image/svg+xmlPadrões da autocitação em artigos de alto impacto da Revista NatureRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207276PADRÕES DA AUTOCITAÇÃO EM ARTIGOS DE ALTO IMPACTO DA REVISTA NATUREESTÁNDARES DE AUTOCITACIÓN EN ARTÍCULOS DE ALTO IMPACTO DE LA REVISTA NATURESTANDARDS OF SELF-CITATION IN HIGH IMPACT ARTICLES OF NATURE JOURNALAdriana FISCHER1Camila GRIMES2Elis Regina KOSLOSKI3Mariana Aparecida VICENTINI4RESUMO: Este trabalho tem por objetivo compreender padrões da autocitação em artigos científicos de alto fator de impacto da revista Nature. A pesquisa é qualitativa e as discussões são sustentadas pela perspectiva sociocultural que compreende a escrita como prática de letramento situada contextualmente.A partir de levantamentos realizados no Google Scholar, selecionamos para análise os quatro artigos mais citados no periódico Nature. A partir das análises, três ocorrências são recorrentes nesses artigos em análise: o alto índice de citação, autocitação e coautoria. Quanto à autocitação, analisamos o contexto de publicação desses estudos, questões relacionadas à legitimidade, às relações de poder e de coautoria que marcam a escrita acadêmico-científica.Os padrões de autocitaçãoindicam um enfoque heterogêneo na escrita dos artigos desta revista, o qual marca convenções nesta área do conhecimento, relações de poder manifestadas nas parcerias entre pesquisadores, o que implica legitimidade na comunidade científica das publicações referidas. PALAVRAS-CHAVE: Escrita acadêmico-científica. Práticas de letramentos. Autocitação. Nature.RESUMEN: Esta investigación tiene como objetivo comprender los patrones de autocitación en artículos científicos de alto impacto de la revista Nature. La investigación es cualitativa y las discusiones están respaldadas por la perspectiva sociocultural que incluye la escritura como una práctica de literacidad contextualizada. De las encuestas realizadas en Google Scholar, seleccionamos para su análisis los cuatro artículos más citados de la revista Nature. Del análisis, tres ocurrencias son recurrentes en estos artículos bajo análisis: elalta tasa de citación, autocitación y coautoría. En cuanto a la autocitación, analizamos el contexto de 1Fundação Universidade Regional de Blumenau(FURB), BlumenauSC Brasil. Docente no Centro de Ciências da Educação, Artes e Letras e no Programa de Pós-Graduação em Educação. Doutorado Linguística (UFSC).ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9787-2814. E-mail:adrfischer@furb.br2Fundação Universidade Regional de Blumenau(FURB), BlumenauSC Brasil. Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Educação. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0105-4046. E-mail:cgrimes@furb.br3Fundação Universidade Regional de Blumenau(FURB), BlumenauSC Brasil. Mestrandano Programa de Pós-graduação em Educação. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6366-9444. E-mail:erkosloski@furb.br4Fundação Universidade Regional de Blumenau(FURB), BlumenauSC Brasil. Doutoranda no Programa de Pós-graduação em Educação. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6256-2904. E-mail:mvicentini@furb.br
image/svg+xmlAdriana FISCHER; Camila GRIMES; Elis Regina KOSLOSKI e Mariana Aparecida VICENTINIRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207277publicación de estos estudios, cuestiones relacionadas con la legitimidad, el poder y las relaciones de coautoría que marcan la escritura académico-científica. Los patrones de autocitación indican un enfoque heterogéneo en la redacción de los artículos de esta revista, lo que marca convenciones en esta área del conocimiento, relaciones de poder manifestadas en alianzas entre investigadores, lo que implica legitimidad en la comunidad científica de las publicaciones mencionadas.PALABRAS CLAVE: Escritura académico-científica. Prácticas de literacidad. Autocitación. Nature.ABSTRACT:This investigation aims to understand self-citation patterns in scientific articles with a high impact factor from the journal Nature. The research is qualitative and the discussions are supported by the socio-cultural perspective that includes writing as a contextually situated literacy practice. From surveys carried out at Google Scholar, we selected for analysis the four most cited articles in the journal Nature. From the analysis, three occurrences are recurrent in these articles under analysis: the high rate of citation, self-citation and co-authorship. As for self-citation, we