A DESIGUALDADE SENTIDA NA MIGRAÇÃO DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS PROVENIENTES DO CONTINENTE AFRICANO


LA DESIGUALDAD QUE SE SIENTE EN LA MIGRACIÓN DE ESTUDIANTES UNIVERSITARIOS DEL CONTINENTE AFRICANO


THE INEQUALITY EXPERIENCED IN THE MIGRATION OF UNIVERSITY STUDENTS OF THE AFRICAN CONTINENT


Denise Miranda de FIGUEIREDO1 Ana Lucia de Moraes HORTA2 Rosa Maria Stefanini de MACEDO3


RESUMO: Os fluxos migratórios estão presentes há muitas décadas e possuem relação com processos sociais, culturais e territoriais. O presente artigo analisou, a partir do discurso de estudantes provenientes do continente africano matriculados em instituições de Ensino Superior, as desigualdades sentidas durante o processo deslocamento, ampliando o olhar frente ao fenômeno da migração internacional temporária e elaborando os significados atribuídos as experiências desses indivíduos. O conteúdo dos discursos foi dividido em três temas: a experiência no Brasil, o preconceito vivido e as marcas da migração. Ao longo do estudo ficou explícito que esses fatores atravessaram a vida desses jovens e permearam suas permanências dentro das universidades brasileiras, sendo eles indicadores de como a diversidade vem sendo tratada por nossa sociedade atualmente. Ficou evidente a necessidade de as Universidades possuírem melhor preparo na recepção e ambientação desses alunos, a fim de minimizar as desigualdades de oportunidades, aumentando as possibilidades de um diálogo intercultural.


PALAVRAS-CHAVE: Migração. Estudantes africanos. Psicologia. Desigualdade. Universidade.


RESUMEN: Los flujos migratorios están presentes desde hace muchas décadas y están relacionados con procesos sociales, culturales y territoriales. Este artículo analizó, a partir del discurso de estudiantes del continente africano matriculados en instituciones de Educación Superior, las desigualdades sentidas durante el proceso de desplazamiento, ampliando la mirada al fenómeno de la migración internacional temporal y elaborando los significados atribuidos a las vivencias de estos individuos. Los discursos se dividió en tres temas: experiencia en Brasil, prejuicio vivido y huellas de la migración. Estos factores


image

1 Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo – SP – Brasil. Membro do grupo de Estudo e Pesquisa Família e Comunidade (GEPFAC) da Escola Paulista de Enfermagem. ORCID: https://orcid.org/0000- 0001-5805-3832. E-mail: denise@denisefigueiredo.com.br

2 Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo – SP – Brasil. Chefe do Departamento de Saúde Coletiva da UNIFESP/EPE. Doutorado em Enfermagem (USP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0514- 3882. E-mail: ana.horta@unifesp.br

image

image

3 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC), São Paulo – SP – Brasil. Coordenadora do Núcleo de Família e Comunidade do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica. Doutorado em Psicologia Clínica (PUC). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9771-2845. E-mail: macedo@pucsp.br

image



atravesaron la vida de estos jóvenes y permearon su permanencia en las universidades brasileñas, que indican cómo la diversidad há sido tratada por nuestra sociedad hoy. Se hizo evidente la necesidad de que las Universidades tengan una mejor preparación para la acogida y ambientación de estos estudiantes con el fin de minimizar las desigualdades en las oportunidades, aumentando las posibilidades de un diálogo intercultural.


PALABRAS CLAVE: Migración. Estudiantes africanos. Psicología. Desigualdad. Universidad.


ABSTRACT: Migration flows have been present for many decades and are related to social, cultural, and territorial processes. This article analyzed, based on the discourse of students from the African continent enrolled in Higher Education institutions, the inequalities felt during the displacement process, expanding the look at the phenomenon of temporary international migration, and elaborating the meanings attributed to the experiences of these individuals. The speeches were divided into three themes: experience in Brazil, prejudice experienced and marks of migration. Throughout the study, it became clear that these factors crossed the lives of these young people and permeated their permanence within Brazilian universities, which are indicators of how diversity has been treated by our society today. It became evident the need for universities to have better preparation for the reception and setting of these students in order to minimize inequalities in opportunities, increasing the possibilities for an intercultural dialogue.


KEYWORDS: Migration. African students. Psychology. Inequality. University.


Introdução


Os fluxos migratórios fazem parte de nossa sociedade há muitas décadas. Estes estão relacionados a processos sociais de dominação, de invasão, de mercado e de conquistas territoriais. O crescente índice de fluxos migratórios, atualmente, possui relação direta com as histórias de colonização e desenvolvimento dos países, com as desigualdades econômicas mundiais e com os conflitos políticos/étnicos (BADI, 2015). Fatores como: os deslocamentos por motivações econômicas; os índices de desemprego em diferentes zonas urbanas; a escassez de recursos naturais; a vinda de intelectuais e profissionais bem qualificados nas mais diversas áreas, que buscam melhores condições de vida em outros países, regiões ou continentes; e a insuficiência no acesso à qualificação profissional contribui para os movimentos migratórios na atualidade, especialmente para a emigração africana, levando jovens a se deslocarem em busca de formação universitária (BARRETO; COUTINHO; RIBEIRO, 2009).

image

image

O presente estudo teve como objetivo analisar, a partir dos principais discursos obtidos na tese de doutorado defendida no Programa de Estudos Pós-graduados em Psicologia Clínica

image



da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo intitulada “Diálogos interculturais dentro de uma Universidade Brasileira” (FIGUEIREDO, 2013), as desigualdades sentidas durante as experiências singulares de deslocamento de estudantes universitários matriculados em instituições de Ensino Superior, provenientes de diferentes regiões do Continente Africano, ampliando o olhar frente ao fenômeno da migração internacional temporária e elaborando os significados atribuídos a esta experiência desses indivíduos. Para isso, o presente artigo utilizou uma abordagem qualitativa teórico-bibliográfica a fim de analisar, a partir do discurso dos estudantes, experiências de diversos jovens provenientes de países africanos dentro de uma universidade brasileira e apontar as dificuldades por eles enfrentadas para sua adaptação, desde o planejamento para seu acolhimento no país até as relações com professores e colegas. Além disso, foi abordado o tema do preconceito aberto ou velado, presente tanto nas relações com brasileiros, como entre grupos africanos. Para a coleta de informações, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com seis estudantes que vivenciaram a migração internacional temporária, que estavam cursando a graduação na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Dessa forma, os assuntos levantados foram divididos em categorias que serão relacionadas e discutidas a seguir.


