image/svg+xml“E se?” Implodindo os pilares da modernidade: Uma resenhasobre o livro A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137261E SE?” IMPLODINDO OS PILARES DA MODERNIDADE: UMA RESENHA SOBRE O LIVRO A DÍVIDA IMPAGÁVEL"¿Y SI?" EN BUSCA DE LOS PILARES DE LA MODERNIDAD: UNA REVISIÓN DEL LIBRO A DÍVIDA IMPAGÁVEL"WHAT IF?" IMPLODING THE PILLARS OF MODERNITY: A REVIEW ON THE BOOK A DÍVIDA IMPAGÁVELGuilherme MARCONDES1[...]como uma imagem anti-dialética, A Dívida Impagávelnão faz mais do que registrar, ao tentar interromper, o desdobrar da lógica perversa que oclui a maneira como, desde o fim do século XIX, a racialidade, opera como um arsenal ético em conjunto por dentro, ao lado, e sempre-a/diante das arquiteturas jurídico-econômicas que constituem o par Estado-Capital. (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 33, grifo do autor).Figura 1Notícias sobre o assassinato de JoãoPedro, jovem negro de 14 anos, em São Gonçalo-RJ, durante a operação das polícias federal e civil em plena pandemia da Covid-19,em 18 de maio de 2020.Fonte: Print de busca no Google com o nome João Pedro1Universidade Estadual do Ceará(PPGS/UECE), FortalezaCEBrasil. Pós-doutorando(com bolsa PNPD/CAPES)no Programa de Pós-Graduação em Sociologia.Doutor e mestre em Sociologia e Antropologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologiae Antropologia PPGSA/UFRJ).ORCID:https://orcid.org/0000-0001-6114-7944.E-mail:gui.marcondesss@gmail.com
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137262Porque não há uma crise ética global e nãosomente local com as mortes de jovens negros(as/es) pelo Estado? Qual o papel da racialidade no pensamento moderno? E se abandonarmos os procedimentos críticos que têm por fundamento as bases ontológicas e epistemológicas da modernidade, o que aconteceria?Estas são as principais perguntas postas por Ferreira da Silva2em A Dívida Impagável(2019).No livro, a autora toma a racialidade3como foco e trata da importância de uma transformação completa de pensamento a partir de uma perspectiva poética negra feministaque seria capaz de pôr abaixo os pilares da modernidade4, a fim de constituir um mundo distinto em termos éticos, políticos, jurídicos e estéticos. Ferreira da Silva realiza uma crítica contundente ao pensamento moderno; aquele localizado (históricae politicamente) onde os tentáculos coloniais, capitalistas e patriarcais pousaram e instituíram um modo societário. Denise Ferreira da Silva (2019) propõe, de fato, “o fim do mundo como a gente conhece”5. Posto que para a autora, esse mundo tal qual o conhecemos é sustentado por pilares que nunca incluíram e nem incluiriam escravizados(as/es) e indígenas, aqueles indivíduos subjugados/expropriados há séculos. Afinal, a forma como pensamos dentro das normas desse mundo só nos permitiria falar de exclusãoe discriminação, não nos permitindo articular um discurso capaz de ir ao centro da violência racial, que é, fundamentalmente, uma violência colonial (que é física, porque inclusive mata e que também expropria não apenas materialmente). Ferreira da Silva realiza, então, um mapeamento do pensamento moderno ocidental, em especial, via filosofia, buscando suas bases ontológicas e epistemológicas. Em seu mapeamento acerca do pensamento moderno, Denise Ferreira da Silva, além de dialogar com a física clássica, aantropologia biológica, bem como com a antropologia e sociologia feitas até tempos atuais, retoma autores como René Descartes (1596-1650),Kant (1724-1804) e Hegel(1770-1831). Sendo fundamental a reconstrução que apresenta a partir de Descartes e sua xima“penso, logo existo”, responsável pela