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Educações no contexto das bandas de pífanos e do Candomblé
RIAEE
– Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1926-1942, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.16764
1926
EDUCAÇÕES NO CONTEXTO DAS BANDAS DE PÍFANOS E DO CANDOMBLÉ
EDUCACIÓN EN EL CONTEXTO DE LAS BANDAS DE PÍFANOS Y DEL
CANDOMBLÉ
EDUCATIONS IN THE CONTEXT OF FIFE BANDS AND CANDOMBLÉ
Elinaldo Menezes BRAGA
1
Belijane Marques FEITOSA
2
Marizete LUCINI
3
Alfrancio Ferreira DIAS
4
RESUMO
:
Este trabalho objetiva discutir as práticas educativas no contexto das bandas de
pífanos e do candomblé. O tema vincula-se às pesquisas que ora desenvolvemos no curso de
doutorado em educação da Universidade Federal de Sergipe. Esta escrita toma como referências
as narrativas do pifeiro
5
Vanildo Franco e do
babalorixá
6
Walter Ti’Ogun, partindo do
entendimento de que não é somente na escola que se apreende, pois concordamos que a
educação acontece também fora dela. Trata-se de um trabalho de abordagem qualitativa, com
o suporte da história oral por meio de entrevistas semiestruturadas. A discussão realizada está
referenciada em estudos decoloniais, numa perspectiva crítica que encanta e liberta. Como
resultados, percebemos que nos processos educativos analisados a curiosidade, a observação, a
repetição, a brincadeira e o afeto são as principais categorias que promovem encantamento nos
pifeiros e nos candomblecistas.
PALAVRAS-CHAVES
: Banda de pífanos. Candomblé. Decolonialidade. Educação.
RESUMEN
:
Este trabajo tiene como objetivo discutir las prácticas educativas en el contexto
de las bandas de pífanos y el candomblé. La temática está vinculada a la investigación que
hemos desarrollado en el curso de doctorado en educación de la Universidad Federal de
Sergipe. Este escrito toma como referencias las narraciones del pifeiro Vanildo Franco y del
babalorixá Walter Ti’Ogun, partiendo del entendimiento de que no es sólo en la escuela donde
se aprende, porque estamos de acuerdo en que la educación también ocurre fuera de ella. Se
trata de un enfoque cualitativo, con el apoyo de la historia oral a través de entrevistas
1
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras – PB – Brasil. Professor do Curso de Letras
Língua Inglesa. Doutorando em Educação (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8056-3430. E-mail:
naldinhobraga2018@gmail.com
2
Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras – PB – Brasil. Professora Adjunta IV. Mestrado
em Educação (UFPB). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9512-9397. E-mail: belimare.pb@gmail.com
3
Universidade Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão – SE – Brasil. Professora do Departamento de Educação.
Doutorado em Educação (UNICAMP). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1532-8968. E-mail:
marizetelucini@gmail.com
4
Universidade Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão – SE – Brasil. Professor Adjunto II do Departamento de
Educação. Doutorado em Sociologia (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5562-0085. E-mail:
diasalfrancio@academico.ufs.br
5
Aquele que toca pífano.
6
Babalorixá ou pai-de-santo é o sacerdote das religiões afro-brasileiras.
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semiestructuradas. La discusión es referenciada en estudios decoloniales, en una perspectiva
crítica que encanta y libera. Como resultados, notamos que en los procesos educativos
analizados la curiosidad, la observación, la repetición, el juego y el afecto son las principales
categorías que promueven el encantamiento en los pifeiros y candomblecistas.
PALABRAS CLAVE
: Banda de pífanos. Candomblé. Educación. Decolonialidad.
ABSTRACT
:
This work aims to discuss educational practices in the context of the fife bands
and candomblé. The theme is linked to the research we are currently developing in the doctoral
course in education at the Federal University of Sergipe. This writing takes as references the
narratives of the pifeiro Vanildo Franco and the babalorixá Walter Ti‘Ogun, starting from the
understanding that it is not only in the school that one learns, because we agree that education
also happens outside of it. This is a qualitative approach, supported by oral history through
semi-structured interviews. The discussion carried out is referenced in decolonial studies in a
critical perspective that enchants and frees. As a result, we noticed that in the analyzed
educational processes, curiosity, observation, repetition, play and affection are the main
categories that promote enchantment in the pifeiros and candomblecistas.
KEYWORDS
: Bands of pífanos. Candomblé. Decoloniality. Education.
Introdução
A discussão que propomos parte do entendimento de que não existe somente um tipo de
educação e de que é fora da sala onde mais se aprende, como nos dizem Brandão (2013) e Illich
(1985), respectivamente. Neste sentido, para discutirmos algumas práticas educativas populares
que constituem os sujeitos que vivenciam os saberes e fazeres relativos às bandas de pífanos
7
e
ao candomblé
8
, este trabalho dialoga com duas experiências, uma no contexto musical,
vivenciada pelo músico Vanildo Franco, e outra no campo religioso, vivenciada pelo
babalorixá
Walter Nunes de Souza.
Para fundamentarmos teoricamente o trabalho, considerando que as bandas de pífanos
e o candomblé não fazem parte do projeto colonial de poder que normatiza modos de ser, de
saber, de viver e de se relacionar com o sagrado, buscamos estabelecer diálogos entre o que os
colaboradores nos dizem em suas narrativas e o que nos propõem alguns pensadores
progressistas que objetivam a libertação dos sujeitos a partir de uma educação crítica e
decolonial. Daí os nossos olhares estarem voltados para os processos de educação acima
7
Pífanos – Flauta rústica fabricada tradicionalmente de bambu. Contém seis furos para digitação e um para o
sopro.
8
Candomblé é uma religião afro-brasileira derivada de cultos tradicionais africanos, que cultua Orixás, Inquices e
Voduns.
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mencionados, de modo que, através deles, possamos compreender como funciona, na prática,
o que nos falam Freire (2019, 2020, 2021), Brandão (2013), Rufino (2021), Hooks (2020),
Santos (2010), Caputo (2012), Arroyo (1987) e outros pensadores que nos ensinam a transgredir
através de estudos voltados à educação popular e à crítica ao modelo de educação que, em vez
de libertar, aprisiona, domestica corpos e mentes.
O Candomblé é uma religião que surgiu no Brasil com a presença dos africanos
escravizados que carregaram, em seus corpos e memórias, seus saberes, seus valores, suas
dores, suas crenças e sua fé. Segundo Silva (2005), o Candomblé se desenvolveu, entre outros
fatores, pela necessidade que os grupos negros tiveram “[...] de reelaborarem sua identidade
social e religiosa sob condições adversas da escravidão e posteriormente do desamparo social,
tendo como referência as matrizes religiosas de origem africana” (SILVA, 2005, p. 52).
As práticas religiosas do Candomblé se desenvolvem a partir do culto a
Orixás
9
,
Inquices
10
e
Voduns
11
pertencentes às nações Ketu, Angola e Jeje, respectivamente,
abrangendo, ainda, entidades como caboclos
12
e marujos oriundos do sistema religioso
brasileiro. Trata-se, portanto, de uma síntese de tradições religiosas da África Ocidental, com
influências de outras tradições religiosas (SANTOS, 2010, p. 30).
