Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796 1
GÊNERO E TRABALHO: PODE O EMPREENDEDORISMO SER UM MEIO PARA
O EMPODERAMENTO DAS MULHERES?
GÉNERO Y TRABAJO: ¿PUEDE EL EMPRENDIMIENTO SER UM MEDIO PARA EL
EMPODERAMIENTO DE LAS MUJERES?
GENDER AND WORK: CAN ENTREPRENEURSHIP BE A MEANS FOR WOMEN
EMPOWERMENT?
Mayco Lima da SILVA1
e-mail: maycosilva2010@hotmail.com
Laura Senna FERREIRA2
e-mail: laurasennafe@hotmail.com
Como referenciar este artigo:
SILVA, M. L.; FERREIRA, L. S. Gênero e trabalho: Pode o
empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das
mulheres? Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00,
e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718. DOI:
https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796
| Submetido em: 01/03/2023
| Revisões requeridas em: 29/09/2023
| Aprovado em: 22/10/2023
| Publicado em: 30/12/2023
Editora:
Profa. Dra. Maria Chaves Jardim
Editor Adjunto Executivo:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria RS Brasil. Doutorando no Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais.
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria RS Brasil. Doutorado em Sociologia pelo
Programa de s-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Professora no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFSM).
Gênero e trabalho: Pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das mulheres?
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796 2
RESUMO: Diante do aumento significativo da precarização do trabalho o empreendedorismo
se propagou como alternativa para os trabalhadores. Para as mulheres, ele procurou representar
um meio para o empoderamento e para a superação das tradicionais barreiras do mercado de
trabalho. A presente pesquisa analisa a relação entre empreendedorismo, empoderamento e
desigualdades de gênero no trabalho, indagando acerca do papel que o empreendedorismo
ocupa na reprodução ou superação das desigualdades de gênero. Para tal, analisamos a partir de
pesquisa documental um caso concreto onde a gestão empresarial aponta o empreendedorismo
como meio para o empoderamento e para a superação das barreiras de gênero no mercado de
trabalho. Concluímos que o empreendedorismo pode emergir como alternativa de
sobrevivência e como meio de empoderamento individual, podendo promover algumas
melhorias individuais em determinadas condições de vida, mas jamais como meio de
empoderamento coletivo e de transformação das estruturas de poder.
PALAVRAS-CHAVE: Empreendedorismo. Empoderamento. Gênero e trabalho.
RESUMEN: Ante el aumento significativo de la precarización del trabajo, el emprendimiento
se propagó como alternativa para los trabajadores. Para las mujeres, buscó representar un
medio para el empoderamiento y para la superación de las tradicionales barreras del mercado
de trabajo. La presente investigación analiza la relación entre emprendimiento,
empoderamiento y desigualdades de género en el trabajo, indagando acerca del papel que el
emprendimiento ocupa en la reproducción o superación de las desigualdades de género. Para
ello, analizamos a partir de una investigación documental un caso concreto donde la gestión
empresarial señala el emprendimiento como medio para el empoderamiento y la superación de
las barreras de género en el mercado laboral. Concluimos que el emprendimiento puede surgir
como alternativa de supervivencia y como medio de empoderamiento individual, pudiendo
promover algunas mejoras individuales en determinadas condiciones de vida, pero nunca como
medio de empoderamiento colectivo y de transformación de las estructuras de poder.
PALABRAS CLAVE: Emprendimiento. Empoderamiento. Género y trabajo.
ABSTRACT: Faced with the significant increase in the precariousness of work,
entrepreneurship has spread as an alternative for workers. For women, it sought to represent
a means for empowerment and for overcoming traditional labor market barriers. This research
analyzes the relationship between entrepreneurship, empowerment and gender inequalities at
work, inquiring about the role that entrepreneurship plays in reproducing or overcoming
gender inequalities. To this end, based on documentary research, we analyzed a concrete case
where business management points to entrepreneurship as a means for empowerment and for
overcoming gender barriers in the labor market. We conclude that entrepreneurship can
emerge as an alternative for survival and as a means of individual empowerment and may
promote some individual improvements in certain living conditions, but never as a means of
collective empowerment and transformation of power structures.
KEYWORDS: Entrepreneurship. Empowerment. Gender and work.
Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
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Introdução
A partir dos anos 1970 uma série de transformações na sociedade e no mundo do
trabalho marcaram o início da etapa flexível da acumulação capitalista. Nessa nova etapa, a
flexibilização do trabalho e dos trabalhadores acarretaram um significativo aumento da
precarização do trabalho. Esse processo foi acompanhado pelo crescimento da participação
feminina no mercado de trabalho, principalmente em ocupações precárias e informais. É nesse
contexto que o empreendedorismo se propagou como alternativa para os trabalhadores
enfrentarem os velhos e novos desafios do mundo do trabalho. Para as mulheres trabalhadoras,
o empreendedorismo procurou representar um meio para o empoderamento e para a superação
das tradicionais barreiras encontradas por estas no mercado de trabalho.
O presente trabalho tem por objetivo analisar a relação entre empreendedorismo,
empoderamento feminino e desigualdades de gênero no mundo do trabalho. Essa análise nos
permitirá indagar acerca do papel que o empreendedorismo ocupa na reprodução das
desigualdades de gênero ou na superação de tais desigualdades a partir de suas possibilidades
emancipatórias.
Na seção que se segue a introdução apresentamos uma síntese das transformações
ocorridas no mundo do trabalho a partir da década de 1970 visando compreender o contexto em
que o empreendedorismo emerge como alternativa para os trabalhadores. Na sequência,
analisamos um caso concreto onde o discurso empresarial aponta o empreendedorismo como
um meio para o empoderamento feminino e para a superação das tradicionais barreiras
encontradas pelas mulheres no mercado de trabalho. Para isso, empregamos como técnica de
produção de dados a pesquisa documental, tratando como documentos o livro escrito pela
fundadora da Mary Kay Inc., Mary Kay Ash, intitulado The Mary Kay Way: o estilo de
liderança de uma das maiores empreendedoras norte-americanas e as mídias digitais da Mary
Kay Brasil e os conteúdos nelas presentes. Foram analisadas 277 postagens feitas durante o ano
de 2020 no Instagram principal da empresa no Brasil, além do website da empresa no país. Por
fim, nas considerações finais, realizamos uma reflexão acerca das possibilidades
emancipatórias dessa forma de inserção laboral.
Gênero e trabalho: Pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das mulheres?
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As transformações no mundo do trabalho e a emergência do empreendedorismo
A partir da segunda metade da década de 1960 e durante a década de 1970, a acumulação
capitalista, caracterizada pela organização da produção no modelo taylorista/fordista e por uma
organização da economia nacional pautada pelo keynesianismo, entra em estado de crise. Essa
crise se porque o modelo então vigente passa a apresentar dificuldades em conter as
contradições inerentes ao modo de produção capitalista, e por, consequentemente, seu modo de
dominação societal passar por constantes questionamentos que colocam em xeque sua
legitimidade (HARVEY, 2008; ANTUNES, 2009). Como resposta a essa crise, a partir dos
anos 1970 teve início, no centro da economia capitalista global, um processo de reestruturação
produtiva e econômica, e reajustamento político e social pelo qual o capital se reorganizou.
No período em questão, uma série de intelectuais, entre eles sociólogos, passaram a
debater acerca da centralidade do trabalho e da classe trabalhadora na sociedade
contemporânea
. Entre aqueles que defendiam o fim da centralidade do trabalho e aqueles que
defendiam sua continuidade, o que há de comum é a compreensão de que o mundo do trabalho
passava por uma série de transformações. Para David Harvey (2008) essa série de
transformações marca a passagem capitalista para um novo regime de acumulação, ainda dentro
do capitalismo, que o autor denominou de acumulação flexível.
Esse processo de reestruturação e reajustamento pelo qual o capital se reorganizou,
conforme indicado por autores como o citado Harvey (2008) e Ricardo Antunes (2009),
ocorreu por meio de diversas transformações na sociedade e no mundo do trabalho. O capital
financeiro consolidou o seu domínio sobre a economia; a informatização e a racionalização do
processo produtivo por meio do incremento da alta tecnologia e de novas formas de controle e
gerência como a horizontalização em redes da estrutura da empresa e a gerência
participativa, onde o controle da qualidade da produção se pelos próprios trabalhadores no
ato de trabalho deram origem ao toyotismo
. Aumento da produtividade e intensificação do
trabalho foi o caminho que o capital trilhou para reafirmar seu domínio, e o resultado foi o
aumento do desemprego, do subemprego e com eles as mais variadas facetas do trabalho
informal e precário e das terceirizações. Por meio de uma política neoliberal de
desregulamentação de leis trabalhistas e de enfraquecimento de políticas sociais, o capital
Esse debate pode ser representado em seus dois posicionamentos opostos a partir das obras Adeus ao proletariado
de André Gorz (1982) e Adeus ao trabalho? de Ricardo Antunes (2006).
O toyotismo é uma forma de organização do trabalho. Entre suas características destacam-se: o sistema de
organização e gestão do trabalho just-in-time, a política de qualidade total, o trabalho em equipe, o alto grau de
tecnologia empregado e a terceirização produtiva (RIBEIRO, 2015).
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implementou seu projeto de reestruturação produtiva e econômica e de reajustamento político
e social, constituindo, assim, o modelo de acumulação capitalista caracterizada por Harvey
(2008) como acumulação flexível
, como mencionado anteriormente. Como consequência
do aumento da produtividade e em contrapartida à redução do emprego fabril, o capital buscou
promover medidas no sentido de acelerar seu tempo de giro, o que possibilitou o crescimento
do setor dos serviços e, conjuntamente, do proletariado dos serviços.
