image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158181A SIMBIOSE PERIFÉRICA: GÊNERO E DEPENDÊNCIA NO PENSAMENTO DE HELEIETH SAFFIOTILA SIMBIOSIS PERIFÉRICA: GÉNERO Y DEPENDENCIA EN EL PENSAMIENTO DE HELEIETH SAFFIOTIPERIPHERAL SYMBIOSIS: GENDER AND DEPENDENCY IN HELEIETH SAFFIOTI’S THINKINGSylvia IASULAITIS1Gustavo GUIMARÃES2RESUMO: O presente artigo enseja um resgaste das contribuições da socióloga feminista brasileira Heleieth Saffiotiàs reflexões sobre dependência e relações de gênero mais precisamente, sua compreensão a respeito da particularidade da opressão de gênero nos países dependentes. Assim, reconstruímos o cenário histórico e intelectual em que a autora se formou e produziu, esboçamos suas relações com este contexto e com os autores clássicos do pensamento social brasileiro. Recuperando esse diálogo, apresentamos sua visão da dependência e da formação social brasileira. E então, delineamos sua complexa análise da situação feminina no capitalismo dependente, ressaltando sua originalidade, criticidade e a relevância destes estudos para o debate contemporâneo sobre unidade entre opressões e conformações específicas das relações de gênero na periferia do sistema. PALAVRAS-CHAVE: Opressão de gênero. Capitalismo dependente. Sul Global. Pensamento social brasileiro. Heleieth Saffioti.RESUMEN:El presente artículo pretende rescatar las contribuciones de la socióloga feminista brasileña Heleieth Saffioti, sus reflexiones sobre dependencia y relaciones de género más concretamente, su comprensión respecto a la particularidad de la opresión de género en los países dependientes. De ese modo, reconstruimos el escenario histórico e intelectual en el que la autora se formó y produjo, esbozamos sus relaciones con este contexto y con los autores clásicos del pensamiento social brasileño. Recuperando ese diálogo, presentamos su visión de la dependencia y de la formación social brasileña. Y entonces, describimos su complejo análisis de la situación femenina en el capitalismo dependiente, resaltando su originalidad, criticidad y la relevancia de estos estudios para el debate contemporáneo sobre unidad entre opresiones y conformaciones específicas de las relaciones de género en la periferia del sistema.PALABRAS CLAVE: Opresión de género. Capitalismo dependiente. Sur Global. Pensamiento social brasileño. Heleieth Saffioti.1Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos SP Brasil. Professora do Departamento de Ciências Sociais e do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade. Doutora em Ciência Política. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3526-1003. E-mail: si@ufscar.br2Universidade Federal de São Carlos(UFSCar), São Carlos SP Brasil. Pesquisador bolsista do CNPq. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5116-5444. E-mail:gustavognascimento9@gmail.com
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158182ABSTRACT: This article offers a review of the contributions of Brazilian feminist sociologist Heleieth Saffiotion dependency and gender relations, particularly her understanding of gender oppression in dependent countries. The study describes the historical and intellectual scenario where the author was educated and developed her work, discussing her relationshipswith the context and with classic authors of Brazilian social thought, presenting her view about dependency and the Brazilian social formation. Finally, Saffioti’s complex analysis of the female situation in dependent capitalism was outlined, emphasizing its originality, criticism, and relevance to the contemporary debate on unity among oppressions and specific configurations of gender relations in the system’s periphery.KEYWORDS: Gender oppression. Dependent capitalism. Global South. Brazilian social thinking. Heleieth Saffioti.IntroduçãoA opressão de gênero é uma realidade objetiva e atinge as mulheres como categoria social. Não obstante, há determinantes distintos e contextos mais vulneráveis à opressão, isto porque as relações de gênero que fundamentam a opressão não existem em um vácuo, e sim em contextos sócio-históricos que conferem características diferenciadas à opressão. Assim como o modo de produção capitalista realiza-se de maneira específica em cada formação social (SAFFIOTI, 2013), também a opressão feminina apresenta suas singularidades. Neste sentido, a região da América Latina e do Caribe é considerada pela ONU Mulheres (2017) como a mais violenta do mundo para mulheres.Os estudos sobre as peculiaridades da opressão de gênero em nações periféricas atualmente genericamente referidas como o Sul Global ainda são escassos. E é justamente sobre este importante porém pouco discutido aspecto do complexo fenômeno da opressão feminina que se centrará este artigo: as particularidades da opressão de gênero na América Latina e no Brasil.Diversas explicações vêm sendo elaboradas para o fenômeno da opressão feminina; não obstante, empreenderemos tal tarefa a partir da categoria teórica de dependência, raramente acionada para explicar a nossa realidade recentemente. Para tanto, teremos como base a obra de Heleieth Saffioti, que foi uma exceção e também pioneira nesse quesito. A socióloga brasileira se propôs a descrever e explicar as peculiaridades da opressão de gênero nos países periféricos na maior parte de sua obra. Embora não sem limitações, Saffioti compreendia que raça, classe, gênero, sexualidade e nação (ou dependência) não eram eixos desvinculados de opressão, mas causa e consequência de um mesmo sistema. Seu aporte teórico é bastante original e, embora articulado ao arcabouço teórico geral da dominação-exploração de classe,
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158183busca contribuir na direção de suprir a lacuna existente de uma teoria coerente e rigorosa da opressão feminina.O fenômeno abrangente da opressão é aqui conceituado de forma rigorosa a partir da obra de Saffioti e, como tal, entendido como sendo a mescla de dominação e exploração. A dominação-exploração das mulheres como um único fenômeno se assenta em duas bases: 1) a político-econômica do regime patriarcal que resulta na intensa discriminação salarial das trabalhadoras, em sua segregação ocupacional e em sua marginalização de importantes papeis econômicos e político-deliberativos e 2) o controle dos corpos e da sexualidade feminina que resulta na sujeição sexual das mulheres e no controle de sua capacidade reprodutiva.É possível identificar crescente interesse pela obra de Heleieth Saffioti, recentemente documentado por Bila Sorj e Anna Bárbara Araujo (2021) em dados estatísticos. Não obstante, a compreensão de Saffioti sobre a dependência brasileira, a relação desta para com a opressão de gênero e o capitalismo permanecem aspectos pouco explorados nesse contexto de retomada de seu pensamento. Foi ao estudo destas feições da produção teórica de Heleieth Saffioti que nossa pesquisa se dedicou, cujo objetivo é compreender sua contribuição no sentido de uma teoria da opressão de gênero sob o capitalismo dependente. Essa pesquisa se debruçou, principalmente, sobre os escritos de Saffioti entre as décadas de 1960 e 1980, onde os temas da dependência e de sua articulação com o capitalismo e a opressão de gênero estavam presentes de forma mais explícita, bem como em diversas entrevistas concedidas pela socióloga, aqui consideradas preciosidades.Inicialmente analisamos seu entendimento da dependência e da formação social brasileiras, posteriormente enfocamos de maneira mais específica a articulação entre opressão de gênero e capitalismo dependente em sua obra. Por fim, conectamos suas ideias aos esforços contemporâneos de pensar gênero e dependência como elementos fundamentais do capitalismo brasileiro, em específico, e do Sul Global, em termos gerais.A dependência em Saffioti A categoria de dependência, por muito tempo esquecida pela teoria social e pelo debate público, ocupara na metade do século XX o centro dos debates sobre o capitalismo e a mudança social na América Latina (MARINI, 2005a). Uma das primeiras instituições responsáveis por defini-la e colocá-la em pauta fora a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe CEPAL, onde a dependência era entendida enquanto uma condição limitadora do desenvolvimento, causada pela vulnerabilidade do subcontinente latino-americano ao controle
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158184externo (FURTADO, 1959; MARINI, 2010). O auge da formulação teórica sobre a dependência está, entretanto, na corrente que ficara conhecida posteriormente como Teoria Marxista da Dependência, ou TMD.Teóricos da TMD como Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra e Theotônio dos Santos rejeitavam a concepção da dependência e doimperialismo enquanto agentes ou entes externos: estavam comprometidos em demonstrar que a própria reprodução ampliada interna do capitalismo no Brasil e na América Latina reforçava a dependência, na medida em que se sustentava na transferência de valor, na superexploração da força de trabalho e na cisão verificada no ciclo do capital entre a produção de mercadorias e as necessidades de consumo dos trabalhadores e trabalhadoras que as produziam. Cada um desses elementos favoreceria o fortalecimento dos demais: a transferência de valor da periferia para os centros pressionava a burguesia a se apropriar do fundo de consumo dos trabalhadores, o empobrecimento das massas favorecia uma produção capitalista voltada ao mercado externo ou ao consumo das classes altas, a necessária acomodação do capital interno a esse tipo de produção impedia a criação de uma produção voltada para as grandes massas que pudesse assumir um outro tipo de eixo de acumulação e enfrentar o domínio imperialista. Nesse sentido, não só a burguesia interna não estaria em contradição com o imperialismo como reproduziria sua própria subordinação às custas da pauperização dos trabalhadores; e todas as classes estavam fadadas a repetir tal ciclo vicioso não fosse a superação completa das relações capitalistas de produção. Nesta concepção, a dependência se relaciona à forma específica assumida pelo desenvolvimento capitalista nos países capitalistas subordinados, no contexto do capitalismo global (MARINI, 2005b; DOS SANTOS, 2000). Saffioti fora profundamente influenciada por todas essas contribuições. Para ela, o capitalismo mundial é uma totalidade complexa que, embora tenha determinações universais, válidas para todas as suas manifestações, não é homogêneo (SAFFIOTI, 2013). Essas determinações essenciais “assumem em cada concreção singular [...], uma aparência necessária, derivada das condições específicas da vida de um povo” além disso, “o modo de produção capitalista realiza-se de maneira específica nas nações perifericamente integradas no capitalismo internacional” (SAFFIOTI, 1973, p.84).Para a autora, os países centrais do capitalismo são caracterizados, acima de tudo, pela sua maior capacidade de: 1) atenuar as tensões produzidas pelo modo capitalista de produção, exportando-as para a periferia e 2) absorver as massas populares para os setores capitalistas da economia isto é, aqueles regidos diretamente por relações capitalistas de produção, onde a força de trabalho é comprada para valorizar o capital empregado pela burguesia mediante à
