¿PODEMOS HABLAR DE GENTRIFICACIÓN EN FAVELAS? ESTUDIO DE CASO DE REQUALIFICACIÓN URBANA EN BAIRRO DE LA PAZ
CAN WE TALK ABOUT GENTRIFICATION IN FAVELAS? CASE STUDY ON URBAN REQUALIFICATION IN BAIRRO DA PAZ
Maria Gabriela HITA1 Emilly Mascarenhas COSTA2
RESUMEN: El artículo discute el uso del concepto de gentrificación en contextos de valoración del suelo en territorios de periferia urbana que sufren transformaciones socioespaciales resultantes de la intervención de las autoridades públicas, la iniciativa privada y procesos complejos de especulación inmobiliaria. Transformaciones también impactadas por las luchas de los movimientos sociales, que en una Bahía afrodescendiente manifiestan características y dimensiones socioculturales únicas. Primero, se revisa el término gentrificación para desarrollar aún más cómo la presencia de agentes gentrificantes en la transformación local de las ciudades brasileñas también ocurre en áreas periféricas, impactando de manera peculiar la forma de vida en estos lugares. A partir del análisis de un estudio de caso etnográfico en la ciudad de Salvador-BA, analizamos los principales
1 Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador – BA – Brasil. Professora Titular do Departamento de Sociologia, Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCS), e o de Estudos Interdisciplinares sobre Mulher, Gênero e Feminismo (PPGNEIM). PQ2-CNPQ no Núcleo de Estudos sobre Corpos, Sensibilidades e Ambientes (ECSAS). Dra. em Ciências Sociais (UNICAMP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5865-7334. E-mail: mghita63@gmail.com
2 Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador – BA – Brasil. Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais (PPGCS) da UFBA. Mestre em Ciências Sociais (PPGCS-UFBA). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9539-1061 E-mail: emillymascarenhass@gmail.com
impactos que un proceso de ordenamiento territorial en un barrio popular sobre este tipo de “gentrificación”, ilustrando como ciertos procesos de cierta “burguesización” se inician a su interior.
PALABRAS CLAVE: Gentrificación. Ciudades. Políticas urbanas. Segregación socioespacial. Barrio de Paz.
ABSTRACT: The article discusses the use of the gentrification concept in contexts of land valuation in territories on the urban periphery that undergo socio-spatial transformations resulting from the intervention of public authorities, private initiative and complex processes of real estate speculation. Transformations also impacted by the struggles of social movements, which in an Afro-descendant Bahia manifest unique sociocultural characteristics and dimensions. First, the term gentrification is revised in order to further develop how the presence of gentrifying agents in the local transformation of Brazilian cities also occurs in peripheral areas, impacting in a peculiar manner the way of life in these places. From the analysis of an ethnographic case study in the city of Salvador-BA, we analyze the main impacts that a process of land regulation in a popular neighborhood has on this kind of “gentrification”, illustrating how processes of certain “bourgeoisization” begins to its interior.
KEYWORDS: Gentrification. Cities. Urban policies. Socio-spatial segregation. Bairro da Paz.
O conceito de gentrificação tem sido amplamente utilizado por diversas áreas do conhecimento para explicar e compreender transformações socioespaciais em antigos centros urbanos que passam por processos de requalificação mediante ações do poder público e da iniciativa privada. Neste artigo, buscamos analisar os atuais processos de transformação socioespacial ocorridos na cidade de Salvador-BA nos últimos anos, tendo em vista ações de iniciativas público-privadas e seus possíveis impactos em comunidades periféricas. Desta maneira, buscamos refletir: seriam estas ações de requalificação de periferias passíveis de se relacionarem a processos de gentrificação? Ou ainda, podemos falar de gentrificação em periferias urbanas?
Buscaremos responder estas questões através da análise do estudo de caso que vem sendo desenvolvido no Bairro da Paz (BP) desde o ano de 2005, dando ênfase ao período de 2013-2016, anos iniciais da implementação do Programa Casa Legal (PCL). Este programa atendeu demandas de regularização fundiária pela Prefeitura Municipal de Salvador (PMS)
durante os governos de Antônio Carlos Magalhães Neto (ACM Neto)3. Por intermédio da implementação do PCL, visamos a debater o uso do conceito de gentrificação em processos de valorização espacial e imobiliária de bairros originalmente periféricos, destacando a importância dos efeitos que ações do poder público e/ou privado produzem ao transformarem a cidade e, por conseguinte, a vida urbana e sociocultural desses locais.
Nos últimos anos, o BP e seu entorno têm passado por mudanças significativas mediante ações de requalificação urbana e ampliação da malha de transporte coletivo, que afetam o espaço físico e a composição socioeconômica e cultural da comunidade. Acreditamos que tais fatores podem ser associados a um novo modo de gentrificação, mesmo este processo ocorrendo de modo sutil e gradual.
Parte dos estudos sobre o assunto defende a relação indissociável entre desenvolvimento das cidades e os usos de seus espaços com interesses e processos de produção/reprodução do capital, o que configura e organiza territórios em todo globo. O crescimento urbano na América Latina foi marcado pelo deslocamento das classes trabalhadoras dos centros urbanos para as periferias, devido ao custo habitacional das regiões centrais, ocupadas pelas classes mais abastadas. O protótipo de ocupação residencial nas cidades, em todo o mundo, tem se transformado: cada vez mais, as classes médias e altas têm ocupado regiões mais distantes do centro da cidade na busca de maior segurança e qualidade de vida (CALDEIRA, 2000).
Esse movimento tende a ser acompanhado pela redução de investimentos nessas regiões, intensificando-se com o aumento da ocupação por moradores de menor poder aquisitivo. Os processos de gentrificação fazem parte de novos tipos de transformações sucedidos nas regiões centrais da cidade que buscam revalorizar esses espaços centrais. O termo é usado para dar conta de processos de requalificação urbana em bairros que foram “abandonados” e negligenciados pelo poder público e pelo capital imobiliário nos diversos processos de expansão urbana, os quais, recentemente, voltaram a atrair a atenção destes grupos econômicos que buscam enobrecê-los, com o intuído de que voltem a ser ocupados e/ou ser frequentados por classes sociais mais abastadas, ou até mesmo por turistas (SMITH, 2007; LEITE, 2002).
A partir da premissa de que não apenas os centros antigos e/ou históricos têm passado por processos de valorização cuja tendência é aumentar o custo de vida local, transformando o
3 Dados coletados no projeto de pesquisa coordenado por Hita: Impacto da Implantação do PCL e da Base Comunitária de Segurança no Bairro da Paz (2013-2017) e Dissertação realizada por Costa (2017): Casa Legal: estudo de caso sobre o Programa de regularização fundiária em Salvador-Ba.
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perfil socioeconômico de seus moradores, esse artigo visa a discutir os usos do termo gentrificação com o intuito incluir nesse debate processos de enobrecimento de regiões originalmente ocupadas por populações mais pobres4 que vêm atraindo interesses especulativos do capital imobiliário e da iniciativa privada. Desse modo, utilizamos o conceito para dar conta de processos de revalorização e requalificação em bairros populares, independentemente do quanto distam do centro histórico e/ou da ocupação anterior por classes mais abastadas do que aquelas que lá residem atualmente. Hita e Gledhill (2010) utilizam à terminologia “gentrificação de baixo nível”, para fundamentar as transformações ocorridas no BP, ao compará-lo com o que ocorre no Centro Antigo de Salvador. Por meio deste comparativo é perceptível que ambos os locais – o centro antigo de Salvador e o BP – compartilham características comuns e muitas diferenças. Nestes termos, para eles:
O futuro de lugares como o Bairro da Paz poderia ser considerado como uma espécie de “gentrificação de baixo nível”, se for considerada a base de remoção de moradores de áreas de risco ambiental e a tendência crescente a uma concentração de propriedade cada vez maior nas mãos de novos moradores com melhores empregos e maiores rendimentos (HITA; GLEDHILL, 2010, p. 55).
O conceito de gentrificação foi utilizado pela primeira vez por Ruth Glass (2018), nos anos 1960, para descrever o retorno das classes médias aos centros urbanos de Londres, abandonados pela suburbanização residencial das classes mais abastadas. Altamente relacionado com processos de transformações urbanas e habitacionais em países anglo-saxões, a gentrificação pode ser definida como um fenômeno físico, socioeconômico e cultural, relacionado a processos de reinvestimento e revalorização de áreas abandonadas pelas classes médias e altas nos distintos processos de expansão urbana (BIDOU-ZACHARIESEN, 2006; SMITH, 2006; 2007; MOURAD; FIGUEIREDO; BALTRUSIS, 2014; RIBEIRO, 2014).
Os processos de expansão urbana latino-americanos diferenciam-se dos sucedidos em países anglo-saxões, motivo pelo qual grande parte dos estudiosos defende a restrição do termo em cidades latino-americanas. Ribeiro (2014) aponta que, apesar da necessidade de cuidado para evitar esvaziamento do conceito, seu engessamento pode ser tão equivocado quanto a aplicação descuidada. Neste artigo, o termo gentrificação é pensado como o processo
4 O termo periferia deve ser entendido em sua conotação social, remetendo à ideia de precariedade e carência de infraestrutura urbana e serviços. No que diz respeito à localização espacial, o BP atualmente está situado em “uma nova centralidade da cidade” de Salvador (HITA, 2017; 2020; SANTOS, 2013).
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de valorização de áreas ocupadas por populações de baixa renda em espaços de alto valor imobiliário, independentemente de estes serem centros antigos/históricos da cidade.
A segregação socioespacial é um traço marcante nas cidades brasileiras, ainda que sua manifestação ocorra através de distintos padrões ao longo da urbanização do país. A bibliografia clássica trata por ‘centro-periferia’ o modelo de habitação no qual as classes médias e altas se mantiveram nos centros urbanos, enquanto os trabalhadores foram forçados a procurar alternativas mais baratas para a moradia, migrando para as margens da cidade. Atualmente, diversos pesquisadores, dentre eles Caldeira (2000), têm indicado a modificação do padrão habitacional em cidades brasileiras, em que as classes abastadas se distanciam cada vez mais dos centros urbanos, preferindo a moradia em condomínios fechados. Este movimento, cria uma nova face para a segregação socioespacial da cidade, na qual condomínios luxuosos fazem fronteiras com favelas5. Esses processos tendem a desvalorizar os centros da cidade, que passaram a ser ocupados por camadas populares ao passo que sofreram com o descaso do poder público. Nesse sentido, diversos estudos sobre gentrificação dizem respeito a processos incentivados pelo Estado, em parceria com a iniciativa privada, cujas articulações visam a revalorizar essas regiões, buscando, assim, por intermédio de reinvestimentos atrair novos moradores e consumidores para essas locais.