analyzed the context of publication of these studies, issues related to legitimacy, power and co-authorship relationships that mark academic-scientific writing. The self-citationpatterns indicate a heterogeneous focus on the writing of the articles in this journal, which marks conventions in this area of knowledge, power relations manifested in partnerships between researchers, which implies legitimacy in the scientific communityof the publications mentioned.KEYWORDS: Academic-scientific writing. Literacy practices. Self-citation. Nature journal.IntroduçãoA escrita acadêmico-científica em artigos com alto índice de citação, da Revista Nature, é o foco de atenção neste artigo. Com particular especificidade, padrões de autocitação nesses artigos nos guiam, a fim de discutirmos regularidades que emergem ao tratarmos esta ocorrência, com apoio de um enfoque social e discursivo (LEA;STREET, 1998, CORRÊA, 2004; BOCH;GROSSMAN, 2002;2015). Nesse sentido, consideramos relevante destacar que, no decorrer deste artigo, optamos por utilizar o termo escrita acadêmico-científica para caracterizar o modo como a escrita é concebida por nós, neste estudo. Esta formulação está de acordo com o modelo dos letramentos acadêmicos, proposto por Lea e Street (1998) que, ao invés de se engajarem em debates sobre valoração da escrita, propuseram conceituar, no plano epistemológico, a escrita em contextos acadêmicos-científicos, que tem relação com a produção de sentido, identidade, poder e autoridade e coloca, em primeiro plano, a natureza institucional daquilo que conta como conhecimento em qualquer contexto acadêmico-científico (LEA; STREET; LILLIS, 2015).
image/svg+xmlPadrões da autocitação em artigos de alto impacto da Revista NatureRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207278A opção pelo uso do termo escrita acadêmico-científica encontra apoio, ainda, em Assis (2014), ao mencionar que as formas écrit scientifique, écrit universitaire, écrit de recherche, em francês, e academic writing ou scientific writing, em inglês, são expressões comuns na referência ao tipo de prática tomada em nossa discussão. Temos o conhecimento de que existem diferenças entre as formas escrita acadêmica e escrita científica, instauradas, principalmente, por uma organização hierárquica, relativamente às práticas discursivas da escrita, em que, num polo há o pesquisador reconhecido e, em outro, o pesquisador em formação. Entretanto, no Brasil, embora se adotem os termos escrita científica e escrita universitária, é mais frequente a ocorrência do temo escrita acadêmico-científica (ASSIS, 2014). Considerando o enfoque em torno das práticas de letramentos (LEA;STREET, 1998), que dão suporte à contextualização da escrita e da publicação científica dos artigos da Revista Nature, opomo-nos ao mito da homogeneidade do gênero discursivo artigo científico, o qual se relaciona a abordagens comumente realizadas por manuais e por normas de redação acadêmica (SILVA; RODRIGUES, 2019). Nossa afiliação encontra lugar na heterogeneidade constitutiva da escrita (CORRÊA, 2004), própria das disciplinas e comunidades científicas (BOCH; GROSSMAN, 2015). Para o pesquisador, seja ele iniciante ou expert, é exigência, segundo Hyland (2005) e Assis, Bailly e Corrêa (2017), comprometer-se com práticas de escrita e divulgação na comunidade científica. Mais propriamente em relação às demandas das normatizações nessas práticas de escrita, um ponto em especial é a referência à voz do outro, como forma de engajamento com os conhecimentos científicos em circulação na área específica do conhecimento. O discurso do outro se materializa, explicitamente no texto, a partir das citações, que contribuem para que o pesquisador ampare e legitime seus posicionamentos. Conforme Boch e Grossmann (2015, p. 296), quando a citação “é incluída em um sistema de autorreferenciamento, ela marca a vontade do escritor de se inscrever em uma continuidade de pensamento, do mesmo modo valorizando, na passagem, inúmeros trabalhos já realizados”. Assim, pode-se dizer que há padrões discursivos em torno da autocitação. Hyland (2003), em um de seus trabalhos sobre escrita acadêmico-científica, faz uma abordagem sobre o uso da autocitação, relacionando-a à automenção. Neste caso, além de fazer a autorreferência a trabalhos já relacionados, o autor de um texto expõe, linguisticamente, a partir do uso da primeira pessoa do discurso (plural ou singular), que é pesquisador/autor dos trabalhos citados.