O Brasil noticiado e o Brasil experimentado


Em 1965 foi lançado o primeiro Protocolo Programa Estudante de Convênio de Graduação (PEC-G), de acordo com o Ministério das Relações Exteriores, a ideia da criação de um Programa de Governo para amparar estudantes de outros países adveio do incremento do número de estrangeiros no Brasil, na década de 1960, e das consequências que isso trouxe para a regulamentação interna do status desses estudantes no Brasil. A África é o continente de origem da maior parte dos estudantes, ao longo da última década, foram mais de 6.000 estudantes selecionados pelo Programa. Entre as nações africanas participantes, destacam-se Cabo Verde, Guiné-Bissau e Angola. De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, hoje o Brasil conta com aproximadamente 17.000 estudantes estrangeiros matriculados em cursos de graduação, abrangendo 176 diferentes nacionalidades.

image

image

Segundo o INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Legislação e Documentos (2018), 45,6% dos alunos estrangeiros que frequentam cursos de graduação no Brasil, provêm do continente Africano, sendo a Angola, o país com o maior número de alunos estrangeiros. Segundo Amaral (2013), o jovem africano/a vem para o Brasil, em uma quantidade cada vez maior, com o intuito de realizar estudos universitários.

image



As oportunidades oferecidas abrangem tanto o ensino superior público, quanto o privado. São ofertadas vagas gratuitas em cursos de graduação nas Instituições de Ensino Superior, da UNILAB (Universidade da Integração da Lusofonia Afro-Brasileira) e dos programas Estudante Convênio de Graduação (PEC-G) e Estudante Convênio de Pós-graduação (PEC- PG), destinadas à formação e qualificação de estudantes estrangeiros. O processo de imigração de jovens de comunidades africanas em busca de estudos superiores em instituições brasileiras vem acontecendo há quase seis décadas, fator que motiva a criação de comunidades africanas em grandes cidades do país, como João Pessoa, Fortaleza, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Porto Alegre (MENDONÇA, 2017).

Nesta categoria foram analisadas as razões pelas quais jovens migrantes escolheram o Brasil como destino, suas expectativas devido a uma imagem previamente construída no seu país de origem e experiências reais que tiveram no Brasil ao realizar o processo de migração. Estes estudantes acreditam que o Brasil possui um custo de vida mais baixo se comparado a outros, como EUA, Portugal e Austrália, por exemplo. Além disso, as especificidades sociais, históricas, educacionais, econômicas e culturais geram laços de amizade que unem o Brasil com os países do continente africano (SUBUHANA, 2009). Mendes (2012) e Subuhana (2009) exploram também os aspectos atrativos associados à imagem veiculada pela por agências de turismo do Brasil e pela mídia brasileira nos países africanos. As heranças africanas e portuguesas proporcionam a aproximação entre os mais diversos ambientes culturais pertencentes aos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e o Brasil. Os jovens africanos relatam sentir o contraste com toda a imagem que os motivou a estarem aqui, ao desembarcarem em São Paulo, a maior cidade do Brasil. Não podemos esquecer que a própria sociedade brasileira insiste no discurso de país multicultural, no qual há harmonia entre pessoas de diferentes origens, o que não condiz com a hierarquia social que atravessa as classes, especialmente os grupos historicamente vulnerabilizados (LIMA, 2017). A presença desses jovens em uma Universidade Brasileira traz a possibilidade de se experimentar o diverso no cotidiano desta Universidade, constituindo as relações que vão se estabelecendo ao longo dos anos da graduação, onde os encontros se dão de modo intercultural, diverso e diferente. Segundo Nhaga (2013), nesses deslocamentos está também o intercâmbio de valores, em que ideias sobre determinados fatos e acontecimentos passam a

ser criadas e recriadas.

Esses fatores podem ser observados no desejo de conhecer um país que geralmente se apresenta alegre, divertido, com pessoas simpáticas, conforme os jovens africanos revelam em suas falas. Envolvidos por imagens preconcebidas sobre o seu futuro nos próximos anos

image

image

Doxa: Rev. Bras. Psico. e Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385

image



(período da graduação), as informações transmitidas pela mídia brasileira, que vincula constantemente a ideia de que no Brasil se vive uma pacificação racial (SILVA; ROSEMBERG, 2008), reflete certos lugares de estereotipagem e objetificação destinados aos negros, principalmente relacionadas ao futebol e ao carnaval. Outro exemplo dessa objetificação é a imagem da mulher negra brasileira metaforizada na figura da mulata que ocorre pacificamente no país (KALY, 2001). Diferentes emoções vão compondo esse cenário no qual o Brasil imaginário se depara com o Brasil real, causando grande impacto sobre os jovens e seu futuro. E é com esse contraste que eles iniciam sua grande jornada rumo à realização de seus sonhos, às descobertas de uma nova cultura, de um novo povo, com hábitos e costumes diferentes dos deles.


