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Um olhar para a dimensão infr
aestrutura como uma das condições objetivas possibilitadoras da qualidade em escolas públicas
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Revista Ibero
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Americana de Estudos em Educaçã
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DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.13473
127
UM OLHAR PARA A DIMENSÃO INFRAESTRUTURA COMO UMA DAS
CONDIÇÕES OBJETIVAS POSSIBILITADORAS DA QUALIDADE EM
ESCOLAS PÚBLICAS
UNA MIRADA A LA DIMENSIÓN DE INFRAESTRUCTURA COMO UNA DE
LAS CONDICIONES OBJETIVAS DE CALIDAD POSIBILITANTE EN LAS
ESCUELAS PÚBLICAS
A LOOK TO THE INFRASTRUCTURE DIMENSION AS ONE OF THE
OBJECTIVE CONDITIONS ENABLERS OF QUALITY IN PUBLIC
SCHOOLS
Claudia Pereira de Pádua SABIA
1
Mara Regina Lemes de SORDI
2
RESUMO
: As avaliações externas e seus indicadores vêm responsabilizando uni
lateralmente
a escola e seus profissionais pelos resultados atingidos por estudantes, desconsiderando o peso
das condições objetivas para o desenvolvimento do trabalho escolar, o que afeta a autoestima
dos professores e gestores. Objetiva
-
se com este estud
o, identificar e analisar as condições
objetivas das escolas públicas do ensino fundamental de uma diretoria de ensino, com
destaque à dimensão infraestrutura. Para tal, a metodologia utilizada envolve abordagem
quanti
-
qualitativa e conjuga pesquisas bibli
ográficas, análise documental e aplicação de
questionários. A coleta de dados consistiu em questionário google docs encaminhado aos
professores dos anos finais do Ensino Fundamental de uma Diretoria de Ensino do oeste
paulista. Como resultados, identificam
os que das 47 escolas pesquisadas, 22 (46,80%)
possuem infraestrutura elementar e 24 (51,06%) podem ser enquadradas como infraestrutura
básica; nenhuma adequada e nenhuma avançada, que seria o nível mais elevado da escala de
infraestrutura proposta por Soa
res Neto
,
Jesus
,
Karino
e
Andrade (2013). Os indicadores da
dimensão infraestrutura evidenciam que as condições objetivas são predominantemente
precárias, o que compromete o desenvolvimento do trabalho docente. Entretanto, as condições
objetivas são subest
imadas nos processos avaliativos, que culpabilizam apenas um dos polos,
ou seja, a escola e seus profissionais, pelos resultados das avaliações externas, e não
responsabilizam o Estado pelo seu não oferecimento. Consideramos a necessidade da
discussão dos
resultados avaliativos na perspectiva de uma responsabilização compartilhada,
ou seja, participativa, em que o poder público se reconheça no processo de melhoria da
qualidade, assumindo a parte que lhe cabe.
PALAVRAS
-
CHAVE
: Qualidade da
e
scola. Condições
o
bjetivas. Infraestrutura
e
scolar.
Responsabilização
e
ducacional
p
articipativa. Avaliação
e
xterna. Avaliação Institucional
Participativa (AIP).
1
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP)
, Campinas
–
SP
–
Brasil.
Professora da Faculdade de
Filosofia e Ciências (
UNESP).
Doutora
do
em Educação
(UNESP)
.
Estágio de Pós
-
Doutorado em
Desenvolvimento (PPGE)
.
ORCID: https://orcid.org/0000
-
0001
-
8173
-
6420
.
E
-
mail:
claudia.sabia@unesp.br
2
Universidade Estadual de Cam
p
inas (UNICAMP)
, Campinas
–
SP
–
Brasil.
Professora Associada do
Departamento de Estudos e Práticas Culturais (DEPRAC) da Faculdade de Educação.
Doutorado em Educação
(UNICAMP).
ORCID:
http
s
://orcid.org/0000
-
0003
-
1216
-
7185
.
