
uma vida habitável no mesmo mundo que os persegue, constrange e mata.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 16
Nas tradições afroindígenas pretas do nordeste brasileiro onde nasci, cosmovisões
simultâneas, presentes, passadas e futuras que acionam camadas que são invisíveis sem
contrapartida com o visível dos poderes supremacistas. O que não permitem nos reunir como
comunidades visíveis às investidas de poder-conhecimento de outros grupos. Os estudos sobre
povos indígenas em encruzilhadas com negros escapam dos estudos sobre comunidades
indígenas tão preferidos pela etnologia, porque os sentidos de afroindígena não se fecham numa
demarcação étnica ou simplesmente racial híbrida, pois tais sentidos acionam as dimensões
subjetivas, espirituais, cosmológicas, materiais e afetivas em constante fluxo com raças,
gêneros, classes, espaços e tempos de maneira a compor cognições e sensibilidades que
permitem outras concepções de experimentar o mundo e recriá-lo em diferentes territórios. O
que não significa que estudos reconhecíveis com comunidades racializadas possam dar pistas
sobre alguma maneira plural de compor mundos. Por exemplo, os estudos sobre a medicina
cósmica dos Pitaguary
27
e da poética ritual dos Tremembés
28
nos dão pistas pela etnografia e
pela historiografia sobre a dificuldade dos esquemas de realismo e fundamentação teórica da
academia de ciências médicas em entender que as manifestações do invisível não são
virtualidades, não são simples anedotas que contamos, que tais manifestações destoam de
princípios historicamente reconhecíveis aos olhos da ontoepistemologia herdada da
modernidade colonial. Essas maneiras de imaginar e criar mundos são invisíveis aos estados
duplos visível e invisível, dito e não-dito, audível e inaudível dos próprios diagramas de
poder.
Enquanto a academia insistir em capturar as imaginações radicais aos velhos parâmetros
de produção e circulação de conhecimento, ficará cada vez mais difícil entender outras
ontoepistemologias como as dos estudos da imaginação radical negra, que vêm criando
metodologias e outras experimentações sobre como abordar o que não se permite apreender
27
“As práticas indígenas de cura, como assumidas pelos Pitaguary, atuam com outra forma de racionalidade, bem
distinta daquela da biomedicina. Tal condição marca uma diferenciação não somente nas condutas diagnóstico-
terapêuticas, mas no modo como são consideradas as pessoas, a natureza e a espiritualidade.” (ANDRADE;
SARAIVA DE SOUZA, 2016, p. 180).
28
“Entre os grupos indígenas do Nordeste existem basicamente quatro modalidades de rituais, conhecidos pelos
nomes de: Ouricuri, Praiá, Toré e Torém. O Toé o mais difundido e se associa de maneira variável às duas
primeiras modalidades. Não iremos, aqui, oferecer uma descrição detalhada de todas elas, dado que nosso objetivo
é estabelecer um quadro geral a propósito da ritualidade indígena no Nordeste capaz de esclarecer as reelaborações
e correspondências que podemos encontrar no Torém Tremembé. Mais importante ainda certos elementos como
os cantos, a coreografia e a presença de bebidas alcoólicas ilustrarão a hipótese de um processo amplo de
comunicação entre esta ritualidade indígena e o imaginário popular no qual a figura do índio e a bebida alcoólica
se associam inelutavelmente, bem como um conhecimento das plantas e de seus poderes curativos.”
(MESSENDER, 2012, p. 32-33).
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 17
como arquivo reconhecível pela academia tal como a conhecemos. Eis a tarefa da fábula crítica
de Hartman (2019; 2008) e, sobretudo, da metodologia fugidia empreendida pelo plano dos
undercommons de que falam Moten e Harney (2013) a seguir:
Nos undercommons do domínio social reprodutivo, os meios, isto é, os planejadores
ainda fazem parte do plano. E o plano é inventar os meios em um experimento comum
lançado de qualquer cozinha, qualquer varanda dos fundos, qualquer porão, qualquer
sala, qualquer banco de parque, qualquer festa improvisada, todas as noites. Esse
experimento em curso com o informal, realizado por e sobre os meios de reprodução
social, como o advento das formas de vida, é o que queremos dizer com planejamento;
planejar no undercommon não é uma atividade, nem pescar, dançar, ensinar ou amar,
mas o incessante experimento com a presença futurista das formas de vida que tornam
tais atividades possíveis (MOTEN; HARNEY, 2013, p. 74-75, tradução e destaque
próprios).
Moten e Harney partem dos undercommons para sustentar a teoria do que denominam
de “estudo pretocomo um estudo profético, uma vez que este nunca se deixa localizar no
tempo real dos acontecimentos, sendo também uma espécie de plano fugitivo que improvisa o
futuro agora. O “estudo preto” nem se detém nas prisões conceituais nem se destina a
simplesmente se rebelar contra elas. Este estudo produz uma dimensão secreta entre a prisão e
a revelação que a primeira tenta impedir. Trata de “um segredo que chama à existência o
profético, um segredo mantido em comum, organizado como secreto, chamando à existência a
organização profética” (MOTEN; HARNEY, 2013, p. 42, tradução própria).
Se, com base nos planos futuristas da imaginação radical negra em alinhamento com
outras histórias da racialidade, falo em imaginar outramente o futuro como aquilo que constrói
redes não localizáveis, isso jamais corresponde a alguma demanda estritamente individual.
Quem criou o individualismo foi o mundo colonizador. Isso não faz parte dos meus modos de
conceber o “euque herdei dos meus avôs e minhas avós da linha materna, que eram povos
atribuídos como Tapuias pelos colonizadores e que eram diversas linhagens de indígenas das
fronteiras entre Maranhão, Ceará e Paraíba conhecidas por suas táticas de guerra impiedosas
para com os povos colonizadores
29
. O que vivo como “eu” existe em implicamento profundo,
uma vez que não imagino solitariamente nem indico que devemos ter essa carga imaginativa
29
“Antes da invasão holandesa, o conhecimento em geral que se tinha dos Tapuias e particularmente dos Cariris
era através das suspeitas informações dos índios Tupís, seus inimigos. Entretanto, já se haviam verificado alguns
contactos de missionários e sobretudo de aventureiros com estes aborígenes. Relativamente ao Ceará, o que temos
a respeito consta do relatório do Padre Luis Figueira, a <<Relação do Maranhão>>, escrita em 1608, descrevendo
a sua malograda expedição ao Ceará, na companhia do Padre Francisco Pinto, então sacrificado na serra da
Ibiapaba pelos Tapuias Tacarijús. Refere-se ao abnegado missionário aos Tapuias que habitavam a serra e as
circunvinhanças desta, pelo Maranhão e pelo lado do Ceará” (POMPEU SOBRINHO, 1934, p. 8).
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 18
toda sob as costas de uma única pessoa ou no mínimo adoeceremos. É quando nos realinhamos
com a Terra que conseguimos tecer novas linhas com o mundo.
Para realmente acontecer, a coisa viva vem de uma imaginação de todo um mundo
cindido e aberto, particular e múltiplo, que escapa e somente por ele efetível. Chegamos, então,
às dimensões das cosmoguerrilhas. O que denomino cosmoguerrilhas não são rebeliões nem
contrarrebeliões em todas as partes, o que as transformariam em agências estatais de
insurgentes. Elas são composições de mundos que não se deixam organizar pelo que o mundo
tal como conhecemos reconhece/reconheceria. Elas estão presentes em múltiplas maneiras de
produção de conhecimento e criação poética que anunciam outros mundos, tais como nas
ficções científicas de Butler (2019; 2017) e nas cosmopoéticas do refúgio de Bona (2020).
Ratifico: não penso os cosmos como existindo a partir de um contra o Mundo do Mesmo,
embora os primeiros acabem sendo contra este Mundo
30
. Então, as cosmoguerrilhas não
objetivam resgatar a memória da conquista por meio da guerra, elas não desejam manter a prisão
colonial por meio de tal memória. As materialidades das cosmoguerrilhas se fazem por uma
espécie de segredo que reimagina as prisões coloniais. As cosmoguerrilhas se permitem
serem localizadas como zonas futuristas prontas a violentar toda violência do Mesmo. Em toda
cosmoguerrilha, se negocia com o racional e o sensível, o representativo e não representável, o
localizável e o não-localizável, a instância e o devir em modos nunca previamente dados nem
totalmente visionados, mas sempre em alguma espécie de trama em que as forças de
manutenção deste mundo que nos constrange só sejam convocadas para o seu próprio fim.
As cosmoguerrilhas retomam um novo sentido de profecia e buscam instaurar uma
imaginação inventiva por meio das gentes que tiveram o desejo de sonhar sequestrado, mas que
conseguem viver pela rota de fuga e além, gentes que mesmo encarceradas estão à parte das
prisões sem estarem diretamente localizadas a partir de um contraponto ao que é racional e
irracional dessas prisões. Apenas os grupos iniciados as alcançam não por serem iniciados pelas
tecnologias da aprendizagem individual deste mundo ou por alguma fenomenologia dos seres
da própria organização, que interferiria sob algum trabalho pedagógico com outras gentes
fugitivas. As cosmoguerrilhas permitem a fuga, uma vez que propiciam aos seus mundos a
aprendizagem de que eles são o próprio universo se autoexperenciando. Trata-se da
30
Na conceituação de cosmos estão mundos que não partem do princípio da separabilidade entre vidas (mais que)
humanas com o mundo à diferença do Mundo do Mesmo em que o mundo é uma propriedade de humanos. Nessa
conceituação em que vidas humanas estão implicados com o universo, as cosmologias e cosmogonias se fundam
no princípio da existência em comum com todas as coisas e todos os seres.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 19
aprendizagem de que cada um ou uma de nós temos o poder de mudança, adaptabilidade,
destruição e criação da imanência radical do próprio cosmos como nos tem alertado a física
quântica sobre os fractais
31
. As cosmoguerrilhas nos ensinam que somos mais que humanos e
que nossas vidas são mais que sociais. A organização de alguma cosmoguerrilha se organiza
pela negligência para com a Norma como autocuidado e pela recusa como defesa. Os
ensinamentos das organizações são sempre para fugirem de todo ensinamento normativo,
porém sempre um reconhecimento entre uma vida e outra vida cuja rota é fugir. Em qualquer
parte deste Mundo do Mesmo, um mundo fugitivo escapa e sempre reconhecerá um outro
fugitivo.
A despossessão ontológica
Agora me dedicarei ao fato de que algumas gentes sempre foram tratadas como sem
ontologias
32
, o que causa um grande curto-circuito na rede de pensamento que opera pela noção
de sujeito como se esta fosse universalmente acolhedora. Estou no intuito de aprofundar a visão
sobre os limites dessa categoria sujeito para uma ação anticolonial. Ocorre que, quando essa
categoria foca aquelas gentes que não estão somente fora de sua ontologia, mas que a priori
foram entendidas como sem ontologias, como de certa forma foram compreendidas as gentes
pretas africanas e as indígenas das américas, deixamos de compreender o que não se permite
mapear pelas concepções modernas do sujeito. Mas óbvio que aqueles que detêm o status de
sujeitos muito prestativamente logo trataram de tramar uma narrativa de concessão da sua
ontologia àquelas gentes sem ela, quando tal concessão (diga-se de passagem, impossível)
interessava ao projeto ontológico moderno-colonial, em especial quando esse projeto começou
a ruir. E, assim, continua-se o projeto das gentes sem ontologias. Esse projeto, no caso das vidas
tornadas negras, costuma apresentar o seguinte trajeto:
A ontologia, quando se admitir de uma vez por todas que ela deixa de lado a
existência, não nos permite compreender o ser do negro. Pois o negro não tem
mais de ser negro, mas sê-lo diante do branco. Alguns meterão na cabeça que
devem nos lembrar que a situação tem um duplo sentido. Respondemos que
31
Na nossa composição física e bioquímica carregamos fractais de diversos corpos do universo, inclusive fractais
de estrelas de dimensões distantes. Os fractais agem como dimensões infinitesimais que nos conectam com todo
o universo, informando que carregamos características e capacidades de tudo o que existe e possa existir no mundo.
A respeito da nossa conexão material e quântica, ver Clegg (2018).
32
Resgato o sentido de ontologia como demarcador do humano nas epistemologias de origem europeia para
afirmar como ele se torna impossível para quem foi destituído/destituída de humanidade via processos coloniais
diversos.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 20
não é verdade. Aos olhos do branco, o negro não tem resistência ontológica.
De um dia para o outro, os pretos tiveram de se situar diante de dois sistemas
de referência. Sua metafísica ou, menos pretensiosamente, seus costumes e
instâncias de referência foram abolidos porque estavam em contradição com
uma civilização que não conheciam e que lhes foi imposta (FANON, 2008, p.
104).
Se a imposição civilizadora como diferenciação racial predeterminante de quem de fato
seriam os sujeitos é uma marca da colonização, a ideia de pôr em equidade todas gentes que
estão submetidas ao processo civilizador numa mesma posição do agente estruturalmente
reconhecido como o civilizado corresponde a uma ficção de poder, cujas maneiras de ser
materializadas no social são desastrosas. É o desapossamento de qualquer possibilidade que
determinadas gentes racializadas tiverem de usufruir dos bens da modernidade que a ontologia
da brancura fabrica como os legítimos e desejáveis. Dizer-se outorgar uma certa ontologia a
outrem tem sido uma tática corrente para diversos propósitos de governança em todo planeta
que, na prática, nunca reconheceram o Outro como ser de direito à vida digna por seus próprios
conceitos de dignidade.
Por exemplo, a respeito da narrativa da transição da Índia ao Estado Moderno,
Chakrabarty (1992) acredita que, além dessa transição ser uma obra de ficção que o mundo
colonizador contou às gentes colonizadas indianas, ela se fazia pela promessa de aderência
daquelas à condição de sujeito. Um acesso impossível porque, tanto no nível teórico como no
prático, o sujeito era sempre o europeu, aquele que, em sua diversidade de existências,
realmente usufruía de autonomia de acordo com as regras do Mundo do Mesmo. Nesse limite
das gentes indianas serem o sujeito da Europa, reside mais do que o indicativo genérico da
impossibilidade de todas as gentes colonizadas pela Europa se tornarem europeias. Há também
o limite da própria noção de sujeito para pensar as tomadas de posição na vida social pelas
gentes dos mundos colonizados.
Todavia, Spivak (2010) nos advertiu que nem todo Outro das colônias é um Outro da
Europa. No caso das colônias americanas, por exemplo, a questão de outridade é mais do que
uma disputa por nacionalismo, ela é, desde o seu início, racial-colonial, uma delimitação de
fronteiras entre o que seria humanidade e o que não seria. O princípio diferenciador é ser
realmente considerado um sujeito branco, segundo as configurações locais da branquitude de
origem europeia. E, no caso específico da ficção Brasil, nunca existiu nacionalismo sem
diferenciação racial e racismo. Os próprios sujeitos brancos coloniais do meu país devolvem o
ato de tal impossibilidade sempre que podem fazê-lo, ainda que inconscientemente ou
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 21
veladamente. Retomando o diálogo com Chakrabarty (1992), este autor nota que dois
sintomas cotidianos da subalternidade das histórias não ocidentais terceiro-mundistas: os
historiadores do outrora chamado Terceiro Mundo sentem uma necessidade de se referir às
obras de história europeia; por seu turno, os sujeitos historiadores da Europa não sentem a
obrigação de corresponder. E eles não sentem exatamente porque, para eles, nós, gentes
“colonizadas”, nunca fomos nem seremos sujeitos por mais que os que se fabricaram como os
verdadeiros sujeitos nos digam o contrário, por mais que eles concebam a ideia moderna de
sujeito por uma lente de ampliação e refração do tipo que, em um zoom cultural, haveria sujeitos
próximos a eles e noutro enquadramento haveria os sujeitos distantes da visão de como o sujeito
acha a si próprio.