O preconceito e suas diferentes tonalidades


A partir do grupo analisado foi possível observar a complexidade da questão do preconceito nas narrativas dos jovens. Alguns disseram não sentir o preconceito, outros disseram que sentem, mas que não sofrem impacto em sua migração, outros ainda relacionaram o preconceito com a falta de informação sobre o Continente Africano. Em relação aos que disseram não sentir, os discursos mostraram que foi como se esses jovens não tivessem experimentado a exclusão e nem o preconceito durante suas experiências. Desse modo, é possível pensar que a matriz do preconceito, nesses casos, não teria sido construída dentro deles e, por isso, não denominam ou significam o que muitas vezes chamamos de preconceito como tal.

image

image

Já em relação aos que disseram sentir, foi possível observar que muitos destes estudantes migrantes temporários percebem, ainda hoje, século XXI, as questões do preconceito racial como temas vivenciados por brasileiros todo o tempo, de maneira explícita ou não. Esse fenômeno compõe a migração internacional temporária desses jovens provenientes do Continente Africano que, por muitas vezes, são julgados por sua negritude (FIGUEIREDO, 2013). A questão racial no Brasil relaciona-se intrinsecamente às questões sociais e econômicas, sendo esses dois fatores estruturantes primordiais para a geração das grandes desigualdades do país e da pobreza. Segundo Teixeira (2010), o “racismo à brasileira” trata sobre discriminar de forma sutil sem parecer que está discriminando. É próprio da sociedade brasileira o preconceito de “marca” onde quanto mais evidente o fenótipo, quanto mais a aparência for negra, maior será o preconceito (MÜLLER et al., 2009).

image



Os indivíduos que pertencem aos grupos minoritários (TAJFEL, 1982) inseridos em sociedades que possuem sua estrutura baseadas em desigualdades de poder estão consequentemente à mercê de múltiplas formas de exclusão. Tais conflitos refletem na identidade social, nas relações e formação dos sujeitos. Dessa forma, os relacionamentos acabam sendo estabelecidos como consequência de pertencer a um ou outros grupos, através de processos de exclusão/inclusão social (SAWAIA, 2008). As relações de poder e dominação entre diferentes grupos que compartilham o mesmo lugar social, atravessadas por práticas de discriminação e exclusão, repercutem em sofrimento, de diferentes formas.

A dimensão individualizante do problema do preconceito vem sendo superada pela vertente sociológica, que o direciona para uma compreensão igualmente mais ampla e que possui como referenciais as relações entre os processos dialéticos de exclusão e de inclusão e os grupos sociais (SAWAIA, 2008). Por sua vez, Lima e Vala (2004), identificam o racismo como um processo de hierarquização, afastamento e discriminação contra um indivíduo ou toda uma categoria social que é definida como diferente a partir de alguma marca física externa, seja esta real ou imaginária, a qual é ressignificada como uma marca cultural definidora de padrões de comportamento. Muller et al (2009) afirmam que o preconceito contra a população negra no país se origina num processo histórico que pretendeu manter os negros brasileiros como cidadãos de segunda categoria. Tal processo se deu através da difusão de centenas de imagens negativas contra as pessoas. A marca física externa, no caso do racismo brasileiro, são os traços afrodescendentes, como o formato do rosto, a cor da pele, e o estilo de cabelo. A marca cultural, além dos diferentes estereótipos estabelecidos como parte do ambiente sociocultural, pode ser identificada pelas diferentes manifestações populares associadas à ideia de raça e classe.

image

De acordo com Kaly (2001) e Subuhana (2005), o preconceito racial é a principal causa do mal-estar em terras brasileiras; e ser universitário e estrangeiro atenua a experiência negativa da discriminação racial. Langa (2014) mostrou que estudantes africanos, no seu cotidiano, percebem a dificuldade dos brasileiros em chamá-los pelos nomes próprios, substituindo-os por outras categorias de apelidos. O tratamento recebido pelos estudantes africanos na sociedade brasileira são os mesmos tratamentos direcionados à população negra local, estereótipos relacionados à periculosidade, marginalidade, pobreza, ignorância, dentre outros (KALY, 2001). A associação entre a cor da pele e pobreza nutre o preconceito contra estudantes estrangeiros que vivem no Brasil e geram diferentes situações constrangedoras de racismo (SUBUHANA, 2005). Para Lima e Vala (2004, p. 407), o racismo à brasileira “nada tem de cordial, pois implica num cenário sinistro de discriminação e exclusão”. Tcham (2012,

image

Doxa: Rev. Bras. Psico. e Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385

image



p. 50) afirma que “de um modo geral, o estudante preto africano no Brasil, independentemente de status social em seu país de origem, é quase sempre colocado nas camadas sociais mais inferiorizadas e humilhadas da sociedade”. Sendo assim, é possível observar que as diferenças raciais ainda são tratadas em nosso país e em nossas universidades não apenas como diferenças, e sim com desigualdades, implicando em um cenário de exclusão no qual as pessoas possuem pouca competência cultural para lidar com o diferente.


Marcas impressas pela migração


A migração para fins de qualificação acadêmica vem ganhando notoriedade dentro das pesquisas acadêmicas pelo fato de ser cada vez mais frequente, multifacetada e complexa (BROOKS; WATERS, 2011; OLWIG; VALENTIN, 2015). Para Kaly (2001), desde o século

image

image

XIX o Brasil possui a tradição de receber jovens de países africanos nas instituições de ensino brasileiras. Segundo o autor, os filhos e filhas de alguns dignitários angolanos e moçambicanos eram enviados para serem educados nas escolas do Rio de Janeiro. Os fluxos entre África e Brasil podem ser analisados a partir de seus aspectos histórico que estão diretamente relacionados aos processos coloniais e pós-coloniais vivenciados por ambos os povos. A partir das narrativas dos jovens em relação à experiência de migração internacional temporária é possível perceber que esse fato pode ser um transformador na vida, não só deles, mas também de famílias, comunidades, de um povo e até de uma nação. Entende-se que o sujeito que migra não é movido apenas por questões econômicas, típicas da migração tradicional, mas também por fatores objetivos e subjetivos relacionados com a experiência migratória e com a realidade com que se deparam nos países de acolhimento (GUSMÃO, 2012). A fala dos estudantes demonstra dificuldades que compõem um cenário de luta, desafios e conquistas, não só de maneira pessoal e singular, mas também porque eles representam um povo em busca de melhores possibilidades de estudo e oportunidades. Tal fato envolve “um estar aqui (Brasil) e um ser de lá (África)”. Envolve ser africano, estrangeiro e negro “fora de lugar” e se dão como reflexos das relações em processo, estabelecidas no contexto social de acolhida e que possui uma dimensão contraditória e conflitiva que, como aponta Silva (2005), exige ser compreendida posto que se associe a perdas e separações, mas também, a reencontros, voltas e reconstruções culturais. Trata-se de um povo que acredita ser possível transformar sonhos em realidade e transformar uma história, sendo a migração uma experiência que coloca em relevo a memória.