Ao longo dos anos, o conceito de gentrificação tem sido utilizado para dar conta de distintos processos de reocupação de espaços pelas classes médias e altas, nos quais podemos perceber a transformação de diferentes usos sociais e culturais do espaço urbano devido ao maior fomento ao convívio e ao consumo mediante a multiplicação de estabelecimentos como butiques, restaurantes, cafés, dentre outros tantos espaços mais frequentados por pessoas de classes médias e altas. Estes novos espaços objetivam ainda a atrair turistas e novos moradores da cidade, especialmente os com maior poder aquisitivo, mobilizados pelas novas sociabilidades e todo o capital cultural e histórico que passa a ser reatualizado nesses lugares (LEITE, 2002; CRIEKINGEN, 2006).
Defendemos que a gentrificação pode ser apresentada como um fenômeno físico, econômico, social e cultural, referente às mudanças causadas pela estrutura residencial, sem se restringir a mudanças de perfil socioeconômico (BIDOU-ZACHARIESEN, 2006). O conceito pode ser útil para analisar e compreender transformações urbanas através das relações estruturais e econômicas, até aquelas que buscam compreendê-lo a partir de atores
5 Embora o estudo de Caldeira (2000) focalize a cidade de São Paulo-SP, vale ressaltar que esse padrão de crescimento urbano tem se tornado bastante comum em Salvador-BA. Podemos citar como exemplo o Bairro da Paz, que vem sendo rodeado por um número crescente de condomínios fechados.
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individuais ou coletivos atraídos pelos modos de vida e de consumo referentes aos distintos centros e espaços da cidade.
Os processos de transformação do espaço urbano podem ser compreendidos de forma mais ampla a partir da relação entre produção e capital. O mercado imobiliário torna-se elemento fundante para compreender a dinâmica de ocupar e produzir o e no espaço urbano. Neil Smith (2006; 2007) explica a dinâmica de desvalorização/valorização dos espaços através do conceito “diferencial de renda” (rent gap6), termo que pode nos ajudar a compreender a articulação do mercado e do Estado nos distintos processos de valorização dos territórios. Se os agentes gentrificadores trazidos por Ruth Glass (2018) eram atores individuais interessados em retornar a determinadas regiões da cidade ocupadas por moradores mais pobres, atualmente, o Estado e o mercado têm desempenhado papel fundamental nos processos de gentrificação urbana.
O Estado tem exercido papel central nos processos de valorização/desvalorização urbana mediante a implementação e desenvolvimento de políticas públicas que visam a valorizar determinadas regiões da cidade, transformando-as em espaços mais atrativos e fomentados pelo crescimento de parcerias público-privadas. Estas parcerias têm atuado coligada e consistentemente para o desenvolvimento de cidades modernas inseridas cada vez mais em lógicas neoliberais, competitivas e estratégicas. A participação do Estado e do mercado como agentes gentrificadores conectam transformações locais com as da economia global, alterando a gentrificação em um fenômeno mundial (BIDOU-ZACHARIASEN, 2006; SMITH, 2007; 2006, MOURAD; FIGUEIREDO; BALTRUSIS, 2014).
A gentrificação não deve ser entendida como um fenômeno homogêneo, as diferenças de cada localidade precisam e devem ser consideradas, entretanto não se pode perder de vista o padrão transformador do urbano que conecta estes locais a outras cidades do mundo e à economia global. Desta maneira, o presente artigo busca ampliar e adaptar o uso do termo a realidades distintas, haja vista entendermos que o conceito de gentrificação pode ser utilizado tanto para entender processos de requalificação de antigos bairros da elite quanto para tratar da mudança funcional dos antigos bairros industriais/operários e de suas transformações sociais, indicando a existência de dois tipos de “aburguesamento”. O primeiro deles ocorre mediante a exclusão de categorias populares, enquanto o segundo se deve à chegada de pessoas mais ricas em áreas que eram, até então, socialmente mistas ou populares. O conceito de gentrificação é utilizado, em grande parte dos estudos, para dar conta de processos
6 Smith (2006) aponta que processos de expansão de cidades para suas margens causam a desvalorização imobiliária desses centros urbanos e a valorização dos subúrbios.
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referentes ao “aburguesamento”, advindo da chegada de camadas sociais mais abastadas em áreas periféricas (BIDOU-ZACHARIASEN, 2006).
A requalificação urbana tem sido tomada como diretriz principal para pensar ações do poder público em comunidades periféricas, substituindo políticas de higienização outrora recorrentes. A maior tolerância com a permanência de comunidades periféricas em determinadas regiões da cidade não implica em sua maior inserção/aceitação na cidade. Ainda hoje, estes espaços são identificados pela maior parte da população da cidade como lócus de violência e criminalidade. Não nos cabe aqui adentrar na discussão acerca da segurança pública ou do nível da criminalidade nas periferias brasileiras, entretanto, não podemos deixar de destacar a relevância e desafios de ações voltadas para pacificar favelas – as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), no Rio de Janeiro, com equivalência, na Bahia, às Bases de Segurança Comunitária (BSC) – em processos que visaram a revalorizar e requalificar tais comunidades. No caso de Salvador, a implementação das BCS associadas a programas de regulação fundiária faz parte de projetos mais amplos de requalificação urbana de algumas cidades. Esta associação de fatores é, via de regra, a porta de entrada desses processos de “gentrificação de baixo nível” (FLEURY; OST, 2013; FREEMAN; BURGOS, 2015; HITA; GLEDHILL, 2010).
Nesse sentido, defendemos que o uso do conceito de gentrificação adaptado a esses novos contextos ilumina processos de transformação socioespaciais e culturais que ocorrem em bairros populares, como o BP, assim como outros em espaços que vêm passando por mudanças graduais na composição de seus moradores, intensificadas pelos processos de especulação imobiliária, mesmo quando esses bairros continuam sendo reconhecidos como locais de pobreza. Por meio desta premissa, discutiremos as modificações oriundas de políticas urbanas que têm ocorrido no BP e arredores desde o início da ocupação, na década de 1980, com o intuito de debater os impactos das mudanças no bairro e na vida de seus moradores.
A localização privilegiada e a história de luta e resistência às investidas às remoções da comunidade fazem do Bairro da Paz (BP) um lócus privilegiado para fundamentar nossa hipótese de requalificação em áreas periféricas, que, com a crescente valorização imobiliária e urbana na região deve ser pensada como processo de gentrificação, devido às transformações
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socioespaciais destes locais e de suas vizinhanças. O BP localiza-se às margens da Avenida Luís Viana Filho, denominada, popularmente, como Avenida Paralela, onde se consolidou um dos principais eixos de expansão urbana de Salvador a partir da década de 1970 (SCHEINOWITZ, 1998). O bairro, inicialmente chamado de invasão das Malvinas, surgiu no início da década de 1980 a partir da ocupação irregular de terras privadas que vieram a ser apropriadas pela Prefeitura Municipal de Salvador (PMS), devido a impostos não pagos pelos proprietários originais. O domínio público da terra não eliminou o conflito, ainda latente, em torno da ocupação daquela região da cidade, processo que ocorreu, no passado, através de violentas investidas por parte do poder público para impedir os moradores de ocuparem o espaço onde é hoje BP.
Moradores mais antigos e lideranças narram a constante luta travada contra os poderes públicos para garantir o direito à moradia naquele lugar da cidade. Tais embates, dentre outras consequências, resultaram na desapropriação e transferência de moradores para a região do Subúrbio Ferroviário. Mas, as terras das Malvinas voltaram a ser sempre reocupadas, por antigos e novos moradores, os quais conquistaram o direito à permanência no bairro por volta de 1987, durante o governo de Waldir Pires, quando passa a ser denominado por Bairro da Paz em alusão ao resultado dessa resistência e conquista7 (ALCÂNTARA, 2005; HITA; DUCCINI, 2007; HITA, 2012; COSTA. 2017).
Desde então a luta por reconhecimento, dignidade e direito a fazer parte da cidade soteropolitana integram a história do local. Do mesmo modo, houve forte empenho de moradores em se contraporem ao estigma de violência recebido pelos demais habitantes de Salvador. Dentre outras ações, esse processo se deu por meio da construção de identidades culturais positivas e reclamo constante de direitos à cidadania plena. Lutas e resistências de favelas afro-baianas, a exemplo das que caracterizam as identidades culturais e políticas do BP, estão marcadas por dimensões raciais e de classe, e não podem ser dissociadas dos processos de luta na Bahia afrodescendente e no surgimento de um novo tipo de identidade comunitária, racial e cultural. Parte significativa de lideranças mais reconhecidas do BP são de jovens e integrantes de grupos culturais afro-baianos, cujas ações e performances se enquadram dentro das fronteiras de temas essenciais aos de uma sociologia da cultura. Cultura afro-baiana que opera como cenário de fundo privilegiado a partir da qual a maior dos moradores atuam, transitam, se identificam, vivem a cidade e constroem seus modos de se manifestar, lutar e resistir.
7 O termo faz alusão à Guerra das Malvinas, ocorrida no mesmo período em que se iniciou a ocupação.
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Muitas das lideranças se auto identificam como “negras” e são simpatizantes ou militantes do Movimento Negro Unificado; outra parte significativa de seus moradores compõe ampla variedade de grupos culturais e de cultura popular afro-baiana, com forte aproximação à cultura do povo de santo e terreiros de candomblé8. É através da reivindicação do papel e valor da cultura popular produzida na comunidade que grande parte das lideranças atuantes no BP se (auto)organizam para reagir ao estigma e à exclusão social. Outros elementos são fundamentais para a construção cultural e sociopolítica do BP, que recebe influências transnacionais, inclusive de grupos negros internacionais, como dos Estados Unidos. Além disso, vale considerar a presença de distintos grupos religiosos além daqueles de matriz africana, tais como as Igrejas Católicas, Evangélicas e Centros Espíritas que compõem, ao lado dos moradores, mudanças socioculturais da comunidade ao longo dos anos. Esses grupos têm exercido potencial influência na vida cotidiana e nos modos de sociabilidade de seus membros, mudando-lhes os modos de se relacionar, vestir e comportar- se. Dentre tais grupos são travadas disputas tanto no espaço micro quanto macrossocial do BP. Os embates, contudo, não impedem a união de moradores dos mais diversos credos e ideologias para defender os interesses coletivos em momentos cruciais para a história da comunidade.
No passado recente, muitas dessas lutas aconteciam mediante manifestações na Av. Paralela, onde líderes e moradores ocupavam o espaço manifestando suas demandas, esse era um modo privilegiado do BP reivindicar e fazer-se notar devido à capacidade de paralisar o fluxo de tráfego de veículos em uma das principais vias da cidade. Esse modo de se manifestar é recordado com certo saudosismo por muitos líderes, que lamentam a perda do espaço da Avenida e os impactos causados pelas passeatas, desde que novas obras de mobilidade urbana modificaram o uso e tipo de acesso à Paralela, que passou a ser mediada por ruas paralelas, menores e mais internas que permitem acesso mais lento às entradas dos bairros. Para Agier (2011), a rua é o espaço da manifestação das dimensões cultural, política e da reinvenção. As manifestações e lutas pelo direito à cidade – características dos modos de mobilização de lideranças e moradores do BP – podem ser entendidas como parte dessas dimensões e das práticas que lhes são inerentes e também próprias das cidades9. A partir das ruas, atores produzem cultura e novos atos políticos. Agier (2011) conecta a arte, à
8 Mais sobre estes grupos culturais do BP e suas complexas relações com poderes públicos, política, identidades afro nacionais e internacionais, assim como os modos como se conectam e se movem na cidade e em suas principais redes de sociabilidade, clientelismo e política, ver Azevedo (2017).
9 As manifestações políticas do BP são promovidas, também, por muitos de seus artistas. Nas cidades, as ruas têm sido palco privilegiado para se expressar, manifestar, além de um espaço de sociabilidade e compartilhamento.
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performance e à política, em seus estudos de antropologia da cidade, que também é uma antropologia dos rituais, uma vez que, para este autor, as produções de atos e performances rituais que criam novos significados podem ser apreendidas sob duas modalidades: as formas da interpretação e as da representação. O ritual é identificador e mediador simbólico da interpretação e da representação, podendo transformar uma multidão de indivíduos em “uma comunidade”. Isso é o que ocorre nas lutas e manifestações de ruas, nos momentos de articulações políticas caracterizadoras dos modos de atuar, lutar e resistir de moradores e lideranças do BP, dando-lhes senso e sentimento de pertença, marcado por qualidades inerentemente fugazes e culturais, mas também, e acima de tudo, políticas (KRUGER; AGIER 2011). Por isso, ao nos referirmos daqui para a frente às lutas e resistência do BP, estamos aludindo a esse modo especial de como seus moradores agem, sociabilizam, vivem e produzem cultura.
Desde 2005, quando nossa equipe de pesquisa iniciou contatos com o BP, presenciamos diversos momentos em que líderes e moradores reuniram-se para enfrentar diferentes ameaças de possíveis remoções decorrentes de várias transformações espaciais ao redor da comunidade. Contudo, só verificamos investidas de desapropriações entre 2014 e 2016. Tais despejos iluminam o que consideramos ser o início mais perceptível do processo de gentrificação naquela região da capital baiana (HITA; GLEDHILL, 2010; HITA, 2012, HITA, 2017; 2020; COSTA, 2017).
O primeiro deles foi a remoção de cerca de setenta casas da parte frontal do bairro devido às obras de duplicação da Av. Orlando Gomes e construção da Av. 29 de março – projetos realizados pelo Governo do Estado, sob a responsabilidade da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER), cujos principais objetivos estavam na seara de melhoria das obras de mobilidade urbana. Além dessa obra, o segundo projeto foi desenvolvido pela PMS para iniciar obras de macrodrenagem e requalificação da região da Rua Beira Rio, área localizada às margens do Rio Jaguaribe, no trecho do Rio que passa pelo BP. Esse projeto inicialmente contou com a desapropriação de aproximadamente trinta habitações localizadas às margens do rio. Apesar desta ação da prefeitura, até o ano de 2017, os dados de nossas pesquisas apontam o crescimento significativo do número de novas habitações nesta mesma região do bairro: foram erguidos na área desocupada pelo menos cem novos casebres. E até 300 por volta de 2021.
Cabe destacar o fato, apontado por líderes comunitários, de que o projeto de desapropriações de casas na Beira Rio responde aos interesses e empenho de moradores de
condomínios de classe média/alta, que fazem fronteira com essa região do BP10. Este local tampouco se encontra inserido na poligonal delimitada pela PMS como Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) do BP. As Zeis são ferramenta jurídica e de regulação fundiária que pode ajudar a legitimar ocupações informais em todo o país, auxiliando habitantes destas localidades a terem garantidos o direito à permanência no território, bem como ao acesso a uma melhor qualidade e quantidade de bens e serviços. Esse tipo de processos de requalificação urbana é, a priori, um dos principais objetivos a serem alcançados por processos de regularização fundiária contemporâneos. Esse é o caso do Programa Casa Legal (PCL) cujo objetivo inicial era regularizar a situação fundiária de cerca de 30.000 famílias em situação de moradia irregular em toda a cidade de Salvador. No primeiro trimestre do ano de 2013, o BP foi escolhido para ser a comunidade piloto da implantação desse programa. Outros 18 bairros foram contemplados a seguir pelo PCL: Bate Coração, Fazenda Coutos, Nova Constituinte, Águas Claras, Nova Brasília do Aeroporto, Nova Brasília de Itapuã, Canabrava, Fazenda Grande do Retiro, Baixa do Camurujipe, Mata Escura, IAPI, Engomadeira, Alto do Coqueirinho, Alto da Esperança, Amazonas, Gamboa de Baixo e Solar do Unhão, Arraial do Retiro e Boca do Rio.
A regularização fundiária é um modo de urbanizar áreas informais ou de ocupação irregular e deve ser seguida, a priori, por processos de maior requalificação. De forma geral, nas diretrizes que orientam as políticas urbanas a entrega da titulação deverá ser seguida ou acompanhada da melhoria de serviços e equipamentos, visando a maior integração dessas comunidades com a cidade formal. Neste sentido, a regularização fundiária exerce papel relevante entre ações do poder público na valorização socioespacial urbana, assim como para a observação das pequenas transformações trazidas à vida dos moradores e os possíveis impactos que possam vir a surgir em decorrência desse tipo de política.
Até o ano de 2016 foram regularizadas apenas as casas que estavam incluídas dentro da poligonal de ZEIS; imóveis fora desta região, assim como aqueles em áreas de risco, como as do Beira Rio, não puderam ser beneficiados pelo programa de regularização fundiária. Vale destacar que o processo de titulação dessas casas está intimamente relacionado com o registro de residências em órgãos municipais. Esse é o grande argumento utilizado pela Prefeitura Municipal de Salvador (PMS) para atrair beneficiários ao PCL, devido à possibilidade de que, vários desses imóveis possam ser transferidos por herança, alugados ou vendidos de forma regular, em futuro próximo. Algo que antes lhes era supostamente vedado.
10 Para mais detalhes ver: Hita (2017; 2020) e Costa (2017).
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Os moradores e lideranças relatam o aumento do número de casas que passam a ser taxadas pelo Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) após a implementação do PCL, assim como o aumento significativo deste imposto em residências que já arcavam com essa taxa anualmente. Nesse sentido, a cobrança do IPTU aparece no decorrer da pesquisa realizada como elemento que merece atenção, já que grande número dos moradores entrevistados fez queixas sobre os valores exorbitantes cobrados, dizendo que não condizem com a realidade socioeconômica da comunidade, nem com o espaço onde vivem, de ZEIS. Esse tipo de informação oriunda de uma ampla inserção em campo nos faz defender a hipótese de que o aumento do custo residencial, seja pela maior taxação do IPTU ou pela inclusão desses moradores em uso regular e oficial de água encanada e luz, a longo prazo, pode levar os moradores mais pobres do bairro a terem que abandonar essas casas e buscar outras alternativas de moradia mais acessível, seja dentro do mesmo bairro em barracos mais precários, ou em bairros mais distantes e periféricos onde muitos tenderão a serem realocados. Especialmente, se forem beneficiários de programas como Minha Casa Minha Vida, associados a muitos processos de despejos e regulação fundiária em curso no BP.
O aspecto físico do bairro também apresentou transformações ao longo dos anos nos quais nossas pesquisas foram desenvolvidas, algumas dessas mudanças foram promovidas pela ação da Prefeitura Municipal de Salvador (PMS), como o Programa Morar Melhor (PMM), que ocorreu paralelo ao PCL. Uma das ações do PMM foi realizar reformas de até R$
5.000 (cinco mil reais) por unidade domiciliar para requalificar casas em estado precário em bairros populares de Salvador. Representantes da Prefeitura alegavam que as reformas nas residências beneficiadas iriam sanar problemas fundamentais de estrutura, tais como consertos de teto e construção de banheiros. Por sua vez, este programa era fortemente criticado por boa parte dos líderes do BP, especialmente aqueles que se opõem à atual gestão da PMS, por não levar em conta as reivindicações dos moradores sobre as reais necessidades de reforma dos imóveis. Para estas lideranças, todo esse processo de requalificar algumas casas ocorreu de modo arbitrário e eleitoreiro, fazendo uso de materiais de baixa qualidade e priorizando muito mais a pintura das fachadas das casas, do que seus problemas estruturais internos, como haviam alegado. Por meio de 30 entrevistas realizadas com beneficiários do PCL, e da observação participante em reuniões e negociações entre líderes e burocratas do PCL, ao longo de todo o processo de implantação, foi possível constatar que o PMM (Programa Morar Melhor) se empenhou para que as reformas fossem realizadas em casas que se encontravam dentro da poligonal e em áreas frontais do bairro, especialmente aquelas situadas em regiões
que podiam ser avistadas da Avenida Paralela, embelezando a vista do bairro para turistas que chegam do Aeroporto e atravessam a Paralela para chegar ao centro da cidade.
Portanto, defendemos que ações público-privadas a longo prazo poderão vir a transformar também o perfil socioeconômico e habitacional desta comunidade sem, com isso, perder de vista a significativa transformação do espaço urbano do Bairro de surgimento na década de 1980 até os dias atuais, resultante também da reconhecida luta desta comunidade pela urbanização do lugar. A presença do Estado tem sido instalada nestas comunidades através de serviços básicos como assistência social, educação, saúde, etc., que foram – e ainda têm sido – reivindicações centrais dos moradores. No BP, o poder estadual tem marcado maior presença por meio da instalação de centros policiais permanentes, como as BCS, instalada no bairro desde 2012.
Se de um lado temos a presença da iniciativa privada e do mercado imobiliário transformando o Bairro da Paz em uma grande ilha periférica rodeada de condomínios fechados para classes mais altas. Por outro lado, temos a ação do poder público modificando o entorno da comunidade e tornando-a cada vez mais acessível. Não é novidade em estudos e pesquisas sobre expansão urbana a importância da ocupação de regiões periféricas para o desenvolvimento da malha urbana, uma vez que, a partir delas, o poder público forçado a investir em mobilidade, serviços e infraestrutura, acabaria, portanto, por valorizar os terrenos vazios, os quais, após os benefícios, poderiam ser vendidos a preços significativamente superiores (CALDEIRA, 2000; GORDILHO-SOUZA, 2000; ROLNIK, 2006; HOLSTON,
2013; CARVALHO; PEREIRA, 2014).
A seguir, apontamos outras transformações recentes ocorridas no entorno do BP. Se durante nossas visitas ao campo eram frequentes relatos sobre as dificuldades de transporte para os moradores, foi instalada, recentemente, uma estação de metrô nas proximidades cuja nomenclatura referencia o nome do bairro. A estação de metrô BP foi inaugurada no segundo semestre de 2017, e junto com ela, podemos ver diversas obras que mudam a visão do bairro para quem chega. A requalificação do Rio Jaguaribe, as reformas da parte frontal da comunidade pelo PMM e uma passarela que conta com estrutura bastante alta, parecem disfarçar hoje os ares de periferia que caracterizava a comunidade.
O nome da estação de metrô chama especialmente a atenção pela visibilidade que passa a ser alcançada pela comunidade que, historicamente, lutou contra o estigma de ser uma das maiores favelas da cidade. Não são incomuns relatos de moradores e lideranças sobre os preconceitos experienciados “na cidade” ao revelarem morar no Bairro da Paz. Do mesmo
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modo, como moradoras “da cidade” foram inúmeras as vezes em que ouvimos comentários alarmados sobre a violência do Bairro.
Fonte: CRR Metrô Bahia
Ao observamos a Figura 1, que traz o mapa de Salvador com a projeção do sistema metroviário, podemos observar duas linhas de metrô: a linha 1, que circula pelo Miolo da cidade e a linha 2, que circula pelo vetor Orla e liga a cidade ao Aeroporto Internacional Deputado Luís Eduardo Magalhães. É interessante observarmos que, apesar de outras estações possuírem o nome dos bairros de onde se avizinham, na linha 2, o Bairro da Paz é das poucas comunidades periféricas cuja estação destaca-lhe o nome, junto as estações de Pernambués e Mussurunga que estão há muito mais tempo consolidadas e que sempre tiveram maior facilidade de integração e acesso ao resto da “cidade”.
Outro elemento que merece ser destacado é a história que o BP tem em relação às nomenclaturas de ruas, praças, instituições públicas e até mesmo do próprio bairro. Nasce com o nome de Malvinas e luta para se transformar em Bairro da Paz, com o intuito de perder a conotação negativa que o nome relacionado à Guerra das Malvinas trazia. Atualmente praças e ruas do bairro aludem à história de luta e identidades culturais da comunidade, cujos moradores lutaram pelo direito à cidade. São exemplares de topônimos do Bairro da Paz nomes como Rua da Resistência, Praça das Decisões, Praça da Paz, dentre outros logradouros
e nomes de instituições públicas com referência direta aos dias de luta da comunidade. Também homenageiam figuras ilustres do Bairro da Paz, como ocorre com o Colégio Mestre Paulo dos Anjos, homenageando a um destacado mestre de capoeira que viveu no bairro (HITA, 2012).
Nesse sentido, vale a pena observarmos com cautela o que significa para o Bairro da Paz nominar a estação de metrô que se encontra em suas mediações. É indiscutível que uma estação de metrô próxima traz vantagens de mobilidade e acesso que antes não existiam. Porém, ao mesmo tempo que a estação resolve um problema grave, a pouca acessibilidade e integração do BP com o resto da cidade, pode ser elemento atrativo de moradores com perfil socioeconômico mais elevado do que os moradores usuais da comunidade, gerando uma possível valorização imobiliária e dificultando a permanência de moradores mais pobres.
Não é exclusividade do Bairro da Paz a extinção de muitas das linhas de ônibus que circulavam entre os bairros antes do funcionamento do transporte metroviário. No caso do BP, podemos observar que as linhas de transporte rodoviário que conectavam o bairro diretamente com outras regiões da cidade foram retiradas, reduzindo as opções de mobilidade. Atualmente, no BP, só existem linhas com destino à Estação Mussurunga, mais importante estação rodoviária e metroviária da região. Apesar da maior facilidade de deslocamento possibilitada aos moradores do BP pela estação de metrô situada às margens da comunidade, não podemos ignorar o fato de que reduziu as possibilidades de deslocamento para outros bairros de Salvador sem a necessidade de integração com o metrô. Vale a pena, pois, questionarmos e analisarmos de modo mais qualitativo e aprofundado os efeitos da chegada do metrô no Bairro da Paz para moradores das diferentes áreas, desde aquelas mais centrais e consolidadas, situadas dento da poligonal da ZEIS, como naquelas mais distantes, com maior dificuldade de acesso. A Estação BP teria, de fato, melhorado a integração e mobilidade de toda a comunidade e moradores do BP?
Se por um lado o metrô aumenta a integração e a mobilidade urbana através do transporte público, por outro, a grande extensão territorial do bairro, quando aliada à retirada de linhas de ônibus, pode ser um dificultador na locomoção de moradores de regiões mais periféricas dentro da comunidade e para outras zonas mais distantes do bairro. Isto porque o acesso aos ônibus, que já era problemático e apresentava intervalos significativos, após a redução das linhas teve suas passagens cada vez mais demoradas.
O processo de desenvolvimento local do Bairro da Paz, como visto, foi paulatino e, atualmente, os moradores contam com equipamentos e serviços que melhoram a qualidade de vida, quando comparados ao início da ocupação na década de 1980. Apesar da ameaça de
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desapropriação parecer ter desaparecido, é perceptível outros modos de expulsar, de forma voluntária, moradores mais vulneráveis, devido à necessidade de reduzir custos com a habitação. Por isso defendemos que a gentrificação se reinventou e adaptou-se a novos cenários urbanos, atuando, agora, nas periferias em ascensão.
Fonte: Google Maps (2021)
Com base nas transformações acompanhadas ao longo dos anos de pesquisa no Bairro da Paz, sobretudo na região central e reconhecida como ZEIS, assim como em diversos outros estudos – alguns citados neste trabalho – defendemos a necessidade de repensar o uso do termo gentrificação dentro dos moldes e transformações urbanas que ocorrem nas grandes cidades latino-americanas.
Mesmo sendo um bairro periférico e apresentando muitos dos problemas comuns a esse tipo de contexto, durante os anos de nossas pesquisas no local, nenhum entrevistado mostrou o desejo explícito de querer sair e mudar-se para outras regiões da cidade. Apesar
disso, nos últimos anos, acompanhamos a saída de alguns moradores e líderes comunitários para outros bairros, alguns deles porque foram beneficiados pelo Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), outros porque tiverem suas casas desapropriadas por obras que ocorreram na região do Beira Rio e na frente da Av. Paralela, nos anos de 2016 e 2014, respectivamente.
Durante a fase de implementação do PCL eram comuns discussões sobre a possibilidade de construção de um conjunto habitacional do PMCMV dentro do BP, para que, dessa maneira, alguns dos moradores beneficiados pudessem continuar vivendo no bairro. Apesar da luta de algumas lideranças, que mapearam possíveis regiões onde alocar um conjunto habitacional do programa na comunidade, não houve resposta positiva do poder público a essa demanda. Assim, a maioria de moradores beneficiados pelo PMCMV foram realocados para outras regiões mais distantes e periféricas. Frases como “aqui é o melhor lugar para se viver”, pronunciadas por moradores de diversas áreas do bairro, eram comuns quando perguntados sobre o desejo de ficar ou ir morar em outras regiões da cidade. Porém, nos chamou maior atenção quando proferida por um ex-morador de um bairro de classe média bastante valorizado na cidade. Na ocasião da entrevista, afirmou preferir morar no BP, onde tem algumas pequenas e médias empresas e bons amigos.
As transformações urbanas e a chegada de bens e serviços ao BP são perceptíveis ao longo dos anos. A comunidade foi crescendo em compasso com o crescimento da cidade e, sobretudo, com a cada vez maior ocupação da Av. Paralela. Apesar das deficiências e baixa qualidade do serviço ofertado, os moradores e lideranças do BP travam hoje outro tipo de batalhas com o poder público. Diferente do que ocorreu nos primeiros anos da ocupação, quando as lutas eram pautadas no direito à moradia e a permanência no solo citadino, as demandas atuais transformaram-se com a chegada de um novo aparato urbano. Atualmente as demandas dos moradores estão mais direcionadas à busca da qualidade dos serviços e equipamentos ofertados, assim como na negociação em busca de contrapartidas sociais que tragam determinadas vantagens ao bairro e a seus habitantes. Essas contrapartidas, não necessariamente, se materializam em ofertas de equipamentos urbanos e infraestrutura, como pelejado e desejado. Muitas vezes aparecem em forma de financiamentos de cursos profissionalizantes para a comunidade ou como benefícios mais pontuais para algumas das Organizações Não Governamentais (ONGS) envolvidas na negociação.
Apesar do intento e pleito em construir um conjunto habitacional do MCMV dentro do BP para os que queriam permanecer, foi perceptível haver quase um consenso entre as lideranças de que a remoção daquelas casas era algo já esperado e até necessário para o bem e
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melhor desenvolvimento da cidade, da região e mesmo para os interesses do bairro como um todo. Desse modo, percebe-se que muitas das ações desenvolvidas pela comunidade hoje visam mais negociar as melhores contrapartidas para o Bairro antes de defender interesses das famílias despejadas (HITA, 2017; 2020). Se de um lado a comunidade vem passando por um processo lento e sutil de transformação, impulsionado pelas políticas urbanas que valorizam os entornos do bairro, por outro, políticas urbanas internas cumprem o papel de se certificar que os moradores estão obrigados a arcarem, cada vez mais, com os custos da melhoria da qualidade de vida da sua comunidade e região, mediante a inclusão de moradores em pagamentos de taxas, impostos e serviços, antes perdoados visando a diminuir o custo das moradias.
Ainda que não descartemos a possibilidade de que os proprietários das residências venham aproveitando a valorização do bairro como forma de conseguir dinheiro mediante o aluguel ou a venda das respectivas casas. Neste artigo, o foco foi o de discutir ações públicas que impossibilitam a permanência de moradores mais pobres, e áreas mais periféricas em centros mais urbanizados e centrais da cidade, como as do BP. Acreditamos que algumas destas residências serão desapropriadas paulatinamente mediante justificativas legítimas, como a necessidade/utilidade pública ou o risco para a moradia. De forma paralela a essa, os moradores mais pobres do BP que residem dentro da poligonal poderão vir a ser expelidos do bairro sem que haja ações de desapropriação, uma vez que, em determinado momento, não mais poderão arcar com os custos da moradia na região, precisando buscar regiões mais baratas e menos valorizadas para sobreviverem. Além do fato de que a documentação entregue pelo PCL lhes permite transações comerciais com o imóvel construídos, tais como venda ou aluguel. Desse modo, acreditamos que apenas os moradores mais acomodados e com maior poder aquisitivo conseguirão manter residência no Bairro da Paz, o qual passará a receber cada vez mais moradores de classes sociais mais elevadas.
É quase consenso entre especialistas sobre cidades e políticas urbanas que ações do poder público tendem a acompanhar os interesses do capital, sobretudo o imobiliário e turístico. Entretanto, vale ressaltar que movimentos sociais urbanos, fortalecidos ao final da ditadura militar no Brasil, vêm transformando os moldes e diretrizes das políticas urbanas, passando a pautá-las na busca pela construção de cidades mais democráticas e menos desiguais através de processos participativos. A inclusão de atores políticos que representem a sociedade civil não garante, contudo, que políticas urbanas sejam construídas visando a assegurar os direitos dos cidadãos urbanos, nem tão pouco seus interesses. Motivo pelo qual a
efetividade da participação social na formulação e monitoramento das políticas públicas por
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parte destes setores da sociedade civil é bastante questionável. Por isso é preciso estar atentos para as sutilezas que podem vir a negar direitos recentemente conquistados. Nesse sentido, acreditamos que a ação gentrificadora do poder público e da iniciativa privada pode surgir através de outros moldes além daqueles descritos pela literatura tradicional acerca do tema. Da mesma forma, é preciso que atualizemos nossos olhares para os locais onde tais políticas passam a ser implementadas e para os impactos delas nas diferentes localidades.
Por isso, defendemos que conceitos como o de gentrificação não servem apenas para entender a retomada de requalificação de antigas regiões centrais/tradicionais pelas classes médias, mas que pode também nos ajudar a pensar e compreender outras transformações produzidas por ações público-privadas em locais periféricos, outrora impactados de políticas higienistas e desapropriação. O respaldo legal pela permanência e direito à cidade dos moradores dessas áreas, após a promulgação do Estatuto da Cidade (2001) não elimina as diferenças socioespaciais ou interesse imobiliário em regiões de especulação. Por esta razão, defendemos o olhar mais atento e matizado na análise de processos experimentados em comunidades carentes e seus entornos, identificando quem são os verdadeiros beneficiados pelo conjunto de ações de urbanização e regulação fundiária e os impactos delas junto aos pobres e vulneráveis.
Nestes termos, acreditamos que o Bairro da Paz vem passando por um processo discreto e lento de gentrificação, que poderá ter como consequência final a redução a área central do bairro, que é demarcada pela PMS como ZEIS. Desta maneira, o bairro poderá sofrer transformações não apenas na área física total, que poderá vir a ser mais reduzida por novas e futuras desapropriações sob justificativas como as de riscos ambientais ou necessidades públicas, mas também no tipo de composição social interna dos que saem, ficam ou chegam.
Transformações como as descritas poderão levar o bairro a um processo lento de maior “aburguesamento”, mesmo que, em curto e médio prazo, seja improvável de ser ocupado por populações de classes médias e altas. Desse modo, acreditamos que o conceito de gentrificação pode nos ajudar a dar conta de transformações urbanas que se distinguem daquelas a que o fenômeno se restringia quando foi utilizado pela primeira vez por Ruth Glass (2018), haja vista a realidade social e as cidades passarem por transformações significativas, que podem implicar na necessidade de rever novos usos de alguns conceitos.
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https://doi.org/10.52780/res.v27iesp1.15692
PODEMOS FALAR DE GENTRIFICAÇÃO EM FAVELAS? ESTUDO DE CASO ACERCA DA REQUALIFICAÇÃO URBANA NO BAIRRO DA PAZ
¿PODEMOS HABLAR DE GENTRIFICACIÓN EN FAVELAS? ESTUDIO DE CASO DE REQUALIFICACIÓN URBANA EN BAIRRO DE LA PAZ
Maria Gabriela HITA1 Emilly Mascarenhas COSTA2
RESUMO: O artigo discute o uso do conceito gentrificação em contextos de valorização do solo em territórios de periferia urbana cujas transformações socioespaciais resultam da influência do poder público, iniciativa privada e complexos processos de especulação imobiliária. As mudanças em muitas destas periferias são também impactadas por lutas de movimentos sociais, que, numa Bahia afrodescendente, manifestam características e dimensões socioculturais singulares. Primeiramente se revisa o termo gentrificação para, a seguir, desenvolver como a presença de agentes gentrificadores na transformação local das cidades brasileiras também ocorre em zonas periféricas, impactando de modo peculiar a vida desses lugares. A partir do estudo de caso de teor etnográfico na cidade de Salvador, capital do estado da Bahia, analisamos os principais impactos de um processo de regulação
1 Federal University of Bahia (UFBA), Salvador – BA – Brazil. Titular professor of the Department of Sociology, Postgraduate Program in Social Sciences (PPGCS), and the Interdisciplinary Studies on Women, Gender and Feminism (PPGNEIM). PQ2-CNPQ at the Center for Studies on Bodies, Sensitivities and Environments (ECSAS). PhD in Social Sciences (UNICAMP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5865-7334. E-mail: mghita63@gmail.com.
2 Federal University of Bahia (UFBA), Salvador – BA – Brazil. Doctoral student of the Postgraduate Program in Social Sciences (PPGCS) at UFBA. Master’s in Social Sciences (PPGCS-UFBA). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9539-1061 E-mail: emillymascarenhass@gmail.com
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fundiária em bairro popular sobre este tipo de gentrificação, ilustrando o processo de “aburguesamento” que vem ocorrendo na região.
PALAVRAS-CHAVE: Gentrificação. Cidades. Políticas urbanas. Segregação socioespacial. Bairro da Paz.
RESUMEN: El artículo discute el uso del concepto de gentrificación en contextos de valoración del suelo en territorios de periferia urbana que sufren transformaciones socioespaciales resultantes de la intervención de las autoridades públicas, la iniciativa privada y procesos complejos de especulación inmobiliaria. Transformaciones también impactadas por las luchas de los movimientos sociales, que en una Bahía afrodescendiente manifiestan características y dimensiones socioculturales únicas. Primero, se revisa el término gentrificación para desarrollar aún más cómo la presencia de agentes gentrificantes en la transformación local de las ciudades brasileñas también ocurre en áreas periféricas, impactando de manera peculiar la forma de vida en estos lugares. A partir del análisis de un estudio de caso etnográfico en la ciudad de Salvador-BA, analizamos los principales impactos que un proceso de ordenamiento territorial en un barrio popular sobre este tipo de “gentrificación”, ilustrando como ciertos procesos de cierta “burguesización” se inician a su interior.
PALABRAS CLAVE: Gentrificación. Ciudades. Políticas urbanas. Segregación socioespacial. Barrio de Paz.
The concept of gentrification has been widely used by several areas of knowledge to explain and understand socio-spatial transformations in old urban centers that undergo requalification processes through actions of the public power and the private initiative. In this article, we seek to analyze the current processes of socio-spatial transformation that have taken place in the city of Salvador-BA in recent years, in view of the actions of public-private initiatives and their possible impacts on peripheral communities. In this way, we seek to reflect: are these actions of requalification of peripheries likely to be related to gentrification processes? Or still, can we talk about gentrification in urban peripheries?
We will seek to answer these questions through the analysis of the case study that has been developed in Bairro da Paz (BP) since 2005, emphasizing the period 2013-2016, the initial years of the implementation of the Program Casa Legal (PCL). This program met demands for land regularization by the Municipality of Salvador (PMS) during the
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governments of Antônio Carlos Magalhães Neto (ACM Neto)3. Through the implementation of the PCL, we aim to discuss the use of the concept of gentrification in processes of spatial and real estate valuation of originally peripheral neighborhoods, highlighting the importance of the effects that public and/or private actions produce in transforming the city and, therefore, consequently, the urban and sociocultural life of these places.
In recent years, the BP and its surroundings have undergone significant changes through actions of urban requalification and expansion of the public transport network, which affect the physical space and the socioeconomic and cultural composition of the community. We believe that such factors can be associated with a new mode of gentrification, even though this process occurs in a subtle and gradual way.
Part of the studies on the subject defend the inseparable relationship between the development of cities and the uses of their spaces with interests and processes of production/reproduction of capital, which configures and organizes territories across the globe. The urban growth in Latin America was marked by the displacement of the working classes from the urban centers to the peripheries, due to the housing cost of the central regions, occupied by the wealthier classes. The prototype of residential occupation in cities around the world has been transformed: increasingly, the middle and upper classes have occupied regions further away from the city center in search of greater security and quality of life (CALDEIRA, 2000).
This movement tends to be accompanied by a reduction in investments in these regions, intensifying with the increase in occupation by residents with lower purchasing power. The gentrification processes are part of new types of transformations that have taken place in the central regions of the city that seek to revalue these central spaces. The term is used to describe processes of urban requalification in neighborhoods that were “abandoned” and neglected by the government and real estate capital in the various processes of urban expansion, which, recently, have again attracted the attention of these economic groups that seek to ennoble them, with the intuition that they will once again be occupied and/or frequented by wealthier social classes, or even by tourists (SMITH, 2007; LEITE, 2002).