separação entre corpo e mente e, assim, pela construção do sujeito moderno como um sujeito autodeterminado que pode conhecer o Mundo, mas que a ele não se mistura. Já com Kant a autora remonta o sujeito que seriaum sujeito científico, em um sistema guiado pelo poder da razão e separado da 2Professora titular na University of British Columbia, no Canadá, e diretora do Instituto de Justiça Socialna mesma instituição.3Conforme expresso na epígrafe deste texto, Ferreira da Silva (2019),compreende a racialidade como uma das ferramentas de dominação produzidas no bojo da modernidade.4Explicitados a seguir.5Fala da pesquisadora em: O Evento Racial, Uma Proposição de Denise Ferreirada Silva. (ALI DO ESPIRITO SANTO, 2017)
image/svg+xml“E se?” Implodindo os pilares da modernidade: Uma resenhasobre o livro A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137263esfera do divino. E, com Hegela autora trata de sua crítica ao pensamento kantiano e a proposição do método dialético. A partir das noções brevemente mencionadas, Ferreira da Silva,a fim de responder às perguntas (éticas, jurídicas e sociológicas) que abrem este texto, remonta aqueles que seriam os três pilares do pensamento moderno, nomeados como: separabilidade, determinabilidadee sequencialidade, que sustentariam o pensamento moderno operando “na sintaxe ética em que a indiferença, como posicionamento moral (comum e pública), faz sentido”(FERREIRA DA SILVA, 2019, p.127). Ou seja, uma ética pautada pela lógica da exclusão e daobliteração, internamente articulada pela subjugação racial. É, neste sentido, que os pilares ontoespistemológicos identificados pela autora suportam um Mundo em que jovens negros(as/es) são assassinados(as/es) por forças do Estado e isso não cria uma crise ético-jurídica em termos globais.Ferreira daSilvadesvela os modos de operação do pensamento moderno relativamente à racialidade através das mencionadas categorias construídas a partir de seu mapeamento, colocando em evidência o que está em disputa quando sua proposta é subverter as formas de pensamento legadas pela modernidade em prol de pensarmos o Mundooutramente6. Destarte, estes pilares ontoepistemológicos são analisados ao longo dos quatro ensaios reunidos que compõem o livro, assim dividido: Introdução: (Di)Ante(s) do Texto; capítulo I. A Ser Anunciado ou Conhecendo (n)os Limites da Justiça; capítulo II. Para uma Poética Negra Feminista:A Busca /Questão da Negridade Para o (Fim do) Mundo; capítulo III. 1 (vida) ÷ 0 (negridade) = ∞ ∞ ou∞/∞: sobre a matéria além da equação de valor; e, capítulo IV. Dívida Impagável: Lendo Cenas de Valor Contra a Flecha do Tempo. Além de contar com um prefácio de autoria de Jota Mombaça e Musa Michelle Mattiuzzi, intitulado Carta à leitora preta do fim dos tempos, e ainda, um posfácio de Pedro Daher chamado O abrir-mão para o futuro.Os pilares ontoepistemológicos trazidos por Ferreira da Silva, são alvo de sua análise na medida em que tais modelos/ferramentas de pensamento estruturam o mundo tal qual o conhecemos. Indicam, portanto, mecanismos/princípios éticos que organizam o pensamento moderno. A separabilidadeé, deste modo, mapeada desde Descartes, mostra-se presente no programa kantiano e não desaparece com Hegel, bem como se apresenta quando, no capítulo I, a autora propõe uma análise acerca dos limites da justiça a partir de sua pergunta sobre o 6Resumidamente, Ferreira da Silva (2019)fala em outridadepara se referir às epistemologias, ontologias e vivências que não se enquadram no modelo proposto/instituído/imposto pela modernidade, em que vigoram a separabilidade, a determinabilidadee a sequencialidade.