A questão do sujeito passa longe da solução das lentes do relativismo cultural. E mais:
a diferença cultural tão endossada desse relativismo tem sido mais uma das inúmeras facetas de
atualizar a diferença racial
33
. Aqui, no Brasil, um exemplo típico de colonialidade da academia
são as exigências de exames de proficiência em língua estrangeira nos programas de pós-
graduação para candidaturas brasileiras quando, em universidades da Europa e dos EUA, por
exemplo, costuma ser rara a exigência para seus candidatos e suas candidatas a respeito de
alguma proficiência em outros idiomas que não os do próprio país. A academia brasileira
esquece ou finge esquecer que essa qualidade de exame que ela exige, além de promover o que
Bourdieu (2007, p. 9) chamou de “a distinção”, é pura colonialidade.
Destarte, as diferenças que enfatizo não podem ser reduzidas às questões de nomeação,
do tipo se nos chamam ou não de sujeito, porque o que ficou mais corriqueiro com o advento
das chamadas críticas anticoloniais somadas a outros pensamentos não hegemônicos foram os
espectros da sobrecodificação, que assombram todo o empreendimento dos modos de
conhecimento dos tempos atuais. Essa sobrecodificação não se resume a um código se
sobrepondo a outro, e sim no próprio princípio de elaboração do mundo por categorias de
entendimento, espaço, tempo e forma que fazem toda codificação possível. Fica a pergunta:
como elaborar cognições que não tentem reduzir os devires irredutíveis da vida nas noções
arquitetadas pelas ontoepistemologias herdadas da modernidade colonial?
No caso do Brasil, a lógica de codificação das raças, por mais velada que seja, não deixa
de dizer como as gentes pretas nunca foram sujeitos e diz isso de muitas maneiras. Uma delas
foi quando, após o processo de abolição da escravidão legalizada, as pretitudes jamais foram
33
A respeito de como a diferença cultural espelha a diferença racial, ver FERREIRA DA SILVA (2019).
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 22
incluídas no campo social que compreende os direitos dos sujeitos e, obviamente, os sujeitos
de direito. O que não significa que aqui acredito na possibilidade de tal projeto de inclusão,
enquanto ele estiver pautado nas composições da ontologia da brancura colonial, mas evidencio
a sua ausência de efetiva tentativa para apontar a falta de interesse do Brasil para com a
qualidade de vida das pretitudes. Por exemplo, após a abolição, as gentes pretas não foram logo
submetidas a projetos de incorporação à sociedade nem como trabalhadoras a vender sua força
de trabalho. Não obstante ao fato de aquelas vidas apreendidas pela categoria do proletariado
serem as que de tão expropriadas têm apenas a sua força de trabalho como meio de
sobrevivência, ver alguma gente como trabalhadora consiste em aproximar-se de certa noção
de sujeito, uma vez que a categoria sujeito pressupõe autonomia. E autonomia é uma das ficções
do sujeito do capital liberal, além de ser algo que até hoje as elites brasileiras não desejam
conferir aos pobres e tampouco reconhecem para gentes pretas, que continuam como a maioria
da população nos índices brasileiros de pobreza.
Segundo Borges (2018, p. 59), no Brasil, aquelas vidas outrora escravizadas
continuaram no período pós-abolição a serem vistas como mera força de trabalho: “Ao negro
sempre houve a força de trabalho, não como vendedor desta, mas como a própria força de
trabalho”. Isso se reflete até hoje quando gentes brasileiras são encontradas sob trabalho
escravo, gentes em sua maioria pretas. O que se encontra consiste em um difícil acesso dessas
a sujeitos de direito, pois a ideia de tal acesso seria um passo para um curto-circuito da rede do
colonialismo “pós-abolicionista” e de todo o racismo que a alimenta. Afinal, retomo Borges
(2018, p. 59):
[...] posicionar-se como classe trabalhadora no pós-abolição é uma
experiência problemática, porque posicionar-se em uma categoria que busca
direitos significa, primeiro, entender-se como sujeito no mundo, algo que foi
perversamente negado no sistema escravista.
Isso não significa que a questão do sujeito se faça exclusivamente pela de trabalho, mas
que esta última, em pleno exercício da designação trabalhador/trabalhadora, pode ser
concedida àquelas gentes que adquiriram a primeira. Hoje, há quem chame as gentes pretas de
trabalhadoras, mas as condições de trabalho da maioria dessas gentes continuam muito
próximas da escravidão.
A respeito dos efeitos do racismo no Brasil, continua Borges:
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 23
As consequências, principalmente no plano psíquico, são notáveis, como a
negação do ser que não é e pretende ser, deste indivíduo sem lugar e, portanto,
que nega a si e aos seus iguais todo o tempo (BORGES, 2018, p. 59).
A afirmação de sem lugar para essas pretitudes vem exatamente do fato de a sociedade
brasileira ter trabalhado a todo instante pela não inclusão dessas gentes. Isso assume
características extremas, desde os incentivos para trazer povos europeus brancos (em especial,
os italianos) ao Brasil em uma política com claros objetivos de branquear a população local sob
a total negligência com as vidas das populações pretas do país até os tempos de hoje, nos quais
políticas afirmativas, como as de cotas raciais, ainda encontram fortes barreiras para serem
efetivadas. Há muitos outros exemplos. Contudo, o processo de tentativas de se enquadrar em
uma noção de sujeito que não o abarca e nunca o abarcará faz do sujeito preto apenas uma
questão de nomeação, pois na prática o racismo vigente insiste em desdizer o que se costuma
dizer da boca para fora. É preciso reelaborar o que faz um sujeito de direito um sujeito de direito
e isso com a completa abolição dos modos de sujeição das arquiteturas de poder-
conhecimento que permitem à ficção racial ser constantemente atualizada.
O racismo tem um lugar proeminente na racionalidade própria do que foi cunhando por
Foucault como biopoder um poder sobre a vida para quem de fato o Mundo acha que merece
viver e se justifica por um fato já notado por Mbembe (2016, p. 128), a saber:
[...] mais do que o pensamento de classe (a ideologia que define história como
uma luta econômica de classes), a raça foi a sombra sempre presente sobre o
pensamento e a prática das políticas do Ocidente, especialmente quando se
trata de imaginar a desumanidade de povos estrangeiros ou dominá-los.
Então, mais do que voltar sempre ao racismo como modo de explicar a mentalidade que
gere os jogos de dominação, cabe-nos interrogar como a própria raça age como elemento de
pensamento-ação-sensação, que arquiteta e passa a ser constantemente arquitetada em redes
múltiplas que, por sua vez, tornam o racismo outramente possível e não só isso.
Rastros, redes e outras cognições possíveis
Agora, acompanho como o colonialismo está marcado por rastros que parecem
desaparecer, mas que sempre permanecem. Estou, cada vez mais, me distanciando da
concepção de que o Mundo do Mesmo seria apenas uma imposição irracional de violência ou
de que ele seria uma estrutura racional de ação violenta. Pois ambas as coisas se efetuam no
colonialismo: irracionalidade e técnicas racionais meticulosas para que o desejo irracional de
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 24
extermínio seja alcançado. A concepção de rastro encontra aqui seu sentido no fato de não
buscar centralizar as forças da colonialidade em esferas automatizadas que impeçam a detecção
das porosidades entre as opressões, suas conexões e desconexões com outras opressões, internas
e externas ao próprio colonialismo. Mais do que ficar restrito às abordagens que até reconhecem
as interfaces dos fenômenos de opressão, estou interessado em atravessar outras encruzilhadas.
Entendo a colonialidade como uma ininterrupta cadeia de violências que se atualiza dentro,
acima, abaixo, na frente e por meio da imposição das logísticas do Mesmo que podem ser
rastreadas por duas forças às quais essas mesmas logísticas se efetivam filosoficamente: a
abstração e a sensação.
a sensação de suspeita de que a manutenção da brutalidade de certas conexões e
desconexões entre mundos não seria possível sem o acoplamento de diversos recursos, meios e
muitos fins que se acordam para os extermínios das gentes de sempre (afrodescendentes,
quilombolas e as indígenas, principalmente no caso brasileiro). Atentar-se a como essas redes
agem me permite combatê-las onde elas se mostram mais cínicas, veladas, quase
imperceptivelmente possíveis de terem sua estratégia vista. Porém, os rastros do colonialismo,
que também são plurais e abertos, por mais que eles ajam por constrições de vidas, compõem
trilhas que se cruzam e desafiam as ideias de origem e sequencialidade. O que significa que o
colonialismo, em suas múltiplas maneiras de agir, não pode ser reduzido a uma narrativa, ou
mesmo a várias narrativas, que tenham o princípio de linearidade como base dos fatos.
cortes, fugas e resistências em todas as histórias de colonização e isso impede qualquer
vontade de sequencialidade, a não ser quando levamos em conta o fato de um mundo que se
pensa o Mundo ter se fabricado como tal via ideias de sequência e determinabilidade
34
.
Quando informo que a colonialidade continua, informo que ela continua porque os
rastros sempre voltam ou simplesmente eles estão ali se atualizando em devir com o mundo. Os
rastros são as marcas que aparecem e desaparecem constantemente para novamente aparecerem,
informando o caráter errático ou mesmo fantasmático que a colonialidade tem e daquilo sem o
34
Tomo emprestada a noção de determinabilidade de Ferreira da Silva (2019) para indicar as bases
ontoepistêmicas sobre causalidade e efeito do projeto moderno-colonial. A autora denominou de separabilidade e
determinabilidade dois elementos entrelaçados do programa kantiano continuam a influenciar projetos
epistemológicos e éticos contemporâneos: (a) separabilidade, isto é, a ideia de que tudo o que pode ser conhecido
sobre as coisas do mundo deve ser compreendido pelas formas (espaço e tempo) da intuição e as categorias do
Entendimento (quantidade, qualidade, relação, modalidade) , todas as demais categorias a respeito das coisas do
mundo permanecem inacessíveis e, portanto, irrelevantes para o conhecimento; e, consequentemente, (b)
determinabilidade, a ideia de que o conhecimento resulta da capacidade do Entendimento de produzir conceitos
formais que podem ser usados para determinar (isto é, decidir) a verdadeira natureza das impressões sensíveis
reunidas pelas formas da intuição” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 39).
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 25
qual ela não seria possível de ser materializada sob a forma de diferença entre humanidades, a
saber, a ficção racial. Por isso também que o racismo escapa de ser retido em uma totalidade,
que ele age em subcamadas variadas por uma série de necropoderes
35
. A visão que almejo
alcançar não traz respostas ou certezas a todas essas questões, mas isso não me isenta de olhar
o colonialismo por outra perspectiva, a dos rastros.
Vale lembrar, as teorias científicas do conceito de rede aparecem como sintoma das
macrologias econômicas e políticas que ganham maiores expansões nos séculos XIX e XX, de
maneira que tais teorias se tornam os parâmetros representativos das condutas do sujeito do
conhecimento de hoje, confundindo o desejo deste sujeito com a operação das redes em que ele
atua, mas este sujeito ainda moderno sempre foi muito mais do que este efeito de suas
sociedades industriais e pós-industriais. Embora teorias, como os estudos de Latour (1994;
2004), apontem que os híbridos e seus coletivos sempre existiram como tais e que a purificação
o processo que separa a vida em zonas ontológicas distintas e que impedia de pensar as
simetrias entre natureza e cultura foi a marca dos que se pensaram sujeitos modernos, o
ocidente europeu passou a pensar mais profundamente em redes no momento em que os
efeitos econômicos, sociais e culturais dos contatos com o atlântico e as imersões de rapina nas
áfricas e américas começaram a ser cada vez mais intensos.
O capitalismo mercantil e sua face posterior, o capitalismo industrial, podem ser
compreendidos a partir das múltiplas histórias da colonização moderna em que as vidas
designadas negras foram transformadas simultaneamente em mercadoria e força de trabalho e,
com isso, tais vidas se tornaram a simetria moderna de natureza e cultura que diz do Negro um
híbrido imaginado pela branquitude europeia a serviço da intensificação da purificação de
certos brancos como os sujeitos legítimos do mundo em relação a outros povos, mas que diz
sobretudo da materialização de um conjunto de práticas de abstração e sensação sobre o mundo.
Como sujeitos da modernidade europeia do dia para noite descobrem que não são nem
nunca foram modernos? Não foram apenas os experimentos da época metafísica nem o
surgimento dos laboratórios de ciência que de fato causaram tal descoberta, como quer Latour.
Os primeiros laboratórios foram os outros povos aos quais primeiro se conferiu a ideia de
inumanos (humanidades inferiores) e não humanos (aquilo que nem apresentaria
humanidade) para depois os compreenderem como objetos dotados de agência. Não à toa que
35
Em referência à teoria sobre necropolítica conceituada por Mbembe (2016) em que os necropoderes
correspondem às injunções das leis, das técnicas, das estéticas e de todas as forças que tornam manifesta macro e
microfisicamente as políticas de matar e deixar morrer determinadas populações do planeta.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 26
a grande teoria moderna da agência dos objetos se deve a essa fantasia colonial, na qual a
percepção de agência aos objetos de todos os mundos se deve à visão de igualar vidas tornadas
negras ao mundo das coisas. Isso diz de toda história de como a Europa construiu o Outro não
somente a partir de um self-mundo, mas também por processos de purificação e simetria entre
naturezas e culturas, embora o termo cultura tenha vindo a ser operado tempos depois do
início da colonização moderna do atlântico.
Volto ao fato de que é preciso ter cuidado com os essencialismos nos estudos sobre
colonialidade. No caso da colonialidade indiana, as configurações sobre o que seria o Outro
imbricam-se com um modo específico de subalternidade, como nos alerta Spivak (2010, p. 76):
Nos estudos subalternos, devido à violência da inscrição epistêmica
imperialista, social e disciplinar, um projeto compreendido em termos
essencialistas deve trafegar em uma prática textual radical de diferenças. O
objeto de investigação do grupo neste caso, nem mesmo do povo como tal,
mas da zona intermediária ou amortecedora flutuante é um desvio de um
ideal o povo ou os subalternos , os quais são definidos como uma diferença
da elite. É em direção a essa estrutura que se orienta a pesquisa, uma situação
um tanto diferente da transparência autodiagnosticada do intelectual radical
do Primeiro Mundo.