From the premise that not only the old and/or historic centers have gone through processes of valuation whose tendency is to increase the cost of local living, transforming the socioeconomic profile of its residents, this article aims to discuss the uses of the term
3 Data collected in the research project coordinated by Hita: Impacto da Implantação do PCL e da Base Comunitária de Segurança no Bairro da Paz (2013-2017) and Dissertation carried out by Costa (2017): Casa Legal: estudo de caso sobre o Programa de regularização fundiária em Salvador-Ba.
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gentrification with the aim to include in this debate processes of ennoblement of regions originally occupied by poorer populations4 that have been attracting speculative interests from real estate capital and the private sector. In this way, we use the concept to account for processes of revaluation and requalification in popular neighborhoods, regardless of how far they are from the historic center and/or previous occupation by wealthier classes than those who currently reside there. Hita and Gledhill (2010) use the terminology “low-level gentrification” to support the transformations that have taken place in the BP, when comparing it with what occurs in the Old Center of Salvador. Through this comparison, it is noticeable that both locations – the old center of Salvador and the BP – share common characteristics and many differences. In these terms, for them:
The future of places like Bairro da Paz could be considered as a kind of “low-level gentrification”, if one considers the basis for the removal of residents from areas of environmental risk and the growing trend towards an increasing concentration of property in the hands of new residents with better jobs and higher incomes (HITA; GLEDHILL, 2010, p. 55, our translation).
The concept of gentrification was first used by Ruth Glass (2018), in the 1960s, to describe the return of the middle classes to the urban centers of London, abandoned by the residential suburbanization of the wealthier classes. Highly related to urban and housing transformation processes in Anglo-Saxon countries, gentrification can be defined as a physical, socioeconomic and cultural phenomenon, related to processes of reinvestment and revaluation of areas abandoned by the middle and upper classes in the different processes of urban expansion (BIDOU-ZACHARIESEN, 2006; SMITH, 2006; 2007; MOURAD,
FIGUEIREDO; BALTRUSIS, 2014; RIBEIRO, 2014).
The processes of urban expansion in Latin America differ from those in Anglo-Saxon countries, which is why most scholars defend the restriction of the term in Latin American cities. Ribeiro (2014) points out that, despite the need for care to avoid emptying the concept, its plastering can be as wrong as careless application. In this article, the term gentrification is thought of as the process of valuing areas occupied by low-income populations in spaces of high real estate value, regardless of whether these are old/historical centers of the city.
4 The term periphery must be understood in its social connotation, referring to the idea of precariousness and lack of urban infrastructure and services. Regarding spatial location, the BP is currently located in “a new centrality of the city” of Salvador (HITA, 2017; 2020; SANTOS, 2013).
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Socio-spatial segregation is a striking feature in Brazilian cities, although its manifestation occurs through different patterns throughout the country's urbanization. The classic bibliography calls ‘center-periphery’ the housing model in which the middle and upper classes remained in urban centers, while workers were forced to look for cheaper alternatives to housing, migrating to the edges of the city. Currently, several researchers, among them Caldeira (2000), have indicated the modification of the housing pattern in Brazilian cities, in which the wealthy classes increasingly distance themselves from urban centers, preferring to live in closed condominiums. This movement creates a new face for the socio-spatial segregation of the city, in which luxury condominiums border favelas5. These processes tend to devalue the city centers, which have come to be occupied by lower classes while they have suffered from the neglect of public authorities. In this sense, several studies on gentrification concern processes encouraged by the State, in partnership with the private sector, whose articulations aim to revalue these regions, thus seeking, through reinvestments, to attract new residents and consumers to these places.
Over the years, the concept of gentrification has been used to account for different processes of reoccupation of spaces by the middle and upper classes, in which we can see the transformation of different social and cultural uses of urban space due to the greater promotion of conviviality and consumption through the multiplication of establishments such as boutiques, restaurants, cafes, among many other spaces more frequented by people from the middle and upper classes. These new spaces also aim to attract tourists and new residents of the city, especially those with greater purchasing power, mobilized by the new sociability and all the cultural and historical capital that starts to be updated in these places (LEITE, 2002; CRIEKINGEN, 2006).
We defend that gentrification can be presented as a physical, economic, social and cultural phenomenon, referring to the changes caused by the residential structure, without being restricted to changes in the socioeconomic profile (BIDOU-ZACHARIESEN, 2006). The concept can be useful to analyze and understand urban transformations through structural and economic relationships, even those that seek to understand it from individual or collective actors attracted by the ways of life and consumption referring to the different centers and spaces of the city.
5 Although the study by Caldeira (2000) focuses on the city of São Paulo-SP, it is worth mentioning that this pattern of urban growth has become quite common in Salvador-BA. We can cite as an example the Bairro da Paz, which has been surrounded by an increasing number of gated communities.
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The processes of transformation of urban space can be understood more broadly from the relationship between production and capital. The real estate market becomes a fundamental element to understand the dynamics of occupying and producing the and in the urban space. Neil Smith (2006; 2007) explains the dynamics of devaluation/valuation of spaces through the concept of “rent gap”6, a term that can help us understand the articulation of the market and the State in the different processes of valuation of territories. If the gentrifying agents brought by Ruth Glass (2018) were individual actors interested in returning to certain regions of the city occupied by poorer residents, currently, the State and the market have played a fundamental role in urban gentrification processes.
The State has played a central role in the processes of urban valuation/devaluation through the implementation and development of public policies that aim to value certain regions of the city, transforming them into more attractive spaces and fostered by the growth of public-private partnerships. These partnerships have worked together and consistently for the development of modern cities increasingly inserted in neoliberal, competitive and strategic logics. The participation of the State and the market as gentrifying agents connect local transformations with those of the global economy, changing gentrification into a worldwide phenomenon (BIDOU-ZACHARIASEN, 2006; SMITH, 2007; 2006, MOURAD;
FIGUEIREDO; BALTRUSIS, 2014).
Gentrification should not be understood as a homogeneous phenomenon, the differences of each location need and should be considered, however one cannot lose sight of the transforming pattern of the urban that connects these places to other cities in the world and to the global economy. In this way, this article seeks to expand and adapt the use of the term to different realities, given that we understand that the concept of gentrification can be used both to understand processes of requalification of former elite neighborhoods and to deal with the functional change of old industrial/workers neighborhoods and their social transformations, indicating the existence of two types of “bourgeoisness”. The first one occurs through the exclusion of popular categories, while the second is due to the arrival of wealthier people in areas that were, until then, socially mixed or popular. The concept of gentrification is used, in most studies, to account for processes related to “bourgeoisness”, arising from the arrival of wealthier social strata in peripheral areas (BIDOU-ZACHARIASEN, 2006).
Urban requalification has been taken as the main guideline for thinking about government actions in peripheral communities, replacing formerly recurring hygiene policies.
6 Smith (2006) points out that processes of expansion of cities to their margins cause the real estate devaluation of these urban centers and the appreciation of the suburbs.s.
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The greater tolerance for the permanence of peripheral communities in certain regions of the city does not imply their greater insertion/acceptance in the city. Even today, these spaces are identified by most of the city's population as a locus of violence and criminality. It is not our place here to enter into the discussion about public security or the level of crime in Brazilian peripheries, however, we cannot fail to highlight the relevance and challenges of actions aimed at pacifying favelas - the Pacifying Police Units (UPPs), in Rio de Janeiro, with equivalence, in Bahia, to the Community Security Bases (BSC) – in processes that aimed to revalue and requalify such communities. In the case of Salvador, the implementation of BCS associated with land regulation programs is part of broader urban requalification projects in some cities. This association of factors is, as a rule, the gateway to these “low-level gentrification” processes (FLEURY; OST, 2013; FREEMAN; BURGOS, 2015; HITA; GLEDHILL, 2010).
In this sense, we argue that the use of the concept of gentrification adapted to these new contexts illuminates processes of socio-spatial and cultural transformation that occur in popular neighborhoods, such as BP, as well as others in spaces that have been undergoing gradual changes in the composition of their residents, intensified by the processes of real estate speculation, even when these neighborhoods continue to be recognized as places of poverty. Through this premise, we will discuss the changes arising from urban policies that have occurred in the BP and surroundings since the beginning of the occupation, in the 1980s, in order to discuss the impacts of changes in the neighborhood and in the lives of its residents.
The privileged location and the history of struggle and resistance to the attempts of community removals make Bairro da Paz (BP) a privileged locus to support our hypothesis of requalification in peripheral areas, which, with the growing real estate and urban valuation in the region, must be thought of as a gentrification process, due to the socio-spatial transformations of these places and their neighborhoods. The BP is located on the banks of Avenida Luís Viana Filho, popularly known as Avenida Paralela, where one of the main axes of urban expansion in Salvador was consolidated in the 1970s (SCHEINOWITZ, 1998). The neighborhood, initially called the Malvinas invasion, emerged in the early 1980s from the irregular occupation of private land that came to be appropriated by the Municipality of Salvador (PMS), due to taxes not paid by the original owners. The public domain of the land
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did not eliminate the conflict, still latent, over the occupation of that region of the city, a process that occurred, in the past, through violent attacks by the public power to prevent the residents from occupying the space where BP is today.
Older residents and leaders narrate the constant struggle waged against the public authorities to guarantee the right to housing in that part of the city. Such clashes, among other consequences, resulted in the expropriation and transfer of residents to the Subúrbio Ferroviário region. But the Falklands lands were always reoccupied, by old and new residents, who won the right to stay in the neighborhood around 1987, during the government of Waldir Pires, when it became known as Bairro da Paz in allusion the result of this resistance and conquest7 (ALCÂNTARA, 2005; HITA; DUCCINI, 2007; HITA, 2012; COSTA. 2017).
Since then, the struggle for recognition, dignity and the right to be part of the city of Salvador have been part of the history of the place. Likewise, there was a strong effort from residents to oppose the stigma of violence received by the other inhabitants of Salvador. Among other actions, this process took place through the construction of positive cultural identities and constant demand for rights to full citizenship. Struggles and resistances in Afro- Bahian favelas, like those that characterize the cultural and political identities of the BP, are marked by racial and class dimensions, and cannot be dissociated from the processes of struggle in Afro-descendant Bahia and the emergence of a new type community, racial and cultural identity. A significant part of BP's most recognized leaders are young people and members of Afro-Bahia cultural groups, whose actions and performances fall within the boundaries of essential themes to those of a sociology of culture. Afro-Bahian culture that operates as a privileged background from which most residents act, transit, identify, live the city and build their ways of manifesting, fighting and resisting.