As bandas de pífanos, por sua vez, são grupos da cultura popular
13
rural, encontrados
em quase todos os estados do Nordeste, cujas atividades estão tradicionalmente vinculadas a
eventos do catolicismo popular. Essa expressão sofre variações quanto a sua formação. No
Sertão Paraibano, por exemplo, é composta por dois pífanos, uma zabumba e uma caixa de
guerra.
Apresentados os dois temas em foco, convidamos você a seguir conosco pelas narrativas
dos colaboradores que, com o suporte da história oral, nos concederam as narrativas destacadas
abaixo.
9
Deuses cultuados no Candomblé de nação Ketu.
10
Deuses cultuados no Brasil pelos Candomblés da nação Angola no Brasil.
11
Deuses cultuados nos Candomblés de nação Jeje no Brasil.
12
Entidades presentes numa vasta gama de religiões de matriz africana no Brasil. No Candomblé convivem com
divindades africanas – Orixás, Inquices, Voduns – e têm suas festas públicas.
13
Cultura Popular, neste texto, está sendo entendida como “[...] uma série de conhecimentos heterogêneos que
constituem os saberes do povo” (GOMES; PEREIRA, 1992, p. 73).
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No Ceará, a educação popular afrouxou nós e libertou Vanildo Franco para criticamente
voar pelo mundo encantado do pífano.
[...] escuto muito dos mestres que cada pessoa tem o seu jeito de tocar, cada
pessoa tem o seu repertório próprio. Uns conhecem mais o repertório religioso
e outros o repertório de forró, mais festivo (FRANCO, 2022)
Na cena pifeira do Ceará destaca-se Vanildo Franco. Natural da zona rural de
Guaramiranga, aos doze anos experimentou o pífano pela primeira vez, quando, em meados
dos anos 90, uma organização não governamental, chegou na comunidade rural Linha da Serra
e, a partir da prática da Yoga, do canto coral infantil e de oficinas de teatro de bonecos e de
pífanos, implementou na escola um projeto popular de educação ambiental que envolvia
professoras/es e estudantes.
O oficineiro responsável pelas aulas de pífano trazia na bagagem uma formação musical
influenciada pelos pifeiros tradicionais do Cariri daquele estado, objetivando ensinar e aprender
pelo contato, observação, brincadeira, repetição e pela prática de tocar em grupo. Conforme
Vanildo Franco, antes de qualquer coisa experimentavam e aprendiam com a natureza. Assim,
a mata virava escola e as plantas e os bichos viravam professores com os quais as/os
educandas/os aprendiam. Para Illich (1985), esse direito de aprender com o mundo é cortado
quando frequentamos a escola sob a alegação de que é nela o único lugar que podemos aprender.
Visão como esta nega que as coisas mais importantes das nossas vidas são aprendidas no dia a
dia comunitário, com a família, amigos, no lazer, ou seja, no que o autor chama de teia
educacional (ILLICH, 1985, p. 25). Era exatamente assim, como revela Vanildo Franco, que
acontecia no caminho para a “escola natureza”, onde a garotada também aprendia uns com os
outros, através das brincadeiras. Mais ainda, aprendiam com plantas, rios, árvores de todo tipo,
bichos, insetos, pedras e gente. Este é um modelo de escola que habita o sonho de Rufino
(2021), nele, além de aprender com a natureza e pela brincadeira, aprende-se pelo diálogo e
pela liberdade de poder praticar a pergunta muito mais do que dar respostas.
Sobre a brincadeira, especificamente, Rufino diz que o não brincar interessa ao projeto
de mundo implementado pela lógica colonial, que, sem poesia, subordina a criança a um modo
adultocêntrico, roubando dela a oportunidade para usar o corpo, tecer partilhas, sentir o afeto e
viver a comunidade. Assim, a rebeldia e a inconformidade diante da crueldade desse mundo
que não sorri são mais do que necessárias, e uma boa estratégia para a prática da brincadeira
como expressão da liberdade é esperançar com
[...] dribles de corpo, gargalhadas, esconderijos, invenções mirabolantes,
bo
doques, bexigas d’água, exércitos de pés sujos e dedões arrebentados nos
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paralelepípedos são sempre bem-vindos para ajudar a desatar os nós dos
corpos que se acostumaram a permanecer tensos e em prontidão para a batalha
(RUFINO, 2021, p. 71).
Os dribles de corpo, as gargalhadas, os dedos arrebentados nas trilhas da mata e o
exército de crianças de pés sujos do projeto implementado na comunidade Linha da Serra
possibilitou o encantamento das crianças pela Yoga, pelo teatro de bonecos, pelo canto coral e,
em Vanildo, especialmente, pela cultura do pífano, abrindo trilhas de liberdade, afeto,
dedicação, empatia, respeito, criticidade, amorosidade, entrega e mais curiosidade.
Se as crianças tivessem ficado atreladas somente ao ensino formal da “escola de
cimento”, talvez Vanildo até fosse um educador na atualidade, mas talvez fosse mais um preso
aos currículos e metodologias que servem de combustível para o fortalecimento do projeto de
educação que promove o apartamento social e favorece a quem diz não à poesia e ao sorriso.
Talvez, na atualidade, ele estivesse em uma sala de aula onde o mais importante seriam as
respostas e não as perguntas, onde a gargalhada seria reprimida, onde não houvesse tempos e
espaços para brincadeiras, onde o terreiro da escola não fosse visto como lugar de ensinar e
aprender.
E, mesmo o mundo nos constituindo a todo instante, ele talvez alimentasse a ideia de
que lugar de criança aprender é no modelo de escola que controla corpos e mentes passivamente
bombardeados com conhecimentos prescritos, simplificados e descontextualizados da realidade
e dos anseios da sua comunidade. Escola esta que não reconhece saberes e metodologias
capazes de promover a aprendizagem de quem tem curiosidade e o prazer pela busca constante,
como acontece no contexto da cultura popular, onde se aprende e ensina mais pela oralidade,
repetindo, mantendo o contato, praticando efetivamente, observando e imitando. Sobre esse
“método”, com base nas suas vivências, Franco (2022) esclarece que:
[...] através da observação você vai aprendendo a partir da imitação, imitando
os mestres, imitando a posição dos dedos, o jeito de soprar, prestando atenção
nas melodias, decorando e tocando junto. Errando nas primeiras vezes, mas
depois acertando nas outras, e a gente fazia muito isso né, ouvir, decorava,
observava, imitava e assim ia aprendendo as músicas.
A experiência de Vanildo nas oficinas de pífanos o fez acreditar em um modelo de
escola onde os estudos teóricos são se desvinculam da prática. Conforme explicou, não faz
sentido decorar números, palavras e fórmulas sem que os educandos tenham a oportunidade de
enxergar e sentir de perto a aplicabilidade dos conteúdos em um ambiente natural, com a
comunidade, vendo os efeitos na vida das pessoas, assim como aconteceu para ele que, numa
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“simples oficina” de tocar e construir pífanos aprendeu sobre ecologia, biologia, matemática,
física, convivência social, cultura e atividades artísticas. No caso dele, a música foi rio que
desaguou num mar de conhecimentos outros. Vanildo Franco ressaltou que
[...] além de sair das quatro paredes, a escola também precisa levar a
comunidade pra dentro dela. Levar o conhecimento popular dos agricultores,
dos artesãos, dos mestres de cultura popular, porque essas são conhecedoras e
vivenciam diariamente esses conteúdos. Nesse caso, a teoria e o conhecimento
popular caminham juntos e constituem seres humanos com muito mais aporte
e referências para lidar com o mundo real (FRANCO, 2022).