A filósofa indiana nos atenta para uma série de desvios possíveis que estruturam as
diferenças por dominação/subjugação, de maneira que todo conhecimento como saber-poder
também opera suas múltiplas rotas. no caso do projeto colonial via atlântico, uma de suas
particularidades foi o fato de um tipo específico de humano ser tido como agente e objeto, de
modo que a sua subjugação vinha por uma expropriação total da condição de humanidade. No
conhecimento científico da Europa, os objetos passaram a ser vistos como agentes híbridos de
natureza e cultura, pois o mundo percebido ao mesmo tempo como objeto e agência pelo mundo
branco moderno-colonial foram as vidas pretas africanas e, não obstante, as dos povos indígenas
que viviam/vivem nas américas. A partir daí que se amplifica certa concepção do pensamento
em rede como um pensamento que não centraliza mais o humano como centro das interações e
que não haveria mais separação entre naturezas e culturas, ou seja, a ideia de simetria encontrará
ressonância no tráfego daqueles agentes híbridos de natureza-cultura forçosamente embarcados
nos navios negreiros pelo fomento do atlântico como uma grande rede de conexão entre mundos
diversos. O salto de múltiplas dimensões que temos, a partir desse fato, é que nos permite
entender que o tecnoindustrial e o informático nunca foram as matrizes primeiras para pensar a
desconstrução de dualidades, de ontologias e de toda série de purificações que outrora certo
projeto de modernidade achou possível.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 27
A influência de como a indústria, e tudo que a gerou e o que dela foi gerado, tem
camadas que ultrapassam as matrizes da Europa Ocidental. No entanto, foi nesta Europa que se
iniciou uma série de deslocamentos do humano de funções até muito tempo pensadas como
executáveis direta e exclusivamente pela humanidade de lá. Estamos diante do surgimento das
operações do trabalho industrializado e do laboratório científico, que costumam nos aparecer
como os exemplos máximos de desfazimento dessa centralidade do humano que encontrou nas
operações informáticas desenvolvidas pelos EUA a sua maior expressão. Mas a mentalidade
tecnológica nascida na Europa e espalhada por todo o mundo não é o fato exclusivamente
responsável pelo surgimento do pensamento pós-humano. Essa própria ideia de irradiação traça
uma flecha do tempo da tecnologia. Porém, as tecnologias e o pensamento do sujeito como
efeito delas são fantasias daquelas pessoas que sempre insistiram em destinar outras gentes
como se estas últimas fossem objetos ou naturezas. Aí o pós-humano é mais humano do que se
possa imaginar!
Não à toa que a primeira coisa que certas teorias da rede trataram logo de fazer, ao
buscarem simetrias entre o humano e o inumano e não humano, foi continuar o projeto de
apagamento das representações daquelas gentes não consideradas humanas ou consideradas
humanas inferiores, coroando o racismo. Esse racismo que impede de ver que diversas
tecnologias ancestrais africanas e tecnologias indígenas das américas, cada uma a sua maneira,
não operam por zonas ontológicas distintas e purificadas, que as teorias pós-humanas dizem
pôr em xeque, mas que sempre foram desconsideradas pelas minhas ancestralidades africanas
e indígenas. A crítica dos pós-humanos, pós-orgânicos e outros ficcionadores de híbridos faz
sentido para quem primeiro acreditou num mundo humano separado das outras coisas e dos
cosmos para só depois enxergá-los como não separados.
Considerações finais: aquém e além das estruturas
A noção de cosmopolítica tem ganhado força nos movimentos ambientais e nas ciências
sociais, em especial na antropologia para compreensão das associações e dissociações entre
todos e todas viventes do planeta. A primeira aparição do termo vem dos trabalhos de Isabelle
Stengers para compreensão de como a história da ciência constrói determinada noção de mundo,
sendo que um desses trabalhos em sua versão mais recente aparece de modo suscinto/preciso
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 28
na forma de artigo publicado em português como A Proposição Cosmopolítica
36
. Em
ressonância com essa perspectiva que o termo começou a surgir em diferentes abordagens de
uma gama de autores, tais como Latour (2004) e Glowczewski (2015), para compreensão dos
modos de composição de mundos e como agem as associações e os ordenamentos por estes
mundos. Longe de compilar uma genealogia do termo cosmopolítica, este ensaio ensejou pensar
como podemos estruturar outros mundos, se entendermos os limites de muitas de nossas
categorias de entendimento e modos de sentir o outro. A rota foi a imaginação radical negra,
uma vez que estamos marcados e marcadas num mundo anti-negro em que a raça em
cruzamento como outros marcadores estruturais são forças que sustentam a separabilidade
37
das nossas relações sociais.
No entanto, reconhecer como as estruturas sociais nos posicionam segundo marcadores
de raça, classe, gênero, sexo e sexualidade, dentre outros, pode abrir passagem para perigosa
ideia de que a crítica estrutural deve se fechar nas políticas das identidades ou numa versão
também extrema, porém contrária, a de que devemos abolir os sentidos de pertencimento rumo
a uma pulverização de nossas histórias particulares em prol de um enquadramento dentro de
um quadro geral de compreensão em que todos seríamos humanos, apagando que a humanidade
não é garantia ontológica de todas as gentes do planeta. Ciente desses dois perigos, concluo este
ensaio sobre a importância política de atravessar tanto visões que afirmam pertencimento de
grupos como aquelas que entendem a possibilidade de existirmos outramente no mundo que se
torna um novo mundo, sem cair no devir da proposta pós-estruturalista de um mundo por vir
que refaz no campo do possível os roteiros da conquista e da expropriação.
Desde o que foi ingenuamente denominado de pós-estruturalismo, oriundo da academia
francesa, já era cada vez mais notório no campo acadêmico euro-americano centrado o fato de
que as ideias de representação e seu campo mais praxiológico o conhecimento sobre/com
ideologias pareciam implicar em uma espécie de mal ao novo pensamento da intelectualidade
moderna pós-estrutural e também para várias facções do pensamento pós-moderno que
apregoavam cada vez com mais veemência as fraturas plurais de tempo e espaço. Essas duas
modalidades diversas e plurais em si de conceber o mundo pós-estrutural e pós-moderno
tinham a representação estrutural e mesmo a ideologia como coisas problemáticas (para não
dizer fora de moda).
36
STENGERS, Isabelle. A proposição cosmopolítica. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, (69),
442-464, 2018.
37
A respeito do conceito de separabilidade, ver nota 30.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 29
No caso da influência europeia, esse momento deve muito de sua força às heranças dos
saberes pós-acontecimentos reivindicatórios de maio de 1968 na França, onde optou-se por
visões micrológicas que tiveram o desejo, a subjetividade e até mesmo o poder como dimensões
a serem compreendidas por operações não mais mapeáveis por conceitos macrológicos. Isso
disparou múltiplas maneiras de pensar com bases fortes nas filosofias nascentes da época, em
especial as de Derrida, Deleuze e Foucault, só para citar nomes dos mais conhecidos no Brasil.
Nos EUA, as investidas sobre o tempo e o espaço vinham principalmente dos avanços
tecnocientíficos do pós-segunda guerra e de toda política imperialista de ascensão desse país
frente ao mundo.
E mais: em ambos os casos, europeu e estadunidense, a teoria da relatividade e a física
quântica das partículas influenciaram modos de entender a vida social e cultural por meio de
concepções moleculares. E isso nos foi importante para entender melhor algumas questões
microfísicas da vida, porém nos foi danoso por acharmos que as ditas velhas questões
macrológicas, em especial as da política e da economia, poderiam ser compreendidas quase que
exclusivamente pelas micropolíticas que elas envolvem sem atentar que, segundo a própria
física quântica, o micro também está no macro e vice-versa. Até uma intelectual profunda como
Spivak (2010, p. 54) cai nessa armadilha quando diz: “a relação entre o capitalismo global
(exploração econômica) e as alianças dos Estados-nação (dominação e geopolítica) é tão
macrológica que não pode ser responsável pela textura micrológica do poder”. Ela também
esquece de atravessar a distinção entre micro e macro.
O problema na passagem do macro para o micro nos estudos sociais/culturais foi que se
opôs as novas concepções de diferença contra as de representação, de maneiras que essa atitude
cheira ao ódio em relação à possível autonomia daquelas vidas que foram menorizadas pelo
Mundo do Mesmo no que tange às questões de direito ao poder, principalmente contra as
representações de cunho identitário de vidas como as homoafetivas, as indígenas, as travestis
etc. Isso se tornou um processo de apagamento de onde se invocava falar de diferença sem dar
muita importância em como a identidade consiste em peça fundamental na luta por existência
social daquelas gentes que são, no nível de aquisição de direitos, sujeitos inexistentes sociais.
O que se estava a chamar de diferença em vários desses estudos franceses eram sempre
maneiras não identitárias de existir, o que serviu para -fé dos sujeitos transparentes
desautorizarem as políticas de afirmação dos grupos que tinham a sua identidade sequestrada e
dissolvida no jogo do devir e/ou das diferenças supostamente pensadas sem referentes.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 30
Por mais que possamos fugir como o diabo foge da cruz de tudo aquilo que fecha os
mundos em alguma identidade que o permita acompanhar e ultrapassar as variações e
derivações do poder, não aconselho simplesmente negar a identidade e todas as outras marcas
que nos constituem e que, muitas vezes, informam quem foi gente marcada para morrer e quem
foi para viver segundo os modos de governança. A equivocada concepção de que negar as
identidades em prol de diferenças no sentido pós-estruturalista permitiria potencializar certos
sujeitos acabou por ofertar recurso aos projetos de apagamento de certas gentes em prol do
sujeito dominante de sempre, que permanecia novamente confortável em sua zona de
transparência para com um mundo que, por sua vez, se mantinha renovado como o Mesmo.
Nessas espécies de estudo, os locais dos supremacismos eram ratificados como a Norma por
meio de certos discursos da diferença, que, no caso especial da filosofia de Deleuze, não
raramente era uma maneira do sujeito diferir buscada pelas intensidades do Outro, por meio das
cartografias da conquista e da expropriação de intensidades.
A ideia de que se estar sempre aberto à multiplicidade e, por isso, à desterritorialização
não diz e tampouco justifica porque, em muitos questionamentos de Deleuze e seus seguidores,
é o sujeito da supremacia racial que necessita de seus outros para empreender a
desterritorialização tal como nos processos de territorialidade descritos por Deleuze e Guattari
(2010) na sua obra máxima, O Anti-Édipo. Embora em tal obra os autores não restrinjam pensar
devir e/ou diferença apenas pela fantasia colonial de menorização de outras existências, essa
forma de pensar se tornou um avatar dos “movimentos aberrantes” para acionar uma
expressão de Lapoujade (2015) de tal filosofia. Apagava-se, assim, não só as ideologias das
lutas das gentes espoliadas de toda espécie, mas apagava-se, principalmente, o fato de que era
de um lugar muito particular e ideologicamente construído, ainda que pensado como
transparente, que vinha toda a invocação e defesa das chamadas diferenças para si, que
existiam via os outros do cardápio colonial interminável sobre o diverso. Quem de fato está
aberto às multiplicidades, primeiro, as buscas em sua própria vida na conexão com outras, e
não no ato de consumir intensidades alheias, a partir da redução da vida dos outros às fantasias
coloniais. Contudo, a localidade, como nos permite entender Ferreira da Silva (2019), é mais
uma ficção de ordenamento, uma vez que o macro está no micro e este no macro, se de fato
seguirmos a visão quântica de que tudo está no todo e o todo em toda parte, por mais fractal
que esta seja.
Não ouso mais operar por uma linha de fuga estritamente no sentido da filosofia da
diferença que desmaterializa mundos e fica suscetível de alguma nova
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 31
territorialização/materialização. Por muito tempo, operei sempre de modo crítico com essa
filosofia (GADELHA, 2017) e, nos meus últimos estudos, tenho tratado de compreender como
a matéria mesma desaparece não por apagamento necropolítico, mas por um efeito de
fugitividade
38
o efeito de que a coisa permanece viva e irradia potências sem poder ser
vista/apreendida pelo mundo tal como o conhecemos e também por um efeito de
espectralidade o efeito da coisa ir e voltar, aparecer e desaparecer assombrando as dimensões
espaço-temporais como nos têm demonstrado os estudos de Gordon (2008) sobre
fantasmagorias sociais, entendidas pela autora como um estado de animação que se abre pelas
fendas espaço-temporais das estruturas sociais e move uma violência social reprimida ou não
resolvida que se sabe, às vezes muito diretamente, às vezes mais obliquamente.
Destarte, eu tenho buscado entender como a matéria (mais que social) de nossas vidas
negocia ou pode sempre negociar com a colonialidade de modo que, no inesperado da transação,
ela acione como colapsar as marcações espaço-temporais do poder, estando essa matéria ali
mesmo onde passam a ocorrer as coisas, onde não haveria mais espaço-tempo a ser
cartografado. Como fazer sumir o tempo e os acontecimentos passarem a acontecer onde
espaço-tempo algum pode ser demarcado? Parece haver uma guerrilha com as próprias
dimensões dos eventos. As narrativas ordenadas do sujeito herói, do salvador, do vencedor, não
alcançam a guerrilha porque esta mesma posta-se sob a insígnia do erro e da morte voltando
como coisa viva, coisa secreta, coisa errática, coisa espectral, tudo aquilo que os arquivos
coloniais dos fins e suas próprias críticas não dão conta.
38
Transmuto a noção de fugitividade tal como proposta por Moten e Harney (2013). Para os autores, a fugitividade
é uma força tramada nos undercommons que escapa até mesmo do desejo de fuga dos seres envolvidos. Lanço a
inquietação de que essa capacidade alinha o (mais que) humano e o não humano com as força fugidias do universo,
tais como as de quebra do espaço-tempo que vão contra a nossa flecha do tempo que organiza as percepções e
sensações do que é determinado mundo.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 32
REFERÊNCIAS
ANDRADE, J. T.; SARAIVA DE SOUSA, C. K. Práticas indígenas de cura no Nordeste
brasileiro: discutindo políticas públicas e intermedicalidade. Revista Anuário
Antropológico, v. 41, n. 2, p. 179-202, 2016.
BONA, D. T. Cosmopoéticas do refúgio. Florianópolis: Cultura e Bárbarie, 2020.
BORGES, J. O que é encarceramento em massa? Belo Horizonte: Letramento; Justificando,
2018.
BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo/Porto Alegre:
Edusp/Zouk, 2007.
BUTLER, J. Deshacer el género. Barcelona: Paidós, 2006.
BUTLER, O. Kindred: Laços de Sangue. São Paulo: Editora Morro Branco, 2017.
BUTLER, O. A parábola dos talentos. São Paulo, Editora Morro Branco, 2019.
CHAKRABARTY, D. “Postcoloniality and the Artifice of History: Who Speaks for ‘Indian’
Pasts?”, Representations, v. 1, n. 37, p. 1-26, 1992.
CLEGG, B. Teoria quântica: 50 conceitos e ideias fundamentais explicados de forma clara e
rápida. São Paulo: Publifolha, 2018.
DELEUZE, G.; GUATTARI, F. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo:
Editora 34, 2010.
DELEUZE, G.; PARNET, C. Diálogos. São Paulo: Editora Escuta, 1998.
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
FERREIRA DA SILVA, D. A dívida impagável. São Paulo: Oficina de Imaginação Política
e Living Commons, 2019.
FOUCAULT, M. História da sexualidade: o cuidado de si. Rio de Janeiro: Edições Graal,
2013. v. 3.
GADELHA, J. O Sensível E O Cruel: uma aprendizagem pelas performances
sadomasoquistas. Rio de Janeiro: Metanoia Editora, 2017.
GLOWCZEWSKI, B. Devires Totêmicos: Cosmopolítica Dos Sonhos. São Paulo: N-1, 2015.