Many of the leaders self-identify as “black” and are sympathizers or activists of the Unified Black Movement; another significant part of its residents make up a wide variety of cultural groups and Afro-Bahian popular culture, with a strong approximation to the culture of the people of santo and terreiros de candomblé8. It is through claiming the role and value of popular culture produced in the community that most of the leaders working in the BP (self)organize to react to stigma and social exclusion. Other elements are fundamental to the cultural and sociopolitical construction of the BP, which receives transnational influences, including international black groups, such as the United States. In addition, it is worth
7 The term alludes to the Falklands War, which took place in the same period in which the occupation began..
8 For more on these BP cultural groups and their complex relationships with public authorities, politics, national and international Afro identities, as well as the ways in which they connect and move in the city and its main networks of sociability, clientelism and politics, see Azevedo (2017).
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considering the presence of different religious groups in addition to those of African origin, such as the Catholic, Evangelical and Spiritist Centers that make up, alongside the residents, sociocultural changes in the community over the years. These groups have exerted a potential influence on the daily life and on the sociability of their members, changing their ways of relating, dressing and behaving. Among such groups, disputes are fought both in the micro and macro-social space of the BP. The clashes, however, do not prevent the union of residents of the most diverse creeds and ideologies to defend collective interests at crucial moments in the history of the community.
In the recent past, many of these struggles took place through demonstrations on Paralela Av., where leaders and residents occupied the space expressing their demands, this was a privileged way for the BP to claim and make itself noticed due to the ability to paralyze the flow of vehicle traffic on one of the main roads in the city. This way of expressing itself is remembered with some nostalgia by many leaders, who lament the loss of the Avenida space and the impacts caused by the marches, since new urban mobility works changed the use and type of access to Paralela, which became mediated by parallel, smaller and more internal streets that allow slower access to neighborhood entrances. For Agier (2011), the street is the space for the manifestation of cultural, political and reinvention dimensions. The manifestations and struggles for the right to the city – characteristics of the ways in which BP leaders and residents are mobilized – can be understood as part of these dimensions and the practices that are inherent to them and also typical of cities9. From the streets, actors produce culture and new political acts. Agier (2011) connects art, performance and politics in his studies of the anthropology of the city, which is also an anthropology of rituals, since, for this author, the productions of ritual acts and performances that create new meanings can be apprehended under two modalities: the forms of interpretation and those of representation. Ritual is an identifier and symbolic mediator of interpretation and representation and can transform a multitude of individuals into “a community”. This is what happens in street fights and demonstrations, in moments of political articulation that characterize the ways of acting, fighting and resisting BP residents and leaders, giving them a sense and feeling of belonging, marked by inherently fleeting and cultural qualities, but also, and above all, politics (KRUGER; AGIER 2011). Therefore, when referring from now on to the struggles and resistance of the BP, we are alluding to this special way in which its residents act, socialize, live and produce culture.
9 BP's political manifestations are also promoted by many of its artists. In cities, the streets have been a privileged stage to express oneself, to manifest, as well as a space for sociability and sharing.
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Since 2005, when our research team started contacts with BP, we have witnessed several moments when leaders and residents came together to face different threats of possible removals arising from various spatial transformations around the community. However, we only saw expropriations between 2014 and 2016. Such evictions illuminate what we consider to be the most noticeable beginning of the gentrification process in that region of the Bahian capital (HITA; GLEDHILL, 2010; HITA, 2012, HITA, 2017; 2020; COSTA, 2017).
The first of these was the removal of about seventy houses from the front of the neighborhood due to the duplication works on Av. Orlando Gomes and construction of Av. 29 de março– projects carried out by the State Government, under the responsibility of the State of Bahia Urban Development Company (CONDER), whose main objectives were to improve urban mobility works. In addition to this work, the second project was developed by PMS to start macro-drainage and requalification works in the Beira Rio Street region, an area located on the banks of the Jaguaribe River, in the stretch of the river that passes through the BP. This project initially involved the expropriation of approximately thirty dwellings located on the banks of the river. Despite this action by the city hall, until the year 2017, the data from our surveys point to a significant growth in the number of new homes in this same region of the neighborhood: at least one hundred new hovels were built in the unoccupied area. And up to 300 by 2021.
It is worth noting the fact, pointed out by community leaders, that the project of expropriation of houses in Beira Rio responds to the interests and efforts of residents of middle/upper class condominiums, which border this region of the BP10. This location is also not included in the polygonal delimited by the PMS as Special Zones of Social Interest (ZEIS) of the BP. The Zeis are a legal and land regulation tool that can help to legitimize informal occupations throughout the country, helping inhabitants of these locations to have their right to remain in the territory guaranteed, as well as access to better quality and quantity of goods and services. This type of urban requalification processes is, a priori, one of the main objectives to be achieved by contemporary land tenure regularization processes. This is the case of the Casa Legal Program (PCL) whose initial objective was to regularize the land situation of around 30,000 families in an irregular housing situation throughout the city of Salvador. In the first quarter of 2013, BP was chosen to be the pilot community for the implementation of this program. Another 18 neighborhoods were covered by the PCL: Bate Coração, Fazenda Coutos, Nova Constitunte, Águas Claras, Nova Brasília do Aeroporto,
10 For more details see: Hita (2017; 2020) and Costa (2017).
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Nova Brasília de Itapuã, Canabrava, Fazenda Grande do Retiro, Baixa do Camurujipe, Mata Escura, IAPI, Engomadeira, Alto do Coqueirinho, Alto da Esperança, Amazonas, Gamboa de Baixo and Solar do Unhão, Arraial do Retiro and Boca do Rio.
Land tenure regularization is a way of urbanizing informal areas or areas of irregular occupation and must be followed, a priori, by processes of greater requalification. In general, in the guidelines that guide urban policies, the delivery of the title must be followed or accompanied by the improvement of services and equipment, aiming at the greater integration of these communities with the formal city. In this sense, land tenure regularization plays an important role among public power actions in urban socio-spatial valorization, as well as for the observation of small changes brought to the lives of residents and the possible impacts that may arise as a result of this type of policy.
Until 2016, only the houses that were included within the ZEIS polygonal were regularized; properties outside this region, as well as those in risk areas, such as those in Beira Rio, could not benefit from the land tenure regularization program. It is worth noting that the process of titling these houses is closely related to the registration of residences in municipal bodies. This is the main argument used by the Municipality of Salvador (PMS) to attract beneficiaries to the PCL, due to the possibility that several of these properties may be transferred by inheritance, rented or sold on a regular basis, in the near future. Something that was supposedly forbidden to them before.
Residents and leaders report the increase in the number of houses that are now subject to the Urban Property and Territorial Tax (IPTU) after the implementation of the PCL, as well as the significant increase in this tax in residences that already paid this tax annually. In this sense, the IPTU collection appears in the course of the research carried out as an element that deserves attention, since a large number of the interviewed residents complained about the exorbitant amounts charged, saying that they do not match the socioeconomic reality of the community, nor with the space where live, from ZEIS. This type of information from extensive field work makes us defend the hypothesis that the increase in residential costs, whether due to higher IPTU taxation or the inclusion of these residents in regular and official use of piped water and electricity, in the long term, it can lead the poorest residents of the neighborhood to have to abandon these houses and seek other alternatives for more affordable housing, either within the same neighborhood in more precarious shacks, or in more distant and peripheral neighborhoods where many will tend to be relocated. Especially if they are beneficiaries of programs such as Minha Casa Minha Vida, associated with many processes of evictions and land regulation underway in the BP.
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The physical aspect of the neighborhood also showed changes over the years in which our research was developed, some of these changes were promoted by the action of the Municipality of Salvador (PMS), such as the Morar Melhor Program (PMM), which took place in parallel to the PCL. One of the PMM's actions was to carry out renovations of up to R$ 5,000 (five thousand reais) per household to requalify houses in a precarious state in popular neighborhoods of Salvador. Representatives of the City Hall claimed that the renovations in the benefited residences would solve fundamental structural problems, such as ceiling repairs and construction of bathrooms. In turn, this program was strongly criticized by many BP leaders, especially those who oppose the current management of the PMS, for not considering the residents' claims about the real needs of real estate renovation. For these leaders, this entire process of refurbishing some houses took place in an arbitrary and electoral way, using low quality materials and prioritizing the painting of the facades of the houses much more than their internal structural problems, as they had alleged. Through 30 interviews carried out with PCL beneficiaries, and participant observation in meetings and negotiations between PCL leaders and bureaucrats, throughout the implementation process, it was possible to verify that the PMM (Morar Melhor) renovations were carried out in houses that were inside the polygonal and in front areas of the neighborhood, especially those located in regions that could be seen from Paralela Av., beautifying the view of the neighborhood for tourists arriving from the Airport and crossing the Paralela to reach the downtown.
Therefore, we argue that long-term public-private actions may also transform the socioeconomic and housing profile of this community without, therefore, losing sight of the significant transformation of the urban space of the Neighborhood from the 1980s to the present day, also resulting from the recognized struggle of this community for the urbanization of the place. The presence of the State has been installed in these communities through basic services such as social assistance, education, health, etc., which were – and still have been – central demands of the residents. In the BP, the state power has been more present through the installation of permanent police centers, such as the BCS, installed in the neighborhood since 2012.
If, on the one hand, we have the presence of the private sector and the real estate market, transforming Bairro da Paz into a large peripheral island surrounded by gated communities for the upper classes. On the other hand, we have the action of the public power modifying the surroundings of the community and making it increasingly accessible. It is not new in studies and research on urban expansion the importance of occupying peripheral
regions for the development of the urban fabric, since, from there, the public power forced to
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invest in mobility, services and infrastructure, would, therefore, end up by value vacant land, which, after the benefits, could be sold at significantly higher prices (CALDEIRA, 2000; GORDILHO-SOUZA, 2000; ROLNIK, 2006; HOLSTON, 2013; CARVALHO; PEREIRA,
2014).