image/svg+xmlAdriana FISCHER; Camila GRIMES; Elis Regina KOSLOSKI e Mariana Aparecida VICENTINIRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207279Além dos elementos apresentados até o momento em torno da autocitação, relacionados a ela estão, também, outros aspectos relevantes, como o fator de impacto e o índice h, os quais auxiliam na compreensão desta ocorrência em artigos de alto impacto.De acordo com Barata (2010, p. 103), o fator de impacto “indica o número médio de citações que os artigos de determinados periódicos recebem em um dado ano. Este índice tem servido para balizar a qualidade das publicações científicas e escolha de periódicos para os quais os autores querem submeter seus trabalhos”. Contudo, em alguns casos, o fator de impacto pode estar relacionado a diversos interesses além da qualidade científica (PINTO; ANDRADE, 1999), tais como, as diferenças de impacto de publicações entre áreas de conhecimento e diferenças entre pesquisadores iniciantes e experts.O índice h foi desenvolvido, em 2005, por Jorge E.Hirsch, da Universidade da Califórnia (OLIVEIRA et al.,2015), avalia a produção científica e mensura a relevância de publicações. Esse índice é um dos indicadores de destaque na literatura científica, que pode integrar o cálculo do fator de impacto. É umparâmetro avaliativo robusto, visto que considera aspectos relativos à produção de artigos e o impacto de número de citações de forma simultânea (SILVA; GRÁCIO, 2017). Além disso, “diversas bases de dados apresentam o cálculo desse indicador, visto que ele é utilizado tanto na avaliação do comportamento da produção científica de pesquisadores como também é um critério avaliativo em diversas agências de fomento” (SILVA; GRÁCIO, 2017, p. 199). Pesquisadores, artigos e periódicos são avaliados por seu índice h em diversas bases de dados, a exemplo da Web of Science, Scopus, Scielo e Google Scholar.Um periódico científico multidisciplinar britânico, de alto fator de impacto e de índice h elevado é a Nature.Lançado em 1869, desempenha um importante papel na circulação de informações científicas para a academia internacional, bem como possui grande visibilidade com a publicação de seus artigos nos meios de comunicação em todo o mundo (BARATA, 2010). Nesse sentido, a Natureconstitui-se como um dos periódicos mais antigos, tradicionais dentre os atuantes no mundo científico (BARATA, 2010; KRASILCHIK; SILVA; SILVA, 2015). Para os autores, este periódico, semanal, possui linguagem compreensível, avaliação por pares, que confere credibilidade e base em um corpo editorial com pesquisadores de renome no meio científico. Desta forma, confere grande valorização na mídia tanto especializada quanto não especializada, bem como apresenta informações significativas e legitimadas, oferecendo visibilidade e prestígio aos autoresque publicam no periódico. A Naturetem como base diversas áreas do conhecimento, especialmente as intituladas Hard Sciencesou Ciências Duras. Para Barata (2010, p. 100), “o termo hard sciencese refere
image/svg+xmlPadrões da autocitação em artigos de alto impacto da Revista NatureRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207280às áreas do conhecimento baseadas na observação empírica e em investigações realizadas a partir do chamado método científico, nas quais estão a física, química, matemática e as ciências biológicas”. As Hard Sciencesrealizam pesquisas pertinentes aos progressos científicos, de alto fator de impacto e, deste modo, têm norteado as demandas de produção acadêmico-científica em outras áreas do conhecimento, em relação ao financiamento de pesquisas e sua legitimidade, por exemplo (BARATA, 2010).Nesse sentido, compreender os modos de escrita nasHard Sciences, pode auxiliar, também, na