GORDON, A. Gosthly Matters: Haunting and The Sociological Imagination. Minneapolis:
University of Minnesota Press, 2008.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 33
HARAWAY, D.; KUNZRU, H. “Você é um ciborgue”: um encontro com Donna Haraway.
In: SILVA, T. T. da. (org.). Antropologia do ciborgue as vertigens do pós-humano. 1. ed.
Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 17-32.
HARTMAN, S. Lose Your Mother: A Journey Along the Atlantic Slave Route. Princeton:
Farrar Straus Giroux, 2008.
HARTMAN, S. Wayward Lives, Beautiful Experiments: Intimate Histories of Social
Upheaval. New York and London: W.W. Norton & Company, 2019. E-Book.
HEGEL, G. W. F. Ciência da Lógica 1. A doutrina do ser. Petrópolis: Vozes, 2016.
KANT, I. Crítica da Razão Pura. São Paulo: Abril S. A. Cultural e Industrial, 1974.
KELLEY, R. Freedom Dreams: The Black Radical Imagination. Boston, Beacon Press,
2002.
KOPENAWA, D.; ALBERT, B. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São
Paulo: Companhia das Letras, 2015.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
LAPOUJADE, D. Deleuze, os movimentos aberrantes. São Paulo: n-1 edições, 2015.
LATOUR, B. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. São Paulo: Editora
34, 1994.
LATOUR, B. Políticas da natureza: como fazer ciência na democracia. São Paulo: EDUSC,
2004.
MBEMBE, A. “Necropolítica”. Arte & Ensaios - Revista do PPGAV/EBA/UFRJ, v. 1, n.
32, p. 123-151, 2016.
MBEMBE, A. Crítica da razão negra. São Paulo, Editora N-1, 2018.
MESSENDER, M. L. L. Etnicidade e ritual Tremembé: construção da memória e lógica
cultural. Revista de Ciências Sociais da UFC, v. 43, n. 2, p. 32-42, 2012.
MOTEN, F.; HARNEY, S. The undercommons: Fugitive planning and black study.
Wivenhoe; New York: Minor Compositions, 2013.
POMPEU SOBRINHO, T. Os Tapuais do Nordeste e a Monografia de Elias Herkman.
Revista do Instituto do Ceará, Revista por ano/1934, p. 7-28, 1934. Disponível em:
https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1934/1934-
Tapuias.pdf. Acesso em: 01 out. 2023.
SPILLERS, H. Black, White, & in Color. Chicago: University of Chicago Press, 2003.
Imaginar novos mundos agora: Cosmopolíticas e racialidade
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 34
SPIVAK, G. A critique of postcolonial reason: toward a history of the vanishing present.
Cambridge, Massachusetts, London: Havard University Press, 1999.
SPIVAK, G. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.
STENGERS, I. A proposição cosmopolítica. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros,
Brasil, n. 69, p. 442-464, 2018.
TSING, A. L. O Antropoceno mais que Humano. Revista Ilha, v. 23, n. 1, p. 176-191, 2021.
VIVEIROS DE CASTRO, E.; DANOWSKI, D. Há um mundo por vir? Ensaio sobre os
medos e os fins. Florianópolis: Cultura e Barbárie; Instituto Socioambiental, 2014.
WARREN, C. L. Ontological Terror: blackness, nihilism, and emancipation. Durhan;
London, Duke University Press, 2018.
CRediT Author Statement
Reconhecimentos: Não se aplica.
Financiamento: A pesquisa foi realizada com financiamento da CAPS.
Conflitos de interesse: Não se aplica.
Aprovação ética: Não se aplica.
Disponibilidade de dados e material: Não se aplica.
Contribuições dos autores: Autoria única.
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 1
IMAGINE NEW WORLDS NOW: COSMOPOLITICS AND RACIALITY
IMAGINAR NOVOS MUNDOS AGORA: COSMOPOLÍTICAS E RACIALIDADE
IMAGINANDO NUEVOS MUNDOS AHORA: COSMOPOLÍTICA Y RACIALIDAD
Juliano GADELHA1
e-mail: jjulianogadelha@outlook.com
How to reference this article:
GADELHA, J. Imagine new worlds now: Cosmopolitics
and raciality. Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23,
n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419. DOI:
https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372
| Submitted: 17/08/2023
| Required revisions: 08/10/2023
| Approved: 03/11/2023
| Published: 22/12/2023
Editors:
Profa. Dra. Maria Teresa Miceli Kerbauy
Prof. Me. Mateus Tobias Vieira
Profa. Me. Thaís Caetano de Souza
1
Writer and multidisciplinary researcher. Master's degree from the Postgraduate Program in Arts at the Federal
University of Ceará, Master's degree in Sociology from the Postgraduate Program in Sociology and Bachelor's
degree in Social Sciences from the same university.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 2
ABSTRACT: This critical essay interrogates colonial modernity's meanings of cosmos, life,
and politics in order to understand the knowable and sensible processes of the struggle for
existence in the world as we know it. The theoretical discussion follows the proposition of
concepts through the black radical imagination, and a critique of the conceptions of subject and
subjection. The methodology involves studies on racism and coloniality for a cosmopolitics that
is attentive to the racialized ways in which governance manages the present, the past and the
future in societies.
KEYWORDS: Cosmos. Escape. Governance. World. Life.
RESUMO: Este ensaio crítico interpela os sentidos de cosmos, vida e política da modernidade
colonial para uma compreensão de processos cognoscíveis e sensíveis de luta por existência
no mundo tal como o conhecemos. A discussão teórica segue a proposição de conceitos por
meio da imaginação radical negra e uma crítica às concepções de sujeito e sujeição. A
metodologia implica os estudos sobre racismo e colonialidade para uma cosmopolítica atenta
aos modos racializados como a governança gere o presente, o passado e o futuro nas
sociedades.
PALAVRAS-CHAVE: Cosmos. Fuga. Governança. Mundo. Vida.
RESUMEN: Este ensayo crítico interroga los significados de cosmos, vida y política de la
modernidad colonial para comprender los procesos cognoscibles y sensibles de la lucha por la
existencia en el mundo tal como lo conocemos. La discusión teórica sigue la proposición de
conceptos a través de la imaginación radical negra y una crítica de las concepciones de sujeto
y sujeción. La metodología implica estudios sobre el racismo y la colonialidad para una
cosmopolítica atenta a las formas racializadas en que la gobernanza gestiona el presente, el
pasado y el futuro en las sociedades.
PALABRAS CLAVE: Cosmos. Escape. Gobernanza. Mundo. Vida.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 3
Introduction
This critical essay starts from the principle of black
2
radical imagination, which does
not consist of a school of thought, nor does it consist of a teaching methodology that calls on
the well-known Kantian parameters
3
of proof and the Hegelian parameters
4
of justification for
theoretical foundations. The idea of radicality comes from how it is possible to imagine the
formulation of our categories of understanding in another way without necessarily detaching
ourselves from our experiences. The attribute of black comes from the fact that it was
intellectuals, artists and groups from social movements against anti-black racism who produced
the first works of this plural kind of imagining worlds in favor of lives turned black in multiple
attempts to escape from the same paradigms that ensure anti-blackness continues to operate in
academia, the arts and politics. An extremely striking work in this endeavor is Freedom
Dreams: The Black Radical Imagination
5
by Robin Kelley, in which the author recounts his
experience as a black intellectual and activist who finds in the desire for freedom not a direct
way of making racism visible and understandable, but a way of imagining the anti-racist
struggle in another way. But how does this quality of sensitive and cognitive capacity become
possible for us, people marked as black? This essay attempts to show this. To do so, it invokes
other manifestations of the world that allow us to rethink some paradigms on race.
Spillers (2003) talks about the extent to which our approaches against racism still move
within a framework of ontological and epistemological understanding that ensures that this
same racism reinvents itself as criticism and even dialogue with the same ends in disallowing
2
In this essay, the identity-political designations of black(s) and the demarcation of blackness that bifurcates the
usual meanings of what would or would not be human are always used to emphasize the plurality of these lives
nuanced by race and their impossibility of ontological rescue within any context still marked by racial fiction.
3
Kant (1974) argued that knowledge about morals, ethics and politics comes from experience, but that there is a
transcendental knowledge that marks experience itself, so that scientific work would always be how this first
knowledge manifests itself in our lives, while philosophy would reflect on the depths of the transcendental itself,
which would allow the philosopher to arrive at pure reason. The scientist's goal will always be to prove a force
that allows the thing to exist as a thing or, otherwise, the thing does not exist. This Kantian ghost of proof crosses
times and places and is even manifested in the social sciences and cultural studies, which believe they have rid
themselves of pure reason. Mbembe (2018) demonstrates this very well in his critique of black reason.
4
Hegel (2016) takes up the Kantian question of reason as the identity of being and object, formulating a principle
of humanity that crowns reason as the marker of the human. Here, the question does not stop at proving a
transcendent capacity of things, but above all justifying (i.e. making the thing amenable to rationalization) so that
it can assume existence, that of being conscious or that of object (that which is passive to other consciousnesses).
In this philosophy, ideas are objects that do not need to be proven in the direct materiality of social life in order to
be justified. These ideas just need to be coherent. This coherence would come from self-consciousness
(Selbstbewusstsein), which does not just abridge to a person's awareness of themselves. Reason would not be in
the field of a thought that is not found in the world that thought itself tries to understand, but in an immanent
capacity of thought that becomes object and phenomenon, and as such inseparable from the justification of its
movements.
5
KELLEY, Robin. Freedom Dreams: The Black Radical Imagination. Boston: Beacon Press, 2002.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 4
the production of knowledge by black people. The author warns us to always put our paradigms
under suspicion, otherwise we tend to fall back into the traps of a knowledge that has always
produced us as the others of science, those whose thoughts and actions can only be understood
as research objects that always need a white framework for validation. It is at this point that the
radical imagination distances itself from traditional black studies, which are usually trapped in
the same conceptual tools that oppress them, because it does not attempt to perform structural
critique by re-enacting the grammars that sustain the world as we know it, which is anti-black.
It is part of the black radical imagination to bring everyday life marked by racism and
make a break with the world as we know it, composing a new political imagination now. By
"now" I mean the duration against the arrow of time in which all times are possible. This is not
about proposing localized studies of how a certain racialized group lives in a cultural context
under the weight of certain structural oppressions. It's about how people marked by race as
black turn this into an infinite field of possibilities to guarantee our existence in a world that
does not recognize us as beings entitled to a dignified existence. The black imagination has
experimented in infinite and radical ways with the formulation of concepts, the creation of
poetics and the proposition of other ways of life for black people that allow them to critically
cross power structures towards new worlds. Hence the futuristic character of this imagination,
which turns its formulations into a refusal of conventional ways of doing science and
philosophy, without denying the importance of imagining the scientific and philosophical in
another way. Here, this imaginative task begins with a critique of the conception of the subject
6
that has guided various social movements in search of recognition of the autonomy of their
members in societies. It so happens that little has been done to question the extent to which this
category allows us to overcome old and new modes of subjection. This attention is followed by
a series of critical formulations as routes for imagining a new cosmopolitics, in other words, a
new composition of our lives with everyone else on the planet without re-enacting the
foundation of property and its most perverse action, the total expropriation of the other, which
is the foundation of slavery.
The subjects who attribute civilization to other worlds, the uncivilized or barely
civilized, who would need to be convinced to unite in the same world project, which would be
exactly the project of civilizing societies: this is the facet of the colonial project that reinvents
and updates itself through discursive practices, which present themselves as plural, dialogical,
6
I use the word subject in italics to emphasize its inability to include the different positions of race, class, gender,
sex, sexuality, among others, that non-normative ways of existing experience.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 5
democratic, salvationist, among other definitions that are far from an effective process of
historical reparation with other peoples, whose right to human ontology
7
was denied at first. If,
on the one hand, the worlds despoiled by colonization have already been almost completely
plundered by the last half millennium, on the other, the world of the subjects who created this
modernity shows increasingly obvious signs of the ruin of their cosmopolitics, which not only
guided them in their respective self-projects of civilization, but which was also responsible for
the very colonial enterprise that continues in its becoming-world
8
, breaking down the divisions
between North and South in these times of those who, according to their own twists and turns
in the trunk of the onto-epistemic inheritances
9
of modernity and humanity, no longer think
they are modern
10
or even human.
In fact, the European civilizing process and coloniality have become one and the same
project. And the most dangerous thing is that it is a project with multiple dimensions, spatialities
and localities. Coloniality, in its plurality, is now becoming the world since its modes of
governance (read: the apparatuses, techniques, aesthetics, sharing, languages and desires that
unite finance, politics and racial fiction)
11
are everywhere. And to make matters worse, there
are the so-called geophysical problems of the planet, which no longer only concern the
existence of (more than) human collectives on Earth, which creates the feeling that the sky will
soon fall for all terran worlds
12
. If the sky has already fallen for other people, why is it only
7
A philosophical principle that makes it possible to understand multiple existences, based on a conception of the
human that is unimplicated from the world itself. This is the Heideggerian legacy of ontology that has forgotten
that the very contingency of the human is marked socially, culturally, morally and politically, so that the human is
not a universal ontological category, as studies by Spivak (1999) and Warren (2018) have already revealed.
8
In addition to affirming certain ways of ordering the world, coloniality also produces meanings of worlds that
are yet to come, since it is mobile and strategic, moving through socio-cultural and historical processes without
being tied to the time and space of a specific locality. It is in the future that coloniality is actualized as new, as
avant-garde, as (re)invention in terrifyingly creative ways. Its new worlds always return as a World of the Same.
9
According to Spivak (1999), ontology has always guided the parameters of knowledge production and the
reflection on this production - epistemology - so there is no such thing as a transparent epistemology, i.e. one that
is not marked. It is in this sense that I speak of ontoepistemic inheritances to allude to what we have inherited from
certain ways of understanding the world and formulating categories of understanding.
10
Here, notions of the modern are based on the understanding that a space-time dimension has been determined
as modern or modernity through economic, social, cultural, political, moral and, above all, racial conceptions and
values. It's about the concept of modernity as a colonial inheritance that reinvents itself as plural in order to deal
with the difference in the world, the endless others that this modernity constructs from time to time in different
localities.
11
Although the concept of governance is plural in political philosophy, I use it to point out that governance is not
just about modes of government. It consists of a mobile and strategic alliance between capital, politics and race
that crosses and is crossed by different modes of government around the world.
12
I allude to the "fall of the sky", based on David Kopenawa's prophecy about the end of worlds in which the Earth
is not just planet Earth (KOPENAWA; BRUCE, 2015). Terran worlds are multiple dimensions that acquire
cosmology through the principles of space, time and form. These worlds are compositions that order the ways in
which we understand locality, duration and the definition of things and beings with the Earth.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 6
now that the supremacist subjects are worried about the fall? Well, the fall they fear is that of
what they identify as their world, because other worlds they have already tried to overthrow,
nothing more obvious and petty. Hence the voices of certain worlds come to haunt other worlds
again on various fronts. The old colonial tactic! What has changed is the shape of the caravels,
now in the mold of neoliberal democracy, of international economic and political packages, of
the deeper ways of feeling and expressing/performing things. It is in these latter ways that, for
example, we have what I call "artistic reproductive futurism".