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158185produção de mais-valia (SAFFIOTI, 2013; 1978; 1977; 1976; 1973). Nos países dependentes, verifica-se o contrário: as contradições do sistema como a desigualdade de renda e a pauperização seriam mais explícitas e intensas, não podendo ser exportadas; e uma quantidade muito maior das massas populares estaria concentrada em setores não-capitalistas da produção, no exército industrial de reserva e/ou desempregados característica também reconhecida pela TMD (MARINI, 2005c).Para a socióloga, bastante inspirada por Celso Furtado (1959) e Caio Prado Jr. (1966), a formação social brasileira nascera capitalista, ainda que apenas parcialmente: produzia produtos primários para o exterior e possuía como classe dominante empresários capitalistas que visavam o lucro, embora predominassem relações de trabalho escravistas e uma estrutura social formalmente organizada em castas, em uma “ordem senhorial-escravocrata” ou “capitalismo escravista” (SAFFIOTI, 1976, p.16). A constituição plena do modo de produção capitalista no Brasil teria se dado no pós-abolição, com a generalização do trabalho assalariado. Esta concepção é também similar a formulações de Fernandes (1976), Cardoso (1977) e Ianni (1962).Após o fim da colonização, consolida-se “uma nova forma de dependência, traduzindo-se esta essencialmente pelos laços comerciais que atavam o país ao centro hegemônico do bloco ocidental de então”, em um primeiro momento a Inglaterra (SAFFIOTI; ACKERMAN,1973, p.86). Depois da crise da economia agroexportadora que culminou na Revolução de 30, a industrialização teria transformado o capitalismo brasileiro em um capitalismo urbano-industrial, capaz de crescer economicamente, porém nos “limites permitidos pela lógica do sistema capitalista internacional”; ou seja, enquanto capitalismo dependente (SAFFIOTI; ACKERMAN,1973, p.88). Com o “esgotamento do processo de substituição de importações” (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p. 87), nos anos 1950, e em um contexto de redefinição da Divisão Internacional do Trabalho,[...] o Brasil sofre maciça penetração de investimentos estrangeiros. Do ponto de vista da relação de dependência, a mudança fundamental é que ela se caracterizará, progressivamente, mais como tecnológica e de capitais que como comercial. Pouco a pouco toma corpo o que habitualmente se chama de internacionalização do mercado interno (SAFFIOTI; ACKERMAN,1973,p.87).Para Saffioti (2013; 1985) a dependência é uma constante na formação social brasileira, passando pela colonização, pelo Império e pela República, e assumindo diversas conformações durante cada um desses períodos. O que eles teriam em comum seriam os aspectos definidores
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158186da dependência a subordinação econômica e a penetração do capitalismo de fora, a heteronomia.Foi possível constatar que, deacordo com os materiais aos quais tivemos acesso durante a pesquisa, o termo capitalismo dependente, próprio da Teoria Marxista da Dependência, é citado textualmente pela primeira vez por Saffioti em um texto de 1973, seguido de uma nota de rodapé crítica, chamando-o de “insatisfatório” e referenciando, em seguida, textos de Francisco Weffort e Fernando Henrique Cardoso (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p.12). Já em textos dos anos 1980 (SAFFIOTI, s/d; 1985), Saffioti utiliza o termo sem ressalvas, especialmenteem um artigo de 1985. Entretanto, a referência é à ideia de capitalismo dependente-associado de Fernando Henrique Cardoso:Se a este cruzamento das contradições de sexo e de classes se somar o fato de o Brasil ter sido penetrado de fora pelo capitalismo,só podendo desenvolver o “capitalismo associado”, dependente do centro hegemônico do sistema capitalista internacional, a situação da mulher ainda se agrava mais. (SAFFIOTI, 1985, p.137).Nesse trecho de um texto de 1985 há algo curioso. Embora citando a teoria de Cardoso, Saffioti apresenta as conclusões da Teoria Marxista da Dependência. Cardoso fazia parte de uma outra corrente teórica que também buscou pensar a dependência latino-americana (CARDOSO; FALETTO, 1984). Porém, para essa corrente, é plenamente possível superar a condição de dependência dentro do capitalismo, dado o contexto favorável e as relações corretas entre classes e grupos. Saffioti, entretanto, reafirma que o único capitalismo possível no Brasil é o capitalismo dependente, assim comoautores como Ruy Mauro Marini e Vânia Bambirra. Essa posição está presente em diversas passagens:[...] os países perifericamente integrados no sistema capitalista internacional estão sujeitos, em virtude de sua própria condição de dependentes, a verem diminuídos, se não praticamente anulados, seus esforços de independentização (possibilitados por certas conjunturas internacionais) nos momentos de recomposição do referido sistema mundial (SAFFIOTI, 2013, p.223).[...] as sobrevivências da “sociedade tradicional” brasileira não fazem senão auxiliar a realização histórica do capitalismo no Brasil da maneira como o permite a condição de país perifericamente integrado no sistema capitalista internacional (SAFFIOTI, 2013, p.343).[...] não há lugar para a hipótese de que, num futuro próximo ou remoto, as sociedades em que hoje ocorrem as realizações “periféricas” do capitalismo venham a atingir o desenvolvimento, entendido este como a realização do tipo macro-estrutural para o qual tendem (SAFFIOTI, 1973, p.161).
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158187Essas ideias não estão presentes na maior parte da escola uspiana de sociologia, da qual Cardoso é expoente, e na maioria dos autores citados por Saffioti. Entretanto, estão presentes em Florestan Fernandes (1975) sobretudo sua fase madura e não seriam estranhas a Saffioti, que conviveu diretamente com os formuladores da vertente marxista da dependência. Ela reconhece essa influência plenamente em entrevistas, referindo-se, ainda, criticamente a Fernando Henrique Cardoso:H.S.: [em resposta a pergunta sobre a influência da CEPAL] Depois do golpe [de 1973] no Chile, eu tinha muito contato com o pessoal que havia se exilado no Chile e quando houve o golpe contra o Allende foram para o México. Eram a Vânia Bambirra, o marido dela na época, o Dr. Theotônio dos Santos, Ruy Mauro Marini, eu ia muito ao México naquela época. Então eu conhecia tudo que dizia respeito à CEPAL, mas, antes [dessa época da década de 70; durante a redação de A mulher na sociedade de classes]? Só pode ter sido pelo Fernando Henrique e pela Ruth (Cardoso) porque quando eles moraram no Chile a biblioteca deles ficou na minha casa. Eu não gosto dele, tanto que eu nunca votei nele. Outro dia houve homenagem de feministas à Ruth e me pediram que eu falasse e dei umas diretas nele! Disse que eu gostaria de falar sobre aquilo que a Ruth não foi, não porque não pudesse, mas porque não quis. Ela não quis ser estrela. Mas ela fazia uma pesquisa honesta e correta. Por quê? Porque FHC e Serra plagiaram a teoria da dependência que foi de RuyMauro Marini. E como eu sei disso? Exatamente porque o Theotônio dos Santos, a Vânia e o Ruy Mauro, estavam exilados no México e eu ia muito lá (SAFFIOTI, 2008, p.289).Essa convivência muito próxima com os autores listados está também citada em Bambirra (1991, p.79), onde Vânia chama Heleieth de “amiga” e narra experiências que tiveram juntas, incluindo o início da organização em parceria de um livro em Cuba, de entrevistas e reflexões sobre as mulheres e a revolução socialista na América Latina, para o qual Saffioti faria a introdução, mas que jamais fora publicado (BAMBIRRA, 1991).De qualquer forma, Saffioti compartilhava com o grupo o ceticismo quanto às possibilidades de superação da dependência dentro do capitalismo e quanto ao que o desenvolvimento capitalista dependente poderia oferecer aos trabalhadores. Isso está refletido profundamente em sua forma de compreender a opressão de gênero: assim como, para os autores marxistas da dependência, os problemas fundamentais das massas latino-americanas eram derivados do capitalismo e não de sua ausência e o desenvolvimento capitalista significava mais dependência ; para Saffioti, a opressão das mulheres na modernidade não era fruto do pré-capitalismo nem resquício de modos de produção anteriores, mas precisamente alimentada pelo desenvolvimento capitalista, e mais capitalismo só poderia significar mais opressão para as mulheres trabalhadoras. Mais do que tudo, as conclusões políticas que decorrem de A mulher na sociedade de classes(2013) são como um manifesto feminista anti-
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158188desenvolvimentista e socialista, voltadas a “afastar a ideia[sic] de que o desenvolvimento do capitalismo constitui a solução para o problema feminino” (SAFFIOTI, 1979, p.12).As relações de gênero sob o capitalismo dependente, conforme SaffiotiA consciência da dependência em que, desde seus inícios, a formação econômico-social capitalista se vem constituindo no Brasil e dos limites que a estrutura internacional de poder impõe à sua realização nos níveis alcançados pelas sociedades de consumo de massas constitui o ponto inicial para a compreensão dos papéis sociais que homens e mulheres vêm desempenhando na sociedade brasileira desde os seus primórdios (SAFFIOTI, 2013, p.229).Em sua obra, Saffioti preocupa-se em descrever e explicar a opressão de gênero no capitalismo contemporâneo, recorrendo para isso à história das formações sociais que o compõem. Seu esforço é o de captar as determinações gerais da subordinação feminina na modernidade, válidas para todas as formações sociais capitalistas; e suas determinações particulares, que variam em decorrência da história e características econômicas e culturais específicas de cada povo e local, e, principalmente, da posição ocupada por essas formações sociais na acumulação capitalista a nível global, ou seja, na Divisão Internacional do Trabalho. É aí que se insere a articulação entre relações de gênero e dependência (SAFFIOTI, 2013).Para a socióloga, o fenômeno da opressão feminina não pode ser compreendido apenas em sua dimensão ideológica e cultural trata-se de desvendar quais mecanismos sociais possibilitam a reprodução continuada dessa opressão e quais interesses materiais movem esses mecanismos. Nesse sentido, a raiz do sexismo sob o capitalismo estaria na marginalização ou integração periférica das mulheres a este modo de produção e os benefícios que o próprio sistema e os principais interessados em sua manutenção, a classe burguesa recolheriam desta situação (SAFFIOTI, 2013;1973).Há diferenças sensíveis na maneira pela qual a autora formula essa questão ao longo de sua obra. Entretanto, no geral Saffioti acentua a incapacidade e o desinteresse que o modo de produção capitalista teriaem transformar todas as pessoas das classes subordinadas em trabalhadoras subordinadas diretamente ao capital: responsáveis por adicionar valor novo ao capital ou torná-lo mais rentável, em relações de trabalho onde o produto da labuta não pertence à sua produtora ou ao seu produtor, mas ao capitalista. O fundamento dessa incapacidade estaria, primeiramente, na tendência do capital a incorporar uma proporção menor de força de trabalho, em relação aos meios de produção, conforme o desenvolvimento das forçasprodutivas possibilita uma produção igual ou maior de mercadorias no mesmo tempo com menos
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158189trabalhadoras e trabalhadores empregados. Por outro lado, a massa de trabalhadoras e trabalhadores desempregados ou em relações de produção não-capitalistas como a produção artesanal, camponesa e a prestação de serviços individuais , serviria como um exército de reserva para a produção diretamente capitalista, podendo ser absorvida em momentos de crescimento, contribuir para o rebaixamento dos salários e direitos dos trabalhadores dos setores capitalistas, ou fornecer um tipo de exploração que beneficia esses setores mesmo estando localizada fora deles (SAFFIOTI, 2013; 1978).A opressão feminina, ao deslocar uma grande quantidade de mulheres para o trabalho doméstico dentro do lar, para o desemprego ou para relações de trabalho não-capitalistas, protegeria o sistema de tensões que ele não poderia suportar caso todos os seus membros despossuídos reivindicassem um lugar no mercado de trabalho formal capitalista issoexplicaria a manutenção e promoção desta opressão por parte do capital. Além disso, o recurso à naturalização das relações sociais representado pelo sexismo desviaria do sistema a crítica, identificando suas falhas como incapacidades naturais de certos grupos (SAFFIOTI, 2013).Em seus textos do final dos anos 1960 e começo dos anos 1970, especialmente A mulher na sociedade de classes([1969] 2013), Saffioti detém-se primordialmente sobre o papel que o confinamento feminino ao trabalho doméstico, de reprodução e de socialização no lar teria para evitar a explicitação das contradições do capitalismo; reforçando que tal sistema teria incentivado esse confinamento conforme seu desenvolvimento o tivesse feito prescindir cada vez mais do trabalho produtivo feminino. Para isso, a autora recorre à comparação entre a participação das mulheres na produção de bens durante e antes do advento do modo de produção capitalista. Neste contexto, Saffioti também ressaltava como a sociedade burguesa só permitiria às mulheres trabalhadoras o trabalho remunerado fora do lar se reunissem certas condições extrema necessidade econômica, estado civil favorável e juventude , e ainda assim, mantendo o trabalho não-remunerado no lar.Durante esse período de sua obra, a dependência comparece como um fator de agudização do fundamento material da opressão feminina no capitalismo a integração periférica ao sistema produtivo nos países dependentes, para possibilitar, em contrapartida, uma atenuação desse mesmo determinante dos países centrais. Essa atenuação explicaria “o maior número de liberdades desfrutadas pelas mulheres dos países altamente desenvolvidos” (SAFFIOTI, 2013, p.193). Para Saffioti (2013, 1973), entretanto, seria exatamente a subordinação e a transferência de riqueza dos países periféricos aos países centrais o possibilitador dessa diferença. A autora afasta, então, a possibilidade de universalização desses benefícios das mulheres dos países imperialistas a maior participação feminina na população