compreensão da dinâmica de produção científica em revistas de alto impacto. A partir dessas delimitações, o objetivo5deste estudo é compreender padrões da autocitação em artigos científicos de alto fator de impacto da revista Nature. Em consonância com as explanações apresentadas até o momento em torno da ocorrência de autocitação em artigos de alto impacto, na área dasHard Sciences, a seguir, apresentamos as principais escolhas metodológicas que nortearam este estudo.Percurso metodológicoEsta pesquisa, aprovada em comitê de ética sob o número 28740820.0.0000.5370, caracteriza-se como qualitativa. Nessa vertente, os dados em torno da autocitação, em artigos da Revista Nature, são analisados de forma indutiva e os sentidos em discussão são de extrema importância ao estudo (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Os artigos selecionados para o presente estudo advêm de uma base de dados de livre acesso ao público.As bases de dados, a exemplo da Web of Science, Scientific Electronic Library Online Scielo, Scopuse Google Scholar, caracterizam-se em importantes mecanismos de organização, classificação e condicionamento da circulação deperiódicos científicos de distintas áreas de conhecimento (CALDERÓN; MARTI-NOGUEIRA; FERNANDEZ-GODENZI, 2018).Para iniciar o levantamento do corpus de pesquisa, a base selecionada para esta investigação foi o Google Scholar, por possuir métricas que identificam os principais periódicos de todas as áreas, como o índice h. Além disso, o Google Scholar, por ser plataforma de acesso gratuito, é de manuseio prático, apresenta informações acerca do fator de impacto de periódicos, de artigos ede autores, disponibilizando, por exemplo, os artigos por ordem de maior número de citações, diferentemente das outras plataformas mencionadas. 5Este objetivo é parte de dois projetos interinstitucionais em andamento, dos quais integramos o corpo de pesquisadores: "Escrita acadêmica/científica: das formas de presença do autor, do outro, das áreas deconhecimento e seus domínios disciplinares" (CNPQ/Universal), liderado pela profa. Dra.Juliana A. Assis (PUC-MG); "Authorship in Different Fields of Knowledge" (CAPES PRINT UNESP), coordenado pela Profa. Dra. Fabiana C. Komesu, UNESP-São José do Rio Preto.
image/svg+xmlAdriana FISCHER; Camila GRIMES; Elis Regina KOSLOSKI e Mariana Aparecida VICENTINIRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207281A Naturefoi selecionada para análise por se tratar do periódico mais citado dentre todas as áreas de conhecimento, no Google Scholare, também, por ser o periódico mais citado dentro das Hard Sciences, levando em conta seu índice h, conforme Figura 1.Figura 1Principais publicações da base de dados Google ScholarFonte: Dados da pesquisa (2020)No Google Scholar, além da primeira posição geral dentre os periódicos, conforme Figura 1, a Naturepossui, também, a primeira posição nas categorias Life Sciences & Earth Sciencese Life Sciences & Earth Sciences (general).Em acréscimo, o índice h5 é 368 e a Mediana é 546. O índice h5 é o indexador h dos artigos publicados nos últimos cinco anos passados. Trata-se do maior número h de uma publicação, em que h artigos publicados de 2014 a 2018 tenham sido citados no mínimo h vezes cada. Já a mediana h5 de umapublicação consiste na média de citações para os artigos que compõem seu índice h5 (GOOGLE SCHOLAR, 2020).Na base de dados Google Scholar, existe uma classificação dos artigos mais citados dentro do periódico de forma decrescente (Quadro 1), na qual pode-se identificar os artigos de maior impacto, a partir do índice h. Deste modo, em pesquisa realizada no mês de fevereiro de 2020, foram selecionados, para a apresente investigação, os quatro artigos mais citados no periódico Nature.