A participação de Vanildo nas oficinas de pífanos fez aflorar o artista e o educador que
ele é. Com dois anos de projeto, experimentou a função de monitor e de coordenar as atividades
de compartilhamento de saberes. No início ficou confuso com a situação de ensinar algo do
qual ele ainda era aprendiz. Refletiu e chegou à conclusão de que ensinaria pelo mesmo método
que ensina e aprende até hoje, ou seja, pela “metodologia dos mestres”. Então, na prática, seus
aprendizes brincavam e exercitavam o ouvido, o olhar e a capacidade de repetir os seus
movimentos.
Paulo Freire (2019, p. 83) nos lembra da importância das/os educadoras/es e
educandas/os se assumirem
epistemologicamente curiosos,
pois, como assevera, sem a
curiosidade que nos move não se aprende nem ensina. Sabendo disso, a curiosidade de Vanildo
Franco lhe atirou na estrada rumo ao Cariri cearense para ter contato direto com os mestres
pifeiros de lá e compreender melhor os processos de transmissão de saberes musicais. Os
contatos com as bandas tradicionais também lhe fizerem perceber que o repertório dos mestres
era muito mais amplo do que ele imaginava. Como mencionou: “O repertório tradicional é uma
coleção gigantesca de melodias que eles incrivelmente guardam na memória, e só eles tocam.”
(FRANCO, 2022). Para começar a aprender tanta música, ouviu do mestre Raimundo: “Meu
fie, é só caçar nas oiças!”. Ou seja, prestar atenção, escutar e repetir (SANTANA; LUCINI,
2019).
Vanildo Franco, a partir das suas vivências, percebeu que além dos momentos em que
p
raticam a profanação, fazendo festa, celebrando casamentos, aniversários, nascimentos,
batizados, a chuva, a colheita, a fartura etc., uma das principais bases de sustentação da banda
de pífanos é a religiosidade popular. Segundo este músico, para os pifeiros, praticar o
catolicismo popular é o estabelecimento de contato direto com o divino que também se revela
pela natureza. No contexto religioso, a banda de pífano encurta o caminho entre o concreto e o
divino, e nesse caminhar sagrado, repleto de músicas tocadas nas missas, renovações, novenas,
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trezenas, acompanhamentos, consagrações, os pifeiros, atentos e sensíveis ao que vem de fora,
capturam as melodias que chegam até eles pelos ouvidos e as introduzem em seus repertórios.
Caminhando na direção contrária aos que negam o abraço às bandas de pífanos, além
de educador, Vanildo Franco tornou-se um pesquisador e luthier. O despertar para a profissão
de fabricar instrumentos também aconteceu durante o projeto de educação popular mencionado,
pois, mesmo sem nenhuma experiência, a criançada também aprendia com a prática de lidar
com ferramentas e de construir instrumentos. Hoje, em seus cursos, Vanildo faz questão de
socializar os seus saberes e de abrir as parabólicas do sensível para experimentar e aprender
mais por onde caminha (BRAGA; LUCINI 2021; MORAES JÚNIOR; OLIVEIRA, 2021;
SANTOS; RIOS, 2021).
A oficina de pífanos também despertou o Vanildo Franco compositor e, com o final do
projeto popular de educação ambiental, esse educador/luthier/pifeiro continuou caminhando e
tocando na sua comunidade, até que, em 2001, foi convidado a integrar a banda Dona Zefinha,
possibilitando que Vanildo levasse a linguagem do pífano para outros cantos do Brasil e do
Mundo. Vejamos o que ele diz sobre essa experiência de palcos:
[...] lá eu posso colocar as minhas músicas para as pessoas conhecerem, e faço
experimentos com o pífano e com a percussão. É uma experiência muito boa.
Pra mim, é muito legal porque a gente tem oportunidade de levar para outros
lugares, através da minha participação na Banda, né? Então a gente já foi aí para
vários lugares na Europa, américa Latina, e eu tocando pífano e percussão, ne?
(FRANCO, 2022).
Para Vanildo, a música das bandas de pífanos merece mais destaque. Daí, em 2018, com
o amigo Guilherme Cunha, cogitou a criação de um grupo de estudos através do qual os dois
pudessem ensinar a tocar pífano. Anunciaram a “boa nova” e deu certo. Logo apareceram 30
pessoas. Nasceu, então, o projeto Pifarada Urbana. Como ele nos explicou:
O Pifarada Urbana é o grupo que a gente trabalha com a metodologia dos
Mestres, né? Que é essa coisa do tocar observar, né? Imitar. A ir atrás e
entender, exercitar o ouvido, praticar a generosidade artística, no caso a
generosidade musical, e é esse método que a gente utiliza; [...] qualquer pessoa
que queira, mesmo sem nenhum conhecimento musical, pode participar.
Então a gente tem uma metodologia muito simples que se a pessoa conseguir
fazer uma ou duas notas no pífano, ela já entra numa apresentação, porque a
gente consegue colocar aquelas duas notas que ela faz num arranjo e ela vai
participar. A partir dali ela vai se estimulando e vai estudando e vai
aprofundando, né? (FRANCO, 2022).
As pessoas que participam aprendem a fazer o seu próprio pífano e vão aos encontros
semanais, realizados aos domingos pela manhã, no Parque Rio Branco. As aulas são gratuitas,
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não têm restrição de idade, e, os que aparecem sem pífano, mesmo ganhando um do projeto,
aprendem o processo de fabricação. Para Vanildo, disseminar o pífano tem uma carga simbólica
muito forte, pois foi através dele que ele teve acesso a um mundo que desconhecia. Como
explicou, o pífano é muito mais do que um instrumento com sete furos, é uma assinatura.
Simboliza a autenticidade, grandeza artística e a identidade de um povo. Isso provoca em
Vanildo uma necessidade de mostrar para o mundo a grandiosidade desse instrumento e da
música ancestral que seus tocadores fazem. Um tipo de música que, de tão implicada pelo
ambiente natural onde vivem os seus fazedores, tradicionalmente rurais, encontra nos pássaros,
na chuva, no vento, no cachorro, na onça, na acauã, na coruja caburé, no rio, na mata e na fé
cada mote para melodias que reviram a gente por dentro e nos harmonizam com a natureza,
com as coisas, com as pessoas e com o sagrado. Tudo isso faz Vanildo entender a importância
dos jovens conhecerem esse universo. Como ressaltou, “essa geração tik tok de hoje em dia não
tem muito conhecimento da identidade cultural deles e do que nós somos” (FRANCO, 2022).