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581810economicamente ativa e o maior número de direitos reprodutivos para todo o mundo capitalista.Em relação ao Brasil, Saffioti recupera a história da formação social para ressaltar como, assim como no caso das mudanças, as permanências econômicas e sociais advindas do período colonial se fazem acompanhar de permanências na tradição e na cultura. Assim, o pesado sexismo e racismo da sociedade escravocrata necessário para a reprodução econômica e social de tal ordem, fundamentada no papel dominante do latifundiário patriarca e na exploração e desumanização de homens e mulheres negras diante da subordinação nacional ao mercado capitalista mundial , continuaria presente pelo novo papel que viria a cumprir em uma sociedade capitalista em “plena constituição” e dependente que, paraa autora, expulsava as mulheres da economia pública e se construía com a combinação de formas modernas e arcaicas de exploração que, nunca contraditórias, sustentavam-se mutuamente. Também expõe os dados sobre a redução da participação feminina no setor secundário do final do século XIX até meados do século XX como comprovação de sua tese do alijamento acentuado das mulheres da produção capitalistas nos países dependentes: em sua opinião, causado sobretudo pelo fenômeno da importação intensa de tecnologia estrangeira “poupadora de força de trabalho” (SAFFIOTI, 2013, p.335-340).E, deste modo, a marginalização da força de trabalho feminina, muitas vezes explicada quase exclusivamente em função de preconceitos e remanescentes de uma “sociedade tradicional” e do pequeno grau de desenvolvimento econômico, apresenta-se como decorrência da plena constituição das relações capitalistas de produção [...]. As justificativas do padrão doméstico de mulher fornecidas pela “mentalidade tradicional” não constituem, desteângulo, fatores de atraso da economia brasileira e retardadores de seu desenvolvimento. Ao contrário, mesmo na fase em que poderia ser mais elevado o nível de emprego e, consequentemente, maior o aproveitamento da mão de obra feminina, a condição de país de economia dependente determinou um subaproveitamento do fator força de trabalho no Brasil. A marginalização de enormes contingentes femininos do sistema produtivo de bens e serviços favoreceu, evidentemente, a acumulação capitalista (SAFFIOTI, 2013, p.341-343).Nesses termos, Saffioti delineia como a situação específica das mulheres sob o capitalismo dependente marginalizadas de uma estrutura incapaz de terceirizar suas contradições ou resolver seu problema de excesso de mão de obra exigiria ferramentas ideológicas mais brutais e explícitas de dominação feminina. Este seria o caso do machismo latino-americano:[...] nas áreas subdesenvolvidas em geral, e especialmente nas nações latino-americanas, o complexo cultural do machismo, vigendo ostensivamente,
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581811expõe mais cruamente a posição subalterna da mulher. Isto não significa, de modo algum, que o comportamento do machão seja o responsável pela reduzida participação feminina na população economicamente ativa destes países, mas sim que as técnicas de dominação das mulheres e as justificativas de sua expulsão do mercado de trabalho são mais rudes e menos refinadas que nas nações desenvolvidas (SAFFIOTI, 1973, p.154).A partir de meados da década de 1970, em um contexto de relativo avanço do emprego feminino nos países centrais, Saffioti passa a se preocupar mais intensamente com o tema da articulação entre o modo de produção capitalista e as relações de trabalho não-capitalistas, refletindo sobre como a marginalização feminina da estrutura produtiva também poderia se expressar em sua presença mais significativa nesses setores da economia (SAFFIOTI, 1976; 1977; 1978). Nos países dependentes, esses “bolsões pré-capitalistas” possuem um “peso relativo muito maior” na economia (SAFFIOTI, 1977, p.33).Para a autora, crítica às concepções de Poulantzas (1972 apudSAFFIOTI, 1977) nesse quesito, a coexistência entre diferentes modos de produção em uma mesma formação social é impossível. O que se verifica, porém, é a subordinação das relações de produção não-capitalistas à dinâmica do modo de produção capitalista, com estas perdendo sua autonomia e dependendo das necessidades desse último para se reproduzir. O capitalismo recriaria constantemente tais relações de produção não-capitalistas em seu interior, precisamente porque o intercâmbio com elas o beneficiaria, permitindo uma maior exploração (ou expropriação) das trabalhadoras ou dos trabalhadores desses setores, sem preocupar-se em garantir sua reprodução. Por outro lado, em períodos de expansão, os setores capitalistas poderiam absorver essa força de trabalho para cuja “[para cuja] formação nunca fizeram nenhum investimento(SAFFIOTI, 1977, p.29, tradução nossa). Esse seria o caso do trabalho reprodutivo no interior da família:Os serviços que são desempenhados geralmente por mulheres na família são destinados à produção diária da força de trabalho do(a) trabalhador(a), assim como à reprodução desta força de trabalho. Embora esse trabalho se dedique à produção de uma mercadoria, a força de trabalho, que é indispensável para o funcionamento do modo de produção capitalista; a organização dentro do grupo familiar não assume uma forma capitalista, isto é, contratual(SAFFIOTI, 1977, p.33, tradução nossa).Já que não é um empreendimento capitalista,a família investe na produção da força de trabalho uma mercadoria no mercado de trabalho sem receber por isso nenhuma compensação monetária. Em outras palavras, a família (acima de tudo seus membros femininos) produz uma mercadoria que não pode comercializar. [...] O trabalhador que é produzido desta maneira irá beneficiar apenas aqueles que, sendo proprietários de um empreendimento capitalista, são capazes de oferecer-lhe um emprego. O preço de produzir e reproduzir a
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581812força de trabalho não entra no sistema de contabilidade da sociedade capitalista(SAFFIOTI, 1977, p.33, tradução nossa).Dessa forma, a produção permanente das condições que permitem a reprodução do capital em sentido estrito depende de uma instituição a família onde as relações pessoais e a produção doméstica são predominantes. Por meio da mobilização de trabalho não-pago, especialmente feminino, essa instituição é mais econômica do que qualquer outra para o propósito de fornecer ao capitalismo a força de trabalho de que necessita(SAFFIOTI, 1977, p.31, tradução nossa).Portanto, a família seria uma instituição altamente adaptada e funcional ao modo de produção capitalista não apesar, mas especialmente pelo fato de não ser organizada em moldes capitalistas.O trabalho doméstico não-remunerado não seria, porém, o único “bolsão pré-capitalista” mediante o qual o capital poderia se beneficiar da exploração acentuada do trabalho feminino. Segundo Saffioti (1977, p.33, tradução nossa), nos países centrais, “[…] dada a própria hegemonia econômica e política exercida por essas regiões, as mulheres possuem oportunidades muito maiores para realizar atividades organizadas dentro das normas capitalistas”. Porém, nos países dependentes, há uma miríade de atividades organizadas de forma não-capitalista sendo constantemente produzidas pela enorme concentração de renda e pela menor capacidade de absorção de força de trabalho dos setores capitalistas dependentes. Estas atividades estão presentes no campo e no ambiente urbano neste, a autora os identifica como tendo mais expressão no setor de serviços, especialmente o “baixo terciário”, onde se concentram muitas mulheres que não teriam “outra alternativa [...] senão a busca do exercício de atividades econômicas nos setores não organizados em moldes capitalistas” (SAFFIOTI, 1978, p.187). Um setor que despertara maior interesse da autora, tanto por sua quase total composição feminina, quanto por seu agigantamento nos países dependentes latino-americanos, fora o emprego doméstico (remunerado) tema de seu livro Emprego doméstico e capitalismo(1978). A socióloga explica e define as relações envolvidas neste tipo de trabalho:[...] as atividades desenvolvidas por empregadas domésticas em residências particulares não se caracterizam como capitalistas. Com efeito, não se encontram elas subjugadas ao capital, mas são remuneradas diretamente pela renda pessoal. Os mesmos serviços domésticos desempenhados em bares, restaurantes, hotéis, incluem-se no setor capitalista da economia, subordinando seus agentes diretamente ao capital. Esta diferença é crucial para caracterizar as atividades de empregadas domésticas como não-capitalistas, ainda que tenham sido engendradas pelo capitalismo. Remuneradas pela renda pessoal, as domésticas executam tarefas cujo «produto», bens e serviços, são consumidos diretamente pela família empregadora, não circulando pelo mercado para efeito de troca com o objetivo de lucro (SAFFIOTI, 1978, p.191).
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581813As empregadas domésticas hoje em dia, em grande parte negras seriam as responsáveis, sobretudo no capitalismo dependente, por parte da reprodução biológica e social de extensas camadas da população sendo, por isso, indispensáveis à lógica do sistema. Entretanto, sua exploração não se daria em moldes tipicamente capitalistas, o que permitiria que a precarização as atingisse com mais força. Saffioti também as identificava como parte do exército de reserva, “mobilizáveis para o trabalho no setor capitalista de atividades econômicas” quando se fizesse necessário (SAFFIOTI, 1978, p.191).Na época de escrita do texto, o feminismo marxista dos EUA e da Europa passava pelo que ficou posteriormente conhecido como a polêmica do trabalho doméstico3. Discutia-se, sinteticamente, o papel do trabalho doméstico no capitalismo. Saffioti ressaltava que o foco deste debate, entretanto, estava no trabalho doméstico não-remunerado desempenhado pelas donas de casa no lar os países centrais não possuíam um setor expressivo de prestação de serviços domésticos remunerados (SAFFIOTI, 1978, p.193).Nos países dependentes, e principalmente no Brasil, a situação era totalmente diferente: a concentração de renda possibilitava às mulheres das classes altas assalariar mulheres pobres, terceirizando assim as funções domésticas que a sociedade lhes incumbia de cumprir. Essas mulheres pobres, por sua vez, eram empurradas ao trabalho remunerado fora do lar pela absoluta necessidade econômica e o alto custo de vida característico dos países dependentes; sem, no entanto, encontrar espaço nos setores capitalistas das atividades econômicas. Submetiam-se, portanto, a um tipo de ocupação de baixa remuneração e onde toda sorte de violações de direitos acontecia. Desta forma, o “caráter dependente do desenvolvimento do capitalismo brasileiro” (SAFFIOTI, 1978, p.192) determinava uma forma específica de realização do trabalho doméstico, e uma ampla concentração das mulheres nas atividades não organizadas em moldes capitalistas que era o sustentáculo de seus menores direitos nas esferas política, trabalhista e reprodutiva, e também do machismo, entendido como forma particular da ideologia sexista sob a dependência. A superação desta condição pressupunha uma completa alteração da estrutura produtiva e econômica do país que revertesse os altos níveis de desemprego e de concentração de renda em outras palavras, superasse a dependência. A magnitude do emprego doméstico nos países latino-americanos é também explicada como determinação particular do desenvolvimento capitalista dependente por Vânia Bambirra (s/d). 3Uma síntese crítica deste debate está em Ferguson (2020).