"Artistic reproductive futurism" consists of the modes of governance in the arts, that is,
the structures of power-domination that manifest themselves in the cognitive, sensitive and/or
aesthetic ways of the arts field and which are updates of colonial, classist, cisheterofuturist
13
and racist structures, among other markings of power-difference in (more than) social life
14
.
These manifestations occur because there is no such thing as art as an autonomous field on the
one hand and modes of governance on the other, but rather because the arts are part of the ways
in which we organize ourselves, think, feel, desire and interact with other living people who are
marked by the cognizant and sensitive architectures that also sustain governance itself. It is in
this composition with worlds that the arts need to elaborate meanings and actions that make it
possible to avoid the manifestation of the structures of domination that precede and follow the
very construction of works or poetics. I say avoidance not in the sense of denying that the arts
are crossed by these structures, but that, in the very impossibility of denying them, we can trace
paths of decolonization of matter and the sensible. So "artistic reproductive futurism" is not
limited to questions of capitalized modes of production or other modes of production tied to
political-economic imaginations; it takes on often subtle spheres of how a normative future
(sexual, religious, generational, etc.) is being maintained even through what we believe to be
the purest subversion of things or believe to be an honest sharing with other forms of life. Hence
the importance of the anti-colonial stance in the arts, because it does not deny the importance
of making art, nor does it exclude the possibilities for people who make art (curators, artists, art
critics, etc.) to negotiate with the curatorial, exhibition, aesthetic laboratory and other markets
13
From the principle that orders futures according to compulsory heterosexuality and cisgenderism.
Cisheterofuturism is a concept I created to inform that the normativities of gender, sex and sexuality produce
futurity.
14
All forms of power produce differentiation between people, things and institutions. The idea of power-difference
serves to point out that difference is not always what escapes modes of domination, as Deleuze and Parnet's (1998)
post-structuralism would have it when they conceive of difference as a line of flight. This French philosophy takes
escape in reference to the plane of representations, forgetting that the diagrams of power are both molar and
molecular, in other words, that these diagrams are both representative and intensive, so that in this philosophy,
escape is against representation and not against the general logic that allows both instance and becoming.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 7
of this field in capitalist societies. Anti-colonial criticism, in its various forms, proposes the
abolition of modes of art-making that are still hostage to governance.
There are all kinds of extractivist subjects proposing peace and unity between the worlds
that modernity itself once divided between moderns and non-moderns. The former, as always,
thinking of the good of all people and for all people, with themselves as the totality. In the end,
this shows that by people they mean only themselves. The colonial project of salvation is that
the subjects, the supposed moderns par excellence, would be aware that they would have to deal
with a certain condition:
[...] the condition that they recognize the existence of a real war where they
saw only a question of politics and the "re-socialization" of ontological
delinquents (the non-modern ones) (VIVEIROS DE CASTRO; DANOWSKI,
2014, p. 121).
But coloniality in these parts was never a question of resocialization, but of
extermination of indigenous peoples and enslavement, especially of black people of African
origin. The thorn in the side of modern people in Europe and their white descendants here is
that now we, racialized people from the Americas and other lands they invaded and plundered,
for whom we were never modern beings, want our part in this modernity. We want to point out
that we are not responsible for the devastation of the Earth, whose effects modern people and
all their modernity have caused and imposed on all humanities, but that we demand rights to
education, health, the economy, and other things more than the political and economic games
played by them commanded say they offer us and they don't offer. Contrary to what some
theories about the Anthropocene might think, such as Tsing's (2021) anthropogenic fable that
seeks more than human alliances, there will be no peace between our worlds and them because
we learned that this separation between us and them is only ours beneficial to the extent that
we manage to escape them, that we remove and return the separatist logic that separates humans
from the universe and that does not recognize how we all are part of everything that exists in
infinity and without the principle of property.
When I question modernity, I am not looking for (impossible) inclusion in their world,
since this world is marked by hierarchical distinctions that produce expropriation, plundering
and massacres of all kinds, all of which are sustained by ways of thinking, acting and feeling
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 8
that are hollowed out by wisdoms of "in common"
15
. In my worldview
16
, there is no separation
between everything we recognize as human and other living things. This separation is one of
the compositions of colonial ways of thinking. This does not mean that I am proposing a
cosmopolitics of homogeneity, but rather a cosmopolitics of recognizing singularities through
the entanglements between all the ways of being in life. However, since they produced what
currently comes to us as governance, the latter hits me with daily blows with which I am
separated from them all the time via exploitation, violence and, above all, in the acquisition of
rights to a livable life.
I come from Afro (descendants of Sudanese peoples) and indigenous (Janduins,
Jenipapos, Canindés and Paiacus peoples) lineages in northeastern Brazil that have given me
conceptions of the future and of being alive that cannot be mapped by any reproductive futurism
of governance. This latest futurism, in its idea of a world to come as salvation for all worlds, is
trying to hold us hostage to a new debt, the debt for the salvation of the planet that finds in
turbulent climatic phenomena supposed justifications for exempting people from their
extermination of other people, maintaining the asymmetrical logic of powers through a false
symmetry, the symmetry that we are all responsible for the devastation of the planet. Well, we
have always been committed to our mother Earth, because it is the colonial subject who has
made its governance an agency with the non-human, causing more and more ends of the world.
This debt card seeks to soften the asymmetries between worlds, so that its proponent subjects
are not concerned with thinking about a symmetrical future for all Earth's worlds, but rather
with putting the responsibility for a series of power asymmetries on a symmetry of guilt, which
says that all beings on Earth will answer for the planet's ills. Yes, we will be responsible for
what happens to the planet. But each person will respond from their own position
17
.
To justify the grand plan of governance, they invoke nothing less than certain theories
of networks and not only them, but especially them, to say how all people, to some extent, are
connected to each other, connected to other collectives and to the other forces on the planet. Of
course, this connection exists, but beyond the cosmic connections we experience, there are
entanglements of power and inequality. The problem is that a certain invocation of networks is
intended to have the effect that there is no room for "purifications" (LATOUR, 1994, p. 16, our
15
Being in common means that we are implicated with each other in an infinite cosmic web.
16
I conceptualize worldview as the perceptions and sensations with the invisible forces that make up cosmologies
and cosmogonies.
17
Perhaps it goes without saying that each group is structurally positioned by society. The idea of positionality
corresponds to the mark that the group or the people belonging to it occupy in the social structure.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 9
translation) that reveal the real agents responsible for certain evils. Some people conveniently
forget that these spaces for purification have been and continue to be mapped out when it comes
to the consumption of certain goods and the enjoyment of certain qualities of life. The supposed
owners of modernity know very well where to allocate minorities when they seek to consume
legitimate goods by separating themselves from the rest of the world. When it comes to denying
rights to other people, asymmetry is the law. Epistemological cynicism and political
shamelessness go hand in hand in theories that fail to pay attention to the fact of network flows.
Far from balancing the worlds, they increasingly point out their asymmetries. I quote Haraway
and Kunzru (2000, p. 36, our translation):
Technology is not neutral. We are inside what we do and what we do is inside
us. We live in a world of connections - and it's important to know who is made
and unmade.
But if everything is together and mixed up, what allows me to trace an us against a them
if not the old asymmetries of power that are updated by the new couplings that range from
everyday computer technologies, through agribusiness to wars fired via the slightest commands
from the commons
18
? We, the lives that have in fact always lived in symmetry with the
cosmos
19
and, although we continue to be persecuted and killed, we denounce the trickery of
the subjects who remain hegemonic, supposedly universal and stable, but overly concerned with
their endless others. We do not want the dirty empire of coloniality, but we do want the right
and the pleasure of being alive on the planet. What many of us demand from this modernity
that haunts us is the right to live, which it claims to promote and does not fulfill, or fulfills for
only a few lives.
In my particular case, for years I have learned to be negligent of the productivity logic
of governance that marks our steps through a kind of eternal return to the cartographies of
conquest and expropriation. I only produce what enables me to achieve implicit prosperity (my
own ascension and that of others living on the planet), after all, we are all constituents of the
cosmos in its most diverse worlds. This does not mean resorting to the racist view that we are
savages. What I want to make clear to other worldviews is that we are the manifestation of the
18
I call minimal commands of the commons the strategies for appropriating ideas, feelings, bodies and things via
the reinvention of their causes and effects in the field of everyday life as microphysical ways of power continuing
to order the ways in which we relate to and share with each other.
19
I conceive of the notion of cosmos in a plural way, since there are different cosmologies as symbolic, affective
and material systems about what the world is. However, each system carries an ordering of things and beings,
sustaining conceptions about the creation of the world - cosmogonies - which return as ordering principles of
cosmological systems, and which are the principles that sustain many of the visions of the genesis of the universe.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 10
universe. It was colonial whiteness that divided up and delimited the ways in which we manifest
and/or manifest the cosmos, separating it from the human. I am not a being in sympathetic
mixture with the world, but I am in common with it, so that the two of us are able to manifest
ourselves in each other, maintaining our singularities and recomposing the infinitude of matter.
We are alive because of what we have in common, and this is not homogeneity. With all this
ancestral learning, I've struggled to kill the desire for knowledge that does not recognize the
other, to get rid of those who live off the imagination besieged by the World of the Same
20
, to
get away from those who turn the ways of teaching/learning into yet another way of capturing,
emptying and objectifying our lives. All of this consists of my knowledge projects. The
apocalyptic project of destroying the world as we know it, that is, destroying the metaphysics
that underpins governance, as Warren (2018) proposes, and the project of postponing the end
of our lifeworlds, as Krenak (2019) rehearses, will not come at the hands of the subjects of
racial supremacy, which is the figure embodied by humanity elected to exist by governance
itself, even though these subjects advocate these causes
21
. In a similar way, these two projects,
which are not mutually exclusive, are difficult for those of us who are racial minorities and who
are still trapped in the colonial desire that captures all the power to be alive that has always
been forged in the absence of the urge to consume and kill.
If we can cut off governance in order to live, it's because the logistics that no longer
separate capital from politics and race do not float over us unharmed. Cutting means
interrupting a flow or distorting it. We are lives that cross these logistics and are crossed by
them. But we have the capacity to adapt and the power to radically transform and improvise.
Governance insists on being in us, but we can cut it out. That's what I call guerrilla warfare. All
this kind of guerrilla warfare is about making one or more injunctions of power structures fail.
Guerrilla warfare is not synonymous with the wars structured around the world, although it does
learn from them. If we flee, we do so because we have been and are being lives forged in a
constant violence from which we are always finding some way out. However, escape does not
merely mean dodging the structures of domination. Escape becomes operative because we also
20
I do not conceptualize the World of the Same as just a world of representations and stratifications of all kinds,
as in French post-structuralism. The Same is not opposed to what we conventionally call difference, as it constitutes
the conventional ways of dealing with it through sensitive, perceptive and reflective orderings of what is similar
and what is singular, representations and non-representable forces, rationalities and irrationalities, among other
things. The Same is part of the world as we know it. Thus, the World of the Same corresponds to how the world
as we know it reinvents itself while maintaining its old colonial architectures.
21
Theories of the end of the world carry different cosmological and cosmogonic presuppositions, so we must pay
attention to which world we are talking about and, above all, which reasons certain groups defend for the end of a
certain world and others set out to postpone the ends of other worlds.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 11
create it in what we are, forged socially, culturally and psychologically in ways of existing with
the world that have not been totally colonized. It is in escape that, consumed, we present ways
of not having our lives consumed, that by dying we plot how to escape death, that by fighting
we also concern ourselves with self-care and other ways of taking pleasure in living. The crack
in the colonial wound is deep and it is naive to think that we are going to close it. Our flight is
right into the abyss that is the world that has been imposed on us. We, racialized people
committed to anti-racism, for example, do not operate by negating the racial scheme as if it
would then disappear, but by making its perverse politics fail. Killing the white schema of racial
supremacy is an exercise in flight that tells us how we inhabit the world, how we are no longer
falling through the cracks, even though the fall is constant. In short, it tells us how we have
learned to fly high from below, dismantling the bottom-surface logic.
If we insist on confronting the futuristic plans of governance through counter-responses
(the old binary logic of confrontation), they can annul the unrecognizable ways of being alive
that have not yet been achieved by it. I have learned from the massacre of our people that we
must cross the semiologies of war to another place, a place of prosperity that is only made
possible by the maintenance of life. If we stay in the dialectical struggle, what is possible will
institutionalize the common game of the races. In black colorism, for example, black versus
white often ends up institutionalizing a common game in which white subjects will always
come out ahead, while the black people participating in the game remain stuck in the white
mirror image. However, it is important to note that the black and white markings of this
colorism do not correspond to the black and white designations of indigenous populations.
However, when a person's ancestry, as in the case of mine, is made up of the compositions of
black African
22
and indigenous South American
23
, which is something common throughout
Brazil, but which manifests itself in a preponderant way in racialized people from the northeast
of the country, especially those born in Ceará and Paraíba, being a blackness generally involves
a complexity in which our self-affirmation in the world does not fit into certain chains of the
duality of racial fiction, although we are constantly marked by such chains.
22
My paternal lineage is marked by Sudanese African peoples, especially those from Nigeria, Dahomey and the
Ivory Coast, where one of my grandmothers came from. In the timeline of my father's conception, José Aldeni
Gadelha, my grandmother, Maria Alice da Silva, a black woman of darker skin, conceived her son with José da
Costa Gadelha, a white man of Sephardic Jewish origin from Algeria.
23
My maternal lineage comes from the Janduins and Paiacus peoples who fled with other indigenous peoples
through Ceará and the surrounding area.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 12
We need not forget that we are people marked by race and point out the whiteness of
those who have marked us and oppress us, but we need to be aware that we, people marked like
others by colonial whiteness, know, in our lives made other and by them, something about
possibilities and we are constantly taken by that whiteness as the condition of possibility for the
production of knowledge of it. What I'm getting at is the fact that it is in the secret contingency
that people on the run reserve life. The white colonial subject, on the other hand, suffers from
the terrible affliction of thinking he is singular when he speaks of the singularity of non-white
people. The condition of this white singularity seems to be non-white worlds. This is a power
game in which, at the same time, the subject of racial supremacy poses as universal, since he is
the representative of the fully human status of the world, and also recognizes himself as
authentic or specific when he diagnoses his peculiarity in relation to the rest of the peoples. The
problem is that this diagnosis is made by the power games, exclusion, expropriation and denial
of autonomy of those peoples who come to be constructed as others. It is, then, a singularity of
the order of power fantasies that is effective in the structural, institutional and behavioral layers
of society.
Making whiteness think about its singularity in relation to non-white lives without
making the latter captured by the former is a step towards racial supremacy being perceived as
also situated in specific places of existence, which say who has power and who does not,
according to the ways of governing the world. It is necessary to recognize that we are
structurally marked and positioned beings, because no fullness and breaking of the chains of
duality will be achieved if we are not attentive to how the World of the Same crosses us and
constitutes us on some level. However, we are not held hostage by localities, nor do I wait for
answers from colonial subjects in order to move on with my life. Waiting for that counter-
response that is so common in clashes about racism prevents us from continuing our escapes,
and it is through what we trace in our escape that we remain living people. Our possibilities do
not depend on the responses of the subjects privileged by colonial whiteness. It's more like
returning the unease of racism to them and escaping in a kind of spell than hoping to be part of
a great pedagogy of racism. What we give back is the logistics of oppression, not its products.