Essa realidade contribuiu muito para que Vanildo passasse a atuar muito mais como
educador do que como músico, e a investir no
Pifarada Urbana
com a esperança de despertar
nas pessoas, através do pífano, o poder da nossa identidade cultural. Esse educador, de práticas
decoloniais, tem consciência da importância do trabalho que promove na busca de libertar as
pessoas, como enfatiza, dessa visão eurocentrista de que “[...] tudo que é bom é o que vem de
fora, e de que, na verdade, a gente tem que se desligar disso, porque isso foi uma coisa
implantada e imposta pra gente por vários motivos e de várias formas”
(FRANCO, 2022).
Diante disso, na sua avaliação,
o universo das bandas de pífanos, carregado de sabedoria
ancestral, e o pífano, especificamente, com toda a sua grandiosidade, são ferramentas capazes
de aflorar nas pessoas a necessidade ontológica de liberdade. Para a nossa conversa, Vanildo
Franco chamou
Paulo Freire para lembrar que toda educação tem que ser libertadora, tem que
ser questionadora. O educador ressaltou que de certa forma leva um pouco dessa liberdade
freiriana para os seus educandos, à medida em que a sua metodologia se pauta pela mesma em
que começou a aprender a tocar e a fabricar pífanos, reproduzindo, assim, o método tradicional.
Para concluir suas reflexões, Vanildo destacou que sentar, absorver, conviver, participar
de uma renovação, presenciar uma banda de pífanos tocando, passar um dia na casa de um
mestre, comer com ele, conversar, escutar suas histórias e tocar com ele faz você aprender muito
mais, ouvindo, observando e repetindo em vez de tentar teorizar (BRAGA; LUCINI, 2021).
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Práticas educativas no candomblé: O terreiro
14
e o fazer educação
O que a gente aprende, a gente ensina. Da mesma forma que fizeram com a
gente. Walter Nunes Souza (2022).
Na cidade de Cajazeiras - Paraíba, a prática do Candomblé é representativa. Entre os
Ilês em atividade está o liderado pelo babalorixá Walter Ti’Ogun, que, segundo nos revelou,
teve seus primeiros contatos com o sagrado quando ainda era criança. A convite de uma tia
integrante de uma casa de umbanda
15
, Walter, seus irmãos e outras crianças da família
frequentavam as festas de erê
16
. Tudo o que viam, resultava nas brincadeiras de interpretar
caboclos e orixás. Sendo de família de músicos, o papel de
ogã
17
era reservado para ele, de
modo que batia tambores improvisados, enquanto os outros rodavam e brincavam de incorporar
as entidades (FEITOSA, 2021).
O encantamento pelo que viam e aprendiam naturalmente garantiu a presença dos
garotos nos rituais abertos à comunidade. Valdemir foi o primeiro a decidir entrar na religião.
Assim, foi iniciado, fez a sua caminhada e virou pai-de-santo. Consequentemente, Walter
diariamente vivenciou o seu
barracão
18
e passou a aprender coisas que não tinha acesso. Pelo
seu relato, as casas de umbanda mais tradicionais não costumam promover o ensino através de
oficinas, por exemplo. Nelas, tudo se aprende pela observação e repetição. Mas a curiosidade
do garoto não perdia oportunidades para questionar. Nesse movimento, acabou casando com
bisneta de mãe-de-santo, e em sua residência viveu durante nove anos. Neste período, disparou
o seu repertório de questionamentos sobre simbologias, danças, toques e canções, de modo que
o seu conhecimento sobre o sagrado se ampliou significantemente.
Nessa época, Walter, ainda um simples admirador, já andava nas casas de
candomblé
e
se apresentava como
ogã
. Certa vez, quando já estava se organizando para a feitura
19
na casa
do seu irmão, incorporou
20
durante um ritual. Ele nos explicou que na umbanda é muito comum
a pessoa incorporar na hora do seu
orixá
. Mas, nesse caso, especificamente, a incorporação se
deu na ora de
oxalá
,
21
já no final do ritual. Nesse momento, o pai-de-santo
do seu irmão reparou
14
Local onde se realiza cultos do candomblé.
15
Religião brasileira formada através de elementos de outras religiões, como o catolicismo, espiritismo e elementos
da cultura indígena e africana.
16
Ibeji na nação Ketu, Vunji nas nações Angola e Congo, o orixá criança, a divindade da brincadeira, da alegria.
17
Nomenclatura genérica para diversas funções masculinas dentro de uma casa de Candomblé, é escolhido pelo
Orixá.
18
Espaço do terreiro onde são realizadas as festas públicas.
19
A iniciação no culto aos orixás representa um renascimento, um novo começo.
20
Nas religiões afro-brasileiras é o momento do transe, quando o orixá chega no seu(ua) filho(a).
21
Divindade africana ligada à criação, tanto do mundo quanto dos seres.
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que a sua incorporação apresentava características de um tipo de
ogum
22
do candomblé de keto.
Desta forma, Walter foi orientado a se filiar a uma casa de candomblé de keto, para que a sua
vida religiosa pudesse caminhar.
Ao falar sobre os motivos que lhe levaram a entrar no candomblé, além dos já citados,
Walter disse que isso se deu da seguinte forma:
[...] me apaixonei e continuo me apaixonando todos os dias através dos rituais
que aprendo, das coisas que vejo acontecer, dos objetivos que a gente alcança,
e com o tempo percebi que amar o candomblé é também lutar pela nossa
sobrevivência, pois por não conhecer a religião muita gente tem preconceito e
nós temos visto muita violência contra o povo do santo, então é preciso que a
gente faça do amor pelos orixás um caminho de se defender através das nossas
atitudes e atividades dentro e fora do terreiro, a gente é de uma religião milenar
que já passou e passa por muita violência, então é preciso cuidar para que o
candomblé possa continuar existindo, pra que a gente e quem quiser ser do
candomblé ter o direito de ter nossa religião, acho que esse é uma luta que
deve ser encampada pelo povo de candomblé (SOUZA, 2022).
A referência ao amor como caminho para a defesa de quem se é nos remete à proposição
de bell hooks (2020) quando traça o amor como sendo uma querença política, quando assume
a sua potencialidade pelo viés da ação de enfrentamento ao que nos subalterniza, uma vez que
de acordo com a autora devemos: “Começar por sempre pensar o amor como uma ação, em vez
de um sentimento, é uma forma de fazer com que qualquer um que use a palavra dessa maneira
automaticamente assuma responsabilidade e comprometimento” (HOOKS, 2020, p. 55).
Walter, assim, seguiu as orientações e decidiu ser
raspado
23
no candomblé. Isso
aconteceu em setembro de 2010, pelas mãos do
babalorixá
Jackson Ricarte, líder espiritual do
Ilê Axé Runtó Runbôci
(O poço que nunca seca). O novo
candomblecista
24
pagou todas as suas
obrigações
25
e, em 2019, no
Ilê Axé Odé Tá Ofá Si Iná
(Caso do caçador que atira sua flecha
contra o fogo), localizado
em
João Pessoa, capital do estado, pelas mãos do
babalorixá
Mano
de
Oxóssi
26
recebeu o
decá
27
e o título de pai-de-santo
.