Entre 1980 e 2008, o setor de serviços “cresceu o seu peso relativo em 30,6%,
respondendo atualmente por dois terços de toda a produção nacional, enquanto
os setores primário e secundário perderam 44,9% e 27,7%, respectivamente,
de suas participações relativas no PIB”. Essas transformações ocorridas no
interior da dinâmica da acumulação capitalista acabaram por afetar a
composição da força de trabalho. [...] Foi essa significativa ampliação dos
serviços que reconfigurou a classe trabalhadora no Brasil (ANTUNES, 2018,
p. 135).
Esse crescimento do setor de serviços não aconteceu apenas no sentido do aumento do
número de trabalhadores empregados formalmente em estabelecimentos do ramo do comércio.
Parte desse crescimento também se deve ao crescimento do número de trabalhadores
subempregados, trabalhadores informais, terceirizados, autônomos, empreendedores
“burgueses-de-si-próprio e proletários-de-si-mesmo” nas palavras do sociólogo Ricardo
Antunes. Estes, na grande maioria dos casos, desenvolvem suas atividades sem proteção social
e trabalhista, desenvolvem trabalho desregulamentado ou com flexibilização regulamentada por
mecanismos que buscam ocultar o caráter precário do trabalho realizado. Antunes (2018, p.
139) demonstra como, no Brasil, durante os anos 1990 houve uma redução drástica no número
de empregos formais, seguida nos anos 2000 pela criação de “21 milhões de postos de trabalho,
dos quais 94,8% recebiam uma baixa remuneração”.
Assim como o trabalho passou por transformações, também o próprio trabalhador
precisou se adequar ao novo mundo que se constituía. Essa mudança concernente ao perfil ideal
do trabalhador favoreceu o aumento da participação feminina na força de trabalho, utilizada
preferencialmente em trabalhos precarizados e informais. O trabalhador típico dessa nova etapa
de acumulação é o trabalhador flexível, que se caracteriza pelo trabalho sem remuneração fixa
constituindo novas formas de assalariamento e remuneração vinculadas à produtividade;
sem direitos trabalhistas, nem jornadas de trabalho determinadas previamente sendo, muitas
Essas características que marcam a acumulação flexível e que se desenvolveram a partir do setor industrial,
naquilo que ficou conhecido como toyotismo, não ficou limitada ao setor produtivo industrial, mas se expandiu
também para outros setores.
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vezes, a jornada determinada por metas a serem cumpridas. Não há, ainda, uma divisão espacial
entre local de trabalho e local de não-trabalho, o que faz com que se apague a diferença entre
tempo e local de trabalho e tempo e local de não-trabalho. Espera-se deste trabalhador que ele
seja polivalente, multifuncional, qualificado, participativo e engajado. Parte desse processo de
participação inclui atribuições como a de pensar o trabalho e o desempenho tendo em vista a
maximização do tempo e o aumento da produtividade funções que, no taylorismo, eram
atribuídas exclusivamente à gerência.
Sob o ponto de vista da distinção de gênero, as estatísticas mostram que está
em processo uma incorporação de mulheres em atividades com jornadas
insuficientes, isto é, 39 horas semanais ou menos. [...] São especialmente
mulheres que, com o aumento da renda média na sociedade, passaram a vender
mercadorias como roupa, perfumaria, itens de beleza, calçados, coisas usadas
etc. Muitas delas não são efetivamente autônomas, são assalariadas
dissimuladas de autônomas. No campo da perfumaria e beleza, essa prática é
bem conhecida e muito utilizada por Avon, Jequiti, Natura e inúmeras outras
empresas nacionais e internacionais. [...] São autônomos, por conta própria,
autoempregados a serviço de grandes empresas. [...] como regra geral, os
contratos não são formalizados e os trabalhadores são entendidos como
sujeitos autônomos que trabalham por conta própria e por próprio risco (DAL
ROSSO, 2017, p. 243).
O referido conjunto de transformações afetaram o mundo do trabalho de forma
profundamente destrutiva do ponto de vista das condições de trabalho e dos direitos dos
trabalhadores. É nesse contexto de condições de vida e trabalho, e como resposta a essa
situação, para “tentar ‘amenizar’ esse flagelo”, que, conforme apontado por Antunes (2018, p.
44), o discurso empresarial propaga como alternativa “um novo subterfúgio: o
‘empreendedorismo’, no qual todas as esperanças são apostadas e cujo desfecho nunca se sabe
qual será”, constituindo, como apontado anteriormente, uma massa que é uma “mescla de
burguês-de-si-próprio e proletário-de-si-mesmo”. Tal alternativa busca ocultar, por meio do
mito do trabalho autônomo e desregulamentado, as formas de seu assalariamento.
A definição do que é o empreendedorismo e quem e o que é o empreendedor não é
inteiramente consensual. Antes do advento do neoliberalismo, a noção de empreendedor se
confundia com a noção de empresário salvo, talvez, que o primeiro, além de ser um
proprietário como o segundo, deveria também prover de um espírito inovador e criativo
.
Porém, a partir da reestruturação produtiva iniciada em torno da década de 1970, e a partir do
surgimento do neoliberalismo, a noção de empreendedorismo passou por uma ressignificação
Ver, por exemplo, a definição de Schumpeter (1997) onde o empreendedor é aquele responsável pelo que o autor
chamou de ‘destruição criativa’.
Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
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onde a propriedade privada deixou de ser um requisito para ser empreendedor. Desse modo, a
noção de empreendedor se descolou da noção de empresário.
A nova noção de empreendedorismo aceita uma diversidade de modos de empreender.
A mudança no significado da noção de empreendedor provocada pelo neoliberalismo não
apenas permitiu que todos, mesmo aqueles que não são detentores da propriedade privada,
possam empreender, como colocou o empreendedorismo como algo a ser desejado por todos.
A substituição da defesa de que todos podem ser empresários, pela concepção
de que todos podem empreender, procura retirar de questão a necessidade da
propriedade privada como índice de comprovação do sucesso profissional e
pessoal (AMORIM; MODA; MEVIS, 2021, p. 7).
Em um artigo intitulado Empreendedorismo: uma forma de americanismo
contemporâneo?, Henrique Amorim, Felipe Moda e Camila Mevis (2021) defendem a tese de
que o empreendedorismo é uma forma de americanismo contemporâneo. Ou seja, assim como
o americanismo, o empreendedorismo seria um ‘modo de vida hegemônico’ de uma dada
‘formação social’. Ao estudar o fordismo, Gramsci (2007) observou que esse modelo de
organização do processo produtivo era acompanhado por um modo de vida específico que
formava um tipo de homem adequado a esse tipo de produção. O modo de vida “estrutura a
forma de viver dos trabalhadores nos seus mais variados aspectos [nos hábitos, no agir, no
pensar, nos valores, etc.], como algo que se verifica materialmente em práticas sociais dentro e
fora dos ambientes de trabalho” (AMORIM; MODA; MEVIS, 2021, p. 2). Sendo assim, o modo
de vida está diretamente vinculado com a formação da subjetividade do trabalhador
subjetividade essa que agora passa a se guiar pela lógica do mercado e da concorrência nas mais
distintas esferas da vida, ou conforme afirmam Dardot e Laval (2016, p. 133), no capitalismo
neoliberal temos a “valorização da concorrência e da empresa como forma geral da sociedade”.
É nesse sentido que Amorim, Moda e Mevis (2021, p. 8) entendem o empreendedorismo atual
como a “síntese de um novo modo de vida, representativo da sociedade neoliberal” constituída
e consolidada a partir da década de 1970: “o empreendedorismo se impõe como a atual e
hegemônica forma de se viver no capitalismo” (AMORIM; MODA; MEVIS, 2021, p. 10).
O empreendedorismo ressignificado não necessitando mais que se seja um
proprietário e entendido agora como um modo de vida, produz nos trabalhadores a ideia de
que eles próprios são uma empresa. Os trabalhadores seriam, portanto, empresários-de-si-
Richard Sennett (2006, p. 72) em seu livro intitulado A cultura do novo capitalismo observa que no capitalismo
contemporâneo, que aqui estamos tratando como neoliberal, houve uma “mudança no sistema de valores da cultura
como um todo, conferindo prestígio moral cada vez menor à estabilidade”.
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mesmos, o sujeito empresarial ou, ainda, o homem-empresa de Dardot e Laval (2016). Segundo
os autores, esse sujeito é aquele que internaliza a lógica empresarial e passa a exercer sobre si
mesmo o controle que no taylorismo a gerência exercia sobre os trabalhadores.
É nesse contexto de crescimento do setor de serviços, de aumento do trabalho informal
e precário, de constituição do trabalhador flexível como modelo ideal do novo mundo do
trabalho, de propagação do empreendedorismo como alternativa e de ampliação do trabalho
feminino, que surge a Mary Kay Inc. Por ser uma das maiores empresas no seu ramo em nível
mundial e por ser uma empresa que, como veremos no tópico a seguir, em seu discurso está
presente a defesa e a promoção do empreendedorismo feminino como meio para o
empoderamento das mulheres, escolhemos a empresa como exemplo concreto e expressão
importante do discurso empresarial que associa o empreendedorismo ao empoderamento
feminino. Portanto, no tópico a seguir buscamos demonstrar como o discurso da empresa
compreende o empreendedorismo feminino e qual o papel que a empresa atribui a ele.
O discurso empresarial e a promoção do empreendedorismo como meio para o
empoderamento das mulheres
A Mary Kay é uma empresa de cosméticos e produtos de cuidados com a pele fundada
no ano de 1963 por Mary Kay Ash e que chegou ao Brasil no ano de 1998. Ela é, no mundo,
uma das três maiores empresas do setor de vendas diretas de cosméticos e produtos para a pele.
Com seus quase 60 anos no mercado, a empresa possui uma força de vendas formada por mais
de 3,5 milhões de pessoas, sendo em sua gigantesca maioria mulheres, distribuídas em mais de
40 países
.
Como vimos, o crescimento da Mary Kay se deu em um contexto econômico mais
amplo que, entre outras características, é marcado (1) pelo crescimento do setor de serviços, (2)
pelo crescimento da participação das mulheres no mercado de trabalho, e também (3) pela
propagação do empreendedorismo como alternativa para os trabalhadores e também como
objeto de desejo. Chamamos de objeto de desejo na medida em que, atualmente, o
empreendedorismo não é apenas uma das poucas alternativas para uma grande parcela dos
trabalhadores o chamado empreendedorismo por necessidade , mas também é visto como
algo bom, almejado, que, como vimos, a flexibilidade se tornou um dos principais elementos
constituintes do trabalho no mundo contemporâneo.
As informações foram retiradas do website da Forbes. Disponível em: https://www.forbes.com/companies/mary-
kay/?sh=2f970d1b2bc9. Último acesso em: 17 jun. 2021.
Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
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A empresa, que adotou o Sistema de Vendas Diretas (SVD) como meio para
comercializar seus produtos, possui, no mundo, mais de 3,5 milhões de pessoas constituindo a
Força de Vendas Independente Mary Kay forma como é chamado o conjunto de consultoras
que são responsáveis por realizar as vendas dos produtos da marca. No Brasil, o número é de
mais de 440 mil consultoras atuando em todo o território nacional
. O SVD é descrito pela
Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas (ABEVD), entidade na qual a Mary Kay
é associada no Brasil, como “um sistema de comercialização de produtos e serviços por meio
do relacionamento entre empreendedores independentes e seus clientes, fora de um
estabelecimento comercial fixo”
. É justamente devido à forma como se realizam as vendas,
ou seja, por meio do SVD, que as mulheres que integram a Força de Vendas Independente Mary
Kay são caracterizadas como empreendedoras pelo discurso da empresa.
Além de caracterizar suas consultoras como empreendedoras, a Mary Kay também
evidencia que o desenvolvimento do empreendedorismo feminino é um dos seus maiores
objetivos e um dos seus principais pilares. Conforme relata a própria fundadora, em seu livro
intitulado The Mary Kay Way: o estilo de liderança de uma das maiores empreendedoras norte-
americana (ASH, 2013), a empresa foi criada com o objetivo de oferecer às mulheres “uma
excelente oportunidade para [...] ganharem tanto dinheiro quanto suas capacidades
permitissem” (ASH, 2013, p. 167). Em sua trajetória profissional, M. K. Ash vivenciou diversas
dificuldades encontradas pelas mulheres no mercado de trabalho. Conforme ela relata, essas
dificuldades encontradas tinham como motivo o simples fato dela ser mulher. Como um
exemplo de tais dificuldades, Ash cita os salários inferiores àqueles recebidos pelos homens, a
desvalorização de suas habilidades e a falta de oportunidades para satisfazer o potencial que
possuía. Foram essas dificuldades que motivaram Mary Kay Ash a fundar a Mary Kay Inc.,
uma empresa por meio da qual pretendia criar uma oportunidade ilimitada às mulheres para que
estas não tivessem de sofrer o que ela sofreu no mercado de trabalho.
Portanto, na empresa fundada por Mary Kay e que leva o seu nome, a busca pelo lucro,
característica inerente a qualquer empresa, deveria ser compatível, segundo a mesma, com a
valorização do trabalho feminino. A empresa enxerga o empreendedorismo feminino como um
importante meio para o empoderamento das mulheres e para a superação das dificuldades
tradicionalmente encontradas por elas no mercado de trabalho. O empoderamento feminino
O número de consultoras no Brasil foi retirado do próprio website da empresa. O levantamento é do ano de 2016.
Disponível em: https://www.marykay.com.br/pt-br/about-mary-kay/press-room/press-releases/2016/aniversario-
mary-kay-brasil. Último acesso em: 20 dez. 2022.
Disponível em: https://www.abevd.org.br/sobre-vendas-diretas/. Último acesso em: 18 jun. 2021.
Gênero e trabalho: Pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das mulheres?
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como um objetivo e um valor da Mary Kay Inc. pode ser exemplificado a partir da frase a
seguir, retirada do website da empresa no Brasil referindo-se à criadora da marca, M. K. Ash:
“Ela mudou o mundo dos negócios, criando mais oportunidades para as mulheres, construiu
uma empresa guiada por seus valores e empoderou as mulheres, colocando-as no controle de
seu próprio futuro”. É através do empreendedorismo feminino que as mulheres estariam livres
de qualquer empecilho motivado pelo gênero que fosse encontrado no tradicional mercado de
trabalho, e poderiam conquistar o sucesso profissional a partir de seus próprios méritos.
Depois de experimentar a desigualdade no local de trabalho, ela [M. K. Ash]
sabia que tinha que fazer uma mudança, não para si, mas para todas as
mulheres. Em 1963, Mary Kay Ash lançou o seu negócio transformando o
local de trabalho até então dominado pelos homens. Uma agente de mudanças
e uma empresária inovadora, Mary Kay Ash dedicou sua vida a capacitar as
mulheres e colocá-las no controle de seus próprios futuros (Retirado do
website da Mary Kay Brasil [online]).
Essa perspectiva, de que o empreendedorismo feminino representa um meio através do
qual as mulheres podem empoderar-se, parece atualizar alguns já conhecidos posicionamentos,
como o feminismo liberal e também do feminismo marxista economicista, onde a emancipação
das mulheres se daria com o ingresso dessas na vida pública e no mercado de trabalho. A figura
abaixo é composta por diversas publicações retiradas do Instagram da empresa no Brasil e
demonstram a conexão, que acabamos de nos referir, entre empoderamento e
empreendedorismo.
Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796 11
Figura 1 Empoderamento e empreendedorismo
Fonte: Perfil da Mary Kay Brasil no Instagram. Acesso em 17 jun. 2021
A partir da compreensão de que o empreendedorismo é um meio para o empoderamento
feminino, a empresa se coloca, então, como um meio para o desenvolvimento da prática
empreendedora entre mulheres, como uma ferramenta de suporte profissional para que as
mulheres alcancem o sucesso no mercado de trabalho (ver figuras 2 e 3). No perfil oficial da
Mary Kay Brasil na rede social Instagram
, é possível encontrar postagens, conforme os
exemplos das figuras abaixo (ver figuras 2 e 3), onde a empresa divulga essa oportunidade de
empreender com os produtos da marca. Nas postagens que acompanhamos, realizadas durante
todo o ano de 2020, é explícita a conexão direta que é estabelecida pelo marketing da empresa
entre ser revendedora dos produtos da marca, ou seja, integrar a força de vendas da Mary Kay,
e ser empreendedora (ver figuras 2 e 3).
Disponível em: https://www.instagram.com/marykaybrasil/. Acesso em 12 jun. 2021.
Gênero e trabalho: Pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das mulheres?
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Figura 2 Pioneira no empreendedorismo feminino
Fonte: Perfil da Mary Kay no Instagram. Acesso em 17 jun. 2021
Figura 3 Ferramentas necessárias para o sucesso
Fonte: Perfil da Mary Kay no Instagram. Acesso em 17 jun. 2021
Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
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Nas redes sociais da empresa a defesa e promoção do empreendedorismo Mary Kay
como oportunidade de sucesso e como meio para a realização de sonhos pessoais são
constantes. Conforme divulgado em uma de suas publicações (ver figura 3), a Mary Kay
forneceria o suporte e ferramentas necessárias para o sucesso. Um outro exemplo está presente
na Figura 4, onde diz que “o seu negócio independente [...] terá o tamanho que você decidir”.
Portanto, o empreendedorismo Mary Kay é apresentado pela empresa como uma oportunidade
de negócio simples e lucrativo (ver figura 3), onde a empresa teria a fórmula, ou ferramentas,
como diz uma das postagens, para o sucesso das suas consultoras (ver figura 3). Mary Kay Ash,
fundadora da empresa, serve, no caso em questão, como um exemplo de sucesso: alguém que,
por mérito próprio, conquistou o sucesso através do empreendedorismo e que agora, com a
fórmula para o sucesso desvendada, criou uma empresa que tem por objetivo servir como
suporte para que outras mulheres possam atingir o sucesso profissional por meio do
empreendedorismo, assim como ela (ver figuras 2, 3, 4 e 5).
Figura 4 Negócio independente Mary Kay
Fonte: Perfil da Mary Kay no Instagram. Acesso em 17 jun. 2021
Sendo assim, a imagem que a empresa procura passar através do conteúdo presente em
suas redes sociais é a de que a Mary Kay Inc. não é uma produtora e comercializadora de
cosméticos e produtos para o cuidado com a pele, ao menos não só. Essa atividade de produção
e comercialização desenvolvida pela empresa seria apenas o meio através do qual a empresa
Mesmo que a imagem esteja disponível no Instagram oficial da Mary Kay Brasil, optamos por ocultar o rosto
originalmente presente.
Gênero e trabalho: Pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das mulheres?
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coloca em prática seu verdadeiro negócio e objetivo: vender a fórmula que permite às mulheres
o sucesso profissional e a realização de sonhos individuais (ver figuras 3, 4 e 5). Como vimos,
essa fórmula é o empreendedorismo feminino, que permitiria às mulheres alcançarem o sucesso
profissional que a elas é dificultado no mercado tradicional de trabalho devido às barreiras
impostas pela discriminação e pela desigualdade de gênero resultantes do modo como se
configura a divisão sexual do trabalho em nossa sociedade.