image



Segundo Danticat (1998) as experiências e memórias individuais são também sociais e coletivas, dado que através do ato de recordar que um indivíduo compartilha alguns momentos de sua experiência do passado. Acredita-se que a partir das experiências familiares é que se constrói grande parte da memória e que estas experiências quase sempre contemplam narrativas sobre seu país de origem. Sarlo (2007) aponta que a memória não deixa dúvidas que as suas fontes e suas narrativas são lembranças de suas experiências, “memória que pode ter sido tomada por empréstimo de familiares e que a parte mais substancial vem de histórias contadas ao longo dos anos pela mãe e pelo pai ou parentes como um todo”. Essas memórias são recriadas em contextos de migrações e costumam forçar o olhar de si para frente e para trás ao mesmo tempo, mantendo desta forma sempre acesa a complexa decisão de ficar ou voltar.


Considerações finais


Percebemos que os estudantes provenientes de diferentes países da África não se pautam por uma única identidade, cultura e tradição. Compreende-se que “o que são” e “o que expressam” são constituídos não só de relações históricas concretas, do passado e do presente em suas diversas e diferentes nações, mas também das relações que constroem no cotidiano de suas vidas, no aqui e agora de sua existência e, de modo particular, no interior da Universidade e do processo educativo. Foi possível observar, a partir do que foi levantado neste estudo, que a imigração acarreta uma série de impactos na vida dos jovens estudantes africanos e influencia na maneira como esses significam suas experiências de migração, permeando questões como a dificuldade de adaptação, o desempenho acadêmico e o isolamento (GUSMÃO, 2011).

image

image

Com base nos discursos dos alunos, ficou explícito que questões relacionadas ao preconceito, às experiências migratórias e as vivências no Brasil, são fatores que atravessaram a vida desses jovens e permearam suas permanências dentro das universidades Brasileiras. As categorias que foram levantadas são indicadores de como as questões relacionadas à diversidade vem sendo tratada por nossa sociedade atualmente. Sendo assim, é evidente a necessidade de as Universidades possuírem melhor preparo para com a recepção e ambientação desses alunos, a fim de minimizar as desigualdades de oportunidades e aumentando as possibilidades de um diálogo intercultural.

image



REFERÊNCIAS


AMARAL, J. B. Atravessando o Atlântico: o Programa Estudante Convênio de Graduação e a cooperação educacional brasileira. Brasília-DF. 2013. 145 p. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação) – Centro de Estudos Avançados (CEAM), Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, 2013.


BARRETO, L.; COUTINHO, M.; RIBEIRO, C. Qualidade de vida no contexto migratório: um estudo com imigrantes africanos residentes em João Pessoa-PB, Brasil. Mudanças- Psicologia da Saúde, São Bernardo do Campo, v. 17, n. 2, p. 116-122, jul./dez. 2009.


BROOKS, R.; WATERS, J. Student mobilities, migration and the internationalization of higher education. London: Palgrave Macmillan, 2011.


FIGUEIREDO, D. M. Diálogos interculturais dentro de uma universidade brasileira. 2013. 166 f. Dissertação (Doutorado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2013.


FIGUEIREDO, J. M. Fluxos migratórios e cooperação para o desenvolvimento: realidades compatíveis no contexto europeu? Lisboa: Observatório da Imigração, ACIME, 2005. v. 3.


GUSMÃO, N. M. “Na Terra do Outro”: a presença de invisibilidade de estudantes africanos no Brasil, hoje. Dimensões, Vitória, v. 26, n. 1, p. 191-204, 2011.


GUSMÃO, N. M. África, Portugal e Brasil: um novo Triângulo das Bermudas? Cadernos CERU, Campinas, v. 23, n. 2, p. 51-62, dez. 2012. DOI: doi.org/10.11606/issn.2595- 2536.v23i2p51-62


KALY, A. P. O Ser Preto africano no "paraíso terrestre" brasileiro: Um sociólogo senegalês no Brasil. Lusotopie, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 105-121, out. 2001.


LANGA, E. N. B. Diáspora Africana no Ceará - Representações sobre as festas e as interações afetivo-sexuais de estudantes africano(a)s em Fortaleza. Revista Lusófona de Estudos Culturais, Porto, v. 2, n. 1, p. 102-122, jun. 2014.


LIMA, L. S; FEITOSA, G. G. Sair da áfrica para estudar no Brasil: fluxos em discussão.

Psicol. Soc., Belo Horizonte, v. 29, e162231, ago. 2017.


LIMA, M.; VALA, J. As Novas Formas de Expressão do Preconceito e do Racismo. Estudos de Psicologia, Natal, v. 9, n. 3, p. 401-411, dez. 2004.


MALOMANO, B.; FONSECA, D. J.; BADI, M. K. Diáspora africana e migração na era da globalização: experiências de refúgio, estudo, trabalho. Curitiba, PR: CRV, 2015.


MENDES, C. F. Uma vitrine do Brasil: telenovelas brasileiras entre estudantes africanos. 2012. 190 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2012.


image

image

MÜLLER, M. et al. Educação e diferenças: os desafios da Lei 10.639/03. Cuiabá, MG: Ed. UFMT, 2009.

image


NHAGA, B. Fluxos migratórios dos estudantes africanos para o Brasil: sistema de integração de estudantes africanos nas universidades públicas do Nordeste (UFCG, UFPB e UFPE). 2013. 156 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, PB, 2013.


OLWIG, K. F.; VALENTIM, K. Mobility, Education and Life Trajectories: New and Old Migratory Pathways. Identities: Global Studies in Culture and Power, v 22. n. 3, p. 247- 257, 2015.


PEC-G. Programa de Estudantes-Convênio de Graduação. Divisões de temas educacionais e língua portuguesa (DELP). Disponível em: http://www.dce.mre.gov.br/PEC/PECG.php.

Acesso em: 22 maio 2020.


SARLO, B. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2007.


SAWAIA, B. As artimanhas da exclusão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.


