image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321293A CONVIVÊNCIA ÉTICA EM ESCOLAS PÚBLICAS: ANÁLISE DE UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO A PARTIR DAS PERSPECTIVAS DOS PROFISSIONAIS DA ESCOLA LA CONVIVENCIA ÉTICA EN ESCUELAS PÚBLICAS: ANÁLISIS DE UN PROGRAMA DE INTERVENCIÓN A PARTIR DE LAS PERSPECTIVAS DE LOS PROFESIONALES DE LA ESCUELAETHICAL COEXISTANCE IN PUBLIC SCHOOLS: ANALYSIS OF AN INTERVENTION PROGRAM FROM THE PERSPECTIVES OF SCHOOL PROFESSIONALSJuliana Aparecida Matias ZECHI1Telma Pileggi VINHA2RESUMO: Diante dos problemas de convivência nas escolas, o Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral - GEPEM elaborou o programa “Convivência ética na escola”, que propõe a implantação de ações visando contribuir para a melhoria da qualidade da convivência escolar e do processo de resolução dos conflitos. Este artigo apresenta uma pesquisa exploratória de caráter descritivo que investigou as percepções de professores e gestores quanto às transformações, contribuições e limitações do programa implantado em quatro escolas públicas. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas e os dados foram analisados qualitativamente. A maioria dos respondentes defende ser papel da escola atuar na qualidade da convivência, favorecendo a formação ética e lidando construtivamente com os conflitos. Entre as mudanças, destaca-se a importância da teoria subsidiando ações; a valorização da participação e protagonismo estudantil; o fortalecimento do respeito e do diálogo nas relações. As limitações foram a falta de engajamento de alguns profissionais, ausência de espaços de diálogo e decisões coletivas na escola.PALAVRAS-CHAVE: Convivência escolar. Intervenção pedagógica. Formação docente. Educação moral. Problemas de convivência. RESUMEN: Frente a los problemas de convivencia en las escuelas, Grupo de Estudio e Investigación en Educación Moral - GEPEM elaboró el programa “La convivencia ética en la escuela”, que propone la implantación de acciones cuyo propósito es contribuir para mejorar la calidad de la convivencia escolar y del proceso de resolución de conflictos. Este artículo presenta un estudio exploratorio de carácter descriptivo que investigó las percepciones de profesores y gestores en lo que se refiere a las transformaciones, contribuciones y limitaciones del programa implantado en cuatro escuelas públicas. Se 1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), Presidente Epitácio SP Brasil. Professora do curso de Pedagogia. Membro do GT Psicologia e Moralidade da ANPEPP. Doutorado em Educação (UNESP). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6053-589X. E-mail: juliana.zechi@ifsp.edu.br 2Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas SP Brasil. Professora do departamento de psicologia educacional. Doutorado em Educação (UNICAMP). ORCID: http://orcid.org/0000-0002-0510-8390. E-mail: telmavinha@gmail.com
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321294realizaron entrevistas semiestructuradas y los datos han sido analizados de modo cualitativo. La mayoría de los que contestaron las entrevistas defiende que es papel de la escuela actuar en la calidad de la convivencia favoreciendo la formación ética y lidiar constructivamente con los conflictos. Entre los cambios se destaca la importancia de la teoría que subsidia acciones; la valorización de la participación y el protagonismo estudiantil; el fortalecimiento del respeto y del diálogo en las relaciones. Las limitaciones fueron la falta de compromiso de algunos profesionales, la ausencia de espacios de diálogo y las decisiones colectivas en la escuela. PALABRAS CLAVE: Convivencia escolar. Intervención pedagógica. Formación de profesores. Educación moral. Problemas de convivencia. ABSTRACT: Faced with the problems of coexistence in schools, Moral Education Research Group - GEPEM developed the program “Ethical coexistence at school”, which proposes the implementation of actions that aim to contribute to improving the quality of school coexistence and the conflict solution process. This article presents an exploratory research of a descriptive character that scrutinized the perceptions of teachers and managers related to the transformations, contributions and limitations of the program implemented in four public schools. Semi-structured interviews were carried out and the data were qualitatively analyzed. Most respondents argue that it is a role of the school to act in the quality of coexistence, favoring ethical training and dealing constructively with conflicts. Among the changes, what stands out is the importance of theory subsidizing actions; valuing student participation and leadership; strengthening respect and dialogue in relationships. The limitations have been the lack of engagement by some professionals, the absence of spaces for dialogue and collective decisions at school. KEYWORDS: School coexistence. Pedagogical intervention. Teacher training. Moral education. Problems of coexistence. Introdução São constantes os relatos de educadores sobre os comportamentos considerados como violência, agressões e indisciplina, e que apontam para a necessidade de se buscar estratégias capazes de melhorar a qualidade das relações interpessoais nas escolas e, ao mesmo tempo, favorecer a formação cidadã, rumo à autonomia moral. Diversos estudos (ABRAMOVAY, 2016; VINHA et al., 2017; ZECHI, 2014) têm indicado como os problemas de convivência, em suas distintas manifestações, afetam o clima escolar, as práticas pedagógicas e as relações interpessoais, sendo um grande desafio na escola. De acordo com dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (IEDE, 2019), metade dos diretores (51,5%) assinalou já ter presenciado agressão física ou verbal de alunos a professores ou funcionários da escola; 68,4% dos professores relataram já ter havido
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321295agressão verbal ou física entre alunos3; e a indisciplina dos alunos é vista por 68% dos gestores como um dos fatores que mais dificulta o funcionamento das escolas. O estudo Teaching and Learning International Survey(OECD, 2014) indicou que, para 34% dos diretores, no Brasil, há intimidação ou ofensa verbal entre os alunos semanalmente, e 12% relatam a mesma frequência de ofensas de estudantes aos professores. Dentre os 34 países participantes do estudo, os docentes brasileiros são os que passam mais tempo mantendo a ordem em sala de aula (20%). Outro exemplo está em Abramovay (2016), para quem 70% dos estudantes de sete capitais brasileiras vivenciaram algum tipo de violência nas suas escolas, sendo 27% cyberbullying, 25% roubos e/ou furtos, 20% ameaças e 13% agressões físicas. Alguns dos estudos indicam que, de fato, há uma percepção do aumento da violência na escola e um sentimento de insegurança (ABRAMOVAY, 2016; OECD, 2021; GARCIA; TOGNETTA; VINHA, 2013; VINHA et al., 2017; ZECHI, 2014). Mas é preciso cuidado com um discurso alarmista, dando a entender que a escola vive um cenário de violência permanente. A violência existe, sem dúvida, sobretudo em algumas unidades de grandes centros e regiões vulneráveis ou em episódios pontuais em escolas, mas em menor número que o alardeado. Vinha et al. (2017) apontam que muitos dos dados que inferem o crescimento da violência escolar consideram como tal qualquer problema de convivência (violência, bullying, incivilidades, indisciplina, entre outros), sem os distinguir. É preciso reconhecer que são fenômenos de natureza distinta, os quais requerem intervenções também diferenciadas. Não raro, propõe-se aumento do rigor das regras e punições para lidar com esses problemas (VINHA; NUNES, 2020), o que acarreta manutenção da heteronomia4. Os problemas de convivência, particularmente a violência, são fenômenos multifatoriais, que extrapolam os muros da escola e não podem ser considerados isoladamente. Todavia, estudos sobre a qualidade do clima e da convivência escolar, ao explicarem o “efeito-escola” nessa área, indicam que quando são percebidos como positivos pela comunidade escolar, ou seja, baseados no respeito, confiança e cuidado mútuos, têm efeito na qualidade das relações interpessoais, sendo fator de resiliência e bem-estar, desempenhando um papel fundamental na prevenção da violência tanto para os alunos quanto 3Cabe destacar que o fato do SAEB juntar em uma única pergunta agressão física e agressão verbal impede uma análise mais criteriosa do tipo de agressão, posto que são formas completamente diferentes. As agressões físicas estão mais próximas à violência, enquanto as verbais, mais relacionadas às incivilidades. 4Na moral heterônoma, os valores não se conservam, sendo regulados pela pressão do meio, isto é, o sujeito modifica o comportamento moral em diferentes contextos. Assim, há uma relação de submissão ao poder, sendo considerado certo obedecer por submissão a autoridade, evitamento de punições ou conformidade a convenções sociais. Na autonomia moral, o sentimento de aceitação ou de obrigação para com as normas é interno (autorregulação), sendo fundamentado na equidade e nas relações reciprocidade. Logo, os valores são conservados, apesar das mudanças de contextos e da presença de pressões sociais (VINHA et al., 2017).
