Quem propaga a pós-verdade? A disseminação de discursos negacionistas e de fake news por grupos fundamentalistas religiosos no Brasil
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023021, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17140 10
arbitrária de supostas verdades tidas como incontestes e cuja origem defendem provir do
sagrado revelado, restrito a uns poucos escolhidos, pertencentes à denominação em questão.
Tais agrupamentos ideológicos-religiosos colocam-se terminantemente indispostos ao
procedimento do diálogo interreligioso e à possibilidade de consenso. Pois, para eles, o Outro
é tido como herege, demoníaco, ameaçador, impuro, cuja crença é ilegítima e corruptiva e que,
portanto, deve ser combatida através de uma batalha espiritual.
De acordo com Brenda Carranza (2009), “Evocar o fenômeno é sinônimo de equacionar
fanatismo, radicalismo, terrorismo e guerra santa, embora cada termo represente realidades
complexas, históricas e conceituais diferentes” (p. 149).
Os grupos fundamentalistas religiosos que se destacam no contexto brasileiro atual são
os evangélicos neopentecostais ultraconservadores que, paulatinamente, vem ganhando espaço
na esfera pública e assumindo um caráter institucional, representando um perigo real para a
sustentação de um Estado laico. Tais grupos, comumente, se arvoram em argumentos retirados
das escrituras sagradas, da forma que melhor lhes convém, apelando para interpretações
radicais, que se aproximam mais do Antigo Testamento do que do evangelho libertário de Jesus
Cristo. São caracterizados por atacarem outras formas de manifestações religiosas, com as quais
não compactuam. Interferem na política e na Comissão dos Direitos Humanos, aspiram intervir
na orientação sexual íntima dos seus fiéis e da sociedade como um todo e frequentemente
espalham Fake News e fazem acusações levianas, tais como a inculpação falsa da
implementação de uma “ideologia de gênero” nas escolas públicas. A não aceitação da
alteridade, a abolição do respeito, as práticas intolerantes, a pretensão de submeter os outros às
suas vontades e verdades radicais são artifícios que gradativamente tem se intensificado. Nesse
sentido, “É o dualismo que impregna a concepção de vida do indivíduo, do grupo, do
movimento fundamentalista, não aceitando meio-termo ou outras formas de moral e tradição”
(CARRANZA, 2009, p. 150-151).
A tendência atual do campo religioso brasileiro aponta para o fortalecimento dos
fundamentalismos, para o acirramento das disputas por influência e conta com a decorrente
intensificação da intolerância religiosa, comprometendo a liberdade de crença.
Os fundamentalistas frequentemente postulam falsas verdades, entendidas como pós-
verdades, bem como apresentam interpretações tendenciosas dos textos sagrados, que induzem
ao radicalismo. Os receptores dos discursos fundamentalistas, não raro, assumem
irrefletidamente a falsidade dessas mensagens, sem contestação, se tornando posteriormente os