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581814Por fim, há a questão do trabalho feminino produtivo sob o capitalismo dependente e suas determinações particulares. O censo realizado pelo IBGE em 1970 e nas décadas posteriores demonstrou um crescimento bastante expressivo do emprego feminino em quase todas as áreas, mas principalmente àquelas ligadas à indústria capitalista. Embora os temas do emprego industrial feminino, sua instabilidade e seus baixos salários já tivessem sido tematizados em outras obras de Saffioti (1978, 2013), nos anos 1980 eles ganham maior centralidade em seu quadro explicativo. Em Força de trabalho feminina: no interior das cifras(1985), Saffioti apresenta sua teorização sobre a simbiose entre patriarcado e capitalismo, analisando as interconexões entre produção e reprodução. Nesse quesito, verifica-se a forte influência da corrente feminista materialista francesa nas formulações de Heleieth Saffioti, representada por autoras como Danièle Kergoat, Dàniele Combes e Monique Haicault.De acordo com a socióloga feminista, há um cruzamento entre reprodução e produção que torna a reprodução presente na produção e a produção presente na reprodução em outros termos, as relações de classe atravessam a família e as relações sociais de sexo também atravessam o terreno da produção capitalista. Tanto o patriarcado quanto o capitalismo teriam uma dimensão econômica, social e cultural, reproduzindo-se, entretanto, como um só sistema. Neste sentido, “não se pode separar as mulheres na esfera da reprodução e os homens na esfera da produção, porquanto ambos são agentes sociais nos dois domínios, reproduzindo-se em ambas as esferas a divisão sexual do trabalho” (SAFFIOTI, 1985, p.103). A associação das mulheres com a reprodução se refletiria em sua exploração tanto dentro quanto fora do lar e da família.Ao verificar, concomitantemente ao processo de expansão do emprego industrial feminino no Brasil, um intenso aumento da discriminação salarial entre homens e mulheres e a concentração destas nos postos mais baixos das fábricas, Saffioti associa o capitalismo dependente não só com a maior magnitude dos setores não-capitalistas e a precarização do trabalho feminino que se verifica neles, mas também com o mais alto grau de exploração que vivenciam as mulheres trabalhadoras (especialmente pobres e não-brancas) dos países dependentes, em relação às mulheres dos países centrais, no próprio setor capitalista da economia. Estas, além disso, passam a compartilhar a inserção no sistema produtivo com a inserção no trabalho não-remunerado no lar, acumulando duas jornadas de trabalho ou então, assalariando outras mulheres, empregadas domésticas com salários ainda mais baixos. Por todos os lados, o capitalismo dependente marcaria a experiência de opressão das mulheres no Brasil.
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581815Dada a simbiose patriarcado-capitalismo, entretanto, a meta da maximização do lucro é mediada pela supremacia masculina. E é desta forma que, pela via da subordinação da mulher ao homem e pela alocação prioritária da mulher aos aparelhos de reprodução, o patriarcado-capitalismo garante,simultaneamente, a reprodução da família trabalhadora e explora em grau mais intenso a força de trabalho feminina, quando dela necessita e nas proporções em que dela precisa. [...]. Enquanto perdurar o sistema patriarcado-capitalismo, homens e mulheres jamais serão socialmente iguais. Disto resulta que a incorporação da força de trabalho feminina apresentará sempre característicos específicos [sic], nos quais poderá ser reconhecida toda sorte de discriminações (SAFFIOTI, 1985, p.138).O tema da simbiose entre patriarcado e capitalismo e, mais ainda, entre patriarcado, capitalismo e racismo será ainda mais explorado no livro O poder do macho(1987) e nas obras posteriores de Heleieth Saffioti.Considerações finais: a simbiose periféricaSaffioti se propôs a descrever e explicar as peculiaridades da opressão de gênero nos países periféricos na maior parte de sua obra. Entretanto, as discussões sobre a unidade entre produção e reprodução, e sobre a determinação mútua entre gênero e dependência, começaram a se fazer cada vez mais escassas a partir dos anos 1980; de modo que poucas autoras e autores latino-americanos elaboraram teorias nesse sentido depois de Saffioti até antes do começo dos anos 2000. Esse quadro mudou recentemente, com o ressurgimento do feminismo-marxista e o resgate da Teoria Marxista da Dependência e da obra de Saffioti.Assim, tem-se ressaltado como categorias como transferência de valor, cisão entre as esferas de circulação, subimperialismo, agigantamento da superpopulação relativa e principalmente superexploração do trabalho ajudam a explicar os traços distintivos das relações de gênero sob dependência, se articuladas com um quadro teórico feminista-marxista, com autoras como Díaz Lozano e Féliz (2020), Teixeira e Zorgetz (2020), Costa e Nogueira (2019), Bittencourt (2014), Cecenã (1983). Conforme Teixeira e Zorgetz (2020):No continente [latino-americano] e nos países dependentes em geral, as mulheres costumam ser trabalhadoras de reprodução doméstica e também assalariadas, ou participam de alguma atividade laboral na esfera pública. Essa distorção tem impacto direto nas condições de reprodução da família e, portanto, trazem custos diretos ao acréscimo da exploração das mulheres na esfera doméstica, seu peso em camadas específicas do exército de reserva, como também na necessidade de cumprir duplas ou triplas jornadas de trabalho (TEIXEIRA; ZORGETZ, 2020).
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581816Bittencourt (2014, p.68) ressalta como o trabalho das mulheres na América Latina se caracteriza por “uma maior intensidade do ritmo produtivo, a menor remuneração, a ocupação em postos marginalizados ou subempregos, a dupla jornada de trabalho” e a responsabilização feminina por “funções que deveriam ser prestadas pelo Estado Social (creches, educação, cuidados, lavanderias, restaurantes)”. Essas trabalhadoras, por sua vez, são em sua maioria negras ou indígenas.Nesse sentido, Saffioti contribui para a apreensão da realidade latino-americana em sua totalidade, evitando a fragmentação entre opressões e exploração capitalista, ao invés disso, recorrendo à unidade contraditória e complexa entre reprodução social e produção. Saffioti contribui decisivamente para isso ao pensar em uma simbiose e depois “nó” entre patriarcado, racismo e capitalismo que se manifesta de forma particular na periferia desse único sistema.As contribuições da atual Teoria (Marxista) da Reprodução Social (TRS) prosseguem nessa direção, ao argumentar que não se trata exatamente de três ou mais opressões com lógicas próprias de dominação e exploração econômica, que se codeterminam e fundem-se. Incorporando críticas do feminismo negro, queere de outrascorrentes, a TRS argumenta que, na realidade, é a relação contraditória entre acumulação capitalista e reprodução social que sedimenta as bases da exploração e de todas as opressões: “Do ponto de vista do capital, a reprodução social da força de trabalho é simultaneamente indispensável e um obstáculo à acumulação” (VOGEL, 2013, p.156, tradução nossa). Tanto o trabalho doméstico não-remunerado no lar quanto a exploração do baixo valor da força de trabalho feminina no âmbito produtivo são momentos dessa relação, da necessidade capitalista de produzir e erodir a vida simultaneamente. A opressão feminina na modernidade, então, está relacionada à sistêmica desvalorização da reprodução social pelo capital reprodução que, por sua vez, é demarcada enquanto responsabilidade feminina. Espaços de reprodução não-patriarcais, como as famílias chefiadas por mulheres negras ou pessoas LGBT, ou os dormitórios femininos de fábricas, também são essenciais à lógica da acumulação capitalista, assim como o trabalho feminino extralar: a forma familiar heteronormativa é predominante por sua alta eficiência em produzir uma vida explorável de forma geracional e barata. Mas sexismo, racismo, LGBTfobia e dominação de classe são produto e (re)produtores de uma mesma matriz material (FERGUSON, 2020; LEWIS,2016).A articulação entre o pensamento de Saffioti, a TMD e a TRS constitui um poderoso ferramental teórico que ainda foi pouco explorado em conjunto. Tal conjunção pode nos revelar, por exemplo, que a experiência das trabalhadoras femininas no capitalismo dependente está
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581817marcada por uma superexploração do trabalho, que se caracteriza por uma apropriação ainda mais deletéria de seu fundo de vida, já que, além de receberem um pagamento de sua força de trabalho que é inferior ao seu valor real, como a maioria dos trabalhadores masculinos latino-americanos, esse valor real já se constitui como inferior ao masculino por seus determinantes históricos e sociais; e além disso, seu tempo de descanso e reposição de energias é constantemente utilizado para o trabalho de produção e reprodução da própria força de trabalho a ser explorada pelo capital dependente e internacional.Além da reprodução da força de trabalho explorada diretamente pelo capital, é colocado como obrigação ou dever moral dessas trabalhadoras a reprodução da vida de extensos setores da própria burguesia e pequeno-burguesia por meio do emprego doméstico; e, sobretudo, a reprodução de uma superpopulação relativa maior do que nos países centrais, majoritariamente composta por mulheres, crianças, pessoas negras e indígenas, e pessoas LGBT grupos sistematicamente eliminados pela violência estatal e civil em nossa região, a serviço da acumulação capitalista dependente. A própria superexploração e sua intensificação que se expressanão só no menor acesso aos bens de consumo individuais, mas também na redução dos bens de consumo coletivo oferecidos pelo Estado , acrescida da magnitude da população que está fora da produção diretamente capitalista, determina uma reprodução social extremamente precarizada para as pessoas trabalhadoras na América Latina e no Caribe o que, como Bhattacharya (2019) ressalta é capaz de produzir violências intensas sobre as mulheres e as demais pessoas com as quais a reprodução da vida é associada, justamente porque estas últimas são responsabilizadas pelas incapacidades do sistema.Por fim, as questões da cisão entre as esferas de circulação e da altíssima concentração de renda no subcontinente se manifestam em “experiências cindidas” de gênero entre aspessoas que pertencem ao mesmo gênero ou identidade sexual advindas das classes altas estratos superiores da pequeno-burguesia e burguesia e estas mesmas da população trabalhadora; de forma mais intensa dos que nos países centrais. O contraste entre amulher burguesa e as mulheres trabalhadoras não-brancas responsáveis pela reprodução social da família da primeira via emprego doméstico é o exemplo mais ilustrativo.AGRADECIMENTOS: ao CNPq, pelo financiamento da pesquisa, no período de 09/2020 a 09/2021.