image/svg+xmlPadrões da autocitação em artigos de alto impacto da Revista NatureRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207282Quadro 1Classificação dos quatro artigos mais citados no periódico Naturena base de dados Google ScholarTÍTULO / AUTORCITADOANOA1-Deep learning.Y LeCun, Y Bengio, G Hinton. Nature 521 (7553), 436-444.167502015A2-Human-level control through deep reinforcement learning.V Mnih, K Kavukcuoglu, D Silver, AA Rusu, J Veness, MG Bellemare, ... Nature 518 (7540), 529-533.61012015A3-Mastering the game of Go with deep neural networks and tree search.D Silver, A Huang, CJ Maddison, A Guez, L Sifre, J Schrittwieser, ... Nature 529 (7587), 484-489.52122016A4-Analysis of protein-coding genetic variation in 60,706 humans.M Lek, KJ Karczewski, EV Minikel, KE Samocha, E Banks, T Fennell, ... Nature 536 (7616), 285-291.45302016Fonte: Google Scholar(2020)Posteriormente à seleção dos artigos, realizamos a análise em torno dos seguintes aspectos: i) o contexto de publicação desses estudos, ii) questões relacionadas à legitimidade e relações de poder que perpassam a escrita acadêmico-científica e iii) especificidades em torno da autocitação. Estes elementos são discutidos e aprofundados, a seguir, na seção que segue.Resultados e discussõesA perspectiva em torno da escrita acadêmico-científica, entendida como uma prática de letramento, dá apoio para que possamos compreender como funciona a dinâmica de visibilidade que publicações acadêmico-científicas recebem em periódicos de alto fator de impacto. Nesse sentido, damos destaque a três ocorrências constantes nos artigos em análise, do periódico Nature:o alto índice de citação, autocitação e coautoria. Outro aspecto que merece atenção é a utilização, dentro do periódico, das normas Vancouver, tipicamente utilizadas por periódicos das Hard Sciences, especialmente por trazerem uma configuração que é captada pelas grandes bases de dados internacionais, a exemplo da Web of Sciencee Scopus (CALDERÓN; MARTI-NOGUEIRA; FERNANDEZ-GODENZI, 2018).Cabe destacar, ainda, o fato de que a seção metodológica dos artigos em análise é apresentada após as conclusões e referências, uma característica específica deste periódico.Nossas constatações são sustentadas pelas discussões de Barata (2010), que define a Naturecomo uma revista de alto fator de impacto reconhecida como um dos mais importantes periódicos científicos do mundo, sendo responsável pela divulgação das descobertas científicas mais relevantes e inéditas. A autora acrescenta que os pesquisadores que submetem
image/svg+xmlAdriana FISCHER; Camila GRIMES; Elis Regina KOSLOSKI e Mariana Aparecida VICENTINIRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 16, n. 1, p. 276-291, jan./mar. 2021. e-ISSN: 1982-5587DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v16i1.14207283seus trabalhos a esta revista compreendem a relevância de suas pesquisas, e que, deste modo, na Natureterão grande visibilidade e divulgação.Nessa direção, relações de poder necessariamente regulam o que conta como conhecimento neste periódico científico (STREET;LEA;LILLIS, 2015). O posicionamento desses três estudiosos, representantes dos estudos dos letramentos, vai ao encontro do que postula Barata (2010), quando discute que, para a publicação na Nature,vários aspectos são relevantes, tais como: grande rigor científico no desenvolvimento do trabalho, reenquadramento do formato por sugestão dos editores, linguagem adaptada e ajustada por editores especializados, contato prévio com os editores antes da submissão do trabalho, conhecimento préviodos editores em relação ao trabalho dos autores, parcerias com pesquisadores estrangeiros e trabalhos multidisciplinares. Nesse sentido, tais aspectos mencionados representam indícios de relações de poder em práticas de letramentos com a escrita acadêmico-científica (STREET;LEA;LILLIS, 2015).Ao partir do dado de que a Revista Naturedivulga os artigos na língua inglesa, damos voz a autores como Emiliozzi (2018) e Hyland(2019), os quais problematizam esta ocorrência. Em consonância com os autores,Barata (2010) indica que o idioma e a condição socioeconômica se apresentam como barreiras para pesquisadores de países de origem não-inglesa, refletindo que “[...] autores e artigos de países periféricos ou pobres recebem um tratamento diferenciado, a saber, mais rigoroso,em relação a países do hemisfério Norte, ricos ou desenvolvidos” (BARATA, 2010, p. 174). Essas discussões sustentam nossos dados ao passo que os artigos analisados por nós são, em sua maioria, de autores que têm o inglês como língua materna e, também, por terem sido produzidos, em grande parte, em contextos de países desenvolvidos. Outro ponto que merece destaque neste estudo é o fato de que uma análise pautada pelos pressupostos das práticas de letramentos, dentre eles relações de poder, contexto, condições de produção, ideologias, identidades e autoridade, permitem que analisemos os sentidos da presença do outro nos artigos. Esta reflexão vai ao encontro do