image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461370A UNIVERSIDADE MULTICAMPI NA REGIÃO INTEGRADA DE DESENVOLVIMENTO PETROLINA-JUAZEIRO1UNIVERSIDAD MULTICAMPI EN LA REGIÓN DE DESARROLLO INTEGRADO PETROLINA-JUAZEIRO THE MULTICAMPI UNIVERSIT IN THE INTEGRATED DEVELOPMENT REGION PETROLINA-JUAZEIRO Eduardo José Fernandes NUNES2Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA3Paulo César Marques de Andrade SANTOS4RESUMO: O objetivo do presente artigo é identificar os impactos provocados pela Universidade Multicampino desenvolvimento social, cultural e econômico na Região Integrada de Desenvolvimento (RIDE) de Petrolina (PE) - Juazeiro (BA). Inicia apresentando as teorias voltadas ao desenvolvimento local/regional do final da década de 1980, com a valorização das atividades econômicas, sociais e culturais desenvolvidas pelos sujeitos em seu próprio espaço caracterizando assim o paradigma do desenvolvimento endógeno aliada ao modelo de acumulação flexível, fugindo aos postulados keynesiano de desenvolvimento regional inseridas na macroeconomia. Trata-se de um estudo qualitativo baseado na revisão de literatura, as quais assinalam que as Universidades do Estado da Bahia (UNEB), de Pernambuco (UPE) e a do Vale do São Francisco (UNIVASF), universidades multicampi, criadas com o objetivo de levar o ensino superior ao interior dos Estados, têm contribuído, nas últimas duas décadas, tanto para a consolidação da Região como centro de excelência em Fruticultura Irrigada, como também, polo universitário de excelência nas mais variadas áreas do conhecimento promovendo o acesso a todos/as aqueles/aquelas das classes populares e que vivem distante dos grandes centros urbanos. O estudo conclui que a Universidade Multicampivem contribuindo de forma efetiva para o desenvolvimento local/regional da RIDE, não apenas na dimensão econômica, mas, também, nas dimensões política, social, cultural e 1O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Brasil (CAPES) Código de Financiamento 001, e faz parte das atividades do estágio de pós-doutoramento junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade (PPGEDUC) da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). 2Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Salvador BA Brasil. Professor Adjunto. Departamento de Educação. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade (PPGFDUC). Doutorado em Análise Geográfica Regional pela Universidade de Barcelona. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9358-8039. E-mail: eduardojosf2@gmail.com 3Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina PE Brasil. Professor Associado. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares (PPGFPPI). Doutorado em Ciências da Saúde pela PUC (PR). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5982-9954. E-mail: tarcisio.silva@upe.br 4Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina PE Brasil. Professor Adjunto do Colegiado de Pedagogia. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares (PPGFPPI). Doutorado em Educação (UFBA). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5803-2388. E-mail: paulo.marques@upe.br
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461371inclusiva quando promove o ingresso de atores sociais que antes não tinham a oportunidade de acesso ao ensino superior. PALAVRAS-CHAVE:Desenvolvimento local. RIDE. Universidade Multicampi. RESUMEN: Este artículo destaca la importancia de la Universidad Multicampi en el desarrollo social, cultural y económico en la Región Integrada de Deserrollo (RIDE) de Petrolina (PE) - Juazeiro (BA). Se inicia presentando teorías orientadas al desarrollo local / regional de finales de la década de 1980, con la valoración de las actividades económicas, sociales y culturales desarrolladas por los sujetos en su propio espacio, caracterizando así el paradigma de desarrollo endógeno aliado al modelo de acumulación flexible, huyendo de los postulados keynesianos del desarrollo regional incrustados en la macroeconomía. Las Universidades del Estado de Bahia (UNEB), de Pernambuco (UPE) y del Vale do São Francisco (UNIVASF), universidades multicampi, creadas con el objetivo de llevar la educación superior al interior de los Estados, han contribuido en los últimos dos décadas, tanto por la consolidación de la Región como centro de excelencia en Fruticultura de Riego, como centro universitario de excelencia en las más variadas áreas del conocimiento, contribuyendo al desarrollo local / regional en sus dimensiones económica, social y cultural . PALABRAS CLAVE: Desarrollo local. RIDE. Universidad Multicampi. ABSTRACT: This article highlights the importance of