E
-
mail:
maradesordi14@g
m
ail.com
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Claudia Pereira de Pádua SABIA e Mara Regina Lemes de SORDI
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128
RESUMEN
: Las evaluaciones externas y sus indicadores han hecho unilateralmente que la
escuela y sus profesionale
s sean responsables de los resultados alcanzados por los
estudiantes, sin tener en cuenta el peso de las condiciones objetivas para el desarrollo del
trabajo escolar, lo que afecta la autoestima de los maestros y administradores. El objetivo de
este estudi
o es identificar y analizar las condiciones objetivas de las escuelas primarias
públicas en una
directora de enseñanza
con énfasis en la dimensión de infraestructura. Para
este fin, la metodología utilizada implica un enfoque cuanti
-
cualitativo
y combina
i
nvestigación bibliográfica, análisis de documentos y aplicación de cuestionarios. La
recopilación de datos consistió en un cuestionario de documentos de Google enviado a los
maestros en los últimos años de la escuela primaria por una dirección de enseñanza
en el
oeste de São Paulo. Como resultado, identificamos que de las 47 escuelas encuestadas, 22
(46.80%) tienen infraestructura primaria, 24 (51.06%) pueden clasificarse como
infraestructura básica, ninguna adecuada, ninguna avanzada que sería el nivel más
alto de la
escala de infraestructura propuesto por Soares Neto
,
Jes
u
s
,
Karino
y
Andrade (2013) Los
indicadores de la dimensión de infraestructura muestran que las condiciones objetivas son
predominantemente precarias, lo que compromete el desarrollo del t
rabajo docente. Sin
embargo, las condiciones objetivas se subestiman en los procesos de evaluación que culpan
solo a uno de los polos, es decir, la escuela y sus profesionales, por los resultados de las
evaluaciones externas y no responsabiliza al Estado p
or
no of
recer
-
los. Consideramos la
necesidad de discutir los resultados de la evaluación en la perspectiva de una
responsabilidad compartida, es decir, participativa, en la que el poder público se reconozca
en el proceso de mejora de la calidad, asumiendo
su parte.
PALABRAS CLAVE
:
Calidad Escolar.
Condiciones objetivas. Infraestructura escolar.
Responsabilidad educativa participativa. Evaluación externa. Evaluación Institucional
Participativa (AIP).
ABSTRACT
: External evaluations and their indicators hav
e unilaterally made the school and
its professionals responsible for the results achieved by students, disregarding the weight of
objective conditions for the development of school work, which affects the self
-
esteem of
teachers and administrators. The aim
of this study is to identify and analyze the objective
conditions of public elementary schools from a teaching board with emphasis on the
infrastructure dimension. To this end, the methodology used involves a quantiqualitative
approach and combines biblio
graphic research, document analysis and application of
questionnaires. The data collection consisted of a google docs questionnaire sent to teachers
in the final years of elementary school from a teaching directorate in the west of São Paulo.
As a result,
we identified that of the 47 schools surveyed, 22 (46.80%) have elementary
infrastructure, 24 (51.06%) can be classified as basic infrastructure, none adequate, none
advanced that would be the highest level of the infrastructure scale proposed by Soares Ne
to
,
Jesus
,
Karino
and
Andrade; (2013). The indicators of the infrastructure dimension show that
the objective conditions are predominantly precarious, which compromises the development
of teaching work. However, the objective conditions are underestimated
in the evaluation
processes that blame only one of the poles, that is, the school and its professionals for the
results of external evaluations and does not hold the State responsible for not offering them.
We consider the need to discuss the evaluation re
sults in the perspective of shared, that is,
participatory, accountability, in which the public power recognizes itself in the quality
improvement process, assuming its part.
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KEYWORDS
: School
q
uality. Objective
c
onditions. School
i
nfrastructure. Participa
tory
e
ducational
a
ccountability.
External
e
valuation. Participatory Institutional Assessment (AIP).
Introdução
O atual contexto educacional evidencia a hegemonia das avaliações de larga escala
(externas) sobre os demais níveis de abordagem da avaliação
(avaliação da aprendizagem) dos
estudantes na sala de aula e (avaliação institucional) da escola.