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581818REFERÊNCIASBAMBIRRA, V. Memorial. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1991.BAMBIRRA, V. A propósito del “Año Internacional de la Mujer”. s/d (mimeo).BHATTACHARYA, T. Explicando a violência de gênero no neoliberalismo. Marx e o Marxismo, v.7, n.12, jan./jun. 2019.BITTENCOURT, N.A. Gênero, trabalho e direito na América Latina: a superexploração das mulheres trabalhadoras nos países dependentes. 2014. 106f. Monografia de Graduação Faculdade de Direito, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014.CARDOSO, F.H.Capitalismo e escravidão no Brasil meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul.2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.CARDOSO, F.H.; FALETTO, E. Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1984.CECEÑA, A.E. Fuerza de trabajo femenina y explotación capitalista. Cuadernos CIDAMO, México, n.11, 1983. COSTA, R.G.; NOGUEIRA, L.A. Os elementos estruturantes do capitalismo na América Latina e as mulheres. Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, 16, 2019, Brasília. Anais[...] Brasília, DF: CBAS, 2019. Disponível em: https://broseguini.bonino.com.br/ojs/index.php/CBAS/issue/view/1. Acesso em: 29 out. 2021.DÍAZ LOZANO, J.A.D.; FÉLIZ, M. Reproducción de la vida, superexplotación y organización popular en clave feminista: una lectura desde Argentina. Cuestiones de Sociología, n.23, e101, 2020. Disponível em: https://www.cuestionessociologia.fahce.unlp.edu.ar/article/view/CSe101. Acesso em: 24 out. 2022.DOS SANTOS, T. Teoria da dependência: balanço e perspectivas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.FERGUSON, S.J. Women and Work: Feminism, Labour, and Social Reproduction. Londres: Pluto Press, 2020.FERNANDES, F. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975.FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1959.IANNI, O. As metamorfoses do escravo: apogeu e crise da escravatura no Brasil meridional.São Paulo: DIFEL, 1962.
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581819LEWIS, H. The Politics of Everybody: Feminism, Queer Theory and Marxism at the Intersection. Londres: Zed Books, 2016. MARINI, R.M. Desenvolvimento e dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005a.MARINI, R.M. Dialética da dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005b.MARINI, R.M. Sobre a Dialética da Dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: Vida e Obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005c.MARINI, R.M. A crise do desenvolvimentismo. In: CASTELO, R.(org.). Encruzilhadas da América Latina no século XXI. Rio de Janeiro: Pão e Rosas, 2010.ONU MULHERES. Região da América Latina e do Caribe é a mais violenta do mundo para mulheres, diz ONU. 22 nov. 2017. Disponível em: http://www.onumulheres.org.br/noticias/regiao-da-america-latina-e-do-caribe-e-a-mais-violenta-do-mundo-para-as-mulheres-diz-onu/. Acesso em: 08 abr. 2020.PRADO JR., C. A revolução brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1966.SAFFIOTI, H.I. B. Trabalho Feminino e Capitalismo.In: CONGRESS OF ETHNOLOGICAL AND ANTHROPOLOGICAL SCIENCES, 9., 1973,Chicago. Proceedings[…]. Chicago,1973.SAFFIOTI, H. I. B. Women, Mode of Production, and Social Formations. Latin American Perspectives, v. IV, n.12-13, 1977.SAFFIOTI, H.I. B. A mulher sob o modo de produção capitalista.Contexto, São Paulo, n. 1, 1976.SAFFIOTI, H.I. B. Emprego doméstico e capitalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 1978.SAFFIOTI, H.I. B. O fardo das brasileiras de mal a pior. In: Revista Escrita/Ensaio, Mulher brasileira: a caminho da libertação, São Paulo, Ano III, n.5, p. 10-39, 1979.SAFFIOTI, H.I. B. Força de trabalho feminina no Brasil: no interior das cifras. Revista Perspectivas, São Paulo, v. 8, p.95-141, 1985.SAFFIOTI, H.I. B. O poder do macho. São Paulo: Moderna, 1987.SAFFIOTI, H.I. B. Entrevista com Heleieth Saffioti. In: MÉNDEZ, N.P. Com a palavra, o segundo sexo: Percursos do pensamento intelectual feminista no Brasil dos anos 1960. Doutorado (Programa de Pós-Graduação em História) Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2008.SAFFIOTI, H.I. B. A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. São Paulo: Expressão Popular, 2013.
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581820SAFFIOTI, H.I. B. O trabalho feminino sob o capitalismo dependente: opressão e discriminação. s/d (mimeo).SAFFIOTI, H.I. B.; ACKERMAN, Maria das Graças G. Considerações sobre o fenômeno urbano no Brasil. Revista Adm. Emp., Rio de Janeiro,v. 13, n. 1, p.83-94, jan./mar. 1973.SORJ, B.; ARAUJO, A.B. A mulher na sociedade de classes: um clássico dos estudos de gênero. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 1, e76729, 2021. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/76729. Acesso em: 24 out. 2022.TEIXEIRA, C.F.; ZORGETZ, E. Puxando um fio solto: reprodução na periferia no epicentro da pandemia. 2020. Disponível em: https://lavrapalavra.com/2020/04/14/puxando-um-fio-solto-reproducao-na-periferia-no-epicentro-da-pandemia/. Acesso em: 29 out. 2021.VOGEL, L. Marxism and the Oppression of Women: Toward a Unitary Theory. Chicago: Haymartket Books, 2013.
image/svg+xmlA simbiose periférica: gênero e dependência no pensamento de Heleieth SaffiotiEstudos de Sociologia, Araraquara,v.27, n.00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581821Como referenciar este artigoIASULAITIS, Sylvia;GUIMARÃES, Gustavo. A simbiose periférica: Gênero e dependência no pensamento de Heleieth Saffioti.Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 27, n. 00,e022028,2022. e-ISSN: 1982-4718. DOI: https://doi.org/10.52780/res.v27i00.15818Submetido em: 17/05/2022Revisões requeridas em:24/06/2022Aprovado em: 22/07/2022Publicado em: 21/12/2022Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.Revisão, formatação, normalização e tradução.
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158181PERIPHERAL SYMBIOSIS: GENDER AND DEPENDENCY IN HELEIETH SAFFIOTI’S THINKINGA SIMBIOSE PERIFÉRICA: GÊNERO E DEPENDÊNCIA NO PENSAMENTO DE HELEIETH SAFFIOTILA SIMBIOSIS PERIFÉRICA: GÉNERO Y DEPENDENCIA EN EL PENSAMIENTO DE HELEIETH SAFFIOTISylvia IASULAITIS1Gustavo GUIMARÃES2ABSTRACT: This article offers a review of the contributions of Brazilian feminist sociologist Heleieth Saffiotion dependency and gender relations, particularly her understanding of gender oppression in dependent countries. The study describes the historical and intellectual scenario where the author was educated and developed her work, discussing her relationshipswith the context and with classic authors of Brazilian social thought, presenting her view about dependency and the Brazilian social formation. Finally, Saffioti’s complex analysis of the female situation in dependent capitalism was outlined, emphasizing its originality, criticism, and relevance to the contemporary debate on unity among oppressions and specific configurations of gender relations in the system’s periphery.KEYWORDS: Gender oppression. Dependent capitalism. Global South. Brazilian social thinking. Heleieth Saffioti.RESUMO: O presente artigo enseja um resgaste das contribuições da socióloga feminista brasileira Heleieth Saffioti às reflexões sobre dependência e relações de gênero mais precisamente, sua compreensão a respeito da particularidade da opressão de gênero nos países dependentes. Assim, reconstruímos o cenário histórico e intelectual em que a autora se formou e produziu, esboçamos suas relações com este contexto e com os autores clássicos do pensamento social brasileiro. Recuperando esse diálogo, apresentamos sua visão da dependência e da formação social brasileira. E então, delineamos sua complexa análise da situação feminina no capitalismo dependente, ressaltando sua originalidade, criticidade e a relevância destes estudos para o debate contemporâneo sobre unidade entre opressões e conformações específicas das relações de gênero na periferia do sistema. PALAVRAS-CHAVE: Opressão de gênero. Capitalismo dependente. Sul Global. Pensamento social brasileiro. Heleieth Saffioti.1Federal University ofSão Carlos (UFSCar), São Carlos SP Brazil. Professor at the Department of Social Sciences and at the postgraduate Program in Science, Technology and Society. PhD in Political Science. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3526-1003. E-mail: si@ufscar.br2Federal University ofSão Carlos(UFSCar), São Carlos SP Brazil. CNPq research fellow. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5116-5444. E-mail:gustavognascimento9@gmail.com
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158182RESUMEN:El presente artículo pretende rescatar las contribuciones de la socióloga feminista brasileña Heleieth Saffioti, sus reflexiones sobre dependencia y relaciones de género más concretamente, su comprensión respecto a la particularidad de la opresión de género en los países dependientes. De ese modo, reconstruimos el escenario histórico e intelectual en el que la autora se formó y produjo, esbozamos sus relaciones con este contexto y con los autores clásicos del pensamiento social brasileño. Recuperando ese diálogo, presentamos su visión de la dependencia y de la formación social brasileña. Y entonces, describimos su complejo análisis de la situación femenina en el capitalismo dependiente, resaltando su originalidad, criticidad y la relevancia de estos estudios para el debate contemporáneo sobre unidad entre opresiones y conformaciones específicas de las relaciones de género en la periferia del sistema.PALABRAS CLAVE: Opresión de género. Capitalismo dependiente. Sur Global. Pensamiento social brasileño. Heleieth Saffioti.IntroductionGender oppression is an objective reality and affects women as a social category. Nevertheless, there are distinct determinants and contexts that are more vulnerable to oppression, because the gender relations that underlie oppression do not exist in a vacuum, but in socio-historical contexts that confer different characteristics to oppression. Just as the capitalist mode of production is carried out in a specific way in each social formation (SAFFIOTI, 2013), femaleoppression also presents its singularities. In this sense, the region of Latin America and the Caribbean is considered by UN Women (2017) as the most violent in the world for women.Studies on the peculiarities of gender oppression in peripheral nations currently generically referred to as the Global South are still scarce. And it is precisely on this important but little discussed aspect of the complex phenomenon of female oppression that this article will focus on: the particularities of gender oppression in Latin America and Brazil.Several explanations have been developed for the phenomenon of female oppression; nevertheless, we will undertake this task from the theoretical category of dependence, rarely used to explain our reality recently. To do so, we will base ourselves on the work of Heleieth Saffioti, who was an exception and also a pioneer in this regard. The Brazilian sociologist set out to describe and explain the peculiarities of gender oppression in peripheral countries in most of her work. Although not without limitations, Saffioti understood that race, class, gender, sexuality and nation (or dependency) were not unrelated axes of oppression, but cause and consequence of the same system. Her theoretical contribution is quite original and, although articulated to the general theoretical framework of class domination-exploitation, she seeks to
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158183contribute towards filling the existing gap of a coherent and rigorous theory of female oppression.The comprehensive phenomenon of oppression is rigorously conceptualized here based on Saffioti's work and, as such, understood as a mixture of domination and exploitation. The domination-exploitation of women as a single phenomenon is based on two bases: 1) the political-economic of the patriarchal regime -which results in intense wage discrimination of female workers, in their occupational segregation and in their marginalization of important economic and political roles-deliberative ones and 2) the control of female bodies and sexuality which results in the sexual subjection of women and in the control of their reproductive capacity.It is possible to identify a growing interest in the work of Heleieth Saffioti, recently documented by Bila Sorj and Anna Bárbara Araujo (2021) in statistical data. Nevertheless, Saffioti's understanding of Brazilian dependency, its relationship to gender oppression and capitalism remains aspects that have not been explored in this context of resuming her thinking. It was to the study of these features of Heleieth Saffioti's theoretical production that our research was dedicated, whose objective is to understand her contribution towards a theory of gender oppression under dependent capitalism. This research focused mainly on Saffioti's writings between the 1960s and 1980s, where the themes of dependency and its articulation with capitalism and gender oppression were more explicitly present, as well as in several interviews granted by the sociologist, here considered precious.Initially, we analyzed her understanding of dependency and the Brazilian social formation, later we focused more specifically on the articulation between gender oppression and dependent capitalism in her work. Finally, we connect their ideas to contemporary efforts to think of gender and dependency as fundamental elements of Brazilian capitalism, in particular, and of the Global South, in general terms.The dependence in SaffiotiThe category of dependency, long forgotten by social theory and public debate, occupied the center of debates on capitalism and social change in Latin America in the mid-twentieth century (MARINI, 2005a). One of the first institutions responsible for defining it and putting it on the agenda was the Economic Commission for Latin America and the Caribbean ECLAC, where dependency was understood as a limiting condition for development, caused by the vulnerability of the Latin American subcontinent to externalcontrol (FURTADO, 1959;
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158184MARINI, 2010). The pinnacle of the theoretical formulation on dependency is, however, in the current that later became known as the Marxist Theory of Dependency, or MTD.MTD theorists such as Ruy Mauro Marini, Vânia Bambirra and Theotônio dos Santos rejected the conception of dependence and imperialism as external agents or entities: they were committed to demonstrating that the expanded internal reproduction of capitalism in Brazil and Latin America reinforced the dependency, insofar as it was based on the transfer of value, on the overexploitation of the workforce and on the split verified in the capital cycle between the production of goods and the consumption needs of the workers who produced them. Each of these elements would favor the strengthening of the others: the transfer of value from the periphery to the centers pressured the bourgeoisie to appropriate the workers' consumption fund, the impoverishment of the masses favored capitalist production aimed at the foreign market or at the consumption of the upper classes, the necessary accommodation of internal capital to this type of production prevented the creation of a production aimed at the great masses that could assume another type of axis of accumulation and face imperialist domination. In this sense, not only would the internal bourgeoisie not be in contradiction with imperialism, but it would reproduce its own subordination at the expense of the impoverishment of the workers; and all classes were doomed to repeat such a vicious cycle if it were not for the complete overcoming of capitalist production relations. In this conception, dependence is related to the specific form assumed by capitalist development in subordinate capitalist countries, in the context of global capitalism (MARINI, 2005b; DOS SANTOS, 2000).Saffiotiwas deeply influenced by all these contributions. For her, world capitalism is a complex totality that, although it has universal determinations, valid for all its manifestations, is not homogeneous (SAFFIOTI, 2013). These essential determinations “take on in each singular concretion [...], a necessary appearance, derived from the specific conditions of the life of a people” furthermore, “the capitalist mode of production is realized in a specific way in nations peripherally integrated into capitalism international” (SAFFIOTI, 1973, p.84, our translation).For the author, the central countries of capitalism are characterized, above all, by their greater capacity to: 1) attenuate the tensions produced by the capitalist mode of production, exporting them to the periphery and 2) absorb the popular masses into the sectors capitalists of the economy that is, those governed directly by capitalist relations of production, where the workforce is purchased to value the capital employed by the bourgeoisie through the production of surplus value (SAFFIOTI, 2013; 1978; 1977; 1976; 1973). In dependent countries, the opposite is verified: the contradictions of the system such as income inequality and
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158185impoverishment would be more explicit and intense and cannot be exported; and a much larger amount of the popular masses would be concentrated in non-capitalist sectors of production, in the industrial reserve army and/or unemployed a characteristic also recognized by MTD (MARINI, 2005c).For the sociologist, greatly inspired by Celso Furtado (1959) and Caio Prado Jr. (1966), the Brazilian social formation was born capitalist, even if only partially: it produced primary products for the exterior and had as a ruling class capitalist entrepreneur who aimed at profit, although slave labor relations and a social structure formally organized in castes, in a “manorial-slave order” or “slave capitalism” (SAFFIOTI, 1976, p.16, our translation). The full constitution of the capitalist mode of production in Brazil would have taken place in the post-abolition period, with the generalization of salaried work. This conception is also similar to formulations by Fernandes (1976), Cardoso (1977) and Ianni (1962).After the end of colonization, “a new form of dependency was consolidated,essentially translating into the commercial ties that tied the country to the hegemonic center of the Western bloc at the time”, at first England (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p.86, our translation). After the crisis of the agro-export economy that culminated in the Revolution of 30, industrialization would have transformed Brazilian capitalism into an urban-industrial capitalism, capable of growing economically, but within the “limits allowed by the logic of the international capitalist system”; that is, asdependent capitalism (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p. 88, our translation). With the “exhaustion of the import substitution process” (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p. 87, our translation), in the 1950s, and in a context of redefinition of the International Division of Labor,[...] Brazil suffers massive penetration of foreign investments. From the point of view of the dependency relationship, the fundamental change is that it will progressively be characterized more as technological and capital than commercial. Step by step, what is usually called the internationalization of the internal market takes shape (SAFFIOTI; ACKERMAN,1973,p.87, our translation).For Saffioti(2013; 1985) dependence is a constant in the Brazilian social formation, going through colonization, the Empire and the Republic, and assuming different conformations during each of these periods. What they would have in common would be the defining aspects of dependency economic subordination and the penetration of capitalism from the outside, heteronomy.It was possible to verify that, according to the materials to which we had access during the research, the term dependent capitalism, typical of the Marxist Theory of Dependency, is
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158186cited textually for the first time by Saffioti in a text from 1973, followed by a footnote criticism, calling it “unsatisfactory” and then referencing texts by Francisco Weffort and Fernando Henrique Cardoso (SAFFIOTI; ACKERMAN, 1973, p. 12). Already in texts from the 1980s (SAFFIOTI, s/d; 1985), Saffioti uses the term without reservations, especially in an article from 1985. However, the reference is to Fernando Henrique Cardoso's idea of dependent-associated capitalism:Ifto this intersection of gender and class contradictions one adds the fact that Brazil has been penetrated from the outside by capitalism, only being able to develop “associated capitalism”, dependent on the hegemonic center of the international capitalistsystem, the situation of women will aggravate even more(SAFFIOTI, 1985, p.137, our translation).In this excerpt from a text from 1985 there is something curious. While citing Cardoso's theory, Saffioti presents the conclusions of the Marxist Theory ofDependency. Cardoso was part of another theoretical current that also sought to think about Latin American dependency (CARDOSO; FALETTO, 1984). However, for this current, it is fully possible to overcome the condition of dependence within capitalism, given the favorable context and the correct relations between classes and groups. Saffioti, however, reaffirms that the only possible capitalism in Brazil is dependent capitalism, as do authors such as Ruy Mauro Marini and Vânia Bambirra. This position is present in several passages:[...] Countries peripherally integrated into the international capitalist system are subject, by virtue of their condition as dependents, to seeing their independence efforts diminished, if not practically annulled (made possible by certain international conjunctures) in times of recomposition of the aforementioned world system (SAFFIOTI, 2013, p.223, our translation).[...] the survivals of the Brazilian “traditional society” do nothing but help the historical realization of capitalism in Brazil in the way allowed by the condition of a country peripherally integrated into the international capitalist system (SAFFIOTI, 2013, p.343, our translation).[...] there is no room for the hypothesis that, in the near or remote future, the societies in which the “peripheral” realizations of capitalism take place today will reach development, understood as the realization of the macro-structural type towards which they tend(SAFFIOTI, 1973, p.161, our translation).These ideas are not present in most of the USP school of sociology, of which Cardoso is an exponent, and in most of the authors cited by Saffioti. However, they are present in Florestan Fernandes (1975) especially his mature phase and would not be foreign to Saffioti, who lived directly with the formulators of the Marxist branch of dependency. She fully recognizes this influence in interviews, also referring critically toFernando Henrique Cardoso:
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158187H.S.: [in response to a question about ECLAC's influence] After the [1973] coup in Chile, I had a lot of contact with people who had gone into exile in Chile and when there was the coup against Allende they went to Mexico. They were Vânia Bambirra, her husband at the time, Dr. Theotônio dos Santos, Ruy Mauro Marini, I went to Mexico a lot at that time. So, I knew everything about ECLAC, but before [that time in the 1970s; during the writing of A Mulher na Sociedade de Classes (Woman in the society of classes)]? It could only have been Fernando Henrique and Ruth (Cardoso) because when they lived in Chile, their library was at my house. I don't like him, so much so that I never voted for him. The other day there was a tribute from feminists to Ruth and they asked me to speak and I gave him some hits! I said that I would like to talk about what Ruth was not, not because she couldn't, but because she didn't want to. She didn't want to be a star. But she did honest and correct research.Why? Because FHC and Serra plagiarized Ruy Mauro Marini's dependency theory. And how do I know this? Precisely because Theotônio dos Santos, Vânia and Ruy Mauro were exiled in Mexico and I used to go there a lot (SAFFIOTI, 2008, p. 289, our translation).This very close coexistence with the listed authors is also mentioned in Bambirra (1991, p. 79), where Vânia calls Heleietha “friend” and narrates experiences they had together, including the beginning of the partnership organization of a book in Cuba, of interviews and reflections on women and the socialist revolution in Latin America, for which Saffioti would make the introduction, but which was never published (BAMBIRRA, 1991).In any case, Saffioti shared with the group the skepticism regarding the possibilities of overcoming dependency within capitalism and regarding what dependent capitalist development could offer workers. This is reflected profoundly in their way of understanding gender oppression: just as, for the Marxist authors of dependency, the fundamental problems of the Latin American masses were derived from capitalism and not from its absence and capitalist development meant more dependency ; for Saffioti, women's oppression in modernity was neither the fruit of pre-capitalism nor a holdover from earlier modes of production, but precisely fueled by capitalist development, and more capitalism could only mean more oppression for working women. More than anything, the political conclusions that flow from A Mulher na Sociedade de Classes(2013) are like an anti-developmentalist and socialist feminist manifesto, aimed at “dispelling the idea [sic] that the development of capitalism constitutes the solution to the female problem” (SAFFIOTI, 1979, p. 12, our translation).
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158188Gender relations under dependent capitalism, according to SaffiotiThe awareness of the dependency in which, since its beginnings, the capitalist economic-social formation has been constituted in Brazil and of the limits that the international structure of power imposes to its realization in the levels reached by the societies of mass consumption constitutes the starting point for the understanding of the social roles that men and women have been playing in Brazilian society since its beginnings (SAFFIOTI, 2013, p. 229, our translation).In her work, Saffioti is concerned with describing and explaining gender oppression in contemporary capitalism, resorting to the history of the social formations that compose it. Her effort is to capture the general determinations of female subordination in modernity, valid for all capitalist social formations; and their particular determinations, which vary as a result of the history and specific economic and cultural characteristics of each people and location, and, mainly, of the position occupied by these social formations in capitalist accumulation at a global level, that is, in the International Division of Labor. This is where the articulation between gender relations and dependency comes into play (SAFFIOTI, 2013).For the sociologist, the phenomenon of female oppression cannot be understood only in its ideological and cultural dimension it is about unraveling which social mechanisms enable the continued reproduction of this oppression and which material interests drive these mechanisms. In this sense, the root of sexism under capitalism would be in the marginalization or peripheral integration of women to this mode of production and the benefits that the system itself and the main stakeholders in its maintenance, the bourgeois class would reap from this situation (SAFFIOTI, 2013; 1973).There are noticeable differences in the way in which the author formulates this question throughout her work. However, in general, Saffioti accentuates the incapacity and lack of interest that the capitalist mode of production would have in transforming all people from the subordinate classes into workers directlysubordinated to capital: responsible for adding new value to capital or making it more profitable, in relations of work where the product of toil does not belong to its producer or its producer, but to the capitalist. The foundation of this inability would be, firstly, in the tendency of capital to incorporate a smaller proportion of labor power, in relation to the means of production, as the development of the productive forces makes possible an equal or greater production of goods at the same time with fewer female workers and employed workers. On the other hand, the mass of unemployed or workers in non-capitalist production relations such as artisanal and peasant production and the provision of individual services would serve as a reserve army for directly capitalist production, which could be
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.158189absorbed in moments of growth, contribute to the lowering of wages and rights of workers in the capitalist sectors, or provide a type of exploitation that benefits these sectors even though it is located outsidethem (SAFFIOTI, 2013; 1978).Female oppression, by displacing large numbers of women into domestic work within the home, unemployment, or non-capitalist labor relations, would protect the system from stresses that it could not withstand if all its dispossessed members were to claim a place in the formal capitalist labor market this would explain the maintenance and promotion of this oppression by capital. Furthermore, resorting to the naturalization of social relations represented by sexism would divert criticism from the system, identifying its failures as natural disabilities of certain groups (SAFFIOTI, 2013).In her texts from the late 1960s and early 1970s, especially A Mulher na Sociedade de Classes([1969] 2013), Saffioti dwells primarily on the role that female confinement to domestic work, reproduction and socialization in home would have to avoid making explicit the contradictions of capitalism; reinforcing that such a system would have encouraged this confinement as its development had made it increasingly do without female productive work. For this, the author resorts to the comparison between the participation of women in the production of goods during and before the advent of the capitalist mode of production. In this context, Saffioti also highlighted how bourgeois society would only allow working women to perform paid work outside the home if they met certain conditions extreme economic need, favorable marital status and youth and even so, maintaining unpaid work in the home.During this period of her work, dependency appears as a factor that sharpens the material foundation of female oppression in capitalism peripheral integration into the productive system in dependent countries, to enable, on the other hand, an attenuation of this same determinant in central countries. This attenuation would explain “the greater number of freedoms enjoyed by women in highly developed countries” (SAFFIOTI, 2013, p. 193, our translation). For Saffioti (2013, 1973), however, it would be exactly the subordination and transfer of wealth from peripheral countries to central countries that made this difference possible. The author then rules out the possibility of universalizing these benefits for women in imperialist countries the greater female participation in the economically active population and the greater number of reproductive rights for the entire capitalist world.With regard to Brazil, Saffioti recovers the history of social formation to highlight how, as in the case of changes, the economic and social permanencies arising from the colonial period are accompanied by permanencies in tradition and culture. Thus, the heavy sexism and racism of the slave society necessary for the economic and social reproduction of such an order,
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581810based on the dominant role of the patriarch landowner and on the exploitation and dehumanization of black men and women in the face of national subordination to the world capitalist market , would continue present for the new role that it would play in a capitalist society in “full constitution” and dependent that, for the author, expelled women from the public economy and was built with the combination of modern and archaic forms of exploitation that, never contradictory, sustained each other. He also exposes the data onthe reduction of female participation in the secondary sector from the end of the 19th century to the middle of the 20th century as proof of his thesis of the accentuated jettisoning of women from capitalist production in dependent countries: in his opinion, caused mainly by the phenomenon of importation intense use of “labor force saving” foreign technology (SAFFIOTI, 2013, p. 335-340).And, in this way, the marginalization of the female workforce, often explained almost exclusively in terms of prejudice and remnants of a “traditional society” and the small degree of economic development, is presented as a result of the full constitution of capitalist relations of production [...]. The justifications for the domestic standard of women provided by the “traditional mentality” do not constitute, from this angle, backward factors for the Brazilian economy and delaying its development. On the contrary, even in the phase in which the level of employment could be higher and, consequently, greater use of female labor, the condition of a country with a dependent economy determined an underutilization of the workforce factor in Brazil. The marginalization of huge female contingents from the productive system of goods and services evidently favored capitalist accumulation (SAFFIOTI, 2013, p. 341-343, our translation).In these terms, Saffioti outlines how the specific situation of women under dependent capitalism marginalized by a structure incapable of outsourcing its contradictions or solving its problem of excess labor would require more brutal and explicit ideological tools of female domination. This would be the case of Latin American machismo:[...] in underdeveloped areas in general, and especially in Latin American nations, the cultural complex of machismo, ostensibly prevailing, exposes the subordinate position of women more crudely. This does not mean, in any way, that macho behavior is responsible for the reduced female participation in the economically active population of these countries, but rather that the techniques of domination of women and the justifications for their expulsion from the labor market are more rude and less refined than in developed nations (SAFFIOTI, 1973, p.154, our translation).From the mid-1970s, in a context of relative advancement in female employment in central countries, Saffioti began to be more intensely concerned with the issue of articulation between the capitalist mode of production and non-capitalist labor relations, reflecting on how the female marginalization of the productive structure could also be expressed in its more
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581811significant presence in these sectors of the economy (SAFFIOTI, 1976; 1977; 1978). In dependent countries, these “pre-capitalist pockets” have a “much greater relative weight” in the economy (SAFFIOTI, 1977, p. 33, our translation).For the author, critical of Poulantzas' (1972 apud SAFFIOTI, 1977) conceptions in this regard, the coexistence between different modes of production in the same social formation is impossible. What is verified, however, is the subordination of non-capitalist production relations to the dynamics of the capitalist mode of production, with these losing their autonomy and depending on the needs of the latter to reproduce. Capitalism would constantly recreate such non-capitalist relations of production within itself, precisely because the exchange with them would benefit it, allowing greater exploitation (or expropriation) of workers in these sectors, without worrying about guaranteeing their reproduction. On the other hand, in periods of expansion, the capitalist sectors could absorb this workforce for whose “formation it never made any investment” (SAFFIOTI, 1977, p. 29). This would be the case of reproductive work within the family:The services which are carried out, generally by women in the family, are destined to the daily production of the worker's labor power, as well as the reproduction of this labor power. Although this labor is dedicated to the production of a commodity labor power which is indispensable to the functioning of the capitalist mode of production, organization within the family group does not assume a capitalist, that is contractual, form(SAFFIOTI, 1977, p.33, our translation).[…] Since it is not a capitalist enterprise, the family invests in the production of labor-power a commodity on the labor market without any monetary compensation. In other words, the family (above all its female members) produces a commodity which it cannot commercialize. […] The worker who is produced in this way will only benefit those who, being owners of a capitalist enterprise, are able to offer him a job. The price of producing and reproducing labor power does not fall within capitalist society's accounting system. […](SAFFIOTI, 1977, p.33, our translation).In this way, the permanent production of the conditions which permit the reproduction of capital strictly depends on an institution the family in which personal relations and domestic production are predominant. By means of the unpaid mobilization of labor, especially of female labor, this institution is more economical than any other for the purpose of supplying capitalism with the labor power it needs(SAFFIOTI, 1977, p.31, our translation).Therefore, the family would be an institution highly adapted and functional to the capitalist mode of production not despite, but especially because of the fact that it is not organized along capitalist lines.
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581812Unpaid domestic work would not, however, be the only “pre-capitalist pocket” through which capital could benefit from the accentuated exploitation of female labor. According to Saffioti (1977, p. 33, our translation), in the central countries, “given the very economic and political hegemony exercised by these regions, women have far greater opportunities to perform economic activities organized within capitalist norms”. However, in the dependent countries, there is a myriad of activities organized in a non-capitalist way being constantly produced by the enormous concentration of income and by the smaller capacity of absorption of labor force of the dependent capitalist sectors. These activities are present in the countryside and in the urban environment in this, the author identifies them as having more expressionin the service sector, especially the “low tertiary sector”, where many women are concentrated who would have “no alternative [...] the pursuit of economic activities in sectors not organized along capitalist lines” (SAFFIOTI, 1978, p. 187, our translation). A sector that aroused the author's greatest interest, both due to its almost total female composition and its growth in dependent Latin American countries, was domestic employment (paid) the subject of her book Employment Domestic and Capitalism(Emprego doméstico e capitalismo-1978). The sociologist explains and defines the relationships involved in this type of work:[...] the activities carried out by maids in private homes are not characterized as capitalist. Indeed, they are not subjugated to capital, but are remunerated directly from personal income. The same domestic services performed in bars, restaurants, hotels, are included in the capitalist sector of the economy, subordinating its agents directly to capital. This difference is crucialto characterize domestic servants' activities as non-capitalist, even though they were engendered by capitalism. Remunerated by personal income, housemaids perform tasks whose «product», goods and services, are consumed directly by the employing family, not circulating in the market for the purpose of exchange with the aim of profit(SAFFIOTI, 1978, p.191, our translation).Domestic servants nowadays largely black would be responsible, especially in dependent capitalism, for part of the biological and social reproduction of large sections of the population and are, therefore, indispensable to the logic of the system. However, their exploitation would not take place in typically capitalist ways, which would allow precarious conditions to hit them harder. Saffioti also identified them as part of the reserve army, “mobilizable for work in the capitalist sector of economic activities” when necessary (SAFFIOTI, 1978, p. 191, our translation).
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581813At the time of writing, Marxist feminism in the US and Europe was going through what was later known as the domestic work controversy3. The role of domestic work in capitalism was briefly discussed. Saffioti emphasized that the focus of this debate, however, was on the unpaid domestic work performed by housewives in the home the central countries did not have a significant sector of paid domestic services (SAFFIOTI, 1978, p. 193).In dependent countries, and especially in Brazil, the situation was completely different: the concentration of income made it possible for women from the upper classes to hire poor women, thus outsourcing the domestic functions that society entrusted them with. These poor women, in turn, were pushed into paid work outside the home by sheer economic necessity and the high cost of living characteristic of dependent countries; without, however, finding space in the capitalist sectors of economic activities. They submitted themselves, therefore, to a type of occupation with low pay and where all sorts of violations of rights took place. In this way, the “dependent character of the development of Brazilian capitalism” (SAFFIOTI, 1978, p. 192, our translation) determined a specific way of carrying out domestic work, and a wide concentration of women in activities not organized along capitalist lines that was the mainstay of their minor rights in the political, labor and reproductive spheres, and also machismo, understood as a particular form of sexist ideology under dependence. Overcoming this condition presupposed a complete change in the country'sproductive and economic structure that reversed the high levels of unemployment and income concentration in other words, overcoming dependence. The magnitude of domestic employment in Latin American countries is also explained as a particular determination of dependent capitalist development by Vânia Bambirra (n.d.).Finally, there is the issue of productive female work under dependent capitalism and its particular determinations. The census carried out by the IBGE in 1970 and in the following decades showed a very expressive growth in female employment in almost all areas, but mainly those linked to capitalist industry. Although the themes of female industrial employment, its instability and low wages had already been addressed in other works by Saffioti(1978; 2013), in the 1980s they gained greater centrality in his explanatory framework. In Female workforce: inside the figures (Força de trabalho feminina: no interior das cifras-1985), Saffioti presents her theorization on the symbiosis between patriarchy and capitalism, analyzing the interconnections between production and reproduction. In this regard, there is a strong influence 3A critical synthesis of this debate is in Ferguson (2020).
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581814of the French materialist feminist current on the formulations of Heleieth Saffioti, represented by authors such as DanièleKergoat, Dàniele Combes and Monique Haicault.According to the feminist sociologist, there is an intersection between reproduction and production that makes reproduction present in production and production present in reproduction in other words, class relations cross the family and social relationsof sex also cross the terrain of capitalist production. Both patriarchy and capitalism would have an economic, social and cultural dimension, reproducing themselves, however, as a single system. In this sense, “women in the sphere of reproduction and men in the sphere of production cannot be separated, since both are social agents in both domains, reproducing the sexual division of labor in both spheres” (SAFFIOTI, 1985, p. 103, our translation). Women's association with reproduction would be reflected in their exploitation both inside and outside the home and family.By verifying, concomitantly with the process of expansion of female industrial employment in Brazil, an intense increase in salary discrimination between men and women and their concentration in the lowest positions in the factories, Saffioti associates dependent capitalism not only with the greater magnitude of the not-capitalists sectors and the precariousness of women's work that is verified in them, but also with the highest degree of exploitation experienced by working women (especially poor and non-white) in dependent countries, in relation to women in central countries, in the sector itself economy capitalist. These, moreover, begin to share their insertion in the productive system with their insertion in unpaid work at home, accumulating two workdays or else, other salaried women, domestic servants with even lower wages. On all sides, dependent capitalism would mark the experience of women's oppression in Brazil.Given the patriarchy-capitalism symbiosis, however, the goal of profit maximization is mediated by male supremacy. And it is in this way that, through the subordination of women to men and the priority allocation of women to the reproduction apparatus, patriarchy-capitalism guarantees, simultaneously, the reproduction of the working family and exploits the female workforce to a more intense degree, when needed and in the proportions needed[…].As long as the patriarchy-capitalism system lasts, men and women will never be socially equal. As a result, the incorporation of the female workforce will always have specific characteristics, in which all sorts of discrimination can be recognized (SAFFIOTI, 1985, p.138, our translation).The theme of the symbiosis between patriarchy and capitalism and, even more so, between patriarchy, capitalism and racism will be further explored in the book The Power of the male(O Poder do macho -1987) and in later works by Heleieth Saffioti.
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581815Final considerations: the peripheral symbiosisSaffioti set out to describe and explain the peculiarities of gender oppression in peripheral countries in most of her work. However, discussions about the unity between production and reproduction, and about the mutual determination between gender and dependence, began to become increasingly scarce from the 1980s onwards; so that few Latin American authors elaborated theories in this sense after Saffioti until before the beginning of the 2000s. This picture has changed recently, with the resurgence of Marxist-feminism and the rescue of the Marxist Theory of Dependency and the work of Saffioti.Thus, it has been emphasized how categories such as transfer of value, division between spheres of circulation, sub-imperialism, enlargement of relative overpopulation and mainly overexploitation of work helps to explain the distinctive traits of gender relations under dependency, if articulated with a feminist-Marxist theoretical framework, with authors such as Díaz Lozano and Féliz (2020), Teixeira andZorgetz (2020), Costa andNogueira (2019), Bittencourt (2014), Cecenã (1983). AccordingTeixeira andZorgetz (2020):In the [Latin American] continent and in dependent countries in general, women tend to be domestic reproduction workers and also wage earners or participate in some labor activity in the public sphere. This distortion has a direct impact on the conditions of family reproduction and, therefore, brings direct costs to the increased exploitation of women in the domestic sphere, their weight in specific layers of the reserve army, as well as the need to fulfill double or triple shifts (TEIXEIRA; ZORGETZ, 2020, our translation).Bittencourt (2014, p. 68, our translation) emphasizes how women's work in Latin America is characterized by “a greater intensity of the productive rhythm, lower remuneration, occupation in marginalized positions or underemployment, double working hours” and female responsibility for “functions that should be provided by the Welfare State (daycare centers, education, care, laundries, restaurants)”. These workers, in turn, are mostly black or indigenous.In this sense, Saffioti contributes to the apprehension of the Latin American reality in its entirety, avoiding the fragmentation between oppressions and capitalist exploitation, instead, resorting to the contradictory and complex unity between social reproduction and production. Saffioti contributes decisively to this by thinking of a symbiosis and then “knot” between patriarchy, racism and capitalism that manifests itself in a particular way on the periphery of this single system.The contributions of the current (Marxist) Theory of Social Reproduction (SRT) continue in this direction, arguing that it is not exactly a question of three or more oppressions with their own logic of domination and economic exploitation, which co-determine and merge.
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581816Incorporating critiques from black, queer, and other feminisms, SRT argues that, in reality, it is the contradictory relationship between capitalist accumulation and social reproduction that sediments the foundations of exploitation and all forms of oppression: “From the point ofview of capital, the social reproduction of the workforce is simultaneously indispensable and an obstacle to accumulation” (VOGEL, 2013, p. 156, our translation). Both unpaid domestic work at home and the exploitation of the low value of female labor in the productive sphere are moments of this relationship, of the capitalist need to simultaneously produce and erode life. Feminine oppression in modernity, then, is related to the systemic devaluation of social reproduction by capital reproduction which, in turn, is demarcated as a female responsibility. Non-patriarchal spaces of reproduction, such as families headed by black women or LGBT people, or female dormitories in factories, are also essential to the logic of capitalist accumulation, as well as extralar female work: the heteronormative family form is predominant due to its high efficiency in producing an exploitable life in a generational and cheap way. But sexism, racism, LGBTphobia and class domination are products and (re)producers of the same material matrix (FERGUSON, 2020; LEWIS, 2016).The articulation between Saffioti's thought, MTD and SRT constitutes a powerful theoretical tool that has still been little explored as a whole. Such a conjunction can reveal, for example, that the experience of female workers in dependent capitalism is marked by an overexploitation of work, which is characterized by an even more deleterious appropriation of their life fund, since, in addition to receiving a payment of their workforce, which is lower than their real value, like most male Latin American workers, this real value is already lower than that of men due to its historical and social determinants; and furthermore, their time of rest and replenishment of energy is constantly used for the work of producing and reproducing their own workforce to be exploited by dependent and international capital.In addition to the reproduction of the labor force exploited directly by capital, these women workers are placed as an obligation or moral duty to reproduce the lives of large sectors of the bourgeoisie and petty bourgeoisie itself through domestic employment; and, above all, the reproduction of a relative overpopulation greater than that in central countries, mostly composed of women, children, black and indigenous people, and LGBT people groups systematically eliminated by state and civil violence in our region, in the service of dependent capitalist accumulation. Overexploitation itself and its intensification which is expressed not only in less access to individual consumer goods, but also in the reduction of collective consumer goods offered by the State , added to the magnitude of the population that is outside directly capitalist production, determines an extremely precarious social reproduction for
image/svg+xmlPeripheral symbiosis: Gender and dependency in Heleieth Saffioti’s thinkingEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581817working people in Latin America and the Caribbean which, as Bhattacharya (2019) points out is capable of producing intense violence against women and other people with whom the reproduction of life is associated, precisely because the latter are blamed for thesystem's inabilities.Finally, the issues of division between spheres of circulation and the very high concentration of income in the subcontinent are manifested in gender “split experiences” among people who belong to the same gender or sexual identity from the upper classes upper strata of the petty-bourgeoisie and bourgeoisie and these same of the working population; more intensely than in central countries. The contrast between the bourgeois woman and the non-white working women responsible for thesocial reproduction of the family in the first way domestic employment is the most illustrative example.ACKNOWLEDGEMENTS: to CNPq, for funding the research, from 09/2020 to 09/2021.REFERENCESBAMBIRRA, V. Memorial. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1991.BAMBIRRA, V. A propósito del “Año Internacional de la Mujer”. s/d (mimeo).BHATTACHARYA, T. Explicando a violência de gênero no neoliberalismo. Marx e o Marxismo, v.7, n.12, jan./jun. 2019.BITTENCOURT, N.A. Gênero, trabalho e direito na América Latina: a superexploração das mulheres trabalhadoras nos países dependentes. 2014. 106f. Monografia de Graduação Faculdade de Direito, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2014.CARDOSO, F.H.Capitalismo e escravidão no Brasil meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul.2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.CARDOSO, F.H.; FALETTO, E. Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica. 7. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1984.CECEÑA, A.E. Fuerza de trabajo femenina y explotación capitalista. Cuadernos CIDAMO, México, n. 11, 1983. COSTA, R.G.; NOGUEIRA, L.A. Os elementos estruturantes do capitalismo na América Latina e as mulheres. Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais, 16., 2019, Brasília. Anais[...].Brasília, DF: CBAS, 2019. Available: https://broseguini.bonino.com.br/ojs/index.php/CBAS/issue/view/1. Access: 29 Oct. 2021.DÍAZ LOZANO, J.A.D.; FÉLIZ, M. Reproducción de la vida, superexplotación y organización popular enclave feminista: una lectura desde Argentina. Cuestiones de
image/svg+xmlSylvia IASULAITIS e Gustavo GUIMARÃESEstudos de Sociologia, Araraquara,v. 27, n. 00, e022028, 2022. e-ISSN: 1982-4718DOI:https://doi.org/10.52780/res.v27i00.1581818Sociología, n.23, e101, 2020. Available: https://www.cuestionessociologia.fahce.unlp.edu.ar/article/view/CSe101. Access: 24 Oct. 2022.DOS SANTOS, T. Teoria da dependência: balanço e perspectivas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.FERGUSON, S.J. Women and Work: Feminism, Labour, and Social Reproduction. Londres: Pluto Press, 2020.FERNANDES, F. Capitalismo dependente e classes sociais na América Latina.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975.FERNANDES, F. A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica.Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1976.FURTADO, C. Formação Econômica do Brasil. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1959.IANNI, O. As metamorfoses do escravo: apogeu e crise da escravatura no Brasil meridional.São Paulo: DIFEL, 1962.LEWIS, H. The Politics of Everybody: Feminism, Queer Theory and Marxism at the Intersection. Londres: Zed Books, 2016. MARINI, R.M. Desenvolvimento e dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005a.MARINI, R.M. Dialética da dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: vida e obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005b.MARINI, R.M. Sobre a Dialética da Dependência. In: MARINI, R.M.; STEDILLE, J.P.; TRASPADINI, R. Ruy Mauro Marini: Vida e Obra. São Paulo: Expressão Popular, 2005c.MARINI, R. M. A crise do desenvolvimentismo. In: CASTELO, R.(org.). Encruzilhadas da América Latina no século XXI. Rio de Janeiro: Pão e Rosas, 2010.ONU MULHERES. Região da América Latina e do Caribe é a mais violenta do mundo para mulheres, diz ONU. 22 nov. 2017. Available: http://www.onumulheres.org.br/noticias/regiao-da-america-latina-e-do-caribe-e-a-mais-violenta-do-mundo-para-as-mulheres-diz-onu/. Access: 08 Apr. 2020.PRADO JR., C. A revolução brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1966.SAFFIOTI, H.I. B. Trabalho Feminino e Capitalismo.In:CONGRESS OF ETHNOLOGICAL AND ANTHROPOLOGICAL SCIENCES, 9., 1973,Chicago. Proceedings[…]. Chicago,1973.SAFFIOTI, H. I. B. Women, Mode of Production, and Social Formations. Latin American Perspectives, v. IV, n.12-13, 1977.
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