Figura 5 Fórmulas para alcançar o sonho
Fonte: Perfil da Mary Kay no Instagram. Acesso em 10 fev. 2021
Conforme colocado por Helena Hirata e Danièle Kergoat (2007), a divisão sexual do
trabalho coloca homens e mulheres em uma relação de conflito acerca da forma como se
dividirá e organizará o trabalho. Essa forma de divisão do trabalho possui dois princípios
fundamentais: o princípio da separação e o princípio da hierarquia. O primeiro distingue os
mais variados trabalhos em trabalhos de homem e trabalhos de mulher; o segundo atribui maior
prestígio social àqueles trabalhos que foram, por meio do princípio da separação, designados
aos homens. Os princípios da separação e da hierarquização têm como desdobramento a
inferiorização social e marginalização das relações sociais de produção do contingente feminino
da população. Portanto, a divisão sexual do trabalho designa os homens ao trabalho produtivo,
valorizado e reconhecido socialmente, e os liberta das obrigações com o trabalho doméstico, ao
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passo que incumbe às mulheres a responsabilidade pelo trabalho doméstico reprodutivo. Ao
ingressar no mercado de trabalho, no mundo profissional, as mulheres passam a enfrentar uma
dupla jornada de trabalho, isto é, o acúmulo do trabalho doméstico e o emprego. Se, na esfera
doméstica, o trabalho reprodutivo realizado por estas mulheres é um trabalho não pago, no
espaço público as mulheres se encontram marginalizadas das relações de produção. Elas
ocupam os empregos mais precários, tendo suas capacidades, competências e habilidades
desvalorizadas e recebendo salários inferiores àqueles recebidos pelos homens, que sua renda
é vista como complementar a dos maridos, pois a partir da divisão sexual do trabalho cabe aos
homens o papel de sustento da família e às mulheres a realização do trabalho doméstico
reprodutivo (BIROLI, 2018). É nesse sentido que a Mary Kay seria uma empresa que gera
oportunidades para que as mulheres consigam, através de seus méritos, atingir o sucesso
profissional sem sofrer com estes problemas, decorrentes da discriminação e da desigualdade
de gênero, tradicionalmente encontrados por elas no mercado de trabalho.
Como as consultoras são vistas como empreendedoras, a lógica da meritocracia e da
livre concorrência está impregnada em toda a estrutura da empresa, o que cria um mecanismo
onde a empresa se protege de determinadas críticas ou contestações em relação ao trabalho e
transfere às consultoras a responsabilidade por suas situações. A empresa comunica à força de
vendas a forma como funciona o sistema de comissões, prêmios, reconhecimentos, promoções
etc., “com essa informação básica disponível a todos de maneira convincente, não se justificam
as acusações de que cometemos alguma injustiça”, afirma a fundadora da empresa (ASH, 2013,
p. 228). Portanto, no plano de carreira da Mary Kay, conforme idealizado pela empresa, nada,
além do próprio desempenho, impede o crescimento profissional das consultoras.
Na força de vendas independente da Mary Kay, um indivíduo pode crescer e
progredir sem subir tradicionalmente na carreira. Milhões de Consultoras de
Beleza operam negócios independentes que lidam diretamente com as
clientes. Cada consultora de Beleza Independente define suas próprias metas,
produtividade e recompensas. Uma expressão dessa responsabilidade é o
papel de Diretora de Vendas Independente. Ela é a pessoa que constrói uma
equipe, educa e guia as outras Consultoras de Beleza Independentes (ASH,
2013, p. 35).
Como empreendedora, ou seja, como dona do seu próprio negócio, a empresa visa
vender a ideia de que o resultado será fruto do mérito. Portanto, bastaria que as consultoras
colocassem dedicação e empenho, que trabalhassem muito para obter sucesso. Tudo isso reforça
a ideia de que a Mary Kay torna possível às mulheres o sucesso profissional e a realização de
sonhos individuais através da oportunidade de empreender. Na medida em que se é seu próprio
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chefe, que, por ser empreendedora, trabalha para si mesma, somente ela é responsável pelo
seu sucesso ou fracasso profissional. Se obteve sucesso, foi consequência de seus esforços, de
sua dedicação, de seu mérito; se fracassou, a culpa também é sua. É construída, então, a ideia
de que a empreendedora precisa trabalhar o máximo possível para obter sucesso, que ela
trabalha para ela mesma, e o seu sucesso só depende de seus esforços e o fruto do seu trabalho
pertence somente a ela. Essa ideia pode ser resumida em: se ela fracassa, é porque não trabalhou
o suficiente, não se dedicou o suficiente, ou seja, é sua culpa e é preciso que se esforce mais.
Sempre vi a força de vendas independente como um microcosmo do sistema
de livre empreendedorismo americano. Independente da idade, gênero,
religião, raça, educação ou experiência de trabalho, qualquer pessoa que passa
a ser Consultora de Beleza Independente Mary Kay entra no negócio no
mesmo nível de outras Consultoras de Beleza Independentes. Ela se torna
literalmente presidente de sua própria empresa. Nós a auxiliamos dando as
ferramentas que podem ajudá-la a ter sucesso. No verdadeiro espírito do livre
empreendedorismo, cada mulher ganha com seu negócio aquilo que está
disposta a investir. Ela é seu próprio chefe, e ninguém diz a ela quando ou
como trabalhar. Se ela tem iniciativa e se baseia na experiência disponível
para auxiliá-la, ela poderá rapidamente criar um negócio de sucesso (ASH,
2013, p. 184).
Como na lógica do neoliberalismo os empreendedores são os responsáveis por seus
sucessos e fracassos, o que se percebe é, ao menos no discurso, a prevalência da lógica da
meritocracia, onde os empreendedores-de-si competem em um mercado e aquele que melhor
aproveitar as oportunidades e tomar as melhores ações obterá sucesso. No caso da Mary Kay,
a lógica da meritocracia, intrínseca ao discurso da gestão empresarial por meio da noção de
empreendedorismo, acaba por responsabilizar as mulheres, de forma individual, pelo sucesso
ou fracasso profissional. Evidentemente que esse discurso empresarial desconsidera que o
desempenho de cada consultora não depende apenas de seus esforços, mas também de outros
fatores, como por exemplo a comentada dupla jornada de trabalho feminina que rouba das
mulheres tempo e energia.
A partir dessa concepção, o fracasso seria resultado de fatores individuais, como por
exemplo, a ausência de empenho e dedicação nas atividades. Ou seja, o problema para o não-
sucesso profissional seria culpa das próprias mulheres e não resultado de uma estrutura social
discriminatória que dificulta, quando não impossibilita, a realização profissional das mulheres
trabalhadoras em seu conjunto, de uma estrutura que tem como consequência para as mulheres
a inferiorização social e marginalização do mercado de trabalho. O que parece estar presente
nessa concepção e, ainda, ser contraditório com um discurso de empoderamento feminino, é
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uma lógica de supervalorização do indivíduo e da ação individual em detrimento do coletivo e
das relações que se constituem em sociedade, mas, conforme David Harvey (2008, p. 158)
observa, essa lógica é típica da sociedade neoliberal. Para o autor, na passagem do capitalismo
para uma etapa de acumulação flexível houve uma “mudança geral das normas e valores
coletivos que tinham hegemonia, [...] para um individualismo muito mais competitivo como
valor central numa cultura empreendimentista que penetrou em muitos aspectos da vida”.
Portanto, no novo empreendedorismo, os trabalhadores se sentem responsabilizados e culpados
pelos seus sucessos e/ou fracassos.
A questão que se coloca aqui não é, necessariamente, a da contradição em um discurso
que alia um individualismo exacerbado com o empoderamento feminino; mas sim, se pode o
empreendedorismo feminino, marcado por um individualismo exacerbado, contribuir para
empoderamento feminino, entendido este como o empoderamento de uma coletividade.
Considerações finais: pode o empreendedorismo ser um meio para o empoderamento das
mulheres?
O termo ‘empoderamento’ tem seu uso demarcado por diversas contradições e conflito.
Uma das principais contradições no seu uso diz respeito ao fato de que esse conceito é moldado
a partir de disputas políticas pelo seu uso.
Por um lado, temos seu uso a partir de uma perspectiva individual, onde o termo faz
referência ao domínio e controle individual e pode ser expresso como autoconfiança e
autoestima. O foco dessa abordagem está no crescimento individual, tirando a questão do poder
da equação (LEON, 2001). Nessa perspectiva, o empoderamento representaria um processo
através do qual o indivíduo se torna mais bem preparado para enfrentar um mercado
competitivo de oportunidades e escolhas (CORNWALL, 2018).
As narrativas de empoderamento a partir de uma perspectiva empresarial e
corporativista, onde se faz presente uma noção individualizada de autoempoderamento através
do mercado, como é o caso da Mary Kay, são denominadas pela professora e antropóloga
Andrea Cornwall (2018), como ‘empoderamento light’. O empoderamento light estaria
centrado no “desejo de capacitar as mulheres a realizarem seu potencial” e seria uma versão de
empoderamento “destituída de qualquer confrontação com as relações sociais e de poder
subjacentes que produzem iniquidades sociais e materiais” (CORNWALL, 2018, n.p.), tendo
seu foco apenas na dimensão econômica do empoderamento. “O empoderamento liberal
procura simplesmente acomodar as mulheres dentro do mercado sem interromper as
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desigualdades sociais e de poder existente [...] o empoderamento light promove a conformidade
dócil” (CORNWALL, 2018, n.p.). Por trás das narrativas do empoderamento light está a ideia
que seria possível empoderar as mulheres engajando-as no mercado.