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137264assassínio de jovens negros(as/es) pelo Estado. Sendo a separabilidadeum princípio que comporta a diferença posto que seja com separação entre os itens da equação. Ou seja, seria um mecanismo/princípio responsável não apenas por uma separação entre corpo e mente, mas que influi, inclusive, na separação entre categorias raciais distintas de indivíduos. Em outra ponta do triângulo, a determinabilidade, que seria crucial ao pensamento kantiano por tratar do que Descartes chamava de “nexo” das consequências, seria uma ação da mente racional para estabelecer algo com certeza. A determinabilidade, analisada no capítulo II, pressupõe um universalque funcionaria como determinante formal. É assim que a autora compreende, por exemplo, como a determinabilidadeé operada através da noção de humanidade (fechada nas fronteiras europeias), pois somente ela compartilharia os poderes determinantes da dita razão universal, por possuir livre-arbítrio e autodeterminação. Por fim, a sequencialidade, analisada no capítulo III, seria a linearidade temporal mediada pela determinabilidade. Ou seja, diz respeito à linearidade do pensamento moderno que ocluiria a colonialidade e a escravidão, apesar de sua suposta inclusão. Denise Ferreira da Silva apresenta, então, os modos como estas categorias, brevemente explicitadas, operam na constituição das regras que estruturam as relações sociais (entre humanos) e com o próprio Mundo (não humano), tal qual proposto pela modernidade. Por mais abstratos que pareçam os mencionados pilares, o seu dessecamento pela autora se dá paralelamente a apresentação de outros modos de pensar, com a centralidade conferida à questão da racialidade, demonstrando, ainda, como esta é constituída por esse legado moderno. Assim sendo, a racialidade cria, de acordo com Denise Ferreira da Silva, uma diferença humana com base na razão kantiana, em que nem todos seguiriam a chamada trajetória do espírito, sendo o pensamento abstrato europeu tomado como expressão mais elevada do espírito na evolução humana. Com base na separabilidade, na determinabilidadee na sequencialidade, ocorreria um processo contínuo de acumulação da expropriação de valor dos indivíduos racializados e historicamente subjugados. Dirá Ferreira da Silva(2019, p.180-181):Ao longo dos últimos cento e cinquenta anos, desde a apresentação da versão clássica do materialismo histórico, a produção capitalista (como delineada por Marx e seus seguidores) não interrompeu a expropriação colonial. Na verdade, o contrário ocorreu. Os últimos duzentos testemunharam episódios repetidos da expropriação colonial de terras, trabalho e recursos, garantida por arquiteturas jurídico-econômicas que operam dentro e fora do Estado-nação, ou seja, da figuração mais recente do corpo político liberal. Indubitavelmente encontramos, hoje, a forma jurídica colonial possibilitando o capital global. Considere, por exemplo, os diversos lugares no mundo que se encontram num estado deviolência contínua várias partes no Oriente
image/svg+xml“E se?” Implodindo os pilares da modernidade: Uma resenhasobre o livro A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137265Médio, continente africano, bairros economicamente despossuídos e áreas rurais na América Latina e no Caribe, ou bairros negros e latinos dos Estados Unidos. Violência que, além de facilitara expropriação deterras, recursos e mão-de-obra, também transforma esses espaços em mercados para a venda de armas e inúmeros serviços e bens fornecidos pela indústria da seguridade. É, deste modo, que a autora analisa a crise globaldo mercado financeiro de 2007 e 2008: como um evento racial fundamental para explicitar o modo como a racialidade opera no processo de acumulação global do capital. Posto que os empréstimos subprimeeram destinados a pessoas com defasagem econômica, que não conseguiam obterempréstimos normais. Pessoas negras e latinas, das classes trabalhadora e média baixa, compreendidas pelas instituições financeiras como “instrumentos financeiros e não entidades morais, isto é, pessoas” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p.157).Os empréstimos subprimeextraiam, por conseguinte, lucro do déficit financeiro de pessoas tomadas como instrumentos para o enriquecimento das instituições financeiras. Tais empréstimos operariam como ferramentas de subjugação colonial e racial, que compõem o que a autora chama de dialética racial, que se daria com a transubstanciação da expropriação colonial em um déficit que seria natural. Destarte, Denise Ferreira da Silva trata, em especial no capítulo IV, da falta de ferramentas do materialismo histórico capazes de abordar o papel da escravidão na acumulação do capital, posto que, como argumenta, a escravização é constitutiva das arquiteturas jurídico-econômicas próprias do (e não temporalmente (separadas do) ou anteriores ao) capital. Sendo ainda vigentes as regras daestrutura social legadas pela modernidade e seus três pilares, que ocluem a violência racial em suas diversas matizes. Deste modo, o conceito de dívida impagável, que dá título ao livro, diz respeito ao continuado processo de expropriaçãodo elemento negro na sociedade ocidental, tratando-se, portanto, de “uma obrigação que se carrega,mas que não deve ser paga” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p.154).Ou ainda, são dívidas nos termos econômicos, mas não no sentido ético, por isso, não deveriam ser saldadas. Fato explicitado pela autora em sua análise de Kindred(1979) de Octávia E. Butlere dos mencionados empréstimos subprime.O mundo legado pela modernidade com seus pilares ontológicos e epistemológicos é chamado pela autora de Mundo Ordenado, onde pessoas estariam marcadas pela racialidade, separadas entre si e do restante do que compõe o Mundo. Desta maneira, a virada de pensamento proposta pela autora tem base na noção de Plenum7, que caracterizaria um Mundo Implicado em oposiçãoao Mundo Ordenado, projetadoe levado a cabo no processo colonial, 7A noção de Universo como Plenumé resgatada por Denise Ferreira da Silva do pensamento de Gottfried Wilhelm Leibniz(1646-1716).