Conforme Fischer (2010), os processos avaliativos constituem um elemento
fundamental da ação educativa. Entretanto, a avaliação não é um momento final do ato
pedagógico e, sim, um elemento integrante do seu processo. Para a autora:
[...] o que se questiona é o fato de que, a partir da década de noventa do
século XX, a implantação de determinadas políticas e o sucesso do
atingimento de metas passaram a determ
inar não só o conteúdo a ser
ensinado, mas também o modo de um estudante responder as questões de
uma prova, ou até a forma como deve pensar. E o mais grave, no dia a dia da
sala de aula, o sentido pedagógico do processo ensinar
a
prender corre o
risco de
ficar focado muito mais nos resultados do que nos processos.
Educadores, pais e professores precisam ter consciência de que a obsessão
pelo resultado pode obscurecer a importância do processo (FISCHER, 2010,
p.
39)
.
As avaliações de larga escala e sua per
spectiva de avaliação uni/bidimensional buscam
expressar o quantum de qualidade que cada escola possui, ignorando as variáveis que afetam
os resultados das aprendizagens dos estudantes.
O processo de ensino
-
aprendizagem é complexo e exige a interação de di
versos fatores
para ser realizado de forma adequada. Requer desde um corpo docente qualificado até
condições de infraestrutura escolar favorável, o que inclui materiais didáticos, equipamentos e
estruturas físicas apropriadas. Sem o suporte suficiente para
o desenvolvimento do seu
trabalho, a atuação do professor fica comprometida, ou seja, o suporte institucional é
fundamental para que o professor possa desenvolver um bom trabalho educacional.
As avaliações externas (Prova Brasil
3
e SARESP
4
) e seus indicad
ores (IDEB
5
e
IDESP
6
) vêm responsabilizando unilateralmente a escola e seus profissionais pelos resultados
atingidos, desconsiderando as condições objetivas para o desenvolvimento do trabalho na
escola e afetando a autoestima dos professores e gestores.
3
Avaliação Nacional do Rendimento Escolar
.
4
Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo
.
5
Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
.
6
Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo
.
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Claudia Pereira de Pádua SABIA e Mara Regina Lemes de SORDI
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Es
te artigo faz parte de estudo de pós
-
doutorado sobre as condições objetivas das
escolas públicas paulistas dos anos finais do ensino fundamental de uma Diretoria de Ensino
da Região oeste do Estado de São Paulo. O objetivo deste trabalho será identificar a
s
condições objetivas da dimensão infraestrutura das escolas pesquisadas para que sejam
consideradas como componentes da qualidade em processos avaliativos coerentes com os
contextos em que se realizam. Portanto, não se restringindo exclusivamente aos resu
ltados dos
testes padronizados e aos índices decorrentes (IDEB e IDESP), numa perspectiva de avaliação
bidimensional que ignora a impossibilidade de se isolar ou exercer controle sobre todas as
variáveis que afetam os resultados.
Para o desenvolvimento des
te trabalho, iniciaremos com as condições objetivas das
escolas, o processo de responsabilização educacional, a metodologia, a apresentação,
discussão e análise dos dados e as considerações finais.
Condições objetivas das escolas
Entendemos que as condi
ções objetivas são componentes da qualidade das escolas
desta Diretoria de Ensino que precisam ser levadas em conta em seus processos avaliativos. A
qualidade de um estabelecimento de ensino deve abarcar três categorias: Projeto Político
Pedagógico (PPP),
corpo social e a infraestrutura. Parece consensual a importância do PPP e
igualmente se valoriza o corpo social da escola como fundamental para sustentar o PPP.
Temos visto que a categoria da infraestrutura é a menos valorizada e que seu peso passa quase
d
esapercebido no processo de qualificação da escola. Disso deriva nosso interesse em
desvelar as condições objetivas desapercebidas e as efetivamente existentes em determinadas
escolas
,
com destaque à infraestrutura e seus indicadores.