Otherwise, we would be back to direct reactive confrontation. Our escape is about knowing
how to be and not be in the games of governance, bewitching its own fetishism.
I rescue my future through the possibilities of escaping from within, even from the
commands, without becoming material for the colonial fantasies of those who position
themselves via privilege like the majority. An escape that can only be imagined by the body
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 13
and the spirit, because the fugitive imagination is not floating in the mind, it is within the
technologies that we engender with other worlds and against the World of the Same. In the case
of visions of how to create new worlds on this plane, I'm not proposing simple reflexive
capacities for the abstractions of subjects. I'm talking about making housing, education, health,
forms of healing and culture effective in their co-creations
24
with organisms, machines,
algorithms, images, sounds, etc. Above all, I'm talking about crime (in the sense of breaking
the order of governance) in relation to these technologies and their organizations. Crime always
informs about the failure of their regularity, their deceptive accessibility, the democratic
guarantees they do not provide, their ability to supposedly generate life when many kill other
lives, etc. In this sense, crime is an escape route. And because the overwhelming majority of
people die, it's not a fatality.
The fugitive imagination is totally embodied in the sense of couplings of people with
other people and with various worlds without the principle of ownership, but with various
senses of vital alignments. A body that (re)imagines a whole life below and beyond the lives
that exist as normal and even those that are said to be abnormal, not for lack of new
designations, but because the escape route is coupled to a whole other plot, that of forces that
cannot be located by the normativities that are the expert and perverse designators of behavior.
What's more, the question is never exclusively about visible bodies, because thinking that
everything should start from the (visible) forms of the body in the world and centralizing life
in bodily matter is one of the fantasies of racialization. Therefore, dealing with the gender, sex
and sexuality markings of people who are insolent to cisheterofuturism, which reduces these
people to the visible of their bodies, is a major problem, before all the other problems that this
involves and which results in failures to understand these people in their struggles for habitable
worlds. An example of a very common mistake is to summarize these lives as dissidents, when
in fact they are possibly insolent to dissidence itself.
What I mean is that there seems to be a politics going on in parallel to the technologies
of control and stimulation, a politics that neither directly opposes the Norm (read the practical
and discursive semiology of governance) nor clearly accepts it, since either of these two
attitudes - resisting or accepting - would be to recognize the normative power and again
24
I do not see creation as the fruit of the "ego", but as a complex and involved process that involves various beings
and forces that manage to detach themselves from the trappings of the world as we know it. Because of this, when
I say that we create something, I'm actually saying that we create in common, in other words, we co-create
something with something else which, in turn, continues or allows the process to continue in multiple directions
and non-colonial sharing.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 14
legitimize it via dissent or simply via confrontation. The manufacture of habitable worlds, in a
deeper sense than the Butlerian vision of habitable life
25
, is something that inevitably passes
through some clandestine route, clandestine to the clandestine people themselves.
Clandestinities trace the routes by which it becomes possible to live their lives that are insolent
of being lived under the logic of the Same. This logic does not consist of an opposite of
difference, but where difference itself is posited as such by the sameness of things. If there is a
politics of non-recognition towards the Norm that does not involve direct confrontation with
the latter, it is in and through this politics that all people, in their clandestine vibrations, deposit
and radiate their inventive capacities to generate new worlds, surpassing this whole World of
the Same that persecutes them. Politics no longer as a common field of tension between forces,
but as life strategies that cannot be located through the eyes of supremacist powers. Not
allowing oneself to be located by these powers without having them as referents or references
for non-location. And perhaps politics is no longer the right word for all of this.
Overcoming the fantasies of subjection
Getting out of the fantasy of desiring the modern heritage of the polis and its subjects
of existence
26
consists of an operation of demystification. Mystification is not a mere truth effect
of some collective lie, it is a constraining effectiveness, it exists and has normative agency.
With this understanding, I allow myself to understand the limit that only understands insolence
as resistance to the power of societies. The idea of resistance not infrequently restricts minority
issues to visions of humanisms legitimized by the power of structures, as if our struggles were
for the restitution of a humanity legitimized by cisheterofuturist whiteness that never belonged
to us, forgetting that many minorities never wanted such a humanity or simply gave up fighting
25
Butler (2006) understands that our vision of the human designates livable lives and unlivable lives, the latter
being all those marked by dissidence, because the very requirements of humanity have been denied to dissident
groups. Fighting for a livable life in a world that normalizes, segregates, sickens and kills a series of lives is the
author's political vision of a livable life. Butler believes in a new path for the human: "There is a certain new path
of the human that takes place in order to begin the process of remaking the human. I can feel that without certain
recognizable traits I cannot live, but I can also feel that the terms by which I am recognized make my life
uninhabitable. This is the conjuncture from which critique emerges as a questioning of the terms that restrict life
in order to open up the possibility of different ways of living" (BUTLER, 2006, p. 16-17, our translation).
26
Alluding to Foucault's (2013) limits on the autonomy of the subject that the author tried to confer in rescue of a
new aesthetic of existence. The subjects of existence are all those with fully human status in the world. Even
though they are hierarchized among themselves, they can resist power, embrace it or confront it with the
possibilities of a structural game of struggle that ensures their belonging to the field of humanity. It turns out that
racialized, transgendered and other people whose humanity has been denied to them are not subjects of existence,
because they are the social non-existents who have often even given up the struggle for a livable life in the same
world that persecutes, constrains and kills them.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 15
to have the humanity of hegemonisms, since the latter simply does not meet the demands of
those in other positions in the world. We have our own ways of autonomy, cooperation, duty,
work, pleasure, creativity, etc. even if we are negotiating with the World of the Same.
I believe in the strength of what is not resisted by political activism, and yet escapes. I
reimagine worlds not through the diagrams of power, but constantly through the impossibilities
of not being common to the diagrams, even though the diagrams persist in the world. From the
failure to abolish the diagram, I experience the conditions of possibility for accessing other
dimensions not locatable by the World of the Same. This all happens when I always try to find
another layer of life, when I show other people and forces that our energy fields, from which
we radiate other possible imaginations, are not in common with the projects of reproductive
futurism, because these imaginations belong neither inside this world nor outside it.
In the black Afro-indigenous traditions of northeastern Brazil, where I was born, there
are simultaneous cosmovisions, present, past and future, which activate layers that are invisible
without any counterpart to the visible of the supremacist powers. This does not allow us to come
together as communities that are visible to the onslaughts of power-knowledge from other
groups. Studies on indigenous peoples at crossroads with blacks escape the studies on
indigenous communities so favored by ethnology, because the meanings of Afro-indigenous
are not confined to an ethnic or simply hybrid racial demarcation, as these meanings trigger
subjective, spiritual, cosmological, material and affective dimensions in constant flux with
races, genders, classes, spaces and times in order to compose cognitions and sensitivities that
allow other conceptions of experiencing the world and recreating it in different territories. This
does not mean that recognizable studies with racialized communities can give clues about some
plural way of composing worlds. For example, studies on the cosmic medicine of the
Pitaguary
27
and the ritual poetics of the Tremembés
28
give us clues through ethnography and
27
Indigenous healing practices, as assumed by the Pitaguary, work with another form of rationality, quite distinct
from that of biomedicine. This condition marks a differentiation not only in diagnostic-therapeutic procedures, but
also in the way people, nature and spirituality are considered(ANDRADE; SARAIVA DE SOUZA, 2016, p.
180, our translation).
28
Among the indigenous groups of the Northeast there are basically four types of ritual, known as: Ouricuri,
Praiá, Toré and Torém. Toré is the most widespread and is variably associated with the first two modalities. We
are not going to offer a detailed description of all of them here, as our aim is to establish a general picture of
indigenous rituals in the Northeast that can shed light on the reworkings and correspondences that we can find in
the Tremembé Torém. More importantly, certain elements such as the chants, the choreography and the presence
of alcoholic beverages will illustrate the hypothesis of a broad process of communication between this indigenous
ritual and the popular imagination in which the figure of the native and the alcoholic beverage are inescapably
associated, as well as a knowledge of plants and their healing powers (MESSENDER, 2012, p. 32-33, our
translation).
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 16
historiography about the difficulty of the realism schemes and theoretical foundations of the
medical sciences academy in understanding that the manifestations of the invisible are not
virtualities, they are not simple anecdotes that we tell, since such manifestations deviate from
historically recognizable principles in the eyes of the onto-epistemology inherited from colonial
modernity. These ways of imagining and creating worlds are invisible to the dual states - visible
and invisible, said and unsaid, audible and inaudible - of the power diagrams themselves.
As long as academia insists on capturing radical imaginations within the old parameters
of knowledge production and circulation, it will become increasingly difficult to understand
other onto-epistemologies such as those of black radical imagination studies, which have been
creating methodologies and other experiments on how to approach what is not allowed to be
apprehended as a recognizable archive by academia as we know it. This is the task of Hartman's
critical fable (2019; 2008) and, above all, of the elusive methodology undertaken by the
undercommons plan mentioned by Moten and Harney (2013) below:
In the undercommons of the reproductive social domain, the means, i.e. the planners,
are still part of the plan. And the plan is to invent the means in a common experiment
launched from any kitchen, any back porch, any basement, any living room, any park
bench, any impromptu party, every night. This ongoing experiment with the informal,
carried out by and on the means of social reproduction, as the advent of life forms, is
what we mean by planning; planning in the undercommon is not an activity, nor is
fishing, dancing, teaching or loving, but the ceaseless experiment with the futuristic
presence of the life forms that make such activities possible (MOTEN; HARNEY,
2013, p. 74-75, auhor’s emphasis, our translation).
Moten and Harney start from the undercommons to support the theory of what they call
the "black study" as a prophetic study, since it never allows itself to be located in the real time
of events but is also a kind of fugitive plan that improvises the future now. The "black study"
neither stops at conceptual prisons nor simply rebels against them. This study produces a secret
dimension between the prison and the revelation that the former tries to prevent. It is "a secret
that calls the prophetic into being, a secret held in common, organized as secret, calling the
prophetic organization into being" (MOTEN; HARNEY, 2013, p. 42, our translation).
If, based on the futuristic plans of the black radical imagination in line with other
histories of raciality, I talk about imagining the future in another way as something that builds
non-locatable networks, this never corresponds to any strictly individual demand. It was the
colonizing world that created individualism. This is not part of my way of conceiving the "me"
that I inherited from my grandfathers and grandmothers of the maternal line, who were peoples
attributed as Tapuias by the colonizers and who were various lineages of indigenous people
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 17
from the borders between Maranhão, Ceará and Paraíba known for their merciless war tactics
towards the colonizing peoples
29
. What I live as "me" only exists in deep implication, since I
do not imagine alone or indicate that we should have all this imaginative load on the back of a
single person, or at the very least we will get sick. It's when we realign ourselves with the Earth
that we manage to weave new lines with the world.
In order to really happen, the living thing comes from an imagination of a whole split
and open world, particular and multiple, which escapes and can only be realized by it. This
brings us to the dimensions of cosmoguerrillas. What I call cosmoguerrillas are not rebellions
or counter-rebellions everywhere, which would turn them into state agencies of insurgents.
They are compositions of worlds that do not allow themselves to be organized by what the
world as we know it recognizes/would recognize. They are present in multiple forms of
knowledge production and poetic creation that announce other worlds, such as Butler's science
fictions (2019; 2017) and Bonn's cosmopoetics of refuge (2020). I reiterate: I do not think of
cosmoses as existing from one against the World of the Same, although the former end up being
against this World
30
. So cosmoguerrillas do not aim to rescue the memory of conquest through
war, they do not want to maintain the colonial prison through such memory. The materialities
of cosmoguerrillas are made by a kind of secret that reimagines colonial prisons.
Cosmoguerrillas only allow themselves to be located as futuristic zones ready to violate all the
violence of the Same. In every cosmoguerrilla, one negotiates with the rational and the sensible,
the representable and the non-representable, the locatable and the non-locatable, the instance
and the becoming in ways that are never previously given or fully envisioned, but always in
some kind of plot in which the forces that maintain this world that constrains us are only
summoned to their own end.
The cosmoguerrillas take on a new sense of prophecy and seek to establish an inventive
imagination through the people who have had their desire to dream kidnapped, but who manage
29
Before the Dutch invasion, the general knowledge of the Tapuias and particularly the Cariris was through the
suspicious information of the Tupís natives, their enemies. However, there had already been some contact between
missionaries and, above all, adventurers and these aborigines. As far as Ceará is concerned, what we have on the
subject can be found in Father Luis Figueira's report, the <<Relação do Maranhão>>, written in 1608, describing
his unsuccessful expedition to Ceará, in the company of Father Francisco Pinto, who was then sacrificed in the
Ibiapaba mountains by the Tapuias Tacarijús. The selfless missionary refers to the Tapuias who inhabited the
mountain range and its surroundings, in Maranhão and on the Ceará side” (POMPEU SOBRINHO, 1934, p. 8, our
translation).
30
The conceptualization of the cosmos includes worlds that do not start from the principle of separability between
(more than) human lives and the world, unlike the World of the Same in which the world is a property of humans.
In this conceptualization in which human lives are implicated with the universe, cosmologies and cosmogonies
are based on the principle of existence in common with all things and all beings.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 18
to live through the escape route and beyond, people who, although imprisoned, are apart from
the prisons without being directly located from a counterpoint to what is rational and irrational
in these prisons. Only initiated groups reach them, not because they are initiated by the
technologies of individual learning in this world or by some phenomenology of the beings of
the organization itself, which would interfere with any pedagogical work with other escaped
people. Cosmoguerrillas allow escape, since they enable their worlds to learn that they are the
universe itself experiencing itself. It's about learning that each and every one of us has the power
to change, adapt, destroy and create the radical immanence of the cosmos itself, as quantum
physics has warned us about fractals
31
. Cosmoguerrillas teach us that we are more than human
and that our lives are more than social. The organization of any cosmoguerrilla is organized by
neglecting the Norm as self-care and by refusing it as defence. The teachings of the
organizations are always to flee from all normative teachings, but there is always a recognition
between one life and another life whose route is to flee. Everywhere in this World of the Same,
a fugitive world escapes and will always recognize another fugitive.
Ontological dispossession
I will now focus on the fact that some people have always been treated as having no
ontology
32
, which short-circuits the network of thought that operates through the notion of
subject as if it were universally welcoming. I am trying to deepen the vision of the limits of this
subject category for anti-colonial action. It turns out that when this category focuses on those
people who are not only outside its ontology, but who a priori have been understood as having
no ontology, as in a way black Africans and the indigenous people of the Americas have been
understood, we fail to understand what is not allowed to be mapped by modern conceptions of
the subject. But it's obvious that those who have the status of subjects very helpfully tried to
plot a narrative of conceding their ontology to those people without it, when such a concession
(impossible, by the way) was of interest to the modern-colonial ontological project, especially
when that project began to collapse. And so the project of people without ontologies continues.
This project, in the case of black lives, usually takes the following path:
31
In our physical and biochemical composition we carry fractals from different bodies in the universe, including
fractals from stars in distant dimensions. Fractals act as infinitesimal dimensions that connect us to the entire
universe, informing us that we carry characteristics and capacities of everything that exists and could exist in the
world. On our material and quantum connection, see Clegg (2018).