Falar de “empoderar as mulheres” implica que o poder pode ser transmitido,
e as mulheres são recipientes que podem ser infundidos com ele. Alegações
de estar “empoderando as mulheres”, engajando-as no mercado [como é o
caso da MK], conjuga poder ao dinheiro. A aquisição de dinheiro passa a ter
poderes quase mágicos, como se, uma vez que as mulheres tivessem seu
próprio dinheiro, poderiam sacudir a varinha e, num passe de mágica, fazer
desaparecer as normas sociais, as relações afetivas e as instituições
subjacentes que as constrangem (CORNWALL, 2018, s.p.).
Por outro lado, o empoderamento está associado à coletividade. Ele representa tanto o
processo como o resultado desse processo que tem como objetivo, no caso do empoderamento
das mulheres, questionar a ideologia patriarcal, transformar as estruturas e instituições que
reforçam e perpetuam a discriminação e as desigualdades de gênero, e criar as condições para
que mulheres tenham acesso aos recursos materiais e de informação. Embora ele não
negligencie a importância do empoderamento em um nível individual, o seu foco é na ação
coletiva (SARDENBERG, 2012).
Para nós, feministas, o empoderamento de mulheres, é o processo da conquista
da autonomia, da autodeterminação. [...] implica, para nós, na libertação das
mulheres das amarras da opressão de gênero, da opressão patriarcal. [...] o
objetivo maior do empoderamento das mulheres é questionar, desestabilizar
e, por fim, acabar com a ordem patriarcal que sustenta a opressão de gênero
(SARDENBERG, 2012, p. 2).
Portanto, o empoderamento libertador, conforme chamado por Cornwall (2018) em
oposição ao empoderamento liberal, coloca a questão do poder no centro de um processo
através do qual as mulheres buscam acabar com o patriarcado e conquistar a autonomia e a
autodeterminação.
O empreendedorismo feminino expresso a partir da Mary Kay Inc. parece estar, como
acabamos de ver no tópico anterior, em conformidade com as narrativas que caracterizam o
empoderamento light, pois se faz presente no caso por nós analisado, uma noção
individualizada de autoempoderamento através do mercado, ou seja, uma noção de
empoderamento focada na dimensão econômica e individual que não questiona as estruturas de
poder e exploração que resultam na inferiorização social da mulher e em sua marginalização
das relações sociais de produção. Nessa perspectiva, é através dos próprios esforços, da busca
por uma solução individual, que as mulheres trabalhadoras devem buscar superar as
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dificuldades e as barreiras impostas pela exploração e opressão as quais estão submetidas. Essa
noção de empoderamento pode até promover algumas melhorias na situação das mulheres, de
forma individual, mas não produz qualquer transformação nas relações de poder estrutural que
são produtoras das desigualdades de gênero. Dessa forma, a ideologia neoliberal que marca o
empreendedorismo feminino apropria-se da ideia de empoderamento para esvaziá-la de
qualquer caráter de mudança social e transformação sistêmica e subordiná-la à ordem vigente
capitalista e patriarcal, realizando a sua domesticação. Nesse sentido, se o uso do termo
empoderamento é marcado por disputas políticas, temos concordância com Cornwall (2018,
n.p.) quando esta coloca que “resgatar o empoderamento como uma estratégia feminista exige
reformulá-lo de maneiras que reinscrevam uma preocupação em mudar as relações de poder
estruturais que produzem desigualdade e opressão”.
Por fim, podemos concluir que, em meio às transformações do capitalismo e do mundo
do trabalho, a modalidade de trabalho flexível exemplificada pelo empreendedorismo Mary
Kay, pode emergir como alternativa precária de sobrevivência e como meio de empoderamento
individual a partir de uma perspectiva liberal, podendo a promover algumas melhorias
individuais em determinadas condições de vida, mas jamais como meio de empoderamento
coletivo e de transformação das estruturas de poder, menos ainda de emancipação, entendendo
esta como o status onde o empoderamento foi alcançado em sua plenitude. Portanto, a ideologia
neoliberal apropria-se da ideia de empoderamento para esvaziá-la de qualquer caráter
transformador, subordinando essa noção à ordem vigente e realizando a sua domesticação.
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Mayco Lima da SILVA e Laura Senna FERREIRA
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
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CRediT Author Statement
Reconhecimentos: Não aplicável.
Financiamento: Mayco L. da Silva foi bolsista CAPES durante o período em que realizou
a pesquisa que deu origem a este artigo.
Conflitos de interesse: Não há conflito de interesse.
Aprovação ética: O trabalho respeitou os procedimentos éticos necessários, primando pelo
anonimato e realizando a indicação das fontes e a apresentação do percurso do estudo.
Disponibilidade de dados e material: Os dados estão referenciados no próprio artigo e as
fontes são de acesso público.
Contribuições dos autores: O presente texto é resultado de uma pesquisa desenvolvida por
Mayco L. da Silva durante o curso de Mestrado em Ciências Sociais. Tal pesquisa contou
com a orientação da Profa. Dra. Laura S. Ferreira. A produção textual deste artigo foi uma
colaboração dos seus autores.
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
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GENDER AND WORK: CAN ENTREPRENEURSHIP BE A MEANS FOR WOMEN
EMPOWERMENT?
GÊNERO E TRABALHO: PODE O EMPREENDEDORISMO SER UM MEIO PARA O
EMPODERAMENTO DAS MULHERES?
GÉNERO Y TRABAJO: ¿PUEDE EL EMPRENDIMIENTO SER UM MEDIO PARA EL
EMPODERAMIENTO DE LAS MUJERES?
Mayco Lima da SILVA1
e-mail: maycosilva2010@hotmail.com
Laura Senna FERREIRA2
e-mail: laurasennafe@hotmail.com
How to reference this paper:
SILVA, M. L.; FERREIRA, L. S. Gender and work: Can
entrepreneurship be a means for women empowerment? Estudos
de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN:
1982-4718. DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796
| Submitted: 01/03/2023
| Revisions required: 29/09/2023
| Approved: 22/10/2023
| Published: 30/12/2023
Editor:
Profa. Dra. Maria Chaves Jardim
Deputy Executive Editor:
Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz
Federal University of Santa Maria (UFSM), Santa Maria RS Brazil. PhD student in the Postgraduate Program
in Social Sciences.
Federal University of Santa Maria (UFSM), Santa Maria RS Brazil. PhD in Sociology from the Postgraduate
Program in Sociology and Anthropology at the Federal University of Rio de Janeiro (UFRJ). Professor in the
Postgraduate Program in Social Sciences (UFSM).
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796 2
ABSTRACT: Faced with the significant increase in the precariousness of work,
entrepreneurship has spread as an alternative for workers. For women, it sought to represent a
means for empowerment and for overcoming traditional labor market barriers. This research
analyzes the relationship between entrepreneurship, empowerment and gender inequalities at
work, inquiring about the role that entrepreneurship plays in reproducing or overcoming gender
inequalities. To this end, based on documentary research, we analyzed a concrete case where
business management points to entrepreneurship as a means for empowerment and for
overcoming gender barriers in the labor market. We conclude that entrepreneurship can emerge
as an alternative for survival and as a means of individual empowerment and may promote
some individual improvements in certain living conditions, but never as a means of collective
empowerment and transformation of power structures.
KEYWORDS: Entrepreneurship. Empowerment. Gender and work.
RESUMO: Diante do aumento significativo da precarização do trabalho o empreendedorismo
se propagou como alternativa para os trabalhadores. Para as mulheres, ele procurou
representar um meio para o empoderamento e para a superação das tradicionais barreiras do
mercado de trabalho. A presente pesquisa analisa a relação entre empreendedorismo,
empoderamento e desigualdades de gênero no trabalho, indagando acerca do papel que o
empreendedorismo ocupa na reprodução ou superação das desigualdades de gênero. Para tal,
analisamos a partir de pesquisa documental um caso concreto onde a gestão empresarial
aponta o empreendedorismo como meio para o empoderamento e para a superação das
barreiras de gênero no mercado de trabalho. Concluímos que o empreendedorismo pode
emergir como alternativa de sobrevivência e como meio de empoderamento individual,
podendo promover algumas melhorias individuais em determinadas condições de vida, mas
jamais como meio de empoderamento coletivo e de transformação das estruturas de poder.
PALAVRAS-CHAVE: Empreendedorismo. Empoderamento. Gênero e trabalho.
RESUMEN: Ante el aumento significativo de la precarización del trabajo, el emprendimiento
se propagó como alternativa para los trabajadores. Para las mujeres, buscó representar un
medio para el empoderamiento y para la superación de las tradicionales barreras del mercado
de trabajo. La presente investigación analiza la relación entre emprendimiento,
empoderamiento y desigualdades de género en el trabajo, indagando acerca del papel que el
emprendimiento ocupa en la reproducción o superación de las desigualdades de género. Para
ello, analizamos a partir de una investigación documental un caso concreto donde la gestión
empresarial señala el emprendimiento como medio para el empoderamiento y la superación de
las barreras de género en el mercado laboral. Concluimos que el emprendimiento puede surgir
como alternativa de supervivencia y como medio de empoderamiento individual, pudiendo
promover algunas mejoras individuales en determinadas condiciones de vida, pero nunca como
medio de empoderamiento colectivo y de transformación de las estructuras de poder.
PALABRAS CLAVE: Emprendimiento. Empoderamiento. Género y trabajo.
Name of the authors
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Introduction
From the 1970s onwards, a series of transformations in society and the world of work
marked the beginning of the flexible stage of capitalist accumulation. In this new stage, the
flexibilization of work and workers led to a significant increase in the precariousness of work.
This process was accompanied by an increase in female participation in the labor market,
mainly in precarious and informal occupations. It is in this context that entrepreneurship has
spread as an alternative for workers to face the old and new challenges of the world of work.
For working women, entrepreneurship has sought to represent a means of empowerment and of
overcoming the traditional barriers they face in the labor market.
The aim of this paper is to analyze the relationship between entrepreneurship, female
empowerment and gender inequalities in the world of work. This analysis will allow us to
investigate the role that entrepreneurship plays in reproducing gender inequalities or in
overcoming them through its emancipatory possibilities.
In the section that follows the introduction, we present a summary of the changes that
have taken place in the world of work since the 1970s in order to understand the context in
which entrepreneurship emerges as an alternative for workers. We then analyze a specific case
in which the business discourse points to entrepreneurship as a means of empowering women
and overcoming the traditional barriers encountered by women in the job market. To do this,
we used documentary research as a data production technique, treating as documents the book
written by the founder of Mary Kay Inc., Mary Kay Ash, entitled The Mary Kay Way: The
Leadership Style of One of America's Greatest Entrepreneurs, and the digital media of Mary
Kay Brasil and the content they contain. 277 posts made during 2020 on the company's main
Instagram in Brazil were analyzed, as well as the company's website in the country. Finally, in
the concluding remarks, we reflect on the emancipatory possibilities of this form of
employment.
Changes in the world of work and the emergence of entrepreneurship
From the second half of the 1960s and throughout the 1970s, capitalist accumulation,
characterized by the organization of production in the Taylorist/Fordist model and by an
organization of the national economy based on Keynesianism, entered a state of crisis. This
crisis occurred because the model in force at the time began to show difficulties in containing
the contradictions inherent in the capitalist mode of production and, consequently, its mode of
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societal domination was constantly questioned, putting its legitimacy in check (HARVEY,
2008; ANTUNES, 2009). In response to this crisis, a process of productive and economic
restructuring and political and social readjustment began at the heart of the global capitalist
economy in the 1970s.
During the period in question, a number of intellectuals, including sociologists, began
to debate the centrality of work and the working class in contemporary society
. Between those
who defended the end of the centrality of work and those who defended its continuity, there
was a common understanding that the world of work was undergoing a series of
transformations. For David Harvey (2008), this series of transformations marks the capitalist
transition to a new regime of accumulation, still within capitalism, which he calls flexible
accumulation.
This process of restructuring and readjustment through which capital reorganized itself,
as indicated by authors such as Harvey (2008) and Ricardo Antunes (2009), took place through
various transformations in society and in the world of work. Financial capital consolidated its
dominance over the economy; the computerization and rationalization of the production process
through the increase in high technology and new forms of control and management - such as
the horizontalization of the company structure into networks and participatory management,
where the quality of production is controlled by the workers themselves in the act of working -
gave rise to Toyotism
. Increased productivity and intensification of work was the path taken
by capital to reaffirm its dominance, and the result was an increase in unemployment,
underemployment - and with them the most varied facets of informal and precarious work - and
outsourcing. Through a neoliberal policy of deregulating labour laws and weakening social
policies, capital implemented its project of productive and economic restructuring and political
and social readjustment, thus constituting the model of capitalist accumulation characterized by
Harvey (2008) as flexible accumulation
, as mentioned above. As a consequence of the increase
in productivity and in contrast to the reduction in factory employment, capital sought to promote
measures to speed up its turnover time, which enabled the growth of the services sector and,
together, of the services proletariat.
This debate can be represented in its two opposing positions in the works Adeus ao proletariado by André Gorz
(1982) and Adeus ao trabalho? by Ricardo Antunes (2006).
Toyotism is a form of work organization. Its characteristics include: the just-in-time work organization and
management system, the total quality policy, teamwork, the high degree of technology employed and production
outsourcing (RIBEIRO, 2015).
These characteristics that mark flexible accumulation and that developed from the industrial sector, in what
became known as toyotism, were not limited to the industrial production sector, but also expanded to other sectors.
Name of the authors
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
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Between 1980 and 2008, the services sector "grew its relative weight by
30.6%, and now accounts for two-thirds of all national production, while the
primary and secondary sectors lost 44.9% and 27.7%, respectively, of their
relative shares in GDP". These transformations within the dynamics of
capitalist accumulation ended up affecting the composition of the workforce.
[...] It was this significant expansion of services that reconfigured the working
class in Brazil (ANTUNES, 2018, p. 135, our translation).
This growth in the service sector has not only been due to an increase in the number of
workers formally employed in commercial establishments. Part of this growth is also due to the
increase in the number of underemployed workers, informal workers, outsourced workers, the
self-employed, entrepreneurs who are "bourgeois-of-themselves and proletarians-of-
themselves" - in the words of sociologist Ricardo Antunes. In the vast majority of cases, these
workers carry out their activities without social and labor protection, they do deregulated work
or work with flexibility regulated by mechanisms that seek to hide the precarious nature of the
work they do. Antunes (2018, p. 139) shows how, in Brazil, during the 1990s there was a drastic
reduction in the number of formal jobs, followed in the 2000s by the creation of "21 million
jobs, 94.8% of which were low-paid".
Just as work underwent changes, the worker himself had to adapt to the new world that
was emerging. This change in the ideal profile of the worker has led to an increase in female
participation in the workforce, preferably in precarious and informal jobs. The typical worker
of this new stage of accumulation is the flexible worker, who is characterized by work without
fixed remuneration - constituting new forms of salaried work and remuneration linked to
productivity; without labour rights, nor working hours determined in advance - often the
working day is determined by targets to be met. There is still no spatial division between the
workplace and the non-workplace, which erases the difference between the time and place of
work and the time and place of non-work. This worker is expected to be multi-skilled, multi-
functional, qualified, participative and engaged. Part of this process of participation includes
tasks such as thinking about work and performance with a view to maximizing time and
increasing productivity - functions that, under Taylorism, were assigned exclusively to
management.
From the point of view of gender distinction, statistics show that women are
being incorporated into activities with insufficient working hours, i.e. 39 hours
a week or less. [...] These are especially women who, with the increase in
average incomes in society, have started selling goods such as clothes,
perfumes, beauty items, shoes, used things, etc. Many of them are not actually
self-employed; they are salaried workers disguised as self-employed. In the
field of perfumery and beauty, this practice is well known and widely used by
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
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Avon, Jequiti, Natura and countless other national and international
companies. [...] They are self-employed, self-employed, self-employed at the
service of large companies. [...] as a general rule, contracts are not formalized
and workers are understood as autonomous individuals who work on their own
account and at their own risk (DAL ROSSO, 2017, p. 243, our translation).
This set of transformations has affected the world of work in a profoundly destructive
way from the point of view of working conditions and workers' rights. It is in this context of
living and working conditions, and as a response to this situation, to "try to 'alleviate' this
scourge", that, as pointed out by Antunes (2018, p. 44, our translation), the business discourse
propagates as an alternative "a new subterfuge: 'entrepreneurship', on which all hopes are
pinned and whose outcome is never known what it will be", constituting, as previously pointed
out, a mass that is a "mixture of bourgeois-of-themselves and proletarian-of-themselves". This
alternative seeks to hide the forms of wage labor through the myth of autonomous and
deregulated work.
The definition of what entrepreneurship is and who and what an entrepreneur is is not
entirely consensual. Before the advent of neoliberalism, the notion of entrepreneur was
confused with the notion of businessman - except perhaps that the former, as well as being an
owner like the latter, should also have an innovative and creative spirit
. However, since the
productive restructuring that began around the 1970s and the emergence of neoliberalism, the
notion of entrepreneurship has undergone a re-signification in which private property is no
longer a requirement for being an entrepreneur. In this way, the notion of entrepreneur became
detached from the notion of businessman.
The new notion of entrepreneurship accepts a diversity of ways of doing business. The
change in the meaning of the notion of entrepreneur brought about by neoliberalism has not
only made it possible for everyone, even those who do not own private property, to undertake,
but has also made entrepreneurship something to be desired by everyone.
The replacement of the defense that everyone can be an businessman with the
conception that everyone can become an entrepreneur seeks to remove the
need for private property as an index of proof of professional and personal
success (AMORIM; MODA; MEVIS, 2021, p. 7, our translation).
See, for example, Schumpeter's (1997) definition where the entrepreneur is responsible for what the author called
'creative destruction'.
Richard Sennett (2006, p. 72) in his book entitled A cultura do novo capitalismo (The Culture of the New
Capitalism) observes that in contemporary capitalism, which we are treating here as neoliberal, there has been a
"change in the value system of culture as a whole, conferring less and less moral prestige on stability".
Name of the authors
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In an article entitled Empreendedorismo: uma forma de americanismo contemporâneo?
(Entrepreneurship: a form of contemporary Americanism), Henrique Amorim, Felipe Moda and
Camila Mevis (2021) defend the thesis that entrepreneurship is a form of contemporary
Americanism. In other words, just like Americanism, entrepreneurship would be a 'hegemonic
way of life' of a given 'social formation'. When studying Fordism, Gramsci (2007) observed
that this model of organizing the production process was accompanied by a specific way of life
that formed a type of man suited to this type of production. The way of life "structures the way
workers live in its most varied aspects [in habits, behavior, thinking, values, etc.], as something
that is materially verified in social practices inside and outside the workplace" (AMORIM;
MODA; MEVIS, 2021, p. 2, our translation). Thus, the way of life is directly linked to the
formation of the worker's subjectivity - a subjectivity that is now guided by the logic of the
market and competition in the most different spheres of life, or as Dardot and Laval (2016, p.
133, our translation) state, in neoliberal capitalism we have the "valorization of competition and
the company as a general form of society". It is in this sense that Amorim, Moda and Mevis
(2021, p. 8, our translation) understand current entrepreneurship as the "synthesis of a new way
of life, representative of neoliberal society" constituted and consolidated since the 1970s:
"entrepreneurship imposes itself as the current and hegemonic way of living in capitalism"
(AMORIM; MODA; MEVIS, 2021, p. 10, our translation).
Entrepreneurship with a new meaning - you no longer need to be an owner - and now
understood as a way of life, produces in workers the idea that they themselves are a company.
Workers would therefore be entrepreneurs-in-themselves, the entrepreneurial subject or even
the company-man of Dardot and Laval (2016). According to the authors, this subject is the one
who internalizes the business logic and begins to exercise the same control over themselves that
in Taylorism, management exercised over the workers.
It is in this context of the growth of the service sector, the increase in informal and
precarious work, the establishment of the flexible worker as the ideal model for the new world
of work, the spread of entrepreneurship as an alternative and the expansion of women's work,
that Mary Kay Inc. emerged. Because it is one of the largest companies in its field worldwide
and because, as we will see in the next section, its discourse defends and promotes female
entrepreneurship as a means of empowering women, we chose the company as a concrete
example and an important expression of the business discourse that associates entrepreneurship
with female empowerment. Therefore, in the following topic we seek to demonstrate how the
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
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company's discourse understands female entrepreneurship and what role the company attributes
to it.
Business discourse and the promotion of entrepreneurship as a means of empowering
women
Mary Kay is a cosmetics and skincare company founded in 1963 by Mary Kay Ash and
which arrived in Brazil in 1998. It is one of the world's three largest companies in the direct
sales sector for cosmetics and skincare products. With almost 60 years on the market, the
company has a sales force of more than 3.5 million people, the vast majority of whom are
women, distributed in more than 40 countries
.
As we have seen, Mary Kay's growth took place in a broader economic context which,
among other characteristics, is marked by (1) the growth of the service sector, (2) the growth
of women's participation in the labor market, and also (3) the spread of entrepreneurship as an
alternative for workers and also as an object of desire. We call it an object of desire insofar as,
today, entrepreneurship is not only one of the few alternatives for a large proportion of workers
- the so-called entrepreneurship by necessity - but it is also seen as something good, something
to be desired, since, as we have seen, flexibility has become one of the main constituent
elements of work in the contemporary world.
The company, which has adopted the Direct Sales System (DSS) as a means of
marketing its products, has more than 3.5 million people worldwide making up the Mary Kay
Independent Sales Force - the name given to the group of consultants who are responsible for
selling the brand's products. In Brazil, there are more than 440,000 consultants working
throughout the country
. DSS is described by the Brazilian Association of Direct Sales
Companies (ABEVD), an organization with which Mary Kay is associated in Brazil, as "a
system for marketing products and services through a relationship between independent
entrepreneurs and their customers, outside a fixed commercial establishment". It is precisely
because of the way sales are made, i.e. through the DSS, that the women who make up the Mary
Kay Independent Sales Force are characterized as entrepreneurs by the company's discourse.
The information was taken from the Forbes website. Available: https://www.forbes.com/companies/mary-
kay/?sh=2f970d1b2bc9. Last access: 17 June 2021.
The number of consultants in Brazil was taken from the company's own website. The survey is from 2016.
Available: https://www.marykay.com.br/pt-br/about-mary-kay/press-room/press-releases/2016/aniversario-mary-
kay-brasil. Last access: 20 Dec. 2022.
Name of the authors
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In addition to characterizing its consultants as entrepreneurs, Mary Kay also states that
the development of female entrepreneurship is one of its main objectives and pillars. According
to the founder herself, in her book entitled The Mary Kay Way: Timeless Principles from
America's Greatest Woman Entrepreneur (ASH, 2013), the company was created with the aim
of offering women "an excellent opportunity to [...] earn as much money as their abilities
allowed" (ASH, 2013, p. 167, our translation). In her professional career, M. K. Ash has
experienced various difficulties encountered by women in the job market. According to her,
these difficulties were due to the simple fact that she was a woman. As an example of these
difficulties, Ash cites lower salaries than those received by men, the devaluation of her skills
and the lack of opportunities to fulfill her potential. It was these difficulties that motivated Mary
Kay Ash to found Mary Kay Inc., a company through which she intended to create unlimited
opportunity for women so that they would not have to suffer what she had suffered in the job
market.
Therefore, in the company founded by Mary Kay and which bears her name, the pursuit
of profit, an inherent characteristic of any company, should be compatible, according to her,
with valuing women's work. The company sees female entrepreneurship as an important means
of empowering women and overcoming the difficulties they traditionally face in the job market.
Female empowerment as an objective and a value of Mary Kay Inc. can be exemplified by the
following sentence, taken from the company's website in Brazil, referring to the brand's creator,
M. K. Ash: "She changed the business world by creating more opportunities for women, built
a company guided by her values and empowered women by putting them in control of their
own future" (our translation). It is through female entrepreneurship that women would be freed
from any gender-based obstacles encountered in the traditional job market and could achieve
professional success on their own merits.
After experiencing inequality in the workplace, she [M. K. Ash] knew she had
to make a change, not just for herself, but for all women. In 1963, Mary Kay
Ash launched her business transforming the previously male-dominated
workplace. An agent of change and an innovative entrepreneur, Mary Kay Ash
dedicated her life to empowering women and putting them in control of their
own futures (Retrieved from the Mary Kay Brasil website [online], our
translation).
This perspective, in which female entrepreneurship represents a means by which women
can empower themselves, seems to update some well-known positions, such as liberal feminism
and also Marxist economic feminism, in which women's emancipation would come about
through their entry into public life and the job market. The figure below is made up of various
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
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posts taken from the company's Instagram in Brazil and demonstrates the connection we have
just mentioned between empowerment and entrepreneurship.
Figure 1 Empowerment and entrepreneurship
Source: Mary Kay Brazil's Instagram profile. Access 17 June 2021
Based on the understanding that entrepreneurship is a means of female empowerment,
the company has positioned itself as a means of developing entrepreneurial practice among
women, as a professional support tool for women to achieve success in the job market (see
figures 2 and 3). On Mary Kay Brasil's official profile on the Instagram social network
, it is
possible to find posts, as shown in the examples below (see figures 2 and 3), where the company
advertises this opportunity to become an entrepreneur with the brand's products. In the posts
we followed, made throughout 2020, the direct connection established by the company's
marketing between being a reseller of the brand's products, i.e. being part of Mary Kay's sales
force, and being an entrepreneur is explicit (see figures 2 and 3).
Available: https://www.instagram.com/marykaybrasil/. Access: 12 June 2021.
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Figure 2 A pioneer in female entrepreneurship
Source: Mary Kay's Instagram profile. Access 17 June 2021
Figure 3 Tools needed for success
Source: Mary Kay's Instagram profile. Access 17 June 2021
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On the company's social networks, there is constant advocacy and promotion of Mary
Kay entrepreneurship as an opportunity for success and as a means of realizing personal dreams.
As stated in one of its publications (see Figure 3), Mary Kay would provide the support and
tools necessary for success. Another example is in Figure 4, where it says that "your
independent business [...] will be as big as you decide". Therefore, Mary Kay entrepreneurship
is presented by the company as a simple and profitable business opportunity (see figure 3),
where the company would have the formula, or tools, as one of the posts says, for the success
of its consultants (see figure 3). Mary Kay Ash, the company's founder, serves, in this case, as
an example of success: someone who, on her own merits, achieved success through
entrepreneurship and who now, with the formula for success unveiled, has created a company
that aims to serve as a support for other women to achieve professional success through
entrepreneurship, just like her (see figures 2, 3, 4 and 5).
Figure 4 Independent Mary Kay business
Source: Mary Kay's Instagram profile. Access 17 June 2021
Thus, the image that the company tries to convey through the content on its social
networks is that Mary Kay Inc. is not a producer and marketer of cosmetics and skin care
products, at least not only. This production and marketing activity carried out by the company
is merely the means by which the company puts its real business and objective into practice:
selling the formula that allows women to achieve professional success and fulfill their
Even though the image is available on the official Mary Kay Brazil Instagram, we have chosen to hide the face
originally present.
Name of the authors
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individual dreams (see figures 3, 4 and 5). As we have seen, this formula is female
entrepreneurship, which would allow women to achieve the professional success that is difficult
for them in the traditional job market due to the barriers imposed by discrimination and gender
inequality resulting from the way the sexual division of labor is configured in our society.
Figure 5 Formulas for achieving the dream
Source: Mary Kay's Instagram profile. Access 10 Feb. 2021
As Helena Hirata and Danièle Kergoat (2007) put it, the sexual division of labour places
men and women in a relationship of conflict over how work will be divided and organized. This
form of division of labor has two fundamental principles: the principle of separation and the
principle of hierarchy. The first distinguishes the most varied jobs into men's work and women's
work; the second attributes greater social prestige to those jobs that have been assigned to men
through the principle of separation. The principles of separation and hierarchization result in
the social inferiorization and marginalization of the female contingent of the population in the
social relations of production. Therefore, the sexual division of labour assigns men to
productive work, which is valued and socially recognized, and frees them from the obligations
of domestic work, while women are responsible for reproductive domestic work. On entering
the job market, in the professional world, women start to face a double working day, i.e. the
accumulation of domestic work and employment. If, in the domestic sphere, the reproductive
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work carried out by these women is unpaid work, in the public sphere they find themselves
marginalized from the relations of production. They occupy the most precarious jobs, their
abilities, skills and competencies are undervalued and they receive lower salaries than men,
since their income is seen as complementary to their husbands', since the sexual division of
labor places men in charge of providing for the family and women in charge of reproductive
domestic work (BIROLI, 2018). It is in this sense that Mary Kay would be a company that
creates opportunities for women to achieve professional success through their merits, without
suffering from the problems of discrimination and gender inequality traditionally encountered
by women in the job market.
As consultants are seen as entrepreneurs, the logic of meritocracy and free competition
is permeated throughout the company's structure, which creates a mechanism whereby the
company protects itself from certain criticisms or challenges to its work and transfers
responsibility for their situations to the consultants. The company communicates to the sales
force how the system of commissions, prizes, recognition, promotions, etc. works. "With this
basic information available to everyone in a convincing way, there is no justification for
accusations that we have committed some injustice," says the company's founder (ASH, 2013,
p. 228, our translation). Therefore, in Mary Kay's career plan, as envisioned by the company,
nothing, apart from their own performance, prevents consultants from growing professionally.
In Mary Kay's independent sales force, an individual can grow and progress
without traditionally moving up the career ladder. Millions of Beauty
Consultants operate independent businesses that deal directly with customers.
Each Independent Beauty Consultant sets her own goals, productivity and
rewards. One expression of this responsibility is the role of Independent Sales
Director. She is the person who builds a team, educates and guides the other
Independent Beauty Consultants (ASH, 2013, p. 35, our translation).
As an entrepreneur, in other words, as the owner of its own business, the company aims
to sell the idea that the result will be the result of merit. Therefore, it would be enough for
consultants to put in dedication and commitment, to work hard to achieve success. All of this
reinforces the idea that Mary Kay makes it possible for women to achieve professional success
and fulfill individual dreams through the opportunity to become entrepreneurs. To the extent
that you are your own boss, since you are an entrepreneur working for yourself, you alone are
responsible for your professional success or failure. If she succeeds, it is the result of her efforts,
her dedication and her merit; if she fails, it is also her fault. The idea is then constructed that
the entrepreneur needs to work as hard as possible to achieve success, since she works for
herself, and her success only depends on her efforts and the fruit of her work belongs to her
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alone. This idea can be summarized as follows: if she fails, it's because she has not worked hard
enough, she has not dedicated herself enough, in other words, it's her fault and she needs to try
harder.
I have always seen the independent sales force as a microcosm of the
American free enterprise system. Regardless of age, gender, religion, race,
education or work experience, anyone who becomes a Mary Kay Independent
Beauty Consultant enters the business on the same level as other Independent
Beauty Consultants. They literally become the president of their own
company. We support her by giving her the tools that can help her succeed. In
the true spirit of free enterprise, each woman earns from her business what she
is willing to invest. She is her own boss, and no one tells her when or how to
work. If she takes the initiative and draws on the experience available to help
her, she can quickly create a successful business (ASH, 2013, p. 184, our
translation).
Since in the logic of neoliberalism entrepreneurs are responsible for their successes and
failures, what we see is, at least in the discourse, the prevalence of the logic of meritocracy,
where the entrepreneurs themselves compete in a market and the one who best takes advantage
of the opportunities and takes the best actions will succeed. In the case of Mary Kay, the logic
of meritocracy, intrinsic to the discourse of business management through the notion of
entrepreneurship, ends up making women individually responsible for their professional
success or failure. Of course, this business discourse disregards the fact that each consultant's
performance depends not only on her efforts, but also on other factors, such as the
aforementioned double working day that robs women of time and energy.
From this point of view, failure would be the result of individual factors, such as a lack
of commitment and dedication to activities. In other words, the problem of professional failure
would be the fault of the women themselves and not the result of a discriminatory social
structure that makes it difficult, if not impossible, for working women as a whole to achieve
professionally, a structure that results in women being socially inferior and marginalized from
the job market. What seems to be present in this conception and is also contradictory to a
discourse of female empowerment, is a logic of overvaluing the individual and individual action
to the detriment of the collective and the relationships that are constituted in society, but, as
David Harvey (2008, p. 158, our translation) observes, this logic is typical of neoliberal society.
For the author, in the transition from capitalism to a stage of flexible accumulation, there has
been a "general shift away from the collective norms and values that had hegemony, [...]
towards a much more competitive individualism as the central value in an entrepreneurial
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
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culture that has penetrated many aspects of life". Therefore, in the new entrepreneurship,
workers feel responsible and guilty for their successes and/or failures.
The question that arises here is not necessarily whether there is a contradiction in a
discourse that combines exacerbated individualism with female empowerment, but whether
female entrepreneurship, marked by exacerbated individualism, can contribute to female
empowerment, understood as the empowerment of a collective.
Final considerations: can entrepreneurship be a means of empowering women?
The term 'empowerment' is used in a way that is marked by various contradictions and
conflicts. One of the main contradictions in its use concerns the fact that this concept is shaped
by political disputes over its use.
On the one hand, we have its use from an individual perspective, where the term refers
to individual mastery and control and can be expressed as self-confidence and self-esteem. The
focus of this approach is on individual growth, taking the issue of power out of the equation
(LEON, 2001). From this perspective, empowerment would represent a process through which
the individual becomes better prepared to face a competitive market of opportunities and
choices (CORNWALL, 2018).
Empowerment narratives from a business and corporatist perspective, where there is an
individualized notion of self-empowerment through the market, as is the case with Mary Kay,
are referred to by professor and anthropologist Andrea Cornwall (2018) as 'empowerment lite'.
Empowerment lite would be centered on the "desire to enable women to realize their potential"
and would be a version of empowerment "devoid of any confrontation with the underlying
social and power relations that produce social and material inequities" (CORNWALL, 2018,
n.p., our translation), focusing only on the economic dimension of empowerment. "Liberal
empowerment simply seeks to accommodate women within the market without disrupting
existing social and power inequalities [...] empowerment lite promotes docile conformity"
(CORNWALL, 2018, n.p., our translation). Behind the narratives of empowerment lite is the
idea that it would be possible to empower women by engaging them in the market.
Talking about "empowering women" implies that power can be transmitted,
and women are vessels that can be infused with it. Claims to be "empowering
women" by engaging them in the market [as is the case with MK] combine
power with money. The acquisition of money comes to have almost magical
powers, as if, once women had their own money, they could wave a wand and
magically make the underlying social norms, emotional relationships and
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institutions that constrain them disappear (CORNWALL, 2018, n.p., our
translation).
Empowerment, on the other hand, is associated with the collective. It represents both
the process and the result of that process which aims, in the case of women's empowerment, to
question patriarchal ideology, transform the structures and institutions that reinforce and
perpetuate discrimination and gender inequalities, and create the conditions for women to have
access to material resources and information. Although it does not neglect the importance of
empowerment on an individual level, its focus is on collective action (SARDENBERG, 2012).
For us feminists, women's empowerment is the process of achieving autonomy
and self-determination. [...] for us, it implies the liberation of women from the
bonds of gender oppression and patriarchal oppression. [...] the ultimate goal
of women's empowerment is to question, destabilize and ultimately end the
patriarchal order that sustains gender oppression (SARDENBERG, 2012, p.
2, our translation).
Therefore, liberatory empowerment, as Cornwall (2018) calls it in opposition to liberal
empowerment, places the question of power at the center of a process through which women
seek to end patriarchy and gain autonomy and self-determination.
The female entrepreneurship expressed through Mary Kay Inc. seems to be, as we have
just seen in the previous topic, in line with the narratives that characterize empowerment in
light of the fact that, in the case we analyzed, there is an individualized notion of self-
empowerment through the market, in other words, a notion of empowerment focused on the
economic and individual dimension that does not question the structures of power and
exploitation that result in the social inferiorization of women and their marginalization from the
social relations of production. From this perspective, it is through their own efforts, the search
for an individual solution, that working women should seek to overcome the difficulties and
barriers imposed by the exploitation and oppression to which they are subjected. This notion of
empowerment may even bring about some improvements in women's situations, on an
individual basis, but it does not bring about any transformation in the structural power relations
that produce gender inequalities. In this way, the neoliberal ideology that marks female
entrepreneurship appropriates the idea of empowerment to strip it of any social change and
systemic transformation and subordinate it to the current capitalist and patriarchal order,
domesticating it. In this sense, if the use of the term empowerment is marked by political
disputes, we agree with Cornwall (2018, n.p., our translation) when she says that "rescuing
Gender and work: Can entrepreneurship be a means for women empowerment?
Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. 00, e023026, 2023. e-ISSN: 1982-4718
DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28i00.17796 18
empowerment as a feminist strategy requires reformulating it in ways that reinscribe a concern
with changing the structural power relations that produce inequality and oppression".
Finally, we can conclude that, in the midst of transformations in capitalism and the world
of work, the flexible work modality exemplified by Mary Kay entrepreneurship can emerge as
a precarious alternative for survival and as a means of individual empowerment from a liberal
perspective, and may even promote some individual improvements in certain living conditions,
but never as a means of collective empowerment and transformation of power structures, let
alone emancipation, which is understood as the status where empowerment has been achieved
in its entirety. Therefore, neoliberal ideology appropriates the idea of empowerment to empty
it of any transformative character, subordinating this notion to the prevailing order and
domesticating it.
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CRediT Author Statement
Acknowledgements: Not applicable.
Financing: Mayco L. da Silva was a CAPES scholarship holder during the period in which
he carried out the research that originated this article.
Conflict of interest: There is no conflict of interest.
Ethical approval: The work respected the necessary ethical procedures, ensuring
anonymity and indicating the sources and presenting the course of the study.
Availability of data and material: The data is referenced in the article itself and the
sources are publicly available.
Authors' contributions: This text is the result of research carried out by Mayco L. da Silva
during his Master's degree in Social Sciences. This research was supervised by Prof. Dr.
Laura S. Ferreira. The textual production of this article was a collaboration of its authors.
Processing and editing: Editora Ibero-Americana de Educação.
Proofreading, formatting, normalization and translation.