Considerando a forte
presença dos reformadores empresariais na política educacional,
que conseguiram a criação do IDEB como indicador que afeta o entendimento do que seja
qualidade, defendemos a necessidade de assumir e de adjetivar a qualidade com o vocábulo
‘social’, que ent
endemos necessário à escola pública e que exige infraestrutura e condições de
trabalho adequadas ao desenvolvimento das aprendizagens. Entendemos que a finalidade da
escola abarca outras dimensões da formação humana que extrapolam a dimensão cognitiva e
de
vem ser consideradas na avaliação educacional.
Apoiamos em Sordi (2017, p.
86) ao afirmar que a “qualidade social na escola pública
deve orientar
-
se pela construção de um mundo melhor, isto é, um mundo mais educado, mais
evoluído culturalmente e socialment
e mais justo.”
Para a autora, estes educadores estão
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“filiados e unidos em torno de uma concepção de qualidade ampliada, detentora de
pertinência social, uma qualidade includente e democrática, construída com os atores, com a
comunidade e regida pela ideia
do bem público
”
.
Explicitamos também a referência ao SINAES, pois este serviu de modelo para a
construção de um olhar ampliado, para a discussão da qualidade da educação superior e
orientou os processos de regulação, ou seja, autorização, reconhecimento,
renovação de
reconhecimento de cursos superiores. Na sua primeira fase foi considerada ideia vanguardista,
mas depois acabou se distanciando de determinada concepção de educação que tinha
compromisso com a formação humana, dadas as pressões de ordem políti
co
-
econômicas que
foram metamorfoseando seus princípios. Em que pese este retrocesso, a Rede Municipal de
Campinas recupera a base filosófica do SINAES para conceber e implementar o processo de
Avaliação Institucional Participativa (AIP), que se contrapõe
ao processo de
responsabilização (accountability) da escola e de seus profissionais unilateralmente pelos
resultados obtidos nas avaliações de larga escala, ou seja, propõe a responsabilidade
compartilhada entre poder público e atores da comunidade escolar
para a construção da
qualidade educacional.
No que concerne ao recorte deste estudo, cabe desvelar o que se entende por condições
objetivas para iluminar o debate sobre a qualidade da escola, e assim a responsabilização
compartilhada traz à cena outros at
ores e fatores que afetam a discussão sobre qualidade.
Conforme Betini (2009):
[...] as condições objetivas, concretas, são aquelas que já existem, aquelas
que na escola pública são providas, dadas pelo poder público, implícitas nas
políticas públicas e
ducacionais. Seguramente, existirão outras que podem ser
conquistadas e outras que podem ser transformadas pela ação do coletivo da
escola e que passam a se incorporar àquelas já existentes. Afinal, as
condições objetivas materiais, tanto determinam como p
odem ser
determinadas pelo homem (BETINI, 2009, p.
91)
.
Paro (2012, p.
598) menciona que as autoridades governamentais responsáveis pelos
sistemas de ensino, em seus discursos, concentram a atenção sobre a formação dos
profissionais da educação como o pro
blema mais importante da qualidade do ensino
fundamental. Para o autor, “pode ser uma boa forma de obnubilar os reais determinantes do
fracasso escolar, ou seja, as condições objetivas de trabalho”. Conforme o Dicionário Aurélio
(2020), obnubilar significa
“escurecer, fazer com que se torne obscuro, como se observado
por entre nuvens”. Pelo que apreendemos, o autor considera as condições objetivas de
trabalho como uma das causas do fracasso escolar.
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Embora não se negue a necessidade de melhor qualificar o
s professores,
especialmente a partir de formação em serviço (mas também não se pode
deixar de, paralelamente, passar a aproveitar melhor suas potencialidades,
frequentemente subutilizadas), é no conjunto dos fatores constitutivos das
práticas presentes no
interior da escola que devem ser buscadas as causas de
seus problemas e as fontes de suas soluções: no montante e na utilização dos
recursos materiais e financeiros; na organização do trabalho; nos métodos de
ensino; na formação, desempenho e satisfação d
o pessoal escolar; nos
currículos e nos programas; no tamanho das turmas; na adequação de
edifícios; na utilização de tempos e espaços; na distribuição da autoridade e
do poder na instituição; na relação com os membros da comunidade e na
importância que se
dê a seu papel como cidadãos/sujeitos; no planejamento,
na avaliação e no acompanhamento constante das práticas escolares; enfim,
em tudo que diz respeito à estrutura e ao funcionamento da escola. [...]
(PARO, 2003, p. 99
apud
PARO, 2012, p.
598
-
599)
.
Em
síntese, Paro (2012), considera como condições objetivas tudo o que diz respeito à
estrutura e ao funcionamento da escola. A pesquisa de Tomaz; Silva (2017)
,
intitulad
a
“O que
as escolas fazem que os testes estandardizados desprezam na avaliação da qualid
ade?
Ouvindo as escolas”
, traz que
:
[...] Não menos importantes foram as contribuições coletadas sobre as
condições objetivas de trabalho na escola
, que indicaram a necessidade de
as redes considerarem: 1) número de alunos coerente com a proposta de
aten
dimento; 2) carga horária docente que respeite tempos sem alunos, para
trabalho na escola; 3)presença no aluno no contra turno; 4) presença de
estagiários e cuidadores na escola; 5) presença de docentes para ministrar
aula e de demais funcionários de apoio
; 6) estrutura física adequada. Estas
condições, aliadas ao cuidado com a formação para o trabalho docente, são
fundamentais para o desenvolvimento das práticas anteriormente citadas,
pois segundo os professores de escola observada “a prática docente em
co
ndições precárias compromete o ensino e, como consequência, a
aprendizagem dos alunos” (TOMAZ; SILVA, 2017, p.
163
, grifo nosso
)
.
Buscamos enfatizar que as condições objetivas não têm sido consideradas como
fatores que afetam o desempenho das escolas e qu
e são publicizadas sob a forma de rankings,
com o resultado das escolas no IDEB ou IDESP. Por outro lado, pesquisas vão apontando que
as condições precárias comprometem o ensino e aprendizagem dos alunos. Soares (2013, p.
181) destaca “a complexa relação e
ntre o valor do IDEB da escola e suas características
contextuais definidas pelo perfil do aluno e pelas condições de oferta escolar”
.
Oliveira;
Pereira Junior (2016) elaboraram trabalho denominado “Indicadores do trabalho docente:
múltiplas associações no
contexto escolar’’ em que apresentam indicadores para
representarem os aspectos do trabalho escolar docente na educação básica a partir de uma
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pesquisa realizada em sete estados brasileiros. Destacamos aspectos relacionados à nossa
discussão sobre as cond
ições objetivas
:
Acrescenta
-
se ainda que o maior efeito total na satisfação profissional foi
exercido pela frequência de desenvolvimento de atividades com colegas de
trabalho. Entretanto,
ao se considerarem, de forma concomitante, as
condições da sala de
aula e da unidade educacional, o efeito conjunto
dessas condições (0,233) se torna o principal aspecto relacionado à
satisfação dos professores com a profissão.
Por mais óbvio que possa
parecer, o investimento em infraestrutura e equipamentos é de suma
imp
ortância para a melhoria da educação, pois não só permite melhor
acolhimento às crianças e jovens que frequentam a escola, como também se
traduz em melhores condições de trabalho para os que nela atuam. Diante
das desigualdades regionais deste país, é muit
o importante termos em vista
que um padrão mínimo de atendimento escolar deveria ser garantido; o
Custo Aluno Qualidade (CAQ),
já aprovado em lei, poderia ser uma medida
relevante nessa direção (OLIVEIRA; PEREIRA JÚNIOR, 2016, p.
874
,
grifo nosso)
.
Segund
o Pinto (2014), o sistema de ensino brasileiro se propõe a formar cidadãos
críticos e autônomos e, portanto, “há um grande impacto sobre a demanda de insumos.
Dificilmente se consegue esse objetivo com muitos alunos por turma e professores que só
sabem seg
uir apostilas.” (PINTO, 2014, p.
10)
.
O autor apresenta ainda estudos sobre os
insumos de Hedges
,
Laine
e
Grenwald (1994), que mostram que existe uma forte correlação
entre insumos escolares e desempenho dos estudantes.
Soares Neto
,
Jesus
,
Karino
e
Andrade
(2013) apresentam pesquisa de Hattie (2009)
que verifica a influência da infraestrutura no desempenho dos estudantes, considerando vários
países, entre os quais Estados Unidos e Nova Zelândia. Neste estudo foi argumentado que a
maior fonte de variância es
tá, na verdade, dentro das escolas e não entre as escolas. Este dado
é consistente em países desenvolvidos, cuja infraestrutura escolar se apresenta de forma
equitativa entre as escolas, não podendo ser ratificado em países que possuem um sistema
educacion
al não equitativo
,
como o Brasil. Neste país, a responsabilidade pela oferta da
educação básica é dividida entre estados e municípios em um cenário de grande desigualdade
regional e com a enorme disparidade existente entre as diversas redes de ensino.
Os
autores citados buscaram identificar qual a infraestrutura adequada para que uma
escola tenha condições de oferecer uma educação de melhor qualidade. Os autores criaram
uma escala para medir a infraestrutura escolar, utilizando como ferramenta a Teoria de
Resposta ao Item (TRI) e se baseando em informações referentes às escolas no Censo Escolar
da Educação Básica de 2011. Os autores estabeleceram quatro categorias: Elementar, Básica,
Adequada e Avançada. O estudo apresenta como resultados que “44,5% das esc
olas
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brasileiras encontram
-
se na categoria elementar, 40% na categoria básica, 14,9% na categoria
adequada e 0,6% em avançada” (SOARES NETO; JESUS; KARINO; ANDRADE; 2013, p.
90
-
92)
.
Conforme abordamos anteriormente, várias pesquisas: Paro (2012)
;
Soares Ne
to
,
Jesus
,
Karino
e
Andrade (2013); Pinto (2014); Oliveira
e
Pereira Junior (2016), dentre outras,
informam a complexa relação de variáveis que interferem no desempenho dos estudantes nos
testes padronizados e, particularmente, no desenvolvimento de aprend
izagens ampliadas,
orientadas por uma matriz de formação humana, ou seja, outras qualidades da escola pública.
No entanto, tem prevalecido a lógica do ranqueamento, exacerbando o controle vertical sobre
a escola, sem considerar as condições objetivas em qu
e a escola está atuando. No tópico
seguinte, apresentaremos o processo de responsabilização educacional e suas várias nuances.
O Processo de
r
esponsabilização
e
ducacional
A
accountability
é uma política de responsabilização com atribuição de consequênci
as
para os agentes escolares. Podemos citar como exemplos as políticas de responsabilização
educacional: a bonificação docente
–
em função do atingimento de metas; a premiação de
alunos ou escolas
–
com destaque o desempenho positivo nas avaliações em larg
a escala; e a
aplicação de sanções e intervenções em escolas que não tenham atingido as metas
determinadas.
Conforme Bonamino
e
Sousa (2012), quando as consequências dessas políticas “são
apenas simbólicas, elas são chamadas de
low stakes
ou de
responsabil
ização branda
. Já
quando as consequências são sérias, elas são chamadas de
high stakes
ou de
responsabilização forte
”
(CARNOY; LOEB, 2002; BROOKE, 2006
apud
BONAMINO;
SOUSA, 2012, p.
375).
Destacamos que no Brasil temos tanto as sanções sérias, ou seja, ma
teriais, como as
simbólicas. Citamos como exemplo de sanções materiais a bonificação docente
7
e a liberação
de recursos às escolas condicionado ao cumprimento de metas
8
, e simbólicas com a
divulgação dos resultados publicamente em rankings que afetam a aut
oestima dos
profissionais da escola, entre outras coisas.
7
Conforme Capocchi (2
0
17), baseado em dados de 2014, dos vinte e sete estados brasileiros
,
treze já possuíam
algum tipo de bonificação docente.
8
Em matéria publicada recentemente no Jornal Folha de São Paulo, a respeito do FUNDEB, os autores
informam que têm avançado as propo
s
tas que reservam parte deste recurso extra para ser distribuído com base
na adoção de boas práticas educacionais
e, também, a partir da melhoria de indicadores educacionais (PUPO;
SALDANÃ, 2020)
.
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Afonso (2012) considera o seu significado ligado a uma forma gerencialista de
prestação de contas:
[...] o significado do vocábulo accountability indica frequentemente uma
forma hierárquico
-
burocr
ática ou tecnocrática e gerencialista de prestação de
contas que, pelo menos implicitamente, contém e dá ênfase a consequências
ou imputações negativas e estigmatizantes, as quais, não raras vezes,
consubstanciam formas autoritárias de responsabilização da
s instituições,
organizações e indivíduos. Aliás, mesmo quando estas caraterísticas são
menos vincadas, o certo é que a representação social que acentua o seu
carácter punitivo tem sido um importante obstáculo à conceptualização de
formas mais avançadas e
alternativas de accountability (AFONSO, 2012, p.
472)
.
Conforme Brooke (2006), esta exigência por maiores informações sobre os resultados
dos sistemas escolares tem sido respondida pela implementação de políticas de
accountability
,
ou seja, de responsabil
ização mediante as quais se tornam públicas as informações sobre o
trabalho das escolas, e consideram
-
se os gestores e outros membros da equipe escolar como
corresponsáveis pelo nível de desempenho alcançado pela instituição.
Ressaltamos que o nosso intere
sse em realizar o mapeamento das condições objetivas
das escolas públicas paulistas desta Diretoria consiste em fornecer subsídios para a discussão
de seus resultados avaliativos na perspectiva de uma responsabilização compartilhada, ou
seja, participativa
, em que o poder público se reconheça no processo de melhoria da
qualidade, assumindo a parte que lhe couber. Por outro lado, a repercussão das condições
objetivas poderá contribuir para diminuir as resistências dos professores aos processos de
avaliação q
ue apenas cobram e responsabilizam
-
nos. Apoiamos em Sordi para explicitar o
sentido da responsabilização participativa. Conforme a autora:
[...] a responsabilização participativa assenta
-
se numa visão de avaliação
dialógica, fruto de um processo intersub
jetivo rico e plural em que se
buscam acordos consensuados de modo transparente e corajoso, negociando
-
se sentidos, tempos, estratégias e metas. Atores se unem em torno do Bem
Comum e, juntos, constroem o futuro pelas decisões que tomam no presente
(SORDI,
2017, p.
93)
.
A responsabilização participativa se contrapõe aos processos de responsabilização
unilateral e vertical que culpabilizam escolas, gestores e professores pelos resultados
insatisfatórios obtidos nas avaliações externas. Segundo Freitas (2016
, p.
128):
O Brasil fez a escolha por uma política nacional imediatista de controle e
responsabilização verticalizada de suas escolas, professores e alunos como
método para aprimorar a qualidade da educação, perdendo a oportunidade de
apostar em uma polí
tica consistente de responsabilização participativa. A
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Claudia Pereira de Pádua SABIA e Mara Regina Lemes de SORDI
RIAE
E
–
Revista Ibero
-
Americana de Estudos em Educação
,
Araraquara, v. 16, n. 1, p. 127
-
152, jan./mar. 202
1
. e
-
ISSN: 1982
-
5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riae
e.v16i1.13473
136
política adotada tem por princípio promover a concorrência entre escolas e
entre os profissionais da área, baseada na ideia de que médias mais altas
seriam um indicador de bom ensino.
Ainda s
egundo Fr
eitas (2013), há evidências de que o desenho desta política
educacional baseada em
accountability
tem origem nos Estados Unidos e, portanto, produziu
efeitos lá dentro. Hoje há uma farta literatura naquele país que examina as consequências da
política de r
esponsabilização.
O trabalho mais conhecido foi o de Ravitch
(2011), que analisa detalhadamente a
reforma educacional americana expressa na
No Child Left Behind
(NCLB), que se baseava na
possibilidade de as famílias escolherem a melhor escola, levando cons
igo para a escola
escolhida as subvenções públicas oferecidas pelo Estado. Visando facilitar a escolha, foi