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137266capitalista e patriarcal. Sendo, então, a dívida impagávelreferente ao processo de contínua expropriação a que alguns corpos têm sido submetidos ao longo da história, o Mundo Implicado, pautado pelo modelo de Plenum,traria a possibilidade de pensar o mundo outramente. O Plenum, por conseguinte, seria possibilidade de vida, de outra vida, em outras perspectivas ontoepistemológicas, que compreenderiam a implicação das pessoas e coisas do mundo umas nas outras. Ou seja,trata de um universo em que cada um dos corpos que existem no mundo expressariam o universo de uma forma única, mas, ao mesmo tempo, expressariam todas as outras coisas que existem no universo. A coletividade ao invés da individualidadeé aqui importante,posto que demarca a diferenciação entre uma perspectiva, como a apresentada por Ferreira da Silva, e aquela do Mundo Ordenadoda modernidade, que classifica, hierarquiza e separa. Dessa forma, o Plenum é um Mundo Implicado, em que[...] a socialidade nãoé mais nem causa nem efeito das relações envolvendo existentes separados, mas a condição incerta sob a qual tudo que existe é uma expressão singular de cada um e de todos os outros existentes atuais-virtuais do universo, ou seja, como Corpus Infinitum(FERREIRA DA SILVA, 2019, p.46, grifo do autor).O projeto proposto por Denise Ferreira da Silva,coloca a racialidade no centro do pensamento moderno, compreendendo como a negridade8seria uma chave para o desmoronamento deste Mundo Ordenadoe a ascensão do Mundo Implicado. Se no primeiro caso, não é possível pensar a diferença sem separação, no segundo, a existência se daria sem o princípio da separabilidade, possibilitando, portanto, o fim do mundo conforme o conhecemos, para o florescimento de uma perspectiva epistemológica e ontológica que traria uma completa virada de pensamento. A Dívida Impagável(2019) pode ser compreendido como um empreendimento de fôlego, criatividade e rigor em pesquisa. Um livro que certamente não é simples deser lido, mas semdúvida fundamental, em que se apresenta a perspectiva de uma autora multifacetada, capaz de transitar entre distintas ciências a fim de explicitar as questões e construir as categorias com que trabalha. Trazendo ao centro da investigaçãoa racialidade, não tendo como alvo uma denúncia, mas um projeto de fim de mundo e nascimento de outro em termos epistemológicos e ontológicos. 8De acordo coma autora, a categoria de negridadepossui duas faces: deum lado, vista como índicede uma situação social nunca deixa de significar a escravidão, relembrando a expropriação da capacidade produtiva dos(as/xs) escravizados(as/xs). De outro, a negridadesinaliza uma capacidade criativa, quando se contempla o Mundo como Plenum. Neste segundo caso, a negridade é compreendida, pela autora, como detentora das ferramentas necessárias para o desmonte do Mundo Ordenado. (FERREIRA DA SILVA, 2019, p.95-97).
image/svg+xml“E se?” Implodindo os pilares da modernidade: Uma resenhasobre o livro A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, jan./dez. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137267Entrelaçando passado, presente e futuro, o livro traz uma nova mirada acerca da modernidade e seus processos dedominação, bem como da negridadecomo categoria também capaz de implodir e subverter as lógicas vigentes no Mundo Ordenadoem busca de um novo modo societário, que vá na contramão da proposta moderna (assentada em uma dialética racialque oclui as violênciasraciais). Buscando a decolonização do mundo, com a implementação de arquiteturas jurídico-econômicas distintas daquelas que, investigadas pela autora, foram constituídas com a modernidade e seguem em vigor. Logo, Denise Ferreira da Silva propõe uma análise que vai ao passado, ao mesmo tempo em que está centrada no presente (em que a violência racial é parte da ordenação do mundo), perseguindo/propondo possibilidades de futuro em que seja possível existir plenamente, ou seja, sem que haja a atribuição deoutridade. Persegue, então, a constituição de um mundo em que a implicação (a capacidade de compreendermos os elementos do mundo como partes singulares, mas não separadas) seja a norma e a partir dela novos caminhos éticos, morais, jurídicos e estéticos sejam possíveis.REFERÊNCIASALI DO ESPIRITO SANTO. O Evento Racial,Uma Proposição de Denise Ferreira da Silva.1 vídeo(107 min). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=T_QBEPK7too. Acesso em:18 maio2020.FERREIRA DA SILVA, D. A Dívida Impagável. São Paulo: Forma Certa,2019.Disponível em: https://casadopovo.org.br/wp-content/uploads/2020/01/a-divida-impagavel.pdf. Acesso em:28 mai. 2021.Como referenciareste artigoMARCONDES, G.“E se?” Implodindo os pilares da modernidade: Uma resenha sobre o livro A Dívida Impagável.Estudos de Sociologia,Araraquara,v.27, n.00,e022014, jan./dez.2022. ISSN: 2358-4238.DOI: https://doi.org/10.52780/res.v27i00.13726Submetido em:26/05/2020Revisões requeridas em:03/11/2020Aprovado em: 20/05/2021Publicado em:30/06/2022/
image/svg+xml"What if?" imploding the pillars of modernity: a review on the book A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137261"WHAT IF?" IMPLODING THE PILLARS OF MODERNITY: A REVIEW ON THE BOOK A DÍVIDA IMPAGÁVELE SE?” IMPLODINDO OS PILARES DA MODERNIDADE: UMA RESENHA SOBRE O LIVRO A DÍVIDA IMPAGÁVEL"¿Y SI?" EN BUSCA DE LOS PILARES DE LA MODERNIDAD: UNA REVISIÓN DEL LIBRO A DÍVIDA IMPAGÁVELGuilherme MARCONDES1[...] as an anti-dialectical image, A Dívida Impagáveldoes nothing more than register, in trying to interrupt, the unfolding of the perverse logic that occludes the way in which, since the end of the 19th century, raciality has operated as a ethical arsenal together inside, alongside, and always-now in front of the legal-economic architectures that constitute the State-Capital pair (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 33, author's emphasis, our translation).Figure1News about the murder of João Pedro, a 14-year-old black man, in São Gonçalo-RJ, during the operation of the federal and civil police in the midst of the Covid-19 pandemic, on 18 May 2020.Source: Google search print with the name João Pedro1Ceará State University (PPGS/UECE), FortalezaCEBrazil. Postdoctoral fellow (with PNPD/CAPES grant) in the Postgraduate Program in Sociology. Doctor and Master in Sociology and Anthropology from the Postgraduate Program in Sociology and Anthropology(PPGSA/UFRJ). ORCID:https://orcid.org/0000-0001-6114-7944.E-mail:gui.marcondesss@gmail.com
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137262Why is not there a global and not just a local ethical crisis with the deaths of young black people by the State? What is the role of raciality in modern thought? And if we abandon the critical procedures that are based on the ontological and epistemological foundations of modernity, what would happen? These are the main questions posed by Ferreira da Silva2in A Dívida Impagável(2019). In the book, the author takes raciality as a focus and deals with the importance of a complete transformation of thoughtfrom a black feminist poeticperspective that would be able to bring down the pillars of modernity3, in order to constitute a distinct world in ethical terms, political, legal and aesthetic. Ferreira da Silva makes a scathing critique of modern thought; the one located (historically and politically) where colonial, capitalist and patriarchal tentacles landed and instituted a societal mode.Denise Ferreira da Silva (2019) proposes, in fact, “the end of the world as we know it”4. Since for the author, thisworld as we know it is supported by pillars that never included and would not include enslaved and indigenous people, those subjugated/expropriated individuals centuries ago. After all, the way we think within the norms of this world would only allow us to talk about exclusion and discrimination, not allowing us to articulate a discourse capable of going to the center of racial violence, which is, fundamentally, colonial violence (which is physical, because even kills and also expropriates not only materially). Ferreira da Silva then carries out a mapping of modern Western thought, especially via philosophy, seeking its ontological and epistemological bases.In her mapping of modern thought, Denise Ferreira da Silva, in addition to dialoguing with classicalphysics, biological anthropology, as well as with anthropology and sociology up to the present time, takes up authors such as René Descartes (1596-1650), Kant (1724-1804) and Hegel (1770-1831). The reconstruction that he presents from Descartes and his maxim “I think, therefore I am” is fundamental, responsible for the separation between body and mind and, thus, for the construction of the modern subject as a self-determined subject that can know the World, but that to it do not mix. With Kant, the author traces back the subject that would be a scientific subject, in a system guided by the power of reason and separated from the sphere of the divine. And, with Hegel, the author deals with her critique of Kantian thought and the proposition of the dialecticalmethod.2Full Professor at the University of British Columbia, Canada, and Director of the Social Justice Institute at the same institution.3Explained below.4Researcher speech in: O Evento Racial, Uma Proposição de Denise Ferreira da Silva. (ALI DO ESPIRITO SANTO, 2017)
image/svg+xml"What if?" imploding the pillars of modernity: a review on the book A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137263From the notions briefly mentioned, Ferreira da Silva, in order to answer the questions (ethical, legal and sociological) that open this text, goes back to what would be the three pillars of modern thought, named as: separability, determinabilityand sequentiality, which would support modern thinking operating “in the ethical syntax in which indifference, as a moral position (common and public), makes sense” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 127, our translation). In other words, an ethics guided by thelogic of exclusion and obliteration, internally articulated by racial subjugation. It is, in this sense, that the onto-epistemological pillars identified by the author support a world in which young black people are murdered by state forces and this does not create an ethical-legal crisis in global terms.Ferreira da Silva reveals the modes of operation of modern thinking in relation to raciality through the aforementioned categoriesconstructed from its mapping, highlighting what is in dispute when her proposal is to subvert the forms of thought bequeathed by modernity in favor of thinking about the world otherwisely5. Thus, these ontoepistemological pillars are analyzed throughout the four essays that make up the book, thus divided: Introduction: (Di)Ante(s) do Texto; chapterI. A Ser Anunciado ou Conhecendo (n)os Limites da Justiça; chapterII. Para uma Poética Negra Feminista:A Busca /Questão da Negridade Para o (Fim do) Mundo; chapterIII. 1 (vida) ÷ 0 (negridade) = ∞ ∞ ou ∞/∞: sobre a matéria além da equação de valor; and, chapterIV. Dívida Impagável: Lendo Cenas de Valor Contra a Flecha do Tempo. In addition to having a preface by Jota Mombasa and Musa Michelle Mattiuzzi, entitled Carta à leitora preta do fim dos tempos, and yet, an afterword by Pedro Daher called O abrir-mão para o futuro.The ontoepistemologicalpillars brought by Ferreira da Silva are the target of his analysis insofar as such thought models/tools structure the world as we know it. Therefore, they indicate ethical mechanisms/principles that organize modern thought. In this way, separabilityis mapped since Descartes, it is present in the Kantian program and does not disappear with Hegel, as well as when, in chapter I, the author proposes an analysis of the limits of justice based on her question about the murder of young black people by the State. Being separabilitya principle that includes the difference, even if it is with separation between the items of the equation. In other words, it would be a mechanism/principle responsible not only for a separation between body and mind, but which also influences the separation between distinct racial categories of individuals.5Briefly, Ferreira da Silva (2019) speaks of otherness to refer to epistemologies, ontologies and experiences that do not fit into the model proposed/instituted/imposed by modernity, in which separability, determinabilityand sequentialityprevail..
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137264At the other end of the triangle, determinability, which would be crucial to Kantian thought for dealing with what Descartes called the “nexus” of consequences, would be an action of the rational mind to establish something with certainty. Determinability, analyzed in Chapter II, presupposes a universal that would function as a formal determinant. This is how the author understands, for example, how determinabilityis operated through the notion of humanity (closed within European borders), as only it would share the determining powers of the so-called universal reason, for having free will and self-determination.Finally, sequentiality, analyzed in Chapter III, would be temporal linearity mediated by determinability. In other words, it concerns the linearity of modern thought that would occlude coloniality and slavery, despite their supposed inclusion. Denise Ferreira da Silva then presents the ways in which these categories, briefly explained, operate in the constitution of the rules that structure social relations (between humans) and with the (non-human) World itself, as proposed by modernity.As abstract as the mentioned pillars may seem, their drying by the author takes place in parallel with the presentation of other ways of thinking, with the centrality given to the issue of raciality, also demonstrating how it is constituted by this modern legacy. Therefore, raciality creates, according to Denise Ferreira da Silva, a human difference based on Kantian reason, in which not everyone would follow the so-called trajectory of the spirit, with European abstract thought taken as the highest expression of the spirit in human evolution.Based on separability, determinabilityand sequentiality, there would be a continuous process of accumulation of expropriation of value from racialized and historically subjugated individuals. Ferreira da Silva (2019, p. 180-181, our translation) will say:Over the past one hundred and fifty years, since the presentation of the classic version of historical materialism, capitalist production (as outlined by Marx and his followers) has not stopped colonial expropriation. In fact, the opposite occurred. The last two hundred have witnessed repeated episodes of colonial expropriation of land, labor and resources, guaranteed by juridical-economic architectures that operate inside and outside the nation-state, that is, the more recent figuration of the liberal political body. Undoubtedly, we find today the coloniallegal form enabling global capital. Consider, for example, the many places in the world that are in a state of ongoing violence various parts of the Middle East, the African continent, economically dispossessed neighborhoods and rural areas in Latin America and the Caribbean, or black and Latino neighborhoods in the United States. Violence that, in addition to facilitating the expropriation of land, resources and labor, also transforms these spaces into markets for the sale of weapons and countless services and goods provided by the insurance industry.
image/svg+xml"What if?" imploding the pillars of modernity: a review on the book A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137265It is in this way that the author analyzes the global financial market crisis of 2007 and 2008: as a fundamental racial event to explain how raciality operates in the process of global capital accumulation. Since the subprimeloans were intended for people with economic lag, who could not obtain normal loans. Black and Latino people, from the working and lower middle classes, understood by financial institutions as “financial instruments and not moral entities, that is, people” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 157, our translation). Subprimeloans therefore extract profit from the financial deficit of people taken as instruments for the enrichment of financial institutions. Such loans would operate as tools of colonial and racial subjugation, which compose what the author calls racialdialectic, which would take place with the transubstantiation of colonial expropriation into a deficit that would be natural.Thus, Denise Ferreira da Silva deals, especially in chapter IV, with the lack of tools of historical materialism capable of approaching the role of slavery in the accumulation of capital, since, as she argues, enslavement is constitutive of the juridical-economic architectures of the (and not temporally (separate from) or prior to) the capital. The rules of the social structure bequeathed by modernity and its three pillars are still in force, which occlude racial violence in its various shades. In this way, the concept of unpayable debt, which gives the book its title, concerns the continued process of expropriation of the black element in Western society, being, therefore, “an obligation that is carried, but that must not be paid” (FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 154, our translation). Or yet, they are debts in economic terms, but not in the ethical sense, therefore, they should not be settled. A fact made explicit by the author in her analysis of Kindred(1979) by Octavia E. Butler and the aforementioned subprimeloans.The world bequeathed by modernity with its ontological and epistemological pillars is called by the author of OrderedWorld, where people would be marked by raciality, separated from each other and from the rest of what makes up the World. In this way, theturn of thought proposed by the author is based on the notion of Plenum6, which would characterize an ImplicatedWorldin opposition to the OrderedWorld, designed and carried out in the colonial, capitalist and patriarchal process. Being, then, the unpayabledebtreferring to the process of continuous expropriation to which some bodies have been subjected throughout history, the ImplicatedWorld, guided by the Plenummodel, would bring the possibility of thinking about the world otherwisely. The Plenum, therefore, would be the possibility of life, of another life, in other ontoepistemological perspectives, which would understand the implication of people and things in the world in each other. That is, it deals with a universe in which each of the 6A noção de Universo como Plenumé resgatada por Denise Ferreira da Silva do pensamento de Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716).