SILVA, M. M. Contribuições metodológicas para análise das migrações. In: DEMARTINE,

Z. B. F.; TRUZZI, O. (org.). Estudos migratórios, perspectivas metodológicas. São Carlos, SP, 2005.


SILVA, P.; ROSEMBERG, F. Brasil: lugares de negros e brancos na mídia. In: DIJK, T. A.

V. (org.). Racismo e Discurso na América Latina. São Paulo, SP: Contexto, 2008. p. 74- 117.

SUBUHANA, C. A experiência sociocultural de universitários da África Lusófona no Brasil: entremeando histórias. Pro-Posições, Campinas, v. 20, n. 1, p. 103-126, abr. 2009.


SUBUHANA, C. Estudar no Brasil: imigração temporária de estudantes moçambicanos do Rio de Janeiro. 2005. 156 f. Dissertação (Doutorado em Serviço Social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 2005.


TAJFEL, H. Grupos humanos e categorias sociais. Lisboa, Portugal: Livros Horizonte, 1982.


TCHAM, I. A África fora de casa: sociabilidade, trânsito e conexões entre os estudantes africanos no Brasil. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE. 2012.


image

image

TEIXEIRA, M. Relações raciais na sociedade brasileira. 2. ed. Cuiabá, MG: UAB/EdUFMT, 2010.

image



Como referenciar este artigo


FIGUEIREDO, D. M.; HORTA, A. L. M.; MACEDO, R. M. S. A desigualdade sentida na migração de estudantes universitários provenientes do continente africano. Doxa: Rev. Bras. Psico. E Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385. DOI:

https://doi.org/10.30715/doxa.v22i00.15364


Submetido em: 25/07/2021

image

image

Revisões requeridas em: 17/08/2021 Aprovado em: 13/09/2021 Publicado em: 01/10/2021

image



THE INEQUALITY EXPERIENCED IN THE MIGRATION OF UNIVERSITY STUDENTS OF THE AFRICAN CONTINENT


A DESIGUALDADE SENTIDA NA MIGRAÇÃO DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS PROVENIENTES DO CONTINENTE AFRICANO


LA DESIGUALDAD QUE SE SIENTE EN LA MIGRACIÓN DE ESTUDIANTES UNIVERSITARIOS DEL CONTINENTE AFRICANO


Denise Miranda de FIGUEIREDO1 Ana Lucia de Moraes HORTA2 Rosa Maria Stefanini de MACEDO3


ABSTRACT: Migration flows have been present for many decades and are related to social, cultural, and territorial processes. This article analyzed, based on the discourse of students from the African continent enrolled in Higher Education institutions, the inequalities felt during the displacement process, expanding the look at the phenomenon of temporary international migration, and elaborating the meanings attributed to the experiences of these individuals. The speeches were divided into three themes: experience in Brazil, prejudice experienced and marks of migration. Throughout the study, it became clear that these factors crossed the lives of these young people and permeated their permanence within Brazilian universities, which are indicators of how diversity has been treated by our society today. It became evident the need for universities to have better preparation for the reception and setting of these students in order to minimize inequalities in opportunities, increasing the possibilities for an intercultural dialogue.


KEYWORDS: Migration. African students. Psychology. Inequality. University.


RESUMO: Os fluxos migratórios estão presentes há muitas décadas e possuem relação com processos sociais, culturais e territoriais. O presente artigo analisou, a partir do discurso de estudantes provenientes do continente africano matriculados em instituições de Ensino Superior, as desigualdades sentidas durante o processo deslocamento, ampliando o olhar frente ao fenômeno da migração internacional temporária e elaborando os significados atribuídos as experiências desses indivíduos. O conteúdo dos discursos foi dividido em três temas: a experiência no Brasil, o preconceito vivido e as marcas da migração. Ao longo do estudo ficou explícito que esses fatores atravessaram a vida desses jovens e permearam suas permanências dentro das universidades brasileiras, sendo eles indicadores de como a


image

1 Federal University of São Paulo (UNIFESP), São Paulo – SP – Brazil. Member of the Study and Research Group Family and Community (GEPFAC) at the School of Nursing of São Paulo. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5805-3832. E-mail: denise@denisefigueiredo.com.br

2 Federal University of São Paulo (UNIFESP), São Paulo – SP – Brazil. Head of the Department of Collective Health, UNIFESP/EPE. Doctorate in Nursing (USP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0514-3882. E-mail: ana.horta@unifesp.br

image

image

3 Pontifical Catholic University of São Paulo (PUC), São Paulo – SP – Brazil. Coordinator of the Family and Community Center of the Postgraduate Program in Clinical Psychology. Doctorate in Clinical Psychology (PUC). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9771-2845. E-mail: macedo@pucsp.br

image



diversidade vem sendo tratada por nossa sociedade atualmente. Ficou evidente a necessidade de as Universidades possuírem melhor preparo na recepção e ambientação desses alunos, a fim de minimizar as desigualdades de oportunidades, aumentando as possibilidades de um diálogo intercultural.


PALAVRAS-CHAVE: Migração. Estudantes africanos. Psicologia. Desigualdade. Universidade.


RESUMEN: Los flujos migratorios están presentes desde hace muchas décadas y están relacionados con procesos sociales, culturales y territoriales. Este artículo analizó, a partir del discurso de estudiantes del continente africano matriculados en instituciones de Educación Superior, las desigualdades sentidas durante el proceso de desplazamiento, ampliando la mirada al fenómeno de la migración internacional temporal y elaborando los significados atribuidos a las vivencias de estos individuos. Los discursos se dividió en tres temas: experiencia en Brasil, prejuicio vivido y huellas de la migración. Estos factores atravesaron la vida de estos jóvenes y permearon su permanencia en las universidades brasileñas, que indican cómo la diversidad há sido tratada por nuestra sociedad hoy. Se hizo evidente la necesidad de que las Universidades tengan una mejor preparación para la acogida y ambientación de estos estudiantes con el fin de minimizar las desigualdades en las oportunidades, aumentando las posibilidades de un diálogo intercultural.


PALABRAS CLAVE: Migración. Estudiantes africanos. Psicología. Desigualdad. Universidad.


Introduction


Migratory flows have been part of our society for many decades. They are related to social processes of domination, invasion, market, and territorial conquests. The increasing rate of migration flows, currently, has a direct relationship with the history of colonization and development of countries, with global economic inequalities and political/ethnic conflicts (BADI, 2015). Factors such as: displacement for economic motivations; unemployment rates in different urban areas; the scarcity of natural resources; the coming of intellectuals and well qualified professionals in various areas, who seek better living conditions in other countries, regions or continents; and insufficient access to professional qualifications contribute to migratory movements today, especially for African emigration, leading young people to move in search of university education (BARRETO; COUTINHO; RIBEIRO, 2009).

image

image

This study aimed to analyze, from the main speeches obtained in the doctoral thesis defended in the Postgraduate Studies Program in Clinical Psychology at the Pontifical Catholic University of São Paulo entitled “Intercultural Dialogues within a Brazilian University” (FIGUEIREDO, 2013), the inequalities felt during the unique experiences of

image



displacement of university students enrolled in institutions of Higher Education from different regions of the African continent, expanding the look at the phenomenon of temporary international migration and elaborating the meanings attributed to this experience of these individuals. To this end, this article used a qualitative theoretical and bibliographical approach to analyze, based on the discourse of students, the experiences of several young people from African countries in a Brazilian university and point out the difficulties they face in adapting, from the planning for their arrival in the country to their relationships with professors and colleagues. In addition, the theme of open or veiled prejudice, present both in relations with Brazilians and among African groups, was addressed. To collect information, semi-structured interviews were carried out with six students who experienced temporary international migration, who were undergraduate students at the Pontifical Catholic University of São Paulo. Thus, the issues raised were divided into categories that will be related and discussed below.


Brazil as reported and Brazil as experienced


In 1965 the first Protocol for Undergraduate Student Agreement Program (PEC-G) was launched, according to the Ministry of Foreign Affairs, the idea of creating a Government Program to support students from other countries came from the increase in the number of foreigners in Brazil in the 1960s, and the consequences that this brought to the internal regulation of the status of these students in Brazil. Africa is the continent of origin of most of the students; over the last decade, more than 6,000 students were selected by the Program. Among the African participating nations are Cape Verde, Guinea-Bissau and Angola. According to the Ministry of Foreign Affairs, Brazil currently has approximately 17,000 foreign students enrolled in undergraduate courses, comprising 176 different nationalities.

image

image

According to INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira Legislation and Documents (2018), 45.6% of foreign students attending undergraduate courses in Brazil, come from the African continent, with Angola, the country with the largest number of foreign students. According to Amaral (2013), young Africans come to Brazil in increasing numbers to pursue university studies. The opportunities offered cover both public and private higher education. Free vacancies are offered in undergraduate courses at Higher Education Institutions, UNILAB (University of Integration of Afro- Brazilian Lusophony) and the Undergraduate Student Agreement (PEC-G) and Graduate Student Agreement (PEC-PG) programs, aimed at the training and qualification of foreign

image



students. The process of immigration of young people from African communities in search of higher studies in Brazilian institutions has been happening for almost six decades, a factor that motivates the creation of African communities in large cities in the country, such as João Pessoa, Fortaleza, São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, and Porto Alegre (MENDONÇA, 2017).

In this category we analyzed the reasons why young migrants chose Brazil as a destination, their expectations due to a previously constructed image in their country of origin and actual experiences they had in Brazil when making the migration process. These students believe that Brazil has a lower cost of living if compared to others, such as USA, Portugal, and Australia, for example. In addition, the social, historical, educational, economic, and cultural specificities generate bonds of friendship that unite Brazil with the countries of the African continent (SUBUHANA, 2009). Mendes (2012) and Subuhana (2009) also explore the attractive aspects associated with the image conveyed by Brazilian tourism agencies and Brazilian media in African countries. The African and Portuguese heritages provide the approximation between the most diverse cultural environments belonging to the Portuguese speaking African Countries (PALOP) and Brazil.

The young Africans report feeling the contrast with the whole image that motivated them to be here when they disembark in São Paulo, the largest city in Brazil. We cannot forget that Brazilian society itself insists on the discourse of a multicultural country, in which there is harmony among people of different origins, which does not match the social hierarchy that crosses classes, especially historically vulnerable groups (LIMA, 2017). The presence of these young people in a Brazilian University brings the possibility of experiencing the diverse in the daily life of this University, constituting the relationships that will be established throughout the years of graduation, where encounters take place in an intercultural, diverse, and different way. According to Nhaga (2013), these displacements also include the exchange of values, in which ideas about certain facts and events are created and recreated.

image

image

These factors can be observed in the desire to get to know a country that is usually happy, fun, with nice people, as the young Africans reveal in their speeches. Involved by preconceived images about their future in the coming years (graduation period), the information transmitted by the Brazilian media, which constantly links the idea that in Brazil there is racial pacification (SILVA; ROSEMBERG, 2008), reflects certain places of stereotyping and objectification of black people, mainly related to soccer and carnival. Another example of this objectification is the image of the black Brazilian woman metaphorized in the figure of the mulatto that occurs peacefully in the country (KALY, 2001).

image



Different emotions compose this scenario in which the imaginary Brazil is faced with the real Brazil, causing great impact on young people and their future. And it is with this contrast that they begin their great journey towards the fulfillment of their dreams, the discoveries of a new culture, a new people, with habits and customs different from their own.


Prejudice and its different shades


From the group analyzed, it was possible to observe the complexity of the issue of prejudice in the narratives of the young people. Some said they did not feel the prejudice, others said they did, but that they did not suffer the impact on their migration, and still others related the prejudice to the lack of information about the African Continent. Regarding those who said they did not feel it, the speeches showed that it was as if these young people had not experienced exclusion or prejudice during their experiences. In this way, it is possible to think that the matrix of prejudice, in these cases, would not have been built within them and, therefore, they do not denominate or mean what we often call prejudice as such.

As for those who said they felt, it was possible to observe that many of these temporary migrant students perceive, even today, in the 21st century, the issues of racial prejudice as themes experienced by Brazilians all the time, explicitly or not. This phenomenon makes up the temporary international migration of these young people from the African Continent, who are often judged for their blackness (FIGUEIREDO, 2013). The racial issue in Brazil is intrinsically related to social and economic issues, these two structuring factors being primordial for the generation of the country's great inequalities and poverty. According to Teixeira (2010), “Brazilian racism” is about discriminating in a subtle way without appearing to discriminate. It is characteristic of Brazilian society the “brand” prejudice where the more evident the phenotype, the more the appearance is black, the greater the prejudice (MÜLLER et al., 2009).

image

image

Individuals who belong to minority groups (TAJFEL, 1982) inserted in societies that have their structure based on power inequalities are consequently at the mercy of multiple forms of exclusion. Such conflicts reflect in the social identity, in the relationships and formation of the subjects. In this way, relationships end up being established because of belonging to one or other groups, through processes of social exclusion/inclusion (SAWAIA, 2008). The power and domination relations between different groups that share the same social place, crossed by practices of discrimination and exclusion, have repercussions in suffering, in different ways.

image



The individualizing dimension of the prejudice problem has been overcome by the sociological approach, which directs it to an equally broader understanding that has as references the relations between the dialectical processes of exclusion and inclusion and social groups (SAWAIA, 2008). Lima and Vala (2004), in turn, identify racism as a process of hierarchization, estrangement, and discrimination against an individual or an entire social category that is defined as different based on some external physical mark, be it real or imaginary, which is re-signified as a cultural mark that defines behavioral patterns. Muller et al. (2009) state that prejudice against the black population in the country originates in a historical process that intended to keep black Brazilians as second-class citizens. Such process took place through the dissemination of hundreds of negative images against people. The external physical mark, in the case of Brazilian racism, are the African descendant features, such as the shape of the face, skin color, and hair style. The cultural mark, besides the different stereotypes established as part of the sociocultural environment, can be identified by the different popular manifestations associated with the idea of race and class.

image

image

According to Kaly (2001) and Subuhana (2005), racial prejudice is the main cause of unease in Brazilian lands; and being a university student and a foreigner mitigates the negative experience of racial discrimination. Langa (2014) showed that African students, in their daily lives, perceive Brazilians' difficulty in calling them by their first names, replacing them with other categories of nicknames. The treatment received by African students in Brazilian society are the same treatments directed to the local black population, stereotypes related to dangerousness, marginality, poverty, ignorance, among others (KALY, 2001). The association between skin color and poverty nurtures prejudice against foreign students living in Brazil and generates different embarrassing situations of racism (SUBUHANA, 2005). For Lima and Vala (2004, p. 407), Brazilian-style racism "has nothing cordial about it, since it implies a sinister scenario of discrimination and exclusion." Tcham (2012, p. 50) states that "in general, the black African student in Brazil, regardless of social status in his country of origin, is almost always placed in the most inferior and humiliated social strata of society. Thus, it is possible to observe that racial differences are still treated in our country and in our universities not only as differences, but as inequalities, implying a scenario of exclusion in which people have little cultural competence to deal with the different.

image



Marks imprinted by migration


Migration for the purpose of academic qualification has been gaining notoriety within academic research because it is increasingly frequent, multifaceted, and complex (BROOKS; WATERS, 2011; OLWIG; VALENTIN, 2015). For Kaly (2001), since the nineteenth century Brazil has the tradition of receiving young people from African countries in Brazilian educational institutions. According to the author, the sons and daughters of some Angolan and Mozambican dignitaries were sent to be educated in schools in Rio de Janeiro. The flows between Africa and Brazil can be analyzed from their historical aspects that are directly related to the colonial and post-colonial processes experienced by both peoples. From the narratives of young people in relation to the experience of temporary international migration, it is possible to see that this fact can be a transformer in their lives, not only of themselves, but also of families, communities, a people, and even a nation. It is understood that the subject that migrates is not only driven by economic issues, typical of traditional migration, but also by objective and subjective factors related to the migratory experience and the reality they encounter in the host countries (GUSMÃO, 2012). The students' speech demonstrates difficulties that make up a scenario of struggle, challenges, and achievements, not only in a personal and unique way, but also because they represent a people in search of better possibilities for study and opportunities. This fact involves "being here (Brazil) and being from there (Africa). It involves being African, foreigner, and black "out of place" and they occur as a reflection of the relations in process, established in the social context of welcome and that has a contradictory and conflicting dimension that, as Silva (2005) points out, requires to be understood since it is associated with losses and separations, but also with reunions, returns, and cultural reconstructions. These are people who believe it is possible to turn dreams into reality and transform history, migration being an experience that highlights memory.

image

image

According to Danticat (1998) individual experiences and memories are also social and collective, since through the act of remembering an individual shares some moments of his past experience. It is believed that a great part of memory is built from family experiences, and that these experiences almost always include narratives about their country of origin. Sarlo (2007) points out that memory leaves no doubt that its sources and its narratives are memories of its experiences, "memory that may have been borrowed from family members and that the most substantial part comes from stories told over the years by the mother and father or relatives as a whole. These memories are recreated in contexts of migration and

image



usually force one to look forward and backward at the same time, thus keeping the complex decision of whether to stay or return always burning.


Final considerations


We realize that students coming from different countries in Africa are not guided by a single identity, culture, and tradition. It is understood that "what they are" and "what they express" are made up not only of concrete historical relations, of the past and the present in their various and different nations, but also of the relations that they build in their daily lives, in the here and now of their existence and, in a particular way, within the University and the educational process. It was possible to observe, from what was raised in this study, that immigration brings a series of impacts on the lives of young African students and influences the way they mean their migration experiences, permeating issues such as the difficulty of adaptation, academic performance, and isolation (GUSMÃO, 2011).

Based on the students' speeches, it was clear that issues related to prejudice, migratory experiences and experiences in Brazil are factors that crossed the lives of these young people and permeated their permanence inside Brazilian universities. The categories that were raised are indicators of how issues related to diversity are currently being dealt with by our society. Thus, it is evident the need for universities to be better prepared to receive and welcome these students, in order to minimize inequalities of opportunities and increase the possibilities of an intercultural dialogue.


REFERENCES


AMARAL, J. B. Atravessando o Atlântico: o Programa Estudante Convênio de Graduação e a cooperação educacional brasileira. Brasília-DF. 2013. 145 p. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Desenvolvimento, Sociedade e Cooperação) – Centro de Estudos Avançados (CEAM), Universidade de Brasília (UnB), Brasília, DF, 2013.


BARRETO, L.; COUTINHO, M.; RIBEIRO, C. Qualidade de vida no contexto migratório: um estudo com imigrantes africanos residentes em João Pessoa-PB, Brasil. Mudanças- Psicologia da Saúde, São Bernardo do Campo, v. 17, n. 2, p. 116-122, jul./dez. 2009.


BROOKS, R.; WATERS, J. Student mobilities, migration and the internationalization of higher education. London: Palgrave Macmillan, 2011.


FIGUEIREDO, D. M. Diálogos interculturais dentro de uma universidade brasileira. 2013. 166 f. Dissertação (Doutorado em Psicologia) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2013.


image

image

Doxa: Rev. Bras. Psico. e Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385

image


FIGUEIREDO, J. M. Fluxos migratórios e cooperação para o desenvolvimento: realidades compatíveis no contexto europeu? Lisboa: Observatório da Imigração, ACIME, 2005. v. 3.


GUSMÃO, N. M. “Na Terra do Outro”: a presença de invisibilidade de estudantes africanos no Brasil, hoje. Dimensões, Vitória, v. 26, n. 1, p. 191-204, 2011.


GUSMÃO, N. M. África, Portugal e Brasil: um novo Triângulo das Bermudas? Cadernos CERU, Campinas, v. 23, n. 2, p. 51-62, dez. 2012. DOI: doi.org/10.11606/issn.2595- 2536.v23i2p51-62


KALY, A. P. O Ser Preto africano no "paraíso terrestre" brasileiro: Um sociólogo senegalês no Brasil. Lusotopie, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 105-121, out. 2001.


LANGA, E. N. B. Diáspora Africana no Ceará - Representações sobre as festas e as interações afetivo-sexuais de estudantes africano(a)s em Fortaleza. Revista Lusófona de Estudos Culturais, Porto, v. 2, n. 1, p. 102-122, jun. 2014.


LIMA, L. S; FEITOSA, G. G. Sair da áfrica para estudar no Brasil: fluxos em discussão.

Psicol. Soc., Belo Horizonte, v. 29, e162231, ago. 2017.


LIMA, M.; VALA, J. As Novas Formas de Expressão do Preconceito e do Racismo. Estudos de Psicologia, Natal, v. 9, n. 3, p. 401-411, dez. 2004.


MALOMANO, B.; FONSECA, D. J.; BADI, M. K. Diáspora africana e migração na era da globalização: experiências de refúgio, estudo, trabalho. Curitiba, PR: CRV, 2015.


MENDES, C. F. Uma vitrine do Brasil: telenovelas brasileiras entre estudantes africanos. 2012. 190 f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade de Brasília, Brasília, DF, 2012.


MÜLLER, M. et al. Educação e diferenças: os desafios da Lei 10.639/03. Cuiabá, MG: Ed. UFMT, 2009.


NHAGA, B. Fluxos migratórios dos estudantes africanos para o Brasil: sistema de integração de estudantes africanos nas universidades públicas do Nordeste (UFCG, UFPB e UFPE). 2013. 156 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, PB, 2013.


OLWIG, K. F.; VALENTIM, K. Mobility, Education and Life Trajectories: New and Old Migratory Pathways. Identities: Global Studies in Culture and Power, v 22. n. 3, p. 247- 257, 2015.


PEC-G. Programa de Estudantes-Convênio de Graduação. Divisões de temas educacionais e língua portuguesa (DELP). Available: http://www.dce.mre.gov.br/PEC/PECG.php. Access: 22 May 2020.


image

image

SARLO, B. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2007.

image



SAWAIA, B. As artimanhas da exclusão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.


SILVA, M. M. Contribuições metodológicas para análise das migrações. In: DEMARTINE,

Z. B. F.; TRUZZI, O. (org.). Estudos migratórios, perspectivas metodológicas. São Carlos, SP, 2005.


SILVA, P.; ROSEMBERG, F. Brasil: lugares de negros e brancos na mídia. In: DIJK, T. A.

V. (org.). Racismo e Discurso na América Latina. São Paulo, SP: Contexto, 2008. p. 74- 117.

SUBUHANA, C. A experiência sociocultural de universitários da África Lusófona no Brasil: entremeando histórias. Pro-Posições, Campinas, v. 20, n. 1, p. 103-126, abr. 2009.


SUBUHANA, C. Estudar no Brasil: imigração temporária de estudantes moçambicanos do Rio de Janeiro. 2005. 156 f. Dissertação (Doutorado em Serviço Social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, 2005.


TAJFEL, H. Grupos humanos e categorias sociais. Lisboa, Portugal: Livros Horizonte, 1982.


TCHAM, I. A África fora de casa: sociabilidade, trânsito e conexões entre os estudantes africanos no Brasil. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE. 2012.


TEIXEIRA, M. Relações raciais na sociedade brasileira. 2. ed. Cuiabá, MG: UAB/EdUFMT, 2010.


How to reference this article


FIGUEIREDO, D. M.; HORTA, A. L. M.; MACEDO, R. M. S. The inequality experienced in the migration of university students of the african continent. Doxa: Rev. Bras. Psico. E Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385. DOI:

https://doi.org/10.30715/doxa.v22i00.15364


Submitted: 25/07/2021 Required revisions: 17/08/2021 Approved: 13/09/2021 Published: 01/10/2021


Responsible for the translation: Editora Ibero-Americana de Educação.

Translated by: Alexander Vinicius Leite da Silva - ORCID: https://orcid.org/0000-0002- 4672-8799



image

image

Doxa: Rev. Bras. Psico. e Educ., Araraquara, v. 22, n. 00, e021014, 2021. e-ISSN: 2594-8385

image