the Multicampi University in social, cultural and economic development in the Integrated Development Region (Região Integrada de Desenvolvimento - RIDE) of Petrolina (PE) - Juazeiro (BA). It begins by presenting theories aimed at local/regional development of the late 1980s, with the appreciation of economic, social and cultural activities developed by the subjects in their own space, thus characterizing the paradigm of endogenous development allied to the flexible accumulation model, fleeing from Keynesian postulates of regional development embedded in macroeconomics. The University of the State of Bahia (UNEB), The University of Pernambuco (UPE) and University of the Vale do São Francisco (UNIVASF), multicampi universities, created with the objective of taking higher education to the interior of the States, have contributed in the last two decades , both for the consolidation of the Region as a center of excellence in Irrigated Fruit Growing, as well as a university center of excellence in the most varied areas of knowledge, contributing to local/regional development in its economic, social and cultural dimensions. KEYWORDS: Local development. RIDE. Multicampi University. IntroduçãoA globalização, para além de um fenômeno socioeconômico resultante das condições sociais específicas criadas no entorno das condições de produção, consumo e acumulação de riqueza, é um processo histórico de integração e interdependência regional com forte influência política, social, cultural, religiosa e econômica. É um processo complexo e
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461372transversal que, como diz Sousa Santos (2020), atravessa diversas áreas da vida social inclusive as práticas culturais e identitárias e as maneiras de busca do saber ou conhecimento (SANTOS, 2020). Sua eficiência se sustenta, por um lado, no avanço da ciência informacional por meio das novas tecnologias digitais de informação e de comunicação que criam redes por onde passam os fluxos financeiros e as formas de controle do capital entre países que constituem blocos econômicos; e, por outro, pelos preceitos neoliberais que romperam, em boa parte, com as práticas do Estado Social, estabelecendo o Estado mínimo com um maior empoderamento e eficiência alocativa de recursos por meio da casta empresarial internacional. Isso posto, como resposta a esse modelo de globalização, a partir dos anos de 1980, um outro fenômeno em escala regional começa aglutinar nas cidades atividades econômicas com base na vocação, saberes e cultura locais. Esse fenômeno conhecido como desenvolvimento endógeno, é resultante das dinâmicas das interações ambientais, antropológicas, culturais, científicas, econômicas, políticas, tecnológicas, sociais e educativas, que contribuem com a reconfiguração do modelo de desenvolvimento do território. Um desses territórios é a Região Integrada de Desenvolvimento (RIDE), um conjunto de municípios pertencentes a dois Estados vizinhos com características socioeconômicas similares para implantação e implementação de políticas públicas que produzam efeitos positivos para todo o território. Nesse sentido, a RIDE passou a ser considerada como instrumento de planejamento de ações comuns, captação e maximização de recursos (IBGE, 2019). Com objetivo de organizar o território, captar recursos e maximizar o uso dos equipamentos públicos, as RIDE são potencializadoras de desenvolvimento local/regional. O termo local ganhou um statusestratégico nas economias das nações, alcançando uma importância vital no tecido econômico, graças às oportunidades decorrentes da reestruturação das plantas industriais flexíveis e dos arranjos produtivos (MARTINELLI; JOYAL, 2004, p. 53). A noção de desenvolvimento local, lembra-nos Vanier (2008), tende a acionar duas lógicas contrapostas: uma lógica exógena e uma lógica endógena. A primeira, estariam associados atributos de um tipo de organização fordista do trabalho industrial e sua dinâmica espacial. Por meio dela, dar-se-ia uma integração renovada de regiões, cidades ou localidades em circuitos nos quais elas encontram uma função especializada, em troca de uma certa transformação social tal como acesso à habitação