image/svg+xmlGuilherme MARCONDESEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137266bodies that exist in the world would express the universe in a unique way, but, at the same time, they would express all the other things that exist in the universe. Collectivity rather than individuality is important here, since it marks the differentiation between a perspective, such as that presented by Ferreira da Silva, and that of the OrderedWorldofmodernity, which classifies, hierarchizes and separates. In this way, the Plenumis an ImplicatedWorld, in whichsociality is no longer either cause or effectof relations involving separate existents, but the uncertain condition under which everything that exists is a singular expression of each and every other virtual-actual existents of the universe, or that is, as CorpusInfinitum(FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 46, author's emphasis, our translation).The project proposed by Denise Ferreira da Silva, places raciality at the center of modern thought, understanding how blackness7would be a key to the collapse of this OrderedWorldand the rise of the ImplicatedWorld. If in the first case, it is not possible to think about difference without separation, in the second, existence would take place without the principle of separability, thus enabling the end of the world as we know it,for the flowering of an epistemological and ontological perspective that would bring a complete turn of thought.A Dívida Impagável(2019) can be understood as an enterprise of breath, creativity and rigor in research. A book that is certainly not easy toread, but undoubtedly fundamental, in which the perspective of a multifaceted author is presented, capable of moving between different sciences in order to explain the issues and build the categories with which she works. Bringing raciality to the center of the investigation, not targeting a denunciation, but an end-of-the-world project and the birth of another in epistemological and ontological terms.Intertwining past, present and future, the book takes a new look at modernity and its processes of domination, as well as blacknessas a category that is also capable of imploding and subverting the logics prevailing in the OrderedWorldin search of a new societal mode that against the modern proposal (based on a racialdialecticthat occludes racial violence). Seeking the decolonization of the world, with the implementation of legal-economic architectures different from those that, investigated by the author, were constituted with modernity and are still in force. Therefore, Denise Ferreira da Silva proposes an analysis that goes to the past, at the same time that it is centered on the present (in which racial violence is part of the ordering 7According to the author, the category of blacknesshas two faces: on the one hand, seen as an index of a social situation, it never ceases to signify slavery, recalling the expropriation of the productive capacity of the enslaved. On the other hand, blacknesssignals a creative capacity, when one contemplates the World as Plenum. In this second case, blacknessis understood by the author as the holder of the necessary tools for the dismantling of the OrderedWorld.(FERREIRA DA SILVA, 2019, p. 95-97).
image/svg+xml"What if?" imploding the pillars of modernity: a review on the book A Dívida ImpagávelEstud. sociol., Araraquara, v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022.e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.137267of the world), pursuing/proposing possibilities for the future in which it is possible to exist fully, that is, without the attribution of otherness. It then pursues the constitution of a world in which implication (the ability to understand the elements of the world as singular but not separate parts) is the norm and from which new ethical, moral, legal and aesthetic paths are possible.REFERENCESALI DO ESPIRITO SANTO. O Evento Racial,Uma Proposição de Denise Ferreira da Silva.2017.1 vídeo (107 min). Available: https://www.youtube.com/watch?v=T_QBEPK7too. Access:18 May2020.FERREIRA DA SILVA, D. A Dívida Impagável. São Paulo: Forma Certa,2019.Available: https://casadopovo.org.br/wp-content/uploads/2020/01/a-divida-impagavel.pdf. Access:28 May2021.How to reference this articleMARCONDES, G."What if?" imploding the pillars of modernity: Areview on the book A Dívida Impagável.Estudos de Sociologia,Araraquara,v.27, n.00, e022014, Jan./Dec. 2022. e-ISSN: 1982-4718. DOI: https://doi.org/10.52780/res.v27i00.13726Submitted:26/05/2020Required revisions:03/11/2020Approved: 20/05/2021Published:30/06/2022/