Below, we point out other recent transformations that have taken place around the BP. If during our visits to the countryside there were frequent reports about the difficulties of transport for the residents, a subway station was recently installed nearby, whose nomenclature refers to the name of the neighborhood. The BP subway station was inaugurated in the second half of 2017, and along with it, we can see several works that change the vision of the neighborhood for those who arrive. The requalification of the Jaguaribe River, the renovations of the front of the community by the PMM and a walkway that has a very high structure, today seem to disguise the air of periphery that characterized the community.
The name of the subway station draws attention especially due to the visibility that is now achieved by the community that, historically, has struggled with the stigma of being one of the largest favelas in the city. Reports from residents and leaders about the prejudices experienced “in the city” when revealing to live in Bairro da Paz are not uncommon. Likewise, as residents of “the city” there were countless times when we heard alarmed comments about the violence in the Neighborhood.
Source: CRR Metrô Bahia
When we look at Figure 1, which shows the map of Salvador with the projection of the subway system, we can observe two subway lines: line 1, which runs through the city's core and line 2, which runs through the Orla vector and connects the city to the Deputado Luís Eduardo Magalhães International Airport. It is interesting to note that, although other stations have the name of the neighborhoods they are close to, on line 2, Bairro da Paz is one of the few peripheral communities whose station highlights its name, along with the Pernambués and Mussurunga stations that are consolidated for a much longer time and that have always had greater ease of integration and access to the rest of the “city”.
Another element that deserves to be highlighted is the history that the BP has in relation to the nomenclature of streets, squares, public institutions and even the neighborhood itself. It was born with the name of Malvinas and fought to become Bairro da Paz, in order to lose the negative connotation that the name related to the Falklands War had. Currently, squares and streets in the neighborhood allude to the history of struggle and cultural identities of the community, whose residents fought for the right to the city. Examples of toponyms of Bairro da Paz are names such as Resistência Street, Praça das Decisões, Praça da Paz, among other places and names of public institutions with direct reference to the days of struggle of the community. They also honor illustrious figures from Bairro da Paz, as in the case of Mestre Paulo dos Anjos High School, honoring an outstanding capoeira master who lived in the neighborhood (HITA, 2012).
In this sense, it is worth observing carefully what it means for Bairro da Paz to name the subway station that is located in its mediations. It is indisputable that a nearby metro station offers mobility and access advantages that did not exist before. However, at the same time that the station solves a serious problem, the poor accessibility and integration of the BP with the rest of the city, can be an attractive element for residents with a higher socioeconomic profile than the usual residents of the community, generating a possible real estate valuation and making it difficult for poorer residents to stay.
It is not exclusive to Bairro da Paz the extinction of many of the bus lines that circulated between the neighborhoods before the operation of subway transport. In the case of BP, we can observe that the road transport lines that connected the neighborhood directly with other regions of the city were removed, reducing mobility options. Currently, in the BP, there are only lines to Mussurunga Station, the most important bus and subway station in the region. Despite the greater ease of travel provided to BP residents by the subway station located on the margins of the community, we cannot ignore the fact that it reduced the
possibilities of travel to other neighborhoods in Salvador without the need for integration with
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the subway. It is worth, therefore, to question and analyze in a more qualitative and in-depth way the effects of the arrival of the subway in Bairro da Paz for residents of different areas, from the more central and consolidated ones, located within the ZEIS polygonal, to those more distant, more difficult to access. Would the BP Station have, in fact, improved the integration and mobility of the entire BP community and residents?
If, on the one hand, the subway increases integration and urban mobility through public transport, on the other hand, the large territorial extension of the neighborhood, when combined with the removal of bus lines, can be a hindrance in the locomotion of residents of more peripheral regions within the community and to other more distant areas of the neighborhood. This is because access to buses, which was already problematic and presented significant intervals, after the reduction of lines had its passages increasingly time consuming. The process of local development of Bairro da Paz, as seen, was gradual and, currently, the residents have equipment and services that improve the quality of life, when compared to the beginning of the occupation in the 1980s. Despite the expropriation menace seems to have disappeared, other ways of voluntarily evicting more vulnerable residents are noticeable, due to the need to reduce housing costs. That is why we argue that gentrification has reinvented itself and adapted itself to new urban scenarios, now operating in the growing
peripheries.
Middle-class condominiuns
Public agencies/institutions
Private education institutions
Bairro da Paz subway station
Source: Google Maps (2021)
Based on the transformations observed over the years of research in Bairro da Paz, especially in the central region and recognized as ZEIS, as well as in several other studies - some cited in this work - we defend the need to rethink the use of the term gentrification within the molds and urban transformations that occur in large Latin American cities.
Despite being a peripheral neighborhood and presenting many of the problems common to this type of context, during the years of our research in the place, no interviewee showed an explicit desire to want to leave and move to other regions of the city. Despite this, in recent years, we have followed the departure of some residents and community leaders to other neighborhoods, some of them because they were benefited by the Minha Casa Minha Vida Program (PMCMV), others because their homes were expropriated by works that took place in the Beira Rio region. and in front of Paralela Av., in the years 2016 and 2014, respectively.
During the PCL implementation phase, discussions were common about the possibility
of building a PMCMV housing project within the BP, so that some of the benefited residents
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could continue living in the neighborhood. Despite the struggle of some leaders, who mapped possible regions where to allocate a housing project for the program in the community, there was no positive response from the government to this demand. Thus, the majority of residents benefiting from the PMCMV were relocated to other more distant and peripheral regions. Phrases such as “here is the best place to live”, pronounced by residents of different areas of the neighborhood, were common when asked about the desire to stay or go to live in other regions of the city. However, it caught our attention when given by a former resident of a highly valued middle-class neighborhood in the city. At the time of the interview, he said he preferred to live in BP, where he has some small and medium-sized companies and good friends.
Urban transformations and the arrival of goods and services to the BP are noticeable over the years. The community grew in step with the growth of the city and, above all, with the increasing occupation of Paralela Av. Despite the deficiencies and low quality of the service offered, the residents and leaders of BP are currently fighting another type of battle with the government. Unlike what happened in the first years of the occupation, when the struggles were based on the right to housing and permanence in the city's soil, current demands were transformed with the arrival of a new urban apparatus. Currently, the demands of the residents are more directed to the search for the quality of services and equipment offered, as well as in the negotiation in search of social counterparts that bring certain advantages to the neighborhood and its inhabitants. These counterparts do not necessarily materialize in offers of urban equipment and infrastructure, as sought after and desired. They often appear in the form of funding for professional training courses for the community or as more specific benefits for some of the Non-Governmental Organizations (NGOs) involved in the negotiation.
Despite the attempt and claim to build a MCMV housing complex within the BP for those who wanted to remain, it was noticeable that there was almost a consensus among the leaders that the removal of those houses was something already expected and even necessary for the good and better development of the city, region and even for the interests of the neighborhood as a whole. In this way, it is clear that many of the actions developed by the community today aim more at negotiating the best counterparts for the neighborhood before defending the interests of evicted families (HITA, 2017; 2020). If, on the one hand, the community has been going through a slow and subtle process of transformation, driven by urban policies that value the surroundings of the neighborhood, on the other hand, internal urban policies fulfill the role of making sure that residents are obliged to pay, each time more,
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with the costs of improving the quality of life of their community and region, through the inclusion of residents in payments of fees, taxes and services, previously forgiven in order to reduce the cost of housing.
Although we do not rule out the possibility that homeowners may be taking advantage of the neighborhood's appreciation as a way of earning money by renting or selling their homes. In this article, the focus was to discuss public actions that make it impossible for poorer residents and more peripheral areas to stay in more urbanized and central centers of the city, such as those of the BP. We believe that some of these homes will be gradually expropriated for legitimate reasons, such as public need/utility or risk to the home. In parallel to this, the poorest residents of the BP residing within the polygonal may be expelled from the neighborhood without any expropriation actions, since, at a given moment, they will no longer be able to afford the costs of housing in the region, needing to look for cheaper and less valued regions to survive. In addition to the fact that the documentation delivered by the PCL allows them to transact business with the built property, such as sale or rent. In this way, we believe that only the most affluent residents with greater purchasing power will be able to maintain their residence in Bairro da Paz, which will increasingly receive residents of higher social classes.
It is almost a consensus among specialists on cities and urban policies that government actions tend to accompany the interests of capital, especially real estate and tourism. However, it is worth mentioning that urban social movements, strengthened at the end of the military dictatorship in Brazil, have been transforming the molds and guidelines of urban policies, starting to guide them in the search for the construction of more democratic and less unequal cities through participatory processes. The inclusion of political actors representing civil society does not, however, guarantee that urban policies are constructed with a view to ensuring the rights of urban citizens, nor their interests. This is why the effectiveness of social participation in the formulation and monitoring of public policies by these sectors of civil society is highly questionable. That is why it is necessary to be attentive to the subtleties that may deny recently conquered rights. In this sense, we believe that the gentrifying action of the public power and the private sector can arise through other molds besides those described by the traditional literature on the subject. Likewise, we need to update our perspectives on the places where such policies are being implemented and on their impacts in different locations.
Therefore, we argue that concepts such as gentrification not only serve to understand the resumption of requalification of old central/traditional regions by the middle classes, but
can also help us to think and understand other transformations produced by public-private
Estud. sociol., Araraquara, v. 27, n. esp. 1, e022004, Apr. 2022. e-ISSN: 1982-4718
actions in peripheral places, once impacted by hygienist policies and expropriation. The legal support for the permanence and right to the city of the residents of these areas, after the promulgation of the City Statute (2001) does not eliminate the socio-spatial differences or real estate interest in speculation regions. For this reason, we defend a more attentive and nuanced look at the analysis of processes experienced in needy communities and their surroundings, identifying who are the real beneficiaries of the set of urbanization and land regulation actions and their impacts on the poor and vulnerable.
In these terms, we believe that Bairro da Paz has been going through a discreet and slow process of gentrification, which may have the final consequence of reducing the central area of the neighborhood, which is demarcated by PMS as ZEIS. In this way, the neighborhood may undergo transformations not only in the total physical area, which may be further reduced by new and future expropriations under justifications such as environmental risks or public needs, but also in the type of internal social composition of those who leave, stay or arrive.
Transformations such as those described may lead the neighborhood to a slow process of greater “bourgeoisness”, even if, in the short and medium term, it is unlikely to be occupied by populations from the middle and upper classes. In this way, we believe that the concept of gentrification can help us to account for urban transformations that are different from those to which the phenomenon was restricted when it was first used by Ruth Glass (2018), given the social reality and cities going through significant transformations, which may imply the need to review new uses of some concepts.
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