32
I rescue the sense of ontology as a demarcator of the human in epistemologies of European origin to affirm how
it becomes impossible for those who have been deprived of their humanity through various colonial processes.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 19
When you admit once and for all that ontology leaves existence aside, it won't
allow us to understand the being of black people. Because black people no
longer have to be black, they have to be black in front of white people. Some
will say that we should remember that the situation has a double meaning. We
reply that this is not true. In the eyes of the white man, the black man has no
ontological resistance. From one day to the next, black people had to situate
themselves in front of two reference systems. Their metaphysics or, less
pretentiously, their customs and frames of reference were abolished because
they contradicted a civilization they did not know and which was imposed on
them (FANON, 2008, p. 104, our translation).
If the imposition of civilization as a predetermining racial differentiation of who the
subjects would actually be is a mark of colonization, the idea of putting all people who are
subject to the civilizing process in the same position as the agent who is structurally recognized
as the civilized corresponds to a fiction of power, whose ways of being materialized in society
are disastrous. It is the dispossession of any possibility that certain racialized people have of
enjoying the goods of modernity that the ontology of whiteness fabricates as legitimate and
desirable. Claiming to grant a certain ontology to others has been a common tactic for various
purposes of governance across the planet which, in practice, have never recognized the Other
as a being entitled to a dignified life by their own concepts of dignity.
For example, regarding the narrative of India's transition to the modern state,
Chakrabarty (1992) believes that, in addition to this transition being a work of fiction that the
colonizing world told the colonized Indian people, it was made through the promise of their
adherence to the condition of subject. An impossible access because, both theoretically and
practically, the subject was always the European, the one who, in his diversity of existences,
really enjoyed autonomy according to the rules of the Same World. In this limit of Indian people
being the subject of Europe lies more than the generic indication of the impossibility of all
people colonized by Europe becoming European. There is also the limit of the very notion of
subject in thinking about the positions taken in social life by the people of the colonized worlds.
However, Spivak (2010) warned us that not every Other from the colonies is an Other
from Europe. In the case of the American colonies, for example, the question of Otherness is
more than a dispute over nationalism, it is, from the outset, racial-colonial, a delimitation of
borders between what is humanity and what is not. The differentiating principle is to actually
be considered a white subject, according to the local configurations of whiteness of European
origin. And, in the specific case of Brazilian fiction, nationalism has never existed without racial
differentiation and racism. My country's own colonial white subjects return the act of such
impossibility whenever they can, even if unconsciously or veiled. Returning to the dialogue
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 20
with Chakrabarty (1992), this author notes that there are two daily symptoms of the subalternity
of non-Western Third World histories: historians from the so-called Third World feel the need
to refer to works of European history; for their part, historians from Europe do not feel the
obligation to correspond. And they do not feel it precisely because, for them, we, the
"colonized" people, have never been and will never be subjects, no matter how much those who
have fabricated themselves as the true subjects tell us otherwise, no matter how much they
conceive of the modern idea of the subject through a lens of magnification and refraction of the
kind that, in one cultural zoom, there would be subjects close to them and in another frame there
would be subjects far removed from the vision of how the subject finds itself.
The question of the subject is far from being solved through the lens of cultural
relativism. Moreover, the cultural difference so endorsed by this relativism has been yet another
of the countless facets of actualizing racial difference
33
. Here in Brazil, a typical example of the
academy's coloniality is the requirement of foreign language proficiency exams in postgraduate
programs for Brazilian candidates, when in universities in Europe and the USA, for example, it
is rare for candidates to be required to have some proficiency in languages other than those of
their own country. Brazilian academia forgets, or pretends to forget, that the quality of the exam
it requires, in addition to promoting what Bourdieu (2007, p. 9) called "distinction", is pure
coloniality.
Thus, the differences I emphasize cannot be reduced to questions of naming, such as
whether or not we are called a subject, because what has become more commonplace with the
advent of so-called anti-colonial critiques, together with other non-hegemonic thoughts, is the
spectre of overcoding, which haunts the entire enterprise of modes of knowledge today. This
overcoding is not just about one code overlapping another, but about the very principle of
elaborating the world through categories of understanding, space, time and form that make all
coding possible. The question remains: how can we elaborate cognitions that do not attempt to
reduce the irreducible becomings of life into the notions architected by the onto-epistemologies
inherited from colonial modernity?
In the case of Brazil, the logic of race codification, however veiled, never fails to tell us
how black people have never been subjects, and it tells us this in many ways. One of them was
when, after the process of abolishing legalized slavery, black people were never included in the
social field that includes the rights of subjects and, obviously, subjects of law. This does not
33
On how cultural difference mirrors racial difference, see FERREIRA DA SILVA (2019).
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 21
mean that I believe in the possibility of such a project of inclusion, as long as it is based on the
compositions of the ontology of colonial whiteness, but it does highlight the absence of an
effective attempt to point out Brazil's lack of interest in the quality of life of the blacknesses.
For example, after abolition, black people were not immediately subjected to projects of
incorporation into society or as workers to sell their labor power. Despite the fact that those
lives apprehended by the category of the proletariat are those that have been so expropriated
that they only have their labor power as a means of survival, seeing some people as workers
consists of approaching a certain notion of subject, since the category of subject presupposes
autonomy. And autonomy is one of the fictions of the subject of liberal capital, as well as being
something that, to this day, Brazilian elites do not wish to confer on the poor, nor do they
recognize for black people, who remain most of the population in Brazilian poverty indices.
According to Borges (2018, p. 59, our translation), in Brazil, those lives that were once
enslaved continued to be seen as mere labor power in the post-abolition period: "The black man
has always been the labor power, not as a seller of it, but as the labor power itself". This is still
reflected today when Brazilian people are found under slave labor, mostly black people. What
we find there is their difficult access to subjects of law, because the idea of such access would
be a step towards short-circuiting the network of "post-abolitionist" colonialism and all the
racism that feeds it. After all, I return to Borges (2018, p. 59, our translation):
[...] positioning oneself as a working class in the post-abolition era is a
problematic experience, because positioning oneself in a category that seeks
rights means, first, understanding oneself as a subject in the world, something
that was perversely denied under the slave system.
This does not mean that the question of the subject is exclusively the question of work,
but that the latter, in full exercise of the designation worker, can only be granted to those people
who have acquired the former. Today, some people call black people workers, but the working
conditions of most of these people are still very close to slavery.
Regarding the effects of racism in Brazil, Borges continues:
The consequences, especially on the psychic level, are remarkable, such as the
denial of the being that is not and pretends to be, of this individual without a
place and, therefore, who denies himself and his equals all the time (BORGES,
2018, p. 59, our translation).
The assertion that there is no place for these blacknesses comes precisely from the fact
that Brazilian society has worked at all times not to include them. This has taken on extreme
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 22
characteristics, from the incentives to bring white European peoples (especially Italians) to
Brazil in a policy with clear objectives of whitening the local population under total neglect for
the lives of the country's black populations to the present day, in which affirmative policies,
such as racial quotas, still encounter strong barriers to being put into effect. There are many
other examples. However, the process of trying to fit into a notion of subject that does not and
never will encompass them makes the black subject just a matter of naming, because in practice
the racism in force insists on dismissing what is usually said out of hand. It is necessary to
rework what makes a subject of law a subject of law, and this can only be done by completely
abolishing the modes of subjection of the architectures of power-knowledge that allow the racial
fiction to be constantly updated.
Racism has a prominent place in the very rationality of what was coined by Foucault as
biopower - a power over life for those who the world actually thinks deserve to live - and is
justified by a fact already noted by Mbembe (2016, p. 128, our translation), namely:
[...] more than class thinking (the ideology that defines history as an economic
class struggle), race has been the ever-present shadow over the thinking and
practice of Western politics, especially when it comes to imagining the
inhumanity of foreign peoples - or dominating them.
So, rather than always returning to racism as a way of explaining the mentality that
manages the games of domination, it is up to us to question how race itself acts as an element
of thought-action-sensation, which architects and is constantly being architected in multiple
networks that, in turn, make racism alteriorly possible and not only that.
Traces, networks and other possible cognitions
I now see how colonialism is marked by traces that seem to disappear, but always
remain. I am increasingly distancing myself from the idea that the World of the Same is just an
irrational imposition of violence or that it is a rational structure of violent action. Because both
things take place in colonialism: irrationality and meticulous rational techniques to achieve the
irrational desire for extermination. The concept of the trace finds its meaning here in the fact
that it does not seek to centralize the forces of coloniality in automated spheres that prevent the
detection of the porosities between oppressions, their connections and disconnections with
other oppressions, both internal and external to colonialism itself. Rather than being restricted
to approaches that even recognize the interfaces of the phenomena of oppression, I am
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 23
interested in crossing other crossroads. I understand coloniality as an uninterrupted chain of
violence that takes place within, above, below, in front of and through the imposition of the
logistics of the Same, which can be traced back to two forces through which these same logistics
are made philosophically effective: abstraction and sensation.
There is a sense of suspicion that maintaining the brutality of certain connections and
disconnections between worlds would not be possible without the coupling of various
resources, means and many ends that are agreed upon for the extermination of the usual people
(Afro-descendants, quilombolas and indigenous people, especially in the Brazilian case).
Paying attention to how these networks act allows me to fight them where they are most cynical,
veiled and almost imperceptibly visible. However, the traces of colonialism, which are also
plural and open, as much as they act by constricting lives, make up trails that intersect and
challenge the ideas of origin and sequentiality. This means that colonialism, in its multiple ways
of acting, cannot be reduced to a narrative, or even several narratives, which have the principle
of linearity as the basis of the facts. There are cuts, escapes and resistances in all the stories of
colonization and this already prevents any desire for sequentiality, except when we take into
account the fact that a world that thinks of itself as the World has been fabricated as such
through ideas of sequence and determinability
34
.
When I say that coloniality continues, I say that it continues because the traces always
come back, or simply that they are there in becoming with the world. The traces are the marks
that constantly appear and disappear only to reappear again, informing us of the erratic or even
fantasmatic character that coloniality has and without which it would not be possible to
materialize in the form of a difference between humanities, namely racial fiction. This is also
why racism cannot be contained in a totality, since it acts in various sub-layers through a series
of necropowers
35
. The vision I aim to achieve does not provide answers or certainties to all
34
I borrow the notion of determinability from Ferreira da Silva (2019) to indicate the onto-epistemic bases of
causality and effect of the modern-colonial project. The author calls separability and determinability "two
intertwined elements of the Kantian program that continue to influence contemporary epistemological and ethical
projects: (a) separability, that is, the idea that everything that can be known about the things of the world must be
understood by the forms (space and time) of intuition and the categories of the Understanding (quantity, quality,
relation, modality) - all other categories about the things of the world remain inaccessible and therefore irrelevant
to knowledge; and, consequently, (b) determinateness, the idea that knowledge results from the capacity of the
Understanding to produce formal concepts that can be used to determine (i.e. decide) the true nature of the sensible
impressions gathered by the forms of intuition" (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 39, our translation).
35
In reference to the theory of necropolitics conceptualized by Mbembe (2016) in which necropowers correspond
to the injunctions of laws, techniques, aesthetics and all the forces that make manifest macro and microphysically
the policies of killing and letting die certain populations of the planet.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 24
these questions, but this does not exempt me from looking at colonialism from another
perspective, that of the traces.
It is worth remembering that the scientific theories of the network concept appear as a
symptom of the economic and political macrologies that gained greater expansion in the 19th
and 20th centuries, so that these theories become the representative parameters of the behavior
of today's subject of knowledge, confusing the desire of this subject with the operation of the
networks in which he acts, but this still modern subject has always been much more than this
effect of his industrial and post-industrial societies. Although theories such as Latour's studies
(1994; 2004), point out that hybrids and their collectives have always existed as such and that
purification - the process that separates life into distinct ontological zones and prevents us from
thinking about the symmetries between nature and culture - was the hallmark of those who
thought of themselves as modern subjects, the European West only began to think more deeply
about networks at the moment when the economic, social and cultural effects of contacts with
the Atlantic and the immersions of prey in the Africas and the Americas began to be more and
more intense.
Mercantile capitalism and its later face, industrial capitalism, can only be understood on
the basis of the multiple histories of modern colonization in which the lives designated as black
were simultaneously transformed into merchandise and labour power and, with this, such lives
became the modern symmetry of nature and culture that says that the Black person is a hybrid
imagined by European whiteness in the service of intensifying the purification of certain whites
as the legitimate subjects of the world in relation to other peoples, but which above all says the
materialization of a set of practices of abstraction and sensation about the world.
How do subjects of European modernity discover overnight that they are not and never
were modern? It was not only the experiments of the metaphysical epoch or the emergence of
science laboratories that caused this discovery, as Latour would have it. The first laboratories
were the other peoples who were first given the idea of being inhuman (inferior humanities)
and non-human (that which no longer even presents humanity) and then understood as objects
endowed with agency. It is no coincidence that the great modern theory of the agency of objects
is due to this colonial fantasy, in which the perception of agency for objects of all worlds is due
to the vision of equating lives turned black with the world of things. This tells the whole story
of how Europe constructed the Other not only from a self-world, but also through processes of
purification and symmetry between natures and cultures, even though the term culture only
came into use long after the modern colonization of the Atlantic began.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 25
I come back to the fact that we have to be careful with essentialisms in coloniality
studies. In the case of Indian coloniality, the configurations of what the Other would be are
intertwined with a specific mode of subalternity, as Spivak (2010, p. 76, our translation) warns
us:
In subaltern studies, due to the violence of imperialist, social and disciplinary
epistemic inscription, a project understood in essentialist terms must travel in
a radical textual practice of differences. The group's object of investigation -
in this case, not even the people as such, but the floating intermediate or buffer
zone - is a deviation from an ideal - the people or the subalterns - who are
defined as a difference from the elite. It is towards this structure that the
research is oriented, a situation somewhat different from the self-diagnosed
transparency of the radical intellectual of the First World.
The Indian philosopher draws our attention to a series of possible deviations that
structure differences through domination/subjugation, so that all knowledge as knowledge-
power also operates its multiple routes. In the case of the Atlantic colonial project, one of its
particularities was the fact that a specific type of human was seen as both agent and object, so
that their subjugation came about through a total expropriation of the condition of humanity. In
European scientific knowledge, objects came to be seen as hybrid agents of nature and culture,
since the world perceived as both object and agency by the modern-colonial white world were
black African lives and, nevertheless, those of the indigenous peoples who lived/live in the
Americas. From there, a certain conception of network thinking is amplified as a thought that
no longer centralizes the human as the center of interactions and that there would no longer be
a separation between natures and cultures, in other words, the idea of symmetry would find
resonance in the traffic of those hybrid agents of nature-culture forcibly embarked on slave
ships by the promotion of the Atlantic as a great network of connection between diverse worlds.
The leap of multiple dimensions that we have, based on this fact, is what allows us to understand
that the techno-industrial and the computerized were never the first matrices for thinking about
the deconstruction of dualities, ontologies and all the series of purifications that a certain project
of modernity once thought possible.
The influence of how industry, and everything that has generated it and what has been
generated from it, has layers that go beyond the matrices of Western Europe. However, it was
in this Europe that a series of displacements of humans from functions long thought to be
performed directly and exclusively by humanity there began. We are faced with the emergence
of industrialized work operations and the scientific laboratory, which usually appear to us as
the maximum examples of the undoing of this centrality of the human, which found its greatest
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 26
expression in the computer operations developed by the USA. But the technological mentality
born in Europe and spread throughout the world is not the only factor responsible for the
emergence of post-human thinking. This very idea of irradiation traces the arrow of
technology's time. However, technologies and the thought of the subject as an effect of them
are fantasies of those people who have always insisted on destining other people as if they were
objects or natures. Then the posthuman is more human than you can imagine!
It's no wonder that the first thing that certain network theories tried to do, by seeking
symmetries between the human and the inhuman and non-human, was to continue the project
of erasing the representations of those people not considered human or considered inferior
human, crowning racism. This racism prevents us from seeing that various African ancestral
technologies and indigenous technologies in the Americas, each in their own way, do not
operate through distinct and purified ontological zones, which posthuman theories claim to call
into question, but which have always been disregarded by my African and indigenous ancestors.
The critique of post-human, post-organic and other hybrid fictionalizers only makes sense to
those who first believed in a human world that was separate from other things and from the
cosmos, only to later see them as non-separate.
Final considerations: above and beyond structures
The notion of cosmopolitics has been gaining momentum in environmental movements
and in the social sciences, especially in anthropology, in order to understand the associations
and dissociations between everyone living on the planet. The first appearance of the term comes
from the work of Isabelle Stengers to understand how the history of science constructs a certain
notion of the world. One of these works, in its most recent version, appears in a succinct/precise
way in the form of an article published in Portuguese as A Proposição Cosmopolítica (The
Cosmopolitical Proposition)
36
. It is in resonance with this perspective that the term began to
appear in different approaches by a range of authors, such as Latour (2004) and Glowczewski
(2015), to understand the ways in which worlds are composed and how associations and
orderings by these worlds act. Far from compiling a genealogy of the term cosmopolitics, this
essay has provided an opportunity to think about how we can structure other worlds, if we
understand the limits of many of our categories of understanding and ways of feeling the other.
36
STENGERS, Isabelle. A proposição cosmopolítica. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, Brasil, (69),
442-464, 2018.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 27
The route was the black radical imagination, since we are marked and marked in an anti-black
world in which race in intersection with other structural markers are forces that sustain the
separability
37
of our social relations.
However, recognizing how social structures position us according to markers of race,
class, gender, sex and sexuality, among others, can open the door to the dangerous idea that
structural critique should close itself off to identity politics, or to an equally extreme but
opposite version, that we should abolish senses of belonging in order to pulverize our particular
histories in favor of framing them within a general framework of understanding in which we
would all be human, erasing the fact that humanity is not an ontological guarantee for all the
people on the planet. Aware of these two dangers, I conclude this essay on the political
importance of crossing both visions that affirm group belonging and those that understand the
possibility of existing in another way in the world that is becoming a new world, without falling
into the becoming of the post-structuralist proposal of a world to come that retraces the
roadmaps of conquest and expropriation in the field of the possible.
Ever since what was naively called post-structuralism, which originated in French
academia, it was already becoming increasingly apparent in the Euro-American centered
academic field that the ideas of representation and its more praxeological field - knowledge
about/with ideologies - seemed to imply a kind of evil to the new thinking of the modern post-
structural intelligentsia and also to various factions of post-modern thinking that were more and
more vehemently proclaiming the plural fractures of time and space. These two diverse and
plural ways of conceiving the world - post-structural and post-modern - saw structural
representation and even ideology as problematic (not to say outmoded).
In the case of the European influence, this moment owes much of its strength to the
legacies of the post-May 1968 demands in France, where micro-logical visions were opted for,
with desire, subjectivity and even power as dimensions to be understood through operations
that could no longer be mapped by macro-logical concepts. This triggered multiple ways of
thinking with strong foundations in the nascent philosophies of the time, especially those of
Derrida, Deleuze and Foucault, just to name a few of the best known in Brazil. In the US, the
attacks on time and space came mainly from the techno-scientific advances of the post-World
War II era and the country's imperialist policy of ascension in the world.
37
On the concept of separability, see footnote 30.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 28
Furthermore, in both cases, European and American, the theory of relativity and
quantum particle physics influenced ways of understanding social and cultural life through
molecular conceptions. And this was important for us to better understand some of the
microphysical issues of life, but it was damaging because we thought that the so-called old
macrological issues, especially those of politics and economics, could be understood almost
exclusively by the micro-politics they involve, without paying attention to the fact that,
according to quantum physics itself, the micro is also in the macro and vice versa. Even a
profound intellectual like Spivak (2010, p. 54, our translation) falls into this trap when she says:
"the relationship between global capitalism (economic exploitation) and the alliances of nation
states (domination and geopolitics) is so macrological that it cannot account for the micrological
texture of power". She also forgets to cross the distinction between micro and macro.
The problem in the transition from macro to micro in social/cultural studies was that the
new conceptions of diferrence were pitted against those of representation, in a way that smacks
of hatred towards the possible autonomy of those lives that have been diminished by the World
of the Same when it comes to questions of the right to power, especially against identity-based
representations of lives such as homosexuals, indigenous people, transvestites, etc. This became
a process of erasure, where people spoke of diferrence without giving much importance to how
identity is a fundamental part of the struggle for social existence of those people who are, in
terms of acquiring rights, socially non-existent subjects. What was being called a diferrence in
several of these French studies were always non-identity ways of existing, which served to bad
faith transparent subjects into disallowing the affirmation policies of groups who had their
identity hijacked and dissolved in the game of becoming and/or diferrences supposedly thought
of without referents.
As much as we can flee like the devil flees from the cross from everything that closes
off worlds in some identity that does not allow us to accompany and overcome the variations
and derivations of power, I do not recommend simply denying identity and all the other marks
that constitute us and that often inform us of who has been marked for death and who has been
marked for life according to the modes of governance. The misconception that denying
identities in favor of diferrences in the post-structuralist sense would make it possible to
empower certain subjects ended up offering recourse to projects to erase certain people in favor
of the usual dominant subject, who remained comfortable once again in his zone of transparency
towards a world that, in turn, remained renewed as the Same. In these kinds of studies, the sites
of supremacisms were ratified as the Norm through certain discourses of diferrence, which, in
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 29
the special case of Deleuze's philosophy, was often a way for the subject to differ, sought by
the intensities of the Other, through the cartographies of the conquest and expropriation of
intensities.
The idea of always being open to multiplicity and, therefore, to deterritorialization does
not say, nor does it justify why, in many of the questions posed by Deleuze and his followers,
it is the subject of racial supremacy who needs others in order to undertake deterritorialization,
as in the processes of territoriality described by Deleuze and Guattari (2010) in their greatest
work, The Anti-Oedipus. Although in this work the authors do not restrict their thinking to
becoming and/or difference only through the colonial fantasy of lessening other existences, this
way of thinking became an avatar of the "aberrant movements" - to use an expression by
Lapoujade (2015) - of this philosophy. It thus erased not only the ideologies of the struggles of
dispossessed people of all kinds, but mainly the fact that it was from a very particular and
ideologically constructed place, even if thought of as transparent, that all the invocation and
defense of the so-called differences for oneself came from, which only existed via the others on
the endless colonial menu of the diverse. Those who are truly open to multiplicities first seek
them out in their own lives in connection with others, and not in the act of consuming other
people's intensities by reducing other people's lives to colonial fantasies. However, locality, as
Ferreira da Silva (2019) allows us to understand, is more of an ordering fiction, since the macro
is in the micro and the micro in the macro, if we really follow the quantum view that everything
is in everything and everything everywhere, however fractal it may be.'
I no longer dare to operate along a line of escape strictly in the sense of the philosophy
of difference that dematerializes worlds and becomes susceptible to some new
territorialization/materialization. For a long time, I have always operated critically with this
philosophy (GADELHA, 2017) and, in my latest studies, I have tried to understand how matter
itself disappears not through necropolitical erasure, but through an effect of fugitivity
38
the
effect that the thing remains alive and radiates powers without being able to be
seen/apprehended by the world as we know it and also by an effect of spectrality the effect
of things coming and going, appearing and disappearing, haunting the spatio-temporal
dimensions, as Gordon's (2008) studies on social phantasmagorias have shown us, understood
38
I transpose the notion of fugitivity as proposed by Moten and Harney (2013). For the authors, fugitivity is a force
woven into the undercommons that escapes even the desire of the beings involved to flee. I am concerned that this
capacity aligns the (more than) human and the non-human with the fugitive forces of the universe, such as those
that break space-time and go against our arrow of time that organizes perceptions and sensations of what a given
world is.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 30
by the author as a state of animation that opens up through the spatio-temporal cracks of social
structures and moves a repressed or unresolved social violence that is known, sometimes very
directly, sometimes more obliquely.
Therefore, I have tried to understand how the matter (more than social) of our lives
negotiates or can always negotiate with coloniality so that, in the unexpectedness of the
transaction, it triggers a collapse of the space-time markings of power, this matter being right
there where things start to happen, where there is no longer any space-time to be mapped. How
can we make time disappear and events start to happen where no space-time can be demarcated?
There seems to be a guerrilla war with the very dimensions of events. The ordered narratives
of the heroic subject, the savior, the victor, do not reach the guerrilla because the guerrilla places
itself under the insignia of error and death, returning as a living thing, a secret thing, an erratic
thing, a spectral thing, everything that the colonial archives of the ends and their own critiques
do not account for.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 31
REFERENCES
ANDRADE, J. T.; SARAIVA DE SOUSA, C. K. Práticas indígenas de cura no Nordeste
brasileiro: discutindo políticas públicas e intermedicalidade. Revista Anuário
Antropológico, v. 41, n. 2, p. 179-202, 2016.
BONA, D. T. Cosmopoéticas do refúgio. Florianópolis: Cultura e Bárbarie, 2020.
BORGES, J. O que é encarceramento em massa? Belo Horizonte: Letramento; Justificando,
2018.
BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo/Porto Alegre:
Edusp/Zouk, 2007.
BUTLER, J. Deshacer el género. Barcelona: Paidós, 2006.
BUTLER, O. Kindred: Laços de Sangue. São Paulo: Editora Morro Branco, 2017.
BUTLER, O. A parábola dos talentos. São Paulo, Editora Morro Branco, 2019.
CHAKRABARTY, D. “Postcoloniality and the Artifice of History: Who Speaks for ‘Indian’
Pasts?”, Representations, v. 1, n. 37, p. 1-26, 1992.
CLEGG, B. Teoria quântica: 50 conceitos e ideias fundamentais explicados de forma clara e
rápida. São Paulo: Publifolha, 2018.
DELEUZE, G.; GUATTARI, F. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo:
Editora 34, 2010.
DELEUZE, G.; PARNET, C. Diálogos. São Paulo: Editora Escuta, 1998.
FANON, F. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.
FERREIRA DA SILVA, D. A dívida impagável. São Paulo: Oficina de Imaginação Política
e Living Commons, 2019.
FOUCAULT, M. História da sexualidade: o cuidado de si. Rio de Janeiro: Edições Graal,
2013. v. 3.
GADELHA, J. O Sensível E O Cruel: uma aprendizagem pelas performances
sadomasoquistas. Rio de Janeiro: Metanoia Editora, 2017.
GLOWCZEWSKI, B. Devires Totêmicos: Cosmopolítica Dos Sonhos. São Paulo: N-1, 2015.
GORDON, A. Gosthly Matters: Haunting and The Sociological Imagination. Minneapolis:
University of Minnesota Press, 2008.
Imagine new worlds now: Cosmopolitics and raciality
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 32
HARAWAY, D.; KUNZRU, H. “Você é um ciborgue”: um encontro com Donna Haraway.
In: SILVA, T. T. da. (org.). Antropologia do ciborgue as vertigens do pós-humano. 1. ed.
Belo Horizonte: Autêntica, 2000. p. 17-32.
HARTMAN, S. Lose Your Mother: A Journey Along the Atlantic Slave Route. Princeton:
Farrar Straus Giroux, 2008.
HARTMAN, S. Wayward Lives, Beautiful Experiments: Intimate Histories of Social
Upheaval. New York and London: W.W. Norton & Company, 2019. E-Book.
HEGEL, G. W. F. Ciência da Lógica 1. A doutrina do ser. Petrópolis: Vozes, 2016.
KANT, I. Crítica da Razão Pura. São Paulo: Abril S. A. Cultural e Industrial, 1974.
KELLEY, R. Freedom Dreams: The Black Radical Imagination. Boston, Beacon Press,
2002.
KOPENAWA, D.; ALBERT, B. A queda do céu: palavras de um xamã yanomami. São
Paulo: Companhia das Letras, 2015.
KRENAK, A. Ideias para adiar o fim do mundo. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
LAPOUJADE, D. Deleuze, os movimentos aberrantes. São Paulo: n-1 edições, 2015.
LATOUR, B. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. São Paulo: Editora
34, 1994.
LATOUR, B. Políticas da natureza: como fazer ciência na democracia. São Paulo: EDUSC,
2004.
MBEMBE, A. “Necropolítica”. Arte & Ensaios - Revista do PPGAV/EBA/UFRJ, v. 1, n.
32, p. 123-151, 2016.
MBEMBE, A. Crítica da razão negra. São Paulo, Editora N-1, 2018.
MESSENDER, M. L. L. Etnicidade e ritual Tremembé: construção da memória e lógica
cultural. Revista de Ciências Sociais da UFC, v. 43, n. 2, p. 32-42, 2012.
MOTEN, F.; HARNEY, S. The undercommons: Fugitive planning and black study.
Wivenhoe; New York: Minor Compositions, 2013.
POMPEU SOBRINHO, T. Os Tapuais do Nordeste e a Monografia de Elias Herkman.
Revista do Instituto do Ceará, Revista por ano/1934, p. 7-28, 1934. Available:
https://www.institutodoceara.org.br/revista/Rev-apresentacao/RevPorAno/1934/1934-
Tapuias.pdf. Access: 01 Oct. 2023.
SPILLERS, H. Black, White, & in Color. Chicago: University of Chicago Press, 2003.
Juliano GADELHA
Rev. Cadernos de Campo, Araraquara, v. 23, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 2359-2419
DOI: https://doi.org/10.47284/cdc.v23i00.18372 33
SPIVAK, G. A critique of postcolonial reason: toward a history of the vanishing present.
Cambridge, Massachusetts, London: Havard University Press, 1999.
SPIVAK, G. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001.
STENGERS, I. A proposição cosmopolítica. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros,
Brasil, n. 69, p. 442-464, 2018.
TSING, A. L. O Antropoceno mais que Humano. Revista Ilha, v. 23, n. 1, p. 176-191, 2021.
VIVEIROS DE CASTRO, E.; DANOWSKI, D. Há um mundo por vir? Ensaio sobre os
medos e os fins. Florianópolis: Cultura e Barbárie; Instituto Socioambiental, 2014.
WARREN, C. L. Ontological Terror: blackness, nihilism, and emancipation. Durhan;
London, Duke University Press, 2018.
CRediT Author Statement
Acknowledgements: Not applicable.
Funding: The research was carried out with funding from CAPS.
Conflict of interest: There are no conflicts of interest.
Ethical approval: Not applicable.
Availability of data and material: Not applicable.
Authors’ contributions: Not applicable.
Processing and editing: Editora Ibero-Americana de Educação.
Proofreading, formatting, normalization and translation.