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321296para os profissionais da escola (BRESSOUX, 2003; DEBARBIEUX et al., 2012; VINHA; NUNES, 2020; 2021). O desafio é como as escolas podem lidar com os problemas de convivência e, ao mesmo tempo, favorecer o desenvolvimento de pessoas autônomas. No Brasil, as experiências bem-sucedidas nessa área em escolas públicas são, ainda, iniciativas isoladas, quase artesanais. É o que mostra o estudo de Menin, Bataglia e Zechi (2013), que examinou os projetos de educação em valores nas escolas públicas. Verificou-se que, de 1.062 escolas que desenvolvem esses projetos, menos de 5% tinham uma proposta mais sistematizada que poderia ser considerada bem-sucedida. A maior parte dos profissionais envolvidos (71%) não teve nenhuma formação nessa área, de modo que suas propostas eram pautadas, principalmente, no senso comum. As autoras apontam motivos pelos quais a grande maioria não era eficaz: as ações eram direcionadas apenas aos alunos; eram pontuais e por curto espaço de tempo; não se tratava de projetos institucionais, mas de um pequeno grupo; empregavam um processo de transmissão/doutrinação; havia evidentes contradições entre os objetivos e o clima relacional e disciplinar, na escola; almejavam o controle dos comportamentos e da disciplina e não o desenvolvimento sociomoral e emocional que ensejaria o emprego de estratégias mais assertivas e cooperativas para lidar com os conflitos. Porém, certas pesquisas com intervenção em escolas brasileiras evidenciam que uma educação para a convivência ética e democrática é possível, além de desejável (MENIN, 2019; TOGNETTA, 2021; VINHA et al.,2017). Segundo tais estudos, incivilidades e vários tipos de violência na escola podem ser enfocados, oportunizando a aprendizagem da necessidade de regras e valores e o desenvolvimento sociomoral e emocional, pela busca de soluções dialógicas, com a participação ativa dos envolvidos. Indicam ainda modos de construção e aprendizagem de valores e práticas coerentes com a convivência ética e democrática que podem e devem ocorrer na educação. Tendo como base essa perspectiva, o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral GEPEM, desenvolveu o programa “A convivência ética na escola”5(CEE). Trata-se de um programa de formação de professores e transformações na escola, com ações diferenciadas e complementares entre si, visando à melhoria da qualidade da convivência e do processo de resolução dos conflitos interpessoais, favorecendo a construção de um clima escolar positivo. 5O programa foi coordenado pelos doutores Telma P. Vinha (FE-UNICAMP), Luciene Tognetta (UNESP) e Cesar Augusto Amaral Nunes (GEPEM) e realizado pela equipe de pesquisadores e alunos de pós-graduação vinculados ao GEPEM - UNICAMP/UNESP.
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321297Qualificamos como éticaa convivência pautada em práticas que defendam valores vinculados ao diálogo, participação, diversidade, justiça, respeito e solidariedade, implicando a formação de sujeitos cada vez mais autônomos, os quais pautem suas decisões e ações em valores morais. Ela não pode se restringir à boa socialização com a adoção de formas de convivência já estabelecidas, mas deve ser compreendida como um processo no qual algumas normas, relações e costumes são criticados e, assim, são pensadas e discutidas novas formas de conviver (PUIG et al.,2000). Por essa concepção, o programa CEE foi implantado pela equipe do GEPEM em seis escolas municipais de Ensino Fundamental, por meio de um convênio da Faculdade de Educação da UNICAMP com uma Secretaria Municipal de Educação. No presente estudo, analisamos apenas quatro escolas, que foram as que começaram a implantação ao mesmo tempo. Destaca-se que elas aderiram voluntariamente ao programa. Com duração prevista de 24 meses, tal programa consiste em ações de prevenção das violências, atenção aos problemas de convivência e promoção dos valores e habilidades sociomorais. Foi elaborado considerando-se três vias diferentes de atuação, porém inter-relacionadas: interpessoal, ligada à maneira de ser e de fazer dos educadores, especialmente a relação que travam entre eles e com seus alunos; curricular, referente ao “planejamento e à execução de atividades pensadas especificamente para trabalhar a formação ética dos alunos”; institucional, que se constitui das “atividades educativas que partem da organização da escola e da classe, e que têm como pressuposto a participação democrática” (PUIG et al., 2000, p. 17). As ações, em síntese, consistiram em: Avaliação do clima escolar e diagnóstico das necessidades institucionais foram feitas reuniões com a equipe gestora e professores, sessões de observações do cotidiano e aplicados questionários para avaliação do clima escolar em alunos, professores e gestores. Posteriormente, os pesquisadores realizaram a devolutiva dos resultados, debatendo os dados com os profissionais da escola e planejando coletivamente as ações decorrentes. Espaço sistematizado para o desenvolvimento de propostas sociomorais e emocionais inserção de uma disciplina semanal, de 90 minutos, na grade curricular das séries finais do Ensino Fundamental, ministrada por um professor de referência selecionado pela escola6. Nas séries iniciais, era ministrada pelo professor polivalente. Formação continuada com os profissionais das escolas semanal/quinzenal, com todos os profissionais da escola, estudando-se temas como a construção da personalidade ética, linguagem assertiva e empática, regras e processos de legitimação, problemas de 6Atuavam por meio de Carga Suplementar de Trabalho de Docente, que são horas remuneradas de trabalho prestadas pelos docentes em outro componente curricular.
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321298convivência, conflitos e possibilidades de intervenções, entre outros, totalizando cerca de 140 horas; formações quinzenais com professores de referência, objetivando estudar a condução de assembleias e procedimentos ativos ligados ao desenvolvimento sociomoral e emocional, ocorrentes na nova disciplina (cerca de 70 horas). Implantação de espaços de participação, resolução e mediação de conflitos realização de assembleias em cada turma, para diálogo e construção de soluções conjuntas para a melhoria da convivência e dos trabalhos; implantação de espaços para a mediação de conflitos em que as partes envolvidas, apoiadas pelo mediador, são incentivadas a dialogar, buscando um acordo satisfatório e não punitivo para a desavença. Equipes de ajuda formadas por grupos de alunos que apoiam os colegas que estão com problemas ou envolvidos em conflitos ou bullying(TOGNETTA, 2021).Escolha coletiva dos valores da escola, com elaboração de plano de ações, revisão da quantidade e qualidade das regras. Elaboração de um Plano Institucional de Convivência um documento que prevê a organização e o funcionamento da instituição com relação à convivência, fixando os objetivos a serem alcançados, as normas que o regulam e as ações que serão realizadas. Acompanhamento e assessoria por meio de sessões de observação participante e reuniões de assessoria à equipe de gestores e professores. A implantação dos procedimentos era flexível, não imposta, ocorrendo com participação coletiva. Nem todos aconteceram nas quatro unidades, devido às necessidades e condições de cada uma. Qualquer implantação de programas em escolas precisa considerar e lidar com realidades diferentes, repletas de desafios, demandas, urgências. No CEE, foi empregado um processo responsivo contínuo, que se trata da interação e interlocução entre os idealizadores e os implementadores, respeitando o contexto e atendendo também às demandas e necessidades das escolas (CAMPOS, 2020). No decorrer e ao término do programa foram realizadas avaliações pela equipe por métodos quanti-qualitativos, como avaliação do clima escolar (pré e pós-testes) e avaliação responsiva7, questionários de avaliações das formações e das transformações na escola e sessões de observação. As diferentes análises dos dados mostraram que as transformações dependem das características de cada instituição, que avançaram em ritmos e caminhos diferentes. Contudo, constataram-se progressos na melhoria expressiva na qualidade das relações interpessoais; no 7Na avaliação responsiva, os participantes são auxiliados a realizar suas próprias avaliações em momentos diversos, e as descobertas são utilizadas para melhorar a compreensão, decisões e ações do programa (VINHA; NUNES; MORO, 2019).
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321299uso de uma comunicação mais empática; na presença de intervenções mais construtivas nos conflitos; na mudança da qualidade das regras e na ampliação da participação dos alunos no processo de elaboração e na discussão dos problemas; no aumento dos sentimentos de justiça, respeito e pertencimento pelos estudantes (CAMPOS, 2020; VINHA; NUNES, 2021, VINHA; NUNES; MORO, 2019). O presente artigo teve como objetivo investigar as percepções de professores e gestores com relação ao programa “A Convivência ética na escola” quanto à implicação destes profissionais com relação à qualidade da convivência e aprendizagem sociomoral dos alunos, assim como conhecer as transformações, contribuições e limitações do programa. Metodologia Para o alcance do objetivo, foi desenvolvida uma pesquisa8exploratória de caráter descritivo. A produção dos dados se deu de duas formas: 1) pela análise dos documentos e registros produzidos no decorrer do programa, a fim de conhecer as ações, processos e avaliações desenvolvidos pelo grupo de formadores; 2) pela realização de entrevistas semiestruturadas para investigar as percepções dos profissionais participantes. O lócusde investigação foram quatro escolas públicas municipais de Ensino Fundamental (1º ao 9º ano), sendo duas delas de período integral, pertencentes a uma grande cidade no interior do estado de São Paulo. Três escolas estão alocadas em regiões de grande vulnerabilidade social e uma na região central do município, porém atende principalmente jovens em cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto. Os sujeitos da pesquisa foram os profissionais das escolas, professores e gestores (diretores, vice-diretores e orientadores pedagógicos), partícipes do programa de intervenção. Ao final do programa, todos os profissionais foram convidados para a entrevista, cuja aplicação foi agendada previamente e feita de forma individual, nas escolas, pela pesquisadora, a qual não fazia parte da equipe que desenhou ou implantou o programa. As entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas qualitativamente, por meio da Análise de Conteúdo9, construindo-se categorias a partir do sentido da fala dos participantes. Participaram 23 sujeitos: 10 professores e orientadores pedagógicos da escola A, representando 28,5% dos profissionais que frequentavam os momentos de formação; seis (8,5%) professores e orientadores pedagógicos da escola B; três (27%) professores da escola 8Projeto aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa CAAE 82949518.9.0000.8142. 9A codificação e a categorização dos dados foram realizadas no Atlas.ti, um softwareque auxilia o pesquisador no processo de organização da análise dos dados qualitativos.
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321300C; e quatro (33%) professores da escola D. Todos os entrevistados são graduados em licenciatura plena (Pedagogia ou outras licenciaturas), seis possuem pós-graduação lato sensue sete pós-graduação stricto sensu. Somente dois professores estão em início de carreira, com até cinco anos de profissão; a maioria deles (14) são profissionais com mais de 15 anos de docência. Apresentação e discussão dos resultados Neste artigo, apresentaremos os resultados do conjunto dos participantes das quatro escolas, em duas grandes categorias.A primeira engloba questões destinadas a compreender as concepções dos entrevistados quanto ao trabalho com a convivência e aprendizagem sociomoral dos alunos. A segunda aborda as percepções com relação às contribuições e aos limites do programa. Implicação dos professores e gestores com relação à qualidade da convivência e aprendizagem sociomoral dos alunos Buscando investigar se os professores e gestores consideravam a escola como também responsável pela qualidade das relações estabelecidas e pela promoção da aprendizagem sociomoral dos estudantes, questionou-se se os participantes entendem ser papel do professor trabalhar a melhoria da convivência, na escola. Todos os entrevistados (100%, n=23) reconheceram ser função do professor abordar o tema e buscar caminhos para melhorar a convivência, mas as respostas indicam razões diferentes, traduzidas principalmente em duas categorias. Para 39% dos respondentes, o trabalho com a convivência era percebido como recurso para se enfrentar os problemas de conflitos entre alunos, entre esses e seus professores, de sorte a melhorar a qualidade das relações, quando não estão boas. São as chamadas ações de “atenção”, as quais são necessárias, sem dúvida; porém, é preciso também investir na prevenção das violências e na promoção de competências socioemocionais e valores morais. Mais do que intervir em situações de problemas de convivência, outros 39% defenderam o papel do professor na prevenção e fomento de uma convivência ética, devendo todos, na escola, contribuir para esse desenvolvimento, não porque falta essa formação aos alunos ou porque a família não está cumprindo seu papel, mas porque o desenvolvimento integral do estudante, incluindo a dimensão social e ética, é papel da escola e é também
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321301responsabilidade da família. Essa percepção, conforme os relatos, foi se consolidando ao longo das formações promovidas pelo programa. Chama a atenção ainda que, mesmo reconhecendo ser papel do professor trabalhar para a melhora da convivência, 9% indicaram que isso é necessário, porque a família e a sociedade não o fazem, ou seja, não se trata de uma função precípua da escola. Essa concepção, embora em porcentagem bem menor, vai ao encontro de outros estudos para os quais muitos docentes são a favor de a escola desenvolver projetos de formação moral, porque há “uma crise de valores” na família e na sociedade e, portanto, cabe à escola “suprir” essa lacuna (MENIN; BATAGLIA; ZECHI, 2013; ZECHI, 2014). Identificamos, na análise documental, que, no início do programa, a maioria dos profissionais atribuía sobretudo às famílias a causa dos problemas de mau comportamento dos alunos e da formação em valores. Esse dado é coerente com os estudos de Dedeschi (2011) e Souza (2012), que apontam ser forte essa crença entre os professores, e que poucos incluem como também influenciando as questões pedagógicas, a falta de espaços de diálogo e de participação ou mesmo a qualidade das relações interpessoais na escola. Logo, não há muito o que mudar, pois “as causas dos problemas” estão fora dos muros da instituição, o que acarreta certa “impotência” e busca de “soluções” também externas, como maior fiscalização, contratação de mais profissionais, projetos de conscientização para as famílias, entre outros (VINHA; TOGNETTA, 2013). As respostas contidas nessa categoria trazem resultados positivos, ao revelarem que todos os entrevistados, mesmo com limites, se implicaram como responsáveis pelo trabalho com a convivência escolar e entendem a escola como lócusde aprendizagem sociomoral. A formação promovida pelo programa CEE, conforme os relatos, colaborou para essa mudança de concepção, enfatizando a validade de se investir em uma consistente formação, nessa área. Percepção dos respondentes sobre as contribuições e dificuldades do programa Nas entrevistas realizadas individualmente solicitou-se aos participantes que comentassem espontaneamente o programa desenvolvido, as principais contribuições, individuais e para a instituição, e como avaliavam as ações realizadas, seus avanços e limites. As respostas foram analisadas em função da percepção sobre as principais contribuições apontadas no campo das três vias de atuação em que o programa foi elaborado: as transformações ocorridas nos âmbitos interpessoal, curricular e institucional.
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321302Quadro 1 Percepção dos respondentes sobre as contribuições do programa (%)10Contribuições Total Transformações no âmbito interpessoalEmbasamento teórico da prática docente 74 Melhora na qualidade das relações pessoais - relação professor-aluno 35 Melhora na qualidade da convivência 22 Mudança na concepção sobre o papel do professor/escola no trabalho com convivência e valores 17 Mudança na concepção acerca dos conflitos interpessoais 17 Mudanças na maneira de ser e agir 17 Melhora na qualidade das relações pessoais - relação entre alunos 13 Transformações no âmbito curricular Reconhecimento da necessidade de se inserir no currículo o tema da convivência 17 Transformações no âmbito institucional Valorização do protagonismo discente 48 Embasamento teórico para a organização do trabalho na escola 13 Fonte: Elaborado pelos autores As transformações ocorridas no âmbito interpessoalconcernem àquelas que inferem diretamente na maneira de ser e de fazer dos educadores e na relação que estabelecem com os alunos. A mais expressiva, citada por 74% dos sujeitos, foi o embasamento teórico da prática docente. Eles reconheceram que, diante das lacunas existentes em sua formação, o embasamento teórico advindo da formação realizada durante o programa influenciou suas práticas, tornando-os mais seguros para lidar com os problemas de convivência e intervir nos conflitos. Outra transformação mencionada foi a melhoria na qualidade das relações interpessoais, 35% ocorrida na relação professor-aluno e 13% entre os alunos. Ao explicarem as mudanças nas relações entre adultos e estudantes, informaram que antes adotavam formas não construtivas de se comunicar com eles, com críticas, censuras e julgamentos de valor; a formação cooperou para uma mudança na linguagem empregada e na forma de atuarem diante dos conflitos, de modo a construírem uma relação de diálogo e respeito mútuo. Outros 22% afirmaram que o programa provocou melhoras na qualidade da convivência entre todos, reduzindo conflitos, violências e incivilidades.Quanto às transformações no âmbito curricular, relativas ao planejamento e execução de atividades para trabalhar a formação ética dos alunos, 17% reconheceram a necessidade de se inserir no currículo das escolas questões associadas à convivência e às 10Algumas vezes, a resposta de um mesmo sujeito se classificou em mais de uma categoria. O percentual foi calculado em relação à soma total de participantes (Total = 23).
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321303habilidades sociomorais e emocionais. Frisaram que o embasamento teórico propiciado pelas formações contribuiu para o planejamento e a execução de tais atividades. Nas transformações no âmbito institucional, as quais envolvem atividades organizadas pela escola, visando a uma participação democrática, 48% dos participantes destacaram a valorização do protagonismo discente. Os respondentes, em geral, identificaram que mudanças de práticas institucionais, como espaços de diálogo com os alunos, revisão das regras e sanções, promoção de assembleias, inserção de uma disciplina de convivência ética e o trabalho com as equipes de ajuda possibilitaram mais oportunidades de manifestação, participação e decisão para os estudantes. Acreditam que tais transformações auxiliaram para que os alunos se sentissem mais pertencentes e percebessem o ambiente escolar como mais respeitoso e justo. No que tange às dificuldadesencontradas na realização do programa, 30% dos respondentes mencionaram o longo tempo de duração do curso (140 horas), gerando cansaço e desinteresse dos docentes. Tal problema foi apontado pelos participantes das escolas A e B; em contrapartida, houve a manifestação de interesse pela continuidade da formação pelos respondentes das escolas C e D, ao indicarem como limitação o encerramento do programa. A divergência nas falas dos respondentes assinala a importância de um planejamento flexível e de se contar com um processo responsivo que possibilita adaptações e aprendizagens durante a implementação. Outra dificuldade apresentada (26%) referiu-se à baixa adesão de alguns professores, não participando da formação ou deixando de desenvolver algumas propostas. Nessa mesma direção, 17% realçaram a resistência de alguns docentes quanto à fundamentação teórica que embasava o programa, resultando em menor engajamento. Em duas escolas, os gestores não participaram das formações, dificultando a compreensão e o oferecimento de condições para maior êxito na implantação das ações. Para mitigar esse problema, os formadores faziam quinzenalmente reuniões com eles sobre o andamento do programa. Essa não participação e consequente maior dificuldade para o desenvolvimento de algumas propostas e para a institucionalização do programa foi mencionada por 26% dos respondentes. A presença de atitudes autoritárias e posturas pouco dialógicas e participativas foi apontada como também decorrente desse pouco envolvimento de alguns docentes e gestores. Esses resultados sinalizam a importância de se planejar, no desenho e na implementação do programa, processos flexíveis capazes de favorecer maior engajamento coletivo e também ações especificamente direcionadas à equipe gestora, tais como formação diferenciada e fomento às trocas horizontais, por meio de comunidades de aprendizagem, com
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321304trocas, colaboração e apoio entre escolas (capacitação lateral) (BERKOWITZ; BIER; MCCAULEY, 2016; VINHA et. al., 2017; ZECHI, 2014). Por fim, observamos ainda que 22% dos respondentes pontuaram a dificuldade em relacionar teoria e prática, sugerindo que, nos momentos formativos, houvesse atividades mais práticas ligadas ao cotidiano escolar; porém, ressaltaram ter havido diálogo e replanejamento das ações dos formadores, na tentativa de sanar tal dificuldade. Estudos (BERKOWITZ et al., 2016; FRICK et al. 2019; MENIN; BATAGLIA; ZECHI, 2013) têm mostrado que uma das maiores dificuldades para o desenvolvimento de projetos e intervenções bem-sucedidas, nessa área, é a ausência de formação consistente que amplie as possibilidades de conhecimento de procedimentos e dos processos e os fundamente, permitindo ir além de ações pontuais e pautadas no senso comum. No programa analisado, a formação docente se destacou como positiva, mas ainda persistiram, entre alguns profissionais, práticas mais autoritárias nas relações e na presença de conflitos. A análise das respostas mostra a dificuldade em transformar ações e culturas instituídas nas escolas. Tais mudanças demandam o planejamento e a implementação de ações em longo prazo, respeitando-se as necessidades e o ritmo de cada instituição e seus profissionais (URUÑELA-NÀJERA, 2018), por isso também a importância de um programa nessa área ser planejado para ser desenvolvido por vários anos. Considerações finais Este estudo trouxe como principal contribuição a análise do programa “A convivência ética na escola” na percepção de professores e gestores das escolas participantes, avaliando as transformações, contribuições e limitações do programa após seu término. As percepções coletadas se mostraram diversas e se concretizaram em conceitos, atitudes e aprendizados compartilhados ao longo do período de implantação. Destacamos como relevante o fato de a maioria dos respondentes defender ser papel do professor/gestor e da escola lidar com os problemas de comportamento e atuar preventivamente na melhoria da qualidade da convivência, sem adotar meios coercitivos ou de conformidade social, mas favorecendo o desenvolvimento da autonomia dos estudantes, o que denota uma importante mudança de concepção sobre assunção do papel da escola, nesse processo. Os participantes também relataram diversas mudanças provocadas pelo programa, destacando os subsídios teóricos que fomentam as práticas para a melhora da convivência e maior segurança e emprego de estratégias construtivas para lidar com os conflitos, a
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321305valorização do protagonismo estudantil e o fortalecimento do respeito e diálogo nas relações interpessoais, o que é corroborado por Vinha, Nunes e Moro (2019). Quanto aos procedimentos, foram destacadas, pelos participantes, as assembleias e as equipes de ajuda como muito importantes para a convivência ética. Identificou-se a falta de engajamento de alguns profissionais e que algumas transformações pretendidas, em especial quanto ao estabelecimento de relações mais dialógicas e a ampliação dos espaços de participação dos profissionais, não avançaram tanto como o esperado em duas escolas. As que apresentaram menor transformação foram as que tinham gestores com menor engajamento e postura mais centralizadora, com pouco envolvimento com o programa. Levin e Fullan (2008) alertam que culturas não mudam por imposição, mas sim pelo deslocamento específico de normas, estruturas e processos existentes por outros. Nesse sentido, a formação dos profissionais, principalmente a partir da reflexão da realidade vivida, é necessária para as mudanças de paradigmas e crenças e para a ampliação de conhecimento, embora isso não garanta resultar em aperfeiçoamento ou transformação de novas práticas. Também não adianta para um programa atuar apenas em processos ou estruturas e não transformar valores, crenças e concepções dos envolvidos. O processo de mudança cultural leva tempo e depende da modelização dos novos valores, práticas e procedimentos que, se espera, substituam os existentes, exigindo planejamento eficiente, formação aprofundada, emprego de energia, acompanhamento e apoio constantes. Para os autores, esse processo deve envolver certa pressão e suporte: a pressão implica objetivos de transformação compactuados, acompanhamento e avaliação transparente; o suporte envolve apoio técnico, desenvolvimento de novas competências, acesso a novas ideias, mais tempo para aprendizado e colaboração. O programa procurou atuar nesse sentido, com objetivos compartilhados, formação constante, acompanhamento, assessoria e colaboração. Contudo, um fator relevante que deve ser considerado por programas que pretendem transformações mais profundas na cultura é a necessidade de contar com um longo período para ser desenvolvido e consolidado, geralmente, maior que 5-6 anos (BELLEI; VANNI; VALENZUELA; CONTRERAS, 2016), o que não ocorreu no CEE, o qual teve a duração de apenas 24 meses. Para maior alcance dos objetivos, recomenda-se a ampliação do período de implementação e acompanhamento. Recomenda-se ainda maior articulação entre formadores, escola e equipe da Secretaria Municipal de Educação. Os dados discutidos neste trabalho evidenciaram que, mesmo com as dificuldades, a construção da convivência ética em meio escolar é desejável e possível, mas implica em
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321306formação continuada e apoio às transformações e aos desafios que a escola enfrenta, a fim de que, paulatinamente e de comum acordo com a comunidade escolar, vá ocorrendo a implantação de ações intencionais e sistematizadas, coordenadas entre si, incluídas em Planos de Convivência e nos Projetos Político-Pedagógicos. Deve responder a objetivos e problemas reais da escola identificados como relevantes por sua comunidade e cujas soluções devem ser acordadas coletivamente. De fato, por ser um lugar de convívio com a diversidade e de aprendizagem da vivência no espaço público, a escola é local ideal para se aprender a viver, de maneira participativa, respeitosa e ética, fortalecendo os valores democráticos. Os resultados deste estudo indicam a validade de investir em formação e acompanhamento dos processos de transformação nas escolas, nessa área. Países como Chile, Colômbia e Espanha, entre outros, possuem políticas públicas ligadas à prevenção e mitigação da violência escolar e à promoção da convivência participativa, inclusiva e democrática, contemplando plano de desenvolvimento profissional docente e certos procedimentos, como a implantação de Comissões de Convivência na escola, processos de mediação de conflitos, valorização da participação e protagonismo juvenil, construção coletiva de Plano de Convivência, entre outros (SALLÁN; BARRERA-COROMINAS, 2014). No Brasil, apesar de o artigo 12 da Lei de Diretrizes e Bases afirmar que as escolas têm a incumbência de “[...] promover medidas de conscientização, de prevenção e de combate a todos os tipos de violência, especialmente a intimidação sistemática (bullying), no âmbito das escolas” e “estabelecer ações destinadas a promover a cultura de paz nas escolas” (BRASIL, 1996), atualmente, a política pública nessa área fomentada pelo Ministério da Educação é o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares11(BRASIL, 2019), que visa a implantar 216 colégios nesse modelo até 2023. Em tais escolas, a gestão é partilhada com militares, sendo que os professores e coordenadores formam a equipe pedagógica, e os policiais, a equipe responsável pela disciplina dos estudantes. São adotados mecanismos disciplinares, oferecendo-se aos estudantes civis uma educação alicerçada em procedimentos, ritos e valores militares, tais como a contenção do conflito, o reforço e o culto aos símbolos nacionais, a imposição de normas rígidas, a obediência acrítica à hierarquia e a uma disciplina inflexível. Com isso, fortalecem nos estudantes, predominantemente, a heteronomia moral, com a obediência às autoridades imposta por relações de coação e de respeito unilateral, não sendo vivenciadas 11O decreto propõe a criação e a expansão de um modelo de escola cívico-militar para instituições de Educação Básica (PECIM). Disponível em: http://escolacivicomilitar.mec.gov.br/ Acesso em: 10 jan. 2021.
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321307experiências importantes que favorecem o desenvolvimento de competências socioemocionais e dos valores democráticos. Na contramão dessa proposta, defendemos que uma das principais finalidades da educação é a autonomia moral, com a assunção voluntária, consciente e racional de valores que o próprio indivíduo legitima e considera como válidos para si e para todos os seres humanos, não importa quem sejam. Para ocorrer essa forma de assunção de valores, os indivíduos devem viver em ambientes onde os conflitos sejam oportunidades de aprendizagem, que haja participação e predominem relações de confiança, cooperação e respeito mútuo. Assim, é preciso oferecer alternativas ao modelo de escolas cívico-militares e às propostas reducionistas de aumento do rigor e do controle, diante da dificuldade das instituições educativas em lidar com os problemas de convivência. Discutir o modelo de convivência escolar implica debater o tipo de sociedade que queremos construir. É imperioso apresentar outros modelos adaptados à realidade das escolas brasileiras, devidamente fundamentados em pesquisas, como evidenciam as experiências de outros países que já avançaram em políticas públicas nessa área. REFERÊNCIAS ABRAMOVAY, M. (org.). Diagnóstico participativo das violências nas escolas: falam os jovens. Rio de Janeiro: FLACSO, OEI, MEC, 2016. BELLEI, C.; VANNI, X.; VALENZUELA, J. P.; CONTRERAS, D. School improvement trajectories: an empirical typology. School Effectiveness and School Improvement, v. 27, n. 3, p. 275-292, 2016. Disponível em: https://educacion.udd.cl/files/2017/11/School-improvement-trajectories-an-empirical-typology.pdf. Acesso em: 12 ago. 2020. BERKOWITZ, M. W.; BIER, M. C.; MCCAULEY, B. Effective features and practices that support character development. In: NATIONAL ACADEMIES OF SCIENCES, ENGINEERING, AND MEDICINE WORKSHOP ON DEFINING AND MEASURING CHARACTER EDUCATION, 2016, Utah. Anais [...]. Utah: Center for Character and Citizenship, University of Missouri-St. Louis, 2016. Disponível em: https://sites.nationalacademies.org/cs/groups/dbassesite/documents/webpage/dbasse_173493.pdf. Acesso em: 17 mar. 2019. BRASIL. Lei n. 9394, de 20 de dezembro de 1996.Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional.Brasília, DF: Presidência da República, 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 14 abr. 2021. BRASIL. Decreto n. 10.004, de 05 de setembro de 2019. Institui o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares. Brasília, DF: Presidência da República, 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D10004.htm. Acesso em: 14 mar. 2020.
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321308BRESSOUX, P. As pesquisas sobre o efeito-escola e o efeito-professor. Educação em Revista. Belo Horizonte, n. 38, p. 17-88, 2003. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/271134780_As_pesquisas_sobre_o_efeito-escola_e_o_efeito-professor. Acesso em: 15 abr. 2021. CAMPOS, S. B. A responsividade no Programa “A Convivência Ética na Escola”:Um olhar para a transformação. 2020. 209 f. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, SP, 2020. DEBARBIEUX, E. et al. Le Climat scolaire: définition, effets et conditions d´amélioration.2012.France: MEN-DGESCO/Observatoire International de la Violence à l´École, 2012. DEDESCHI, S. C. C. Bilhetes reais e/ou virtuais: uma análise construtivista da comunicação entre escola e família. 2011. Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2011. FRICK, L. T. et al.Estratégias antibullying para o ambiente escolar. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 14, n. 3, p. 1152-1181, 2019. DOI: 10.21723/riaee.v14i3.12380. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/12380/8250. Acesso em: 20 maio 2020. GARCIA, J.; TOGNETTA, L. R. P.; VINHA, T.P. Indisciplina, conflitos e bullying na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2013. IEDE. Interdisplinaridade e Evidências no Debate Educacional. Como estão as escolas públicas no Brasil.São Paulo: IEDE, 2019. Disponível em: https://www.portaliede.com.br/wp-content/uploads/2019/04/Ambiente_Escolar_Questionarios_Saeb2017_Iede.pdf?fbclid=IwAR2QPOKXqz0tgObqlrTeisHJM-IaRkMk8HNFklhxn_OpJLuEQB_FQhIWDKQ. Acesso em: 03 nov. 2019. LEVIN, B.; FULLAN, M. Learning about System Renewal. Educational Management Administration & Leadership, v. 36, n. 2, p. 289-303, 2008. Disponível em: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1741143207087778. Acesso em: 12 ago. 2020. MENIN, M. S. S. Adesão a valores sociomorais na contemporaneidade: um estudo com escolares de Ensino Fundamental e Médio.Schème - Revista Eletrônica de Psicologia e Epistemologia Genéticas, v. 11, n. esp. 5, p. 86-122, 2019. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/scheme/article/view/8903. Acesso em: 25 set. 2020. MENIN, M. S. S.; BATAGLIA, P. U. R.; ZECHI; J. A. M. (org.). Projetos bem-sucedidos de educação em valores:relatos de escolas públicas brasileiras. São Paulo: Cortez, 2013. OECD. Organização para a Economia Cooperação e Desenvolvimento. TALIS 2013 Technical Report. Paris: OECD, 2014. Disponível em: http://www.oecd.org/education/school/talis-2013-results.htm. Acesso em: 12 jul. 2019.
image/svg+xmlA convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escolaRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321309OECD. Organização para a Economia Cooperação e Desenvolvimento. Education in Brazil:an international perspective. Paris: OECD publishing, 2021. Disponível em: https://www.oecd-ilibrary.org/education/education-in-brazil_60a667f7-en. Acesso em: 17 jul. 2021. PUIG, J. M. et al. Democracia e participação escolar: propostas de atividades.São Paulo: Moderna, 2000. SALLÁN, J. G.; BARRERA-COROMINAS, A. (org.). La convivencia en los centros educativos de educación básica en Iberoamérica. Santiago de Chile: EDO UAB Visión Consultores, 2014. SOUZA, F. F. Crise na relação pedagógica: implicações da indisciplina sobre as relações e aprendizagem em sala de aula. In:SEMINÁRIO INDISCIPLINA NA EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA, 8., 2012, Curitiba. Anais [...]. Curitiba, PR: PUC, 2012. p. 130-149. Tema: O que fazemos com as mentes rebeldes na escola?. TOGNETTA, L. R. P. (org.). Passo a passo da implementação de um Sistema de Apoio entre iguais. Americana: Adonis, 2021. URUÑUELA-NÁJERA. P. M. Aprender a convivir desde el centro educativo. Barcelona, Espanha: Octaedro, 2018. VINHA, T. P.; NUNES, C. A. A. Professional development and transformation program for ethical and democratic coexistence in Brazilian schools. In:RAMOS, M. A. et al. (org.). Redes de Cultura Escolar en pro de la Educación para la Paz: Experiencias, análisis y propuestas de intervención. Guadalajara: Ed. Fundación Vivir en Armonía. p. 162-171. VINHA, T. P.; NUNES, C. A. A. As agressões do aluno ao professor: cenários e possibilidades de intervenção na escola. Educação Unisinos, v. 24, p. 1-13, 2020. Disponível em: http://revistas.unisinos.br/index.php/educacao/article/view/edu.2020.241.33/60748040. Acesso em: 25 fev. 2021. VINHA, T. P.; NUNES, C. A. A.; MORO, A. Contemporaneidade e a convivência democrática na escola. Schème Revista Eletrônica de Psicologia e Epistemologia Genéticas,v. 11, n. esp. 6, p. 123-159, 2019. Disponível em: https://revistas.marilia.unesp.br/index.php/scheme/article/view/8904. Acesso em: 28 out. 2020. VINHA et al.Da escola para a vida em sociedade: o valor da convivência democrática. Americana: Adonis, 2017. VINHA, T. P.; TOGNETTA, L. R. P. A comunicação entre escolas e família por meio dos bilhetes ou notificações eletrônicas. In: FUENTES, M. C. P.; JURADO, M. M. M. (org.). Variables Psicológicas y Educativas para la intervención en el ámbito escolar.Granada, Espanha: GEU, 2013. p. 425-430. ZECHI, J. A. M. Educação em valores: solução para a violência e a indisciplina na escola? 2014. 250f. Tese (Doutorado em Educação) Universidade Estadual Paulista, UNESP, Presidente Prudente, 2014.
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI e Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321310Como referenciar este artigo ZECHI, J. A. M.; VINHA, T. P. A convivência ética em escolas públicas: Análise de um programa de intervenção a partir das perspectivas dos profissionais da escola. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1293-1310, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587. DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.15032 Submetido em: 15/04/2021 Revisões requeridas em: 28/12/2021Aprovado em: 16/02/2022 Publicado em: 01/04/2022
image/svg+xmlLa convivencia ética en escuelas públicas: análisis de un programa de intervención a partir de las perspectivas de los profesionales de la escuela RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1300-1317, abr./jun. 2022.e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321300LA CONVIVENCIA ÉTICA EN ESCUELAS PÚBLICAS: ANÁLISIS DE UN PROGRAMA DE INTERVENCIÓN A PARTIR DE LAS PERSPECTIVAS DE LOS PROFESIONALES DE LA ESCUELAA CONVIVÊNCIA ÉTICA EM ESCOLAS PÚBLICAS: ANÁLISE DE UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO A PARTIR DAS PERSPECTIVAS DOS PROFISSIONAIS DA ESCOLA ETHICAL COEXISTANCE IN PUBLIC SCHOOLS: ANALYSIS OF AN INTERVENTION PROGRAM FROM THE PERSPECTIVES OF SCHOOL PROFESSIONALSJuliana Aparecida Matias ZECHI1Telma Pileggi VINHA2RESUMEN: Frente a los problemas de convivencia en las escuelas, Grupo de Estudio e Investigación en Educación Moral - GEPEM elaboró el programa “La convivencia ética en la escuela”, que propone la implantación de acciones cuyo propósito es contribuir para mejorar la calidad de la convivencia escolar y del proceso de resolución de conflictos. Este artículo presenta un estudio exploratorio de carácter descriptivo que investigó las percepciones de profesores y gestores en lo que se refiere a las transformaciones, contribuciones y limitaciones del programa implantado en cuatro escuelas públicas. Se realizaron entrevistas semiestructuradas y los datos han sido analizados de modo cualitativo. La mayoría de los que contestaron las entrevistas defiende que es papel de la escuela actuar en la calidad de la convivencia favoreciendo la formación ética y lidiar constructivamente con los conflictos. Entre los cambios se destaca la importancia de la teoría que subsidia acciones; la valorización de la participación y el protagonismo estudiantil; el fortalecimiento del respeto y del diálogo en las relaciones. Las limitaciones fueron la falta de compromiso de algunos profesionales, la ausencia de espacios de diálogo y las decisiones colectivas en la escuela. PALABRAS CLAVE: Convivencia escolar. Intervención pedagógica. Formación de profesores. Educación moral. Problemas de convivencia. RESUMO: Diante dos problemas de convivência nas escolas, o Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral - GEPEM elaborou o programa “Convivência ética na escola”, que propõe a implantação de ações visando contribuir para a melhoria da qualidade da convivência escolar e do processo de resolução dos conflitos. Este artigo apresenta uma pesquisa exploratória de caráter descritivo que investigou as percepções de professores e gestores quanto às transformações, contribuições e limitações do programa implantado em 1Instituto Federal de Educación, Ciencia y Tecnología de São Paulo (IFSP), Presidente Epitácio - SP - Brasil. Profesor del curso de pedagogía. Miembro del GT de PSICOLOGÍA y Moralidad de ANPEPP. Doctora en Educación (UNESP). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6053-589X. E-mail: juliana.zechi@ifsp.edu.br 2Universidad Estatal de Campinas (UNICAMP), Campinas - SP - Brasil. Profesora en el departamento de Psicología de la Educación. Doctora en Educación (UNICAMP).. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-0510-8390. E-mail: telmavinha@gmail.com
image/svg+xmlJuliana Aparecida Matias ZECHI y Telma Pileggi VINHA RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1300-1317, abr./jun. 2022.e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321301quatro escolas públicas. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas e os dados foram analisados qualitativamente. A maioria dos respondentes defende ser papel da escola atuar na qualidade da convivência, favorecendo a formação ética e lidando construtivamente com os conflitos. Entre as mudanças, destaca-se a importância da teoria subsidiando ações; a valorização da participação e protagonismo estudantil; o fortalecimento do respeito e do diálogo nas relações. As limitações foram a falta de engajamento de alguns profissionais, ausência de espaços de diálogo e decisões coletivas na escola.PALAVRAS-CHAVE: Convivência escolar. Intervenção pedagógica. Formação docente. Educação moral. Problemas de convivência. ABSTRACT: Faced with the problems of coexistence in schools, Moral Education Research Group - GEPEM developed the program “Ethical coexistence at school”, which proposes the implementation of actions that aim to contribute to improving the quality of school coexistence and the conflict solution process. This article presents exploratory research of a descriptive character that scrutinized the perceptions of teachers and managers related to the transformations, contributions and limitations of the program implemented in four public schools. Semi-structured interviews were carried out and the data were qualitatively analyzed. Most respondents argue that it is a role of the school to act in the quality of coexistence, favoring ethical training and dealing constructively with conflicts. Among the changes, what stands out is the importance of theory subsidizing actions; valuing student participation and leadership; strengthening respect and dialogue in relationships. The limitations have been the lack of engagement by some professionals, the absence of spaces for dialogue and collective decisions at school. KEYWORDS: School coexistence. Pedagogical intervention. Teacher training. Moral education. Problems of coexistence. Introducción Existen constantes denuncias de educadores sobre conductas consideradas como violencia, agresión e indisciplina, que apuntan a la necesidad de buscar estrategias capaces de mejorar la calidad de las relaciones interpersonales en las escuelas y, al mismo tiempo, favorecer la educación ciudadana, hacia la autonomía moral. Varios estudios (ABRAMOVAY, 2016; VINHA et al., 2017; ZECHI, 2014) han indicado cómo los problemas de convivencia, en sus diferentes manifestaciones, afectan al clima escolar, las prácticas pedagógicas y las relaciones interpersonales, siendo un gran reto en la escuela. Según datos del Sistema de Evaluación de la Educación Básica (IEDE, 2019), la mitad de los directores (51.5%) reportaron haber presenciado agresiones físicas o verbales de estudiantes a maestros o personal escolar; El 68,4% de los docentes informó que ya había
image/svg+xmlLa convivencia ética en escuelas públicas: análisis de un programa de intervención a partir de las perspectivas de los profesionales de la escuela RIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1300-1317, abr./jun. 2022.e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.150321302habido agresión verbal o física entre los estudiantes3; y la indisciplina de los estudiantes es vista por el 68% de los directivos como uno de los factores que más dificulta el funcionamiento de las escuelas. El estudio Teaching and Learning International Survey(OECD, 2014) indicó que, para el 34% de los directores, en Brasil, hay intimidación u ofensa verbal entre los estudiantes semanalmente, y el 12% reporta la misma frecuencia de ofensas estudiantiles a los maestros. Entre los 34 países que participaron en el estudio, los maestros brasileños son los que más tiempo dedican a mantener el orden en el aula (20%). Otro ejemplo es el de Abramovay (2016), para quien el 70% de los estudiantes de siete capitales brasileñas experimentaron algún tipo de violencia en sus escuelas, el 27% de los cuales cyberbullying, 25% robo y/o hurto, 20% amenazas y 13% agresiones físicas. Algunos de los estudios indican que, de hecho, existe una percepción de aumento de la violencia en la escuela y una sensación de inseguridad (ABRAMOVAY, 2016; OCDE, 2021; García, GARCÍA, 2010 TOGNETTA; VINHA, 2013; VINHA et al., 2017; ZECHI, 2014). Pero hay que tener cuidado con un discurso alarmista, dando a entender que la escuela está viviendo un escenario de violencia permanente. La violencia existe, sin duda, sobre todo en algunas unidades de grandes centros y regiones vulnerables o en episodios puntuales en las escuelas, pero en un número menor que los muy sanados. Vinha et al. (2017) señalan que muchos de los datos que infieren el crecimiento de la violencia escolar consideran como tal cualquier problema de convivencia (violencia, bullying, incivilidades, indisciplina, entre otros), sin distinguirlos. Es necesario reconocer que son fenómenos de distinta naturaleza, que requieren también intervenciones diferenciadas. A menudo, se propone aumentar el rigor de las reglas y castigos para hacer frente a estos problemas (VINHA; NUNES, 2020), que implica el mantenimiento de la heteronomía4. Los problemas de convivencia, particularmente la violencia, son fenómenos multifactoriales, que van más allá de las paredes de la escuela y no pueden considerarse de forma aislada. Sin embargo, los estudios sobre la calidad del clima y la vida escolar, al explicar el "efecto escuela" en esta área, indican que cuando son percibidos como positivos 3Vale la pena señalar que el hecho de que el SAEB una en una sola cuestión la agresión física y la agresión