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461373moderna, elevação do nível geral de alfabetização, novos espaços de consumo (VANIER, 2008). Contraposta a este “regime de acumulação”, a lógica endógena que guiaboa parte dos modelos de desenvolvimento local (ACSELRAD, 2002, p. 33) estabeleceria uma organização socioeconômica alternativa, que substituiria o sistema fordista em crise, caracterizando-se pela capacidade de ativar e combinar recursos próprios até então negligenciados, práticas potencialmente inovadoras, poupança local, ofertas de emprego correspondentes às novas aspirações coletivas quanto à qualidade de vida, meio ambiente, lazer , identidade e cultura, entre outras.. Essa nova configuração do território produzidos pela desterritorialização e reterritorialização, como bem assinalam Guattari (2009), Haesbaert (2002) e Refestin (2009), produzem uma nova relação de produção real e simbólica que impactam diretamente nos aspectos sociais, econômicos e culturais do lugar, onde o desenvolvimento do território passa a ser alvejado não mais pela sua capacidade de atrair investimentos produtivos, mas por gerar esses investimentos (AMARAL FILHO, 2009). Estre as instituições afetadas por essa nova configuração territorial está a universidade, que como Instituição de Ensino Superior (IES), é um exemplo de instituição composta por diversas organizações que transformam, produzem, religam e mantêm sujeitos em constante interação e inter-relação com os sistemas presentes no espaço que ocupa. A IES é um local de produção e reprodução dos valores, das expectativas e dos fatos concretos que são tratados em sala de aula, nos laboratórios e atividades práticas desenvolvidas por estudantes em sua formação inicial ou continuada. O resultado das ações da IES implica na melhoria das relações tanto no contexto social, quanto no econômico e cultural. Nesse sentido, ela é responsável por criar e desenvolver políticas públicas para atender expectativas e as demandas sociais que circundam a educação, e no entorno da Universidade, o território. Espaço onde são exercidas as relações de poder nos diversos contextos tais como: antropológico, ambiental, cultural, econômico, jurídico, político e simbólico. É nele que a Universidade finca os pilares do Ensino, da Pesquisa e da extensão, na expectativa de que, na interação desses pilares, consiga cumprir sua missão educacional e atender às demandas do lugar. Deste modo, o objetivo do presente estudo, foi identificar os impactos provocados pela Universidade Multicampino desenvolvimento social, cultural e econômico na Região Integrada de Desenvolvimento (RIDE) de Petrolina (PE) - Juazeiro (BA). O artigo enfatiza a importância do processo de interiorização do ensino superior, em sua estrutura multicampi, e
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461374como essa instituição tem colaborado com o desenvolvimento dos territórios em suas diversas dimensões: econômica, social, política e cultural. O território pesquisado foi a Região Integrada de Desenvolvimento RIDE Petrolina-Juazeiro composta por um conjunto de oito municípios pertencentes aos Estados de Pernambuco e Bahia. Esse espaço tem características socioeconômicas semelhantes o que tem possibilitado investimentos em políticas públicas que produzam efeitos para todo o território. Nele estão presentes as universidades multicampido Estado da Bahia (UNEB), de Pernambuco (UPE) e do Vale do São Francisco (UNIVASF). Essas instituições juntas ofertam cerca de 2000 vagas/ano, em 34 cursos de graduação dos quais 11 cursos são de licenciaturas e 23 cursos são de bacharelados. Nos campilocalizados na cidade de Juazeiro (BA), concentram a maioria dos cursos de Engenharia com uma oferta de 400 vagas nas Engenharias Agronômica, de Bioprocessos e Biotecnologia, Agrícola e Ambiental, Civil, de Computação, de Produção, Elétrica e Mecânica. Nos campilocalizados em Petrolina (PE) concentram os cursos para formação de professores com uma oferta de 630 vagas nas licenciaturas em Ciências Biológicas, Educação Física, Geografia, História, Letras, Matemática e Pedagogia, e os cursos de saúde que concentram 360 vagas distribuídas entre os cursos de Enfermagem, Fisioterapia, Medicina e Nutrição. Quadro 1Distribuição da oferta de vagas/ano pelas Universidades multicampi 2018/2019 CURSOS VAGAS % Engenharias 400 20% Licenciaturas 630 31,5% Saúde 360 18% Outros 610 30,5% Total 2000 100% Fonte: Criado pelos autores Além dos cursos de Engenharia, Formação de Professores e Saúde, que juntos concetram 69,5% das vagas ofertadas na RIDE Petrolina e Juazeiro, 30,5% das vagas estão distribuídas entre os cursos de Administração, Direito, Jornalismo e Multimeios, Zootecnia, Artes Visuais, Medicina Veterinária entre outros. Pertencente a cátedra de estudos sobre o desenvolvimento local/regional, o aporte teórico apresenta autores de referência das áreas da Educação, Geografia e Sociologia produzindo um estudo multi e interdisciplinar importantes para estudantes, pesquisadores e acadêmicos que estudam as teorias do desenvolvimento e a contribuição das instituições de ensino superior nos resultados alcançados.
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461375Além da introdução, o estudo apresenta mais quatro seções: A universidade e o territórioque trata do processo de territorialização, do desenvolvimento endógeno e o papel da Universidade no desenvolvimento local/regional; ARide Petrolina e Juazeiroque caracteriza o território e mostra as forças organizativa responsável peal composição, interação e cooperação dos papéis sociais presentes no espaço e a força competitiva que auxilia no aperfeiçoamento dos instrumentos e técnicas produtivas. A seção Contribuição da universidade multicampiMulticampia ou multicampicom a RIDE Petrolina-Juazeiroque apresenta a funcionalidade da estrutura multicampi, o processo histórico e seu campo de atuação no território por meio das atividades de ensino, pesquisa e extensão na formação do capital cultural voltado a realidade do semiárido, desenvolvimento da vocação econômica e a divulgação dos valores históricos herdados de cada município que compõe o lugar. Por fim seguem as considerações finaisque apresentam os resultados desta pesquisa qualitativa cunhada por uma revisão de literatura documental e bibliográfica (não consta no resumo, caso a utilize, levar também este procedimento para o resumo) realizada ao enfatizar os impactos da universidade multicampimulticampia ou multicampi na RIDE Petrolina-Juazeiro por intermédio das atividades de ensino, pesquisa e extensão que auxiliam na formação do sujeito crítico-reflexivo, no desenvolvimento de tecnologias para criação de instrumentos e técnicas produtivas, e o desenvolvimento de competências e habilidades voltadas para as especificidades do território. A Universidade e o Território Para qualquer leigo em qualquer parte do mundo que esteja distante das discussões acadêmicas, a educação superior assume um papel de destaque no desenvolvimento do território que integra. Mas, a bem da verdade, no Brasil, essa participação é algo bem recente e inicia-se com a autonomia didático-científica das Universidades, conquistada com a promulgação da Constituição Federal de 1988, associada ao princípio da indissociabilidade “entre ensino, pesquisa e extensão”, conforme descrito no Art. 207 (BRASIL, 1988). A autonomia didático-pedagógica possibilitou, trazer para o ambiente acadêmico e levar para a comunidade no entorno, discussões relativas aos problemas de ordem política, social e econômica produzindo reflexões de suma importância para a vida das pessoas além de prestar serviços educativos especializados na produção de competências e habilidades para criação e difusão de tecnologias que tragam benefícios para as pessoas e ao processo de territorialização.
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461376Para Solins (2009), a territorialização apresenta três aspectos distintos: (I) os elementos caracterizadores da territorialidade presentes na organização social como pode ser observado no interior dos grupos, nas redes e entre redes; (II) a presença de técnicas e formas que moldam determinado lugar. Entende-se aqui lugarcomo espaço que agrega características comuns como vegetação, clima e etc., mas também, segundo Milton Santos (2003, p. 62) “não há mais como distinguir [...] lugar e região. Região e lugar são a mesma coisa. Todos se derivam de um conceito-matriz: espaço, e expressam espacialidades relativas ao contexto em que é utilizado” (ISSA; CÁSSIO, 2009, p. 76) e, (III) a territorialidade é resultante de um processo de enraizamento da identidade, cultura, história, crenças, valores, aspectos presentes nas relações sociais, econômicas e políticas. Observado o território por essa dimensão - em constante processo de adaptação e transformação - percebemos que a universidade além de contribuir com elementos para produção material do espaço com empreendimentos e tecnologias resultantes da pesquisa aplicada para resolver problemas emergentes, propicia a formação de valores que serão perpetuados por meio da reflexão transformadora produzida pela educação. No entanto, por muito tempo, soluções para os problemas críticos do território foram pensados por meios de critérios exarados da teoria clássica do desenvolvimento regional, também conhecida como teoria centro-baixo5, e elenca três teses potencialmente capazes de gerar desenvolvimento ancorado numa força propulsora exógena que pode influenciar positivamente, a partir do centro das regiões, as atividades econômicas que são elas: a teoria da base de exportação, a teoria do polo de crescimento e a teoria de difusão. A teoria da base de exportação vê no incremento das atividades da economia a possibilidade de gerar excedentes para comercialização com outras regiões, a força principal do processo de desenvolvimento regional; a teoria dos polos de crescimento desenvolvida por Perroux (1967) assinala que a força motriz do desenvolvimento está localizado em uma região, onde, geralmente grupos de unidades produtivas de bens de capital ou de consumo, geram efeitos positivos e negativos para outras regiões, na medida em que esses efeitos vão se acumulando a atividade motriz se tornará um polo propulsor da economia da regional. No entanto, investimentos governamentais para o desenvolvimento ancoradas nas teorias tradicionais com base nas forças exógenas (fatores de ordem externa), em sua maioria não levam em consideração setores importantes da comunidade local e em consequência reforçam os problemas de ordem social e política existentes. A constatação desse fato, deu 5Porque os projetos e propostas para as soluções dos problemas do lugar eram pensadas e decididas por políticas, políticos e governantes que ficavam/ficam distantes da região.
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461377origem a uma nova teoria com base nas competências e habilidades geradas nesse espaço local. Denominada de teoria do desenvolvimento endógeno, ela prevê o desenvolvimento a partir da articulação dos atores locais no uso das potencialidades do lugar como bem assinala Martinelli e Joyal (2004, p. 11): O modelo [de desenvolvimento endógeno] pode ser definido como um desenvolvimento realizado de baixo para cima, ou seja, partindo das potencialidades socioeconômicas originais do próprio local, em vez de um modelo de desenvolvimento imposto de cima para baixo pelo poder central do estado. Essa teoria enseja três dimensões distintas e nos remete ao universo das políticas públicas: a relação do Estado com a economia; a participação das Universidades e centros de pesquisas por meio das ações de ensino, pesquisa e extensão e; os programas e projetos que estimulam o desenvolvimento das vocações locais e a difusão tecnológica. Da relação do Estado com o mercado, destacam-se as relações de construção do espaço local/regional, a cultura e o processo histórico das concepções de seu desenvolvimento. Da participação das Universidades e centros de pesquisas, evidencia-se que se tratam de instituições que produzem, atualizam e transformam informações em conhecimento capazes de produzir bens de consumo e bens de capital. Dos programas e projetos, sublinha-se a importância da promocação do desenvolvimento das vocações locais e a difusão tecnológica que partem tanto da ação do Estado em sua reação com economia por intermédio das instituições profissionalizantes e de fomento, quanto da ação das instituições de ensino superior por meio do ensino, pesquisa e/ou extensão. Observa-se então que a missão da Universidade está intrinsicamente ligada ao do território que é “umconstruto histórico-social, possuidor de uma qualidade necessária e resultante do processo que o produz; ele se refere de maneira aberta a realizações concretas, materializadas, localizadas e enraizadas (SOLINÍS, 2009, p. 97). A territorialização, ao dar uma determinada ordem aos elementos dispersos em um âmbito qualquer, produz o conceito de lugar. Longe de ser apenas um espaço geográfico, o território agrega comportamentos de organização e reorganização social que permeiam as relações do homem com o espaço, como pode ser observado na Região Integrada de Desenvolvimento localizada no nordeste brasileiro entre os Estados de Pernambuco e Bahia. Onde são desenvolvidos projetos e programas comuns de desenvolvimento local/regional. Esse território foi criado em 2001 e passou a ser chamado de RIDE Petrolina-Juazeiro.
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461378Ride Petrolina-Juazeiro Criada pela lei complementar 113 de 19/09/2001 (BRASIL, 2001) e regulamentada pelo Decreto 4.366, de 09/2002 (BRASIL, 2002), a RIDE Petrolina-Juazeiro ocupa um espaço formado pelos municípios dePetrolina, Lagoa Grande, Orocó, Santa Maria da Boa Vista no Estado de Pernambuco; e Juazeiro, Casa Nova, Curaçá e Sobradinhono Estado da Bahia. Concentra uma população de686 mil habitantes (Censo 2010) (BRASIL, 2010), em uma área de 35 mil quilômetros quadrados, conforme segue a localização na figura 1.Figura 1RIDE Petrolina Juazeiro Fonte: Plano de Ação (BRASIL, 2010) Trata-se de uma área de terra com solo de rochas cristalinas onde em sua grande maioria composta por gnaisses, granitos, migmatitos e xistos. De relevo plano e ondulado, sua localização geográfica associada ao clima semiárido prospecta um cenário de limpidez atmosférica na maioria dos meses do ano, sendo os meses de março e abril os mais úmidos com a umidade relativa do ar variando em torno de 61% a 65% na cidade de Juazeiro da Bahia e 66% a 71,5% na cidade de Petrolina - Pernambuco (EMBRAPA, 2021)66Agência de Informação Embrapa Condições climáticas do Vale do São Francisco (2021).
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461379Com o passar do tempo, a RIDE tornou-se grande polo tecnológico da fruticultura irrigada. Em 2018, o Produto Interno Bruto da região alcançou a marca de R$ 13,6 milhões de reais. Nesse mesmo período, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da região, que reflete as condições de renda (padrão de vida), saúde (expectativa de vida) e educação (alfabetização de adultos e níveis de escolarização) registrou índice médio de 0,618. Índice expressivo quando comparado a de outras cidades do semiárido ou sertão nordestino. Cada município integrante da RIDE desempenha um papel fundamental nos resultados econômicos alcançados, esse construto é resultante da cooperação e competição que os atores (sujeitos, empresas, organizações) desempenham. Mas cada um dos municípios mantém suas características socioculturais, suas tradições e seus valores herdados. São essas diferenças presentes no espaço que possibilitam o desenvolvimento de políticas de desenvolvimento coerentes com as reais necessidades de cada município. Nesse sentido, Becker (2003) enfatiza que a base do desenvolvimento regional se concentra nas interações construídas no espaço local. Para a autora, conhecer e identificar atores e potencialidades existentes nesse espaço pode viabilizar o seu crescimento econômico. O fortalecimento sistêmico local e a dinâmica da comunicação entre municípios da RIDE, favorece as relações sujeito versussujeito nos diversos sistemas e suas possíveis interações nas definições e alcance de metas e objetivos comuns. Por isso, o ponto de partida teórico-metodológico [dos planejamentos de desenvolvimento] é a base local. Sobre e a partir dessa base localizada ocorrem as múltiplas determinações-desafios em seus múltiplos sentidos: do setorial para o regional, ou vice-versa; do econômico-corporativo transnacionalizado para o sócio-ambiental regionalizado, ou viceversa; do global para o local, ou vice-versa; do econômico para o social, ou vice-versa; do mercado para a sociedade, ou vice-versa; compondo um processo de articulações configuradas por um conjunto de relações setoriais e espaciais ou conexões internas, estruturantes das dinâmicas diferenciadas dos processos de desenvolvimento regional (BECKER, 2003, p. 107-108, grifo nosso). Os resultados dessa interação entre sistemas promovem a prospecção das organizações via interação entre porções do espaço geográfico o que é motivado pelos movimentos de cooperação e competição entre organizações. Nesse ínterim, acompanhar, compreender e desenvolver instrumentos de cooperação e competição com outras regiões possibilitam ganhos econômicos, financeiros e sociais para o espaço local. O ambiente produtivo, nessa perspectiva, é aquele que compreende duas forças distintas, mas que se completam: a força organizativa responsável pela composição, interação e cooperação dos papéis sociais no espaço local e a força competitiva que auxilia no
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461380desenvolvimento e aperfeiçoamento contínuo dos instrumentos e técnicas produtivas. Isso porque, no momento em que as relações dos agentes locais passam a definir as formas de produzir a criação dos meios e modos de produção a serem utilizados no processo de acumulação econômica, o local passa a ser considerado como [...] um ambiente produtivo inovador construído e alicerçado em instituições com base na cooperação e integração das cadeias produtivas e das redes econômicas sociais, de tal modo que ele amplie as oportunidades locais, gere trabalho e renda, atraia novos negócios e crie condições para um desenvolvimento humano sustentável (MARTINELLI; JOYAL, 2004, p. 61). Esses ambientes são mantidos pelas redes de cooperação e integração das cadeias produtivas e possibilitam a sua expansão econômica e social pela capacidade de produzir em escalas cada vez maiores, desenvolver mais habilidades tecnológicas por intermédio da inovação e mais competitividade com menores custos. As Instituições de Ensino Superior (IES), como instituições aprendentes, desenvolvem um papel importante nesse contexto. São elas que criam, estimulam e desenvolvem competências e habilidades para o trabalho e aperfeiçoamento das cadeias produtivas, como, também, a formação do sujeito crítico e reflexivo capaz de agir de forma autônoma nas interações sociais construídas tanto no âmbito do município, quanto na interação com outros municípios integrantes da RIDE. Para Almeida (1980, p. 32), “A universidade exerce as funções básicas de reproduzir e de criar. Desenvolvimento é criação, produção de novas formas, de novas relações de produção. Desenvolvimento é o envolvimento do homem com a natureza e a sociedade.”. A Região Integrada de Desenvolvimento de Petrolina-Juazeiro conta com cinco IES públicas das quais três são multicampi: a Universidade do Estado da Bahia (UNEB), a Universidade de Pernambuco (UPE) e a Universidade do Vale do São Francisco (UNIVASF). As duas primeiras já estavam na região antes da criação da RIDE e a UNIVASF, que foi criada em 2002, no mesmo ano de sua criação. Com exceção da UNIVASF, a UNEB e a UPE foram criadas transformando, em campi,as faculdades isoladas existentes no interior dos Estados da Bahia e de Pernambuco. Na cidade de Juazeiro, duas faculdades passaram por essa transformação: a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCLJ) e a Faculdade de Agronomia do Médio do São Francisco (FAMESF). Em 1983, a FFCLJ passou a ser chamada de Departamento de Ciências Humanas (DCH), que atualmente, reúne os cursos de Pedagogia e Comunicação Social Jornalismo e Multimeios; em 1997, a FAMESF, passou a ser chamada de Departamento de
image/svg+xmlEduardo José Fernandes NUNES; Tarcísio Fulgêncio Alves da SILVA e Paulo César Marques de Andrade SANTOSRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461381Tecnologia e Ciências Sociais (DTCS) que reúne, atualmente, os cursos de Engenharia Agronômica, Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia, e Direito. Além dos cursos de formação inicial, a UNEB Campus III tem à disposição da RIDE Petrolina-Juazeiro quatro Programas stricto-sensu: Programa de Pós-Graduação em Agronomia: Horticultura Irrigada; Programa de Pós-Graduação em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental; Programa de Pós-Graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Territorial; Pós-Graduação em Educação, Cultura e Territórios Semiáridos; e, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Educação. Na cidade de Petrolina, integra-se a essa transformação a Faculdade de Formação de Professores (FFPP) que, em 1990, tornou-se campi da Universidade de Pernambuco (UPE). Atualmente o campusreúne os cursos de Enfermagem, Fisioterapia, Nutrição, Licenciaturas Ciências Biológicas, em Geografia, História, Letras, Matemática e Pedagogia. Além dos Programas de Pós-Graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares, registram-se o Programa de Pós-Graduação em Reabilitação e Desempenho Funcional, o Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia Ambiental para o Semiárido e o Programa de Pós-Graduação em Etnobiologia e Conservação da Natureza. Este último, em parceria com a Universidade Federal Rural de Pernambuco, a Universidade Federal de Pernambuco, a Universidade Regional do Cariri e a Universidade Estadual da Paraíba. A UNIVASF foi criada como instituição multicampi para atender as Regiões do Vale e Médio São Francisco. Na RIDE são dois campi o campusde Juazeiro com os cursos de formação inicial em Artes Visuais, Ciências Sociais, Engenharia Agrícola e Ambiental, Engenharia Civil, Engenharia da Computação, Engenharia de Produção, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecânica. E o campus de Petrolina com os cursos de Administração, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Medicina, Psicologia, Ciências Biológicas, Engenharia Agronômica, Medicina Veterinária e Zootecnia.Além desses cursos de formação inicial, são oferecidos cursos de Pós-Graduação em Agronomia Produção Vegetal, Pós-Graduação em Ciência Animal, Pós-Graduação em Ciências Veterinárias no Semiárido, Programa de Pós-Graduação em Biociências, Pós-Graduação em Dinâmicas de Desenvolvimento do Semiárido, Pós-Graduação em Ciências dos Materiais, Pós-Graduação em Engenharia Agrícola, Mestrado Profissional em Extensão Rural, Doutorado Profissional em Agroecologia e Desenvolvimento Territorial, além dos Mestrados em Rede como Mestrado em Ensino de Física, e, Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para Inovação, em Sociologia, em Administração Pública.
image/svg+xmlA universidade multicampi na região integrada de desenvolvimento Petrolina-JuazeiroRIAEERevista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 2, p. 1370-1386, abr./jun. 2022. e-ISSN: 1982-5587 DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i2.157461382Contribuições da Universidade multicampi multicampiana RIDE Petrolina-Juazeiro