Pedimos para ele nos falar mais sobre os processos de ensino e aprendizagem relativos
ao candomblé
e ele nos explicou que
nesse contexto, tradicionalmente, tudo é totalmente na
base da observação. Não tem livro sagrado. Ele, em particular, como falamos no início do texto,
22
Orixá associado à guerra e ao fogo, representado sob a figura de um guerreiro.
23
Ritual de iniciação no Candomblé que simboliza o nascimento.
24
Nome que se dá aos adeptos do Candomblé.
25
São ritos realizados após a iniciação para o fortalecimento dos laços estabelecidos entre os iniciados e seus
orixás, perspectivando um caminho de crescimento no terreiro.
26
Orixá da mata que tem sob o seu domínio o arco e a flecha, o provedor.
27
Cargo ritualístico, é outorgado por um sacerdote do candomblé.
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começou na infância. Depois, já iniciado, teve a sorte de participar de uma oficina de candomblé
no barracão de pai Jackson, ministrada por um
alabê
28
vindo da capital. Para ele, isso foi um
começo de quebra de padrões na pedagogia da casa, pois essas oficinas permitiram o acesso ao
conhecimento teórico, já que no candomblé se aprende pela observação, obedecendo o tempo
certo de aprender. O crescimento espiritual se dá gradativamente, respeitando os níveis da
caminhada do iniciado, que começa como
iaô
e vai até zelador ou
babalorixá
. Nessa religião,
aquele que está na fase de iniciação é considerado um recém-nascido, e para um recém-nascido
não se ensina tudo. Quando Walter era
iaô
29
,
foi o pai Jorge que lhe ensinou nomes em
iorubá
30
,
rezas e cânticos, coisas que se aprende no
rancor.
31
Walter mencionou que a aprendizagem
continua com a saída do rancor, mas, para isso, é importante auxiliar nas tarefas que os mais
velhos executam, pois, quando se ajuda os mais velhos, se aprende, por exemplo, a cozinhar
para cada santo, a executar os rituais de limpeza com as folhas específicas dos
orixás
. Por isso
ser importante ajudar as pessoas que estejam abertos ao ensino. No entanto, segundo o relato
de Walter, em muitas casas de tradição as pessoas dizem assim: “eu aprendi na baixa”
32
,
Você tem que ficar caladinho, observando pra depois colocar em prática o que você
observou. Se você fizer uma coisa que você não deveria ter feito com certeza você leva uma
baixa, porque você ainda não está na hora de fazer. Mas, se você não fizer nada, também leva
baixa por não ter aprendido nada ainda (SOUZA, 2022).
Desta forma, cada um vai aprendendo devagar o que pode ou o que não pode ver, saber
e fazer. Quando vc é rodante
33
, por exemplo, na iniciação você já recebe um cargo. Os homens
podem ser
ogãs
e as mulheres
ekedi
34
. Costuma-se dizer que essas pessoas já nascem grandes,
já podendo ter acesso a tudo. No entanto, apesar de serem grandes, o respeito à hierarquia é
fundamental. Em qualquer nível de graduação quem se forma primeiro deve ser respeitado por
quem é formado depois. Como dito, mesmo que ambos sejam, por exemplo,
iaôs
.
Pelo relato de Walter, mesmo quando alguém chega a ser
babalorixá
o processo de
aprendizagem continua. O
babalorixá
passa a ter acesso a todas as liturgias, vai se constituindo
28
Ogã responsável pelos toques rituais, alimentação, conservação e preservação dos instrumentos musicais
sagrados do candomblé.
29
Filhos-de-santo que já iniciados.
30
Idioma da família linguística nígero-congolesa falado secularmente pelos iorubás; foi trazido pelos africanos
escravizados e traficados para o Brasil, legou muitas palavras ao português brasileiro, e é usado em ritos religiosos
afro-brasileiros.
31
Ambiente de acesso restrito onde acontecem as cerimônias ritualísticas.
32
Aprender sendo repreendido quando quer fazer algo que ainda não pode ou, quando pode fazer não sabe por que
não observou atentamente quando estava sendo feito por uma pessoa mais velha do terreiro.
33
Pessoa que ‘roda no santo’, incorpora o Orixá.
34
Cargo feminino na hierarquia do Candomblé no Brasil; não entram em transe, pois necessitam estar ‘acordadas’
para atender às necessidades dos Orixás. São escolhidas do Orixá, e pelo Orixá.
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a cada dia, aprendendo com os mais velhos, pela inquietação e curiosidade permitida pela
pedagogia do terreiro, atendendo ao impulso natural da incompletude. Para Paulo Freire (2019,
p. 82-83), uma educação que nega a prática formadora inibe e dificulta a curiosidade que,
mesmo sujeita a limites, deve estar em pleno exercício, pois, como explica, sem a curiosidade
que nos move, que nos inquieta e nos insere na busca, não aprendemos nem ensinamos. Ainda
mais, para ele, a curiosidade é um direito que temos, e devemos lutar por ele.
Falando novamente sobre as crianças, Walter lembrou que ao se tornar pai-de-santo a
família de candomblé aumenta. Pois o
pai-de-santo tem seus filhos biológicos e os
filhos-de-
santo
35
também têm seus filhos. Desta forma, convivem com ele o tempo inteiro e acabam
reproduzindo o que muitos fizeram quando crianças, ou seja, brincam e perguntam os porquês
das coisas. Assim, vão aprendendo sobre os
orixás
e os significados dos rituais, contrariando a
escassez de poesia imposta pela lógica colonial, cujo projeto de mundo “[...] investe na
dominação e alteração das formas de se usar o corpo, invocar a memória, sentir o afeto, viver a
comunidade e tecer a partilha, a brincadeira como expressão da liberdade do ser é um ato de
descolonização.” (RUFINO, 2021, p. 70).
Apesar desse envolvimento natural das crianças com a religião, elas são iniciadas apenas
quando crescem, e se decidirem se inserir. Neste caso, elas levam vantagem em relação a quem
não vem de família de
axé
36
, visto que já estão com uma carga de conhecimento muito grande.
Para Walter Nunes Souza,
A criança é curiosa por natureza. Ela vai perguntando e a gente vai explicando.
Consequentemente, as nossas crianças vão passando pelo mesmo processo que a gente passou,
aprendendo pelo amor, pela curiosidade e pela repetição através das brincadeiras. (SOUZA,
2022).
A este respeito, Caputo (2015) mostra que no terreiro há uma rede educativa onde se
aprende de maneira cooperativa, compartilhada, e apresenta distinções entre a aprendizagem
que acontece no terreiro e na escola:
“
Na escola, só o professor é o líder que passa para todo
mundo. E os alunos não passam para os outros que perderam. Aqui todo mundo passa para todo
mundo [...]” (CAPUTO, 2015, p. 782). “Na escola é muita teoria [...] a gente pega muita coisa,
mas não praticamos [...]. Aqui não. Aqui, aprendemos e praticamos ao mesmo tempo [...]
”
(CAPUTO, 2015, p. 783), o que denota um fazer educação a partir de uma dinâmica
comunitária e pedagógica onde a oralidade exerce um papel fundamental.
35
Pessoa iniciada no Candomblé.
36
Termo usado no Candomblé e nas religiões afro-brasileiras, que significa pessoas do mesmo axé. Família de
santo.
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Educações no contexto das bandas de pífanos e do Candomblé
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Segundo Walter, o pai-de-santo mostra aos seus filhos o que se pode ensinar e aprender.
“Se alimentar um bebê com um prato de pirão
37
ele morre, então tem que começar com
mingau
38
. Quando ficar mais fortinho, come cuscuz e depois come o pirão” (SOUZA, 2022).
Fechando a nossa entrevista/conversa ele lembrou que nas casas que frequentou os
ensinamentos não lhe foram negados. Com os pais-de-santo aprendeu coisa simples e coisas
mais profundas. Além da observação e dessa vontade de ensinar dos pais-de-santo
mencionados, Walter ressaltou que outra fonte de conhecimento na contemporaneidade são as
obras dos pesquisadores que escrevem sobre o candomblé, de tal sorte que a leitura também é
uma forma de aprendizagem.
Mais algumas considerações
Um dos questionamentos que sempre fazem é: os terreiros de Candomblé e as
comunidades de pifeiros são lugares de educação? A resposta é sim! O terreiro e as bandas de
pífanos são mundos de aprendizagens e ensinagens que ocorrem continuamente, que nos
fortalecem, não apenas no sentido religioso, mas também nos constituem enquanto pessoas que
circulam por vários espaços, interagindo e compondo sentidos às relações que estabelecemos
do ponto de vista social, relacional, profissional, afetivo, na criação de vínculos, relações
interpessoais e atitudes perante o mundo para além das porteiras do terreiro e das casas dos
pifeiros.
Como Brandão (2013) e Freire (2020), perspectivamos que o fazer educação acontece
nos lugares onde se processam convivências e estabelecem-se relações entre pessoas
;
o terreiro
e as comunidades de pífano têm uma rede educativa compartilhada e com formas distintas de
construir o processo de ensinagens e aprendizagens. A maneira de fazermos as nossas
ensinagens é vinculada à experiência, não separamos o saber do fazer, é outro jeito de aprender
que nos aproxima do que aprendemos, vinculados à nossa própria relação com a natureza, com
a comunidade. Esse processo ocorre pelas vivências, experiências, palavrares, movimentos,
agires, comportamentos, observações, repetições, brincadeiras e ensinamentos diretamente
vindos dos mais velhos. Aprender, dessa forma, “[...] significa tornar-se, sobre o organismo,
uma pessoa, ou seja, realizar em cada experiência humana individual a passagem da natureza à
cultura” (BRANDÃO, 1984, p. 18).
37
Papa de farinha de mandioca temperada com caldo de carne bovina, de peixe ou galinha.
38
Alimento cozido, de consistência cremosa, pastosa, feito ger. de leite e açúcar, engrossado com cereais ou
farinhas variadas (aveia, maisena, fubá de milho, arroz etc.); papa, papinha.
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É um fazer educação assentado na disseminação e valoração de nossos saberes culturais
atravessados pela nossa ancestralidade, por meio da oralidade, e tendo como referências o
aprender a partir da observação e repetição constante e do imitar as nossas mais velhas e os
nossos mais velhos, aprendemos e praticamos concomitantemente, errando, refazendo e
acertando, sendo um processo progressivo, considerando o tempo de iniciado do aprendiz de
acordo com a hierarquia, e sempre com as nossas mais velhas e os nossos mais velhos, não
havendo a figura da/o professora/o re, nem um momento específico para que aconteça. Para
aprender é necessário tempo e envolvimento com as atividades cotidianas das comunidades,
pois o compartilhar pode acontecer em qualquer momento e lugar, e, como nos diz Freire
(2020), uns com os outros mediatizados pelo mundo, bem como em conversas informais onde
ativamos o nosso ouvir e ver atentamente para aprender, considerando, assim, o sentido de um
fazer educativo que tem o cotidiano e as nossas culturas como chãos educativos e constituidores
da nossa realidade, “num movimento social do qual (todes) participam, no qual se fazem e se
educam” (ARROYO, 1987, p. 18), que ecoa em nossas maneiras de compreender e de
interpretar o mundo.
Em nossos espaços se desenvolvem processos de ensinagens e aprendizagens dos saberes
que constituem nossa cultura, atravessados pela tradição, pela nossa ancestralidade e por nossos
valores civilizatórios
39
, que exprimem as bases da nossa composição social, cultural, histórica,
afetiva, religiosa, ética e ancestral. Nossa educação é ancestral, voltada para uma concepção de
mundo e de natureza onde somos vinculados à diversidade de formas de vida, aos ciclos da
existência, ao viver em comunidade e em compartilhamentos que nos foram legados por aqueles
que vieram antes de nós, que estão entre nós e com os que ainda virão, que guiam os nossos
agires, refletires, sentires e giros por onde nos movemos e nos afirmamos enquanto povo de
santo, enquanto pifeiros, dando sentido ao nosso modo de viver, ao nosso devir.
A educação nesses espaços é também uma educação de resistência, uma vez que
aprendemos e preservamos os nossos valores de base comunitária e resistimos à trama colonial
que ao longo de séculos tenta negar, invisibilizar e exterminar os nossos saberes, a nossa
existência, desenvolvendo um conjunto de práticas educativas em que as nossas ensinagens e
aprendizagens reverberam não somente nos espaços do pífano e do candomblé, mas em todos
os outros lugares por onde andamos, atravessando aqui, no caso, a nossa docência como
39
Corporeidade, Oralidade, Musicalidade, Ludicidade, Circularidade, Religiosidade, Memória, Ancestralidade,
Cooperativismo, Energia Vital, e Territorialidade.
In
: Projeto A COR DA CULTURA.
Valores Civilizatórios
.
Rio de Janeiro, 2013. Disponível em: http://www.acordacultura.org.br/oprojeto. Acesso em: 14 jun. 2021.
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Educações no contexto das bandas de pífanos e do Candomblé
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professores formadores de professores, não desrespeitando as distinções entre esses ambientes,
e destacando que esse chegamento deriva do fato de que somos parte dessas comunidades.
Nas nossas comunidades fazemos uma educação que pode ser considerada “[...] como
força de batalha e cura” (RUFINO, 2021, p. 6), sensível às diversidades de saberes existentes,
de pessoas e de formas de pensar que nos mobilizam para seguir dizendo ao mundo que
existimos, que existem outras maneiras de se conceber a vida, uma educação “[...]
comprometida com a diversidade das existências e das experiências sociais [...]” (RUFINO,
2021, p. 12), possibilitando o acolher e constituindo o pertencer, desejando e esperançando,
como Freire e hooks, o fortalecer de uma ação educativa que considere o comunitarismo como
uma das forças de reação e contraposição às relações opressoras contemporâneas.
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Como referenciar este artigo
BRAGA, E. M.; FEITOSA, B. M.; LUCINI, M.; DIAS, A. F. Educações no contexto das bandas
de pífanos e do Candomblé.
Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação
, Araraquara,
v. 17, n. 3, p. 1926-1942, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587. DOI:
https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.16764
Submetido em
: 11/02/2022
Revisões requeridas em
: 09/04/2022
Aprovado em
: 23/05/2022
Publicado em
: 01/07/2022
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
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Educación en el contexto de las bandas de pífanos y del Candomblé
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1934-1950, jul./sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.16764
1934
EDUCACIÓN EN EL CONTEXTO DE LAS BANDAS DE PÍFANOS Y DEL
CANDOMBLÉ
EDUCAÇÕES NO CONTEXTO DAS BANDAS DE PÍFANOS E DO CANDOMBLÉ
EDUCATIONS IN THE CONTEXT OF FIFE BANDS AND CANDOMBLÉ
Elinaldo Menezes BRAGA
1
Belijane Marques FEITOSA
2
Marizete LUCINI
3
Alfrancio Ferreira DIAS
4
RESUMEN
:
Este trabajo tiene como objetivo discutir las prácticas educativas en el contexto
de las bandas de pífanos y el candomblé. La temática está vinculada a la investigación que
hemos desarrollado en el curso de doctorado en educación de la Universidad Federal de Sergipe.
Este escrito toma como referencias las narraciones del pifeiro
5
Vanildo Franco y del babalorixá
6
Walter Ti’Ogun, partiendo del entendimiento de que no es sólo en la escuela donde se aprende,
porque estamos de acuerdo en que la educación también ocurre fuera de ella. Se trata de un
enfoque cualitativo, con el apoyo de la historia oral a través de entrevistas semiestructuradas.
La discusión es referenciada en estudios decoloniales, en una perspectiva crítica que encanta y
libera. Como resultados, notamos que en los procesos educativos analizados la curiosidad, la
observación, la repetición, el juego y el afecto son las principales categorías que promueven el
encantamiento en los pifeiros y candomblecistas.
PALABRAS CLAVE
: Banda de pífanos. Candomblé. Educación. Decolonialidad.
RESUMO
:
Este trabalho objetiva discutir as práticas educativas no contexto das bandas de
pífanos e do candomblé. O tema vincula-se às pesquisas que ora desenvolvemos no curso de
doutorado em educação da Universidade Federal de Sergipe. Esta escrita toma como
referências as narrativas do pifeiro Vanildo Franco e do babalorixá Walt
er Ti’Ogun, partindo
do entendimento de que não é somente na escola que se apreende, pois concordamos que a
educação acontece também fora dela. Trata-se de um trabalho de abordagem qualitativa, com
o suporte da história oral por meio de entrevistas semiestruturadas. A discussão realizada está
1
Universidad Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras
–
PB
–
Brasil. Profesor del Curso de Letras Lengua
Inglesa. Doctorado en Educación (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8056-3430. E-mail:
naldinhobraga2018@gmail.com
2
Universidad Federal de Campina Grande (UFCG), Cajazeiras
–
PB
–
Brasil. Profesora Adjunta IV. Maestría en
Educación (UFPB). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9512-9397. E-mail: belimare.pb@gmail.com
3
Universidad Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão
–
SE
–
Brasil. Profesora del Departamento de Educación.
Doctorado en Educación (UNICAMP). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1532-8968. E-mail:
marizetelucini@gmail.com
4
Universidad Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão
–
SE
–
Brasil. Profesor Adjunto II del Departamento de
Educación. Doctorado en Sociología (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5562-0085. E-mail:
diasalfrancio@academico.ufs.br
5
El que toca el pífano.
6
Babalorixá o pai-de-santo es el sacerdote de las religiones afrobrasileñas.
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Elinaldo Menezes BRAGA; Belijane Marques FEITOSA; Marizete LUCINI y Alfrancio Ferreira DIAS
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1934-1950, jul./sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.16764
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referenciada em estudos decoloniais, numa perspectiva crítica que encanta e liberta. Como
resultados, percebemos que nos processos educativos analisados a curiosidade, a observação,
a repetição, a brincadeira e o afeto são as principais categorias que promovem encantamento
nos pifeiros e nos candomblecistas.
PALAVRAS-CHAVES
: Banda de pífanos. Candomblé. Decolonialidade. Educação.
ABSTRACT
:
This work aims to discuss educational practices in the context of the fife bands
and candomblé. The theme is linked to the research we are currently developing in the doctoral
course in education at the Federal University of Sergipe. This writing takes as references the
narratives of the pifeiro Vanildo Franco and the babalorixá Walter
Ti‘Ogun
, starting from the
understanding that it is not only in the school that one learns, because we agree that education
also happens outside of it. This is a qualitative approach, supported by oral history through
semi-structured interviews. The discussion carried out is referenced in decolonial studies in a
critical perspective that enchants and frees. As a result, we noticed that in the analyzed
educational processes, curiosity, observation, repetition, play and affection are the main
categories that promote enchantment in the pifeiros and candomblecistas.
KEYWORDS
: Bands of pífanos. Candomblé. Decoloniality. Education.
Introducción
La discusión que proponemos es parte del entendimiento de que no hay un solo tipo de
educación y que es fuera de la sala donde más se aprende, como nos dicen Brandão (2013) e
Illich (1985), respectivamente. En este sentido, discutir algunas prácticas educativas populares
que constituyen los sujetos que experimentan los conocimientos y acciones relacionadas con
las bandas de pífanos
7
y candomblé
8
, esta obra dialoga con dos experiencias, una en el contexto
musical, vivida por el músico Vanildo Franco, y otra en el ámbito religioso, vivida por el
babalorixá
Walter Nunes de Souza.
Para fundamentar teóricamente el trabajo, considerando que las bandas de pífano y
candomblé no forman parte del proyecto colonial de poder que estandariza formas de ser, de
conocer, de vivir y de relacionarse con lo sagrado, buscamos establecer diálogos entre lo que
los colaboradores nos cuentan en sus narrativas y lo que algunos pensadores progresistas
proponen que apuntan a la liberación de los sujetos de una educación crítica y decolonial. De
ahí que nuestros ojos se centren en los procesos educativos mencionados anteriormente, para
que, a través de ellos, podamos entender cómo Freire (2019, 2020, 2021), Brandão (2013),
7
Pífano - Flauta rústica tradicionalmente hecha de bambú. Contiene seis orificios para escribir y uno para soplar.
8
El candomblé es una religión afrobrasileña derivada de los cultos tradicionales africanos, que adora a Orixás,
Inquices y Voduns.
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Educación en el contexto de las bandas de pífanos y del Candomblé
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Rufino (2021), Hooks (2020), Santos (2010), Caputo (2012), Arroyo (1987) y otros pensadores
nos enseñan a transgredir a través de estudios dirigidos a la educación popular y la crítica del
modelo educativo que, en lugar de liberar, encarcela, domestica cuerpos y mentes.
El Candomblé es una religión que surgió en Brasil con la presencia de africanos
esclavizados que llevaban sus conocimientos, sus valores, sus dolores, sus creencias y su fe en
sus cuerpos y recuerdos. Según Silva (2005), el candomblé se desarrolló, entre otros factores,
debido a la necesidad que tenían los grupos negros "[...] reelaborar su identidad social y
religiosa en condiciones adversas de esclavitud y posterior indefensión social, teniendo como
referencia las matrices religiosas de origen africano". (SILVA, 2005, p. 52).
Las prácticas religiosas del Candomblé se desarrollan a partir del culto a
Orixás
9
,
Inquices
10
y
Voduns
11
perteneciente a las naciones Ketu, Angola y Jeje, respectivamente,
abarcando también entidades como caboclos
12
y marineros del sistema religioso brasileño. Es,
por lo tanto, una síntesis de las tradiciones religiosas de África Occidental, con influencias de
otras tradiciones religiosas (SANTOS, 2010, p. 30).
Las bandas de pífanos, a su vez, son grupos de cultura popular
13
se encuentra en casi
todos los estados del noreste, cuyas actividades están tradicionalmente vinculadas a eventos del
catolicismo popular. Esta expresión varía en términos de su formación. En el Sertão Paraibano,
por ejemplo, consta de dos pífanos, una zabumba y una caja de guerra.
Presentados los dos temas en foco, los invitamos a seguir con nosotros a través de las
narrativas de los colaboradores que, con el apoyo de la historia oral, nos otorgaron las narrativas
que se destacan a continuación.
En Ceará, la educación popular nos aflojó y liberó a Vanildo Franco para volar
críticamente por el mundo encantado del pífano.
[...] Escucho a muchos de los maestros que cada persona tiene su propia forma
de tocar, cada persona tiene su propio repertorio. Algunos conocen más el
repertorio religioso y otros el repertorio de forró, más festivo (FRANCO,
2022)
9
Dioses adorados en la nación Candomblé de Ketu.
10
Dioses adorados en Brasil por los Candomblés de la nación angoleña en Brasil.
11
Dioses adorados en los Candomblés de la nación Jeje en Brasil.
12
Entidades presentes en una amplia gama de religiones de origen africano en Brasil. En Candomblé conviven con
deidades africanas
–
Orixás, Inquices, Voduns
–
y tienen sus fiestas públicas.
13
La Cultura Popular, en este texto, se entiende como "[...] una serie de conocimientos heterogéneos que
constituyen el conocimiento de las personas
” (GOMES
; PEREIRA, 1992, p. 73).
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En la escena pifeira de Ceará destaca Vanildo Franco. Nacido en la zona rural de
Guaramiranga, a la edad de doce años, experimentó el fife por primera vez, cuando, a mediados
de la década de 1990, una organización no gubernamental llegó a la comunidad rural Linha da
Serra y, a partir de la práctica del Yoga, el canto coral infantil y los talleres de teatro de títeres
y títeres, implementó en la escuela un proyecto de educación ambiental popular que involucró
a maestros y estudiantes.
El tallerista responsable de las clases de fife llevaba en su equipaje una formación
musical influenciada por los pifeiros tradicionales de Cariri de ese estado, con el objetivo de
enseñar y aprender por contacto, observación, juego, repetición y la práctica de tocar en grupos.
Según Vanildo Franco, antes que nada, experimentaron y aprendieron de la naturaleza. Así, el
bosque se convirtió en escuela y las plantas y los animales se convirtieron en maestros con los
que los estudiantes los aprendieron. Para Illich (1985), este derecho a aprender del mundo se
corta cuando asistimos a la escuela con el argumento de que es el único lugar donde podemos
aprender. Visión como esta niega que las cosas más importantes de nuestras vidas se aprendan
en comunidad cotidiana, con la familia, los amigos, en el ocio, es decir, en lo que el autor llama
una tesis educativa (ILLICH, 1985, p. 25). Fue exactamente así, como revela Vanildo Franco,
que sucedió en el camino a la "escuela de la naturaleza", donde los niños también aprendieron
unos de otros, a través de juegos. Además, aprendieron de plantas, ríos, árboles de todo tipo,
animales, insectos, piedras y personas. Este es un modelo de escuela que habita el sueño de
Rufino (2021), en él, además de aprender de la naturaleza y el juego, se aprende a través del
diálogo y la libertad de practicar la pregunta mucho más que de dar respuestas.
Sobre el chiste, específicamente, Rufino dice que no jugar interesa al proyecto mundial
implementado por la lógica colonial, que, sin poesía, subordina al niño a una forma centrada en
el adulto, robándole la oportunidad de usar el cuerpo, tejer acciones, sentir afecto y vivir la
comunidad. Así, la rebeldía y la inconformidad ante la crueldad de este mundo que no sonríe
son más que necesarias, y una buena estrategia para la práctica del juego como expresión de
libertad es esperar con
[...] el regate corporal, la risa, los escondites, los inventos de avistamiento, las
piedras de soplado, las vejigas de agua, los ejércitos de pies sucios y los dedos
rotos en los adoquines siempre son bienvenidos para ayudar a desatar los
nudos de los cuerpos que se han acostumbrado a permanecer tensos y listos
para la batalla (RUFINO, 2021, p. 71).
Los regates corporales, las risas, los dedos rotos en los senderos del bosque y el ejército
de niños con los pies sucios del proyecto implementado en la comunidad Linha da Serra
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Educación en el contexto de las bandas de pífanos y del Candomblé
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permitieron el encantamiento de los niños por el Yoga, el teatro de marionetas, el canto de coral
y, en Vanildo, especialmente por la cultura del fife, abriendo senderos de libertad, afecto,
dedicación, empatía, respeto, criticidad, amor, entrega y más curiosidad.
Si los niños habían estado atados solo a la enseñanza formal de la "escuela de cemento",
tal vez Vanildo fue incluso un educador hoy, pero tal vez fue más un prisionero de los planes
de estudio y metodologías que sirven de combustible para el fortalecimiento del proyecto
educativo que promueve el apartamento social y favorece a aquellos que dicen no a la poesía y
sonríen. Quizás, en la actualidad, estaba en un aula donde lo más importante serían las
respuestas y no las preguntas, donde se reprimirían las risas, donde no había momentos y
espacios para jugar, donde el patio de la escuela no era visto como un lugar para enseñar y
aprender.
Y aunque el mundo nos constituye en todo momento, podría alimentar la idea de que el
lugar de un niño para aprender está en el modelo escolar que controla cuerpos y mentes
bombardeados pasivamente con conocimiento prescrito, simplificado y descontextualizado de
la realidad y los anhelos de su comunidad. Esta escuela no reconoce conocimientos y
metodologías capaces de promover el aprendizaje de aquellos que son curiosos y complacidos
por la búsqueda constante, como sucede en el contexto de la cultura popular, donde se aprende
y se enseña más por la oralidad, repitiendo, manteniendo el contacto, practicando eficazmente,
observando e imitando. Sobre este "método", basado en sus experiencias, Franco (2022) explica
que:
[...] a través de la observación se aprende de la imitación, imitando a los
maestros, imitando la posición de los dedos, la forma de soplar, prestando
atención a las melodías, decorando y jugando. Cometiendo errores en las
primeras veces, pero luego golpeando a los demás, e hicimos mucho de eso,
correcto, escuchando, decorando, mirando, imitando y así aprendiendo las
canciones.
La experiencia de Vanildo en los talleres de fife le hizo creer en un modelo escolar
donde los estudios teóricos se alejan de la práctica. Según explicó, no tiene sentido decorar
números, palabras y fórmulas sin que los alumnos tengan la oportunidad de ver y sentir de cerca
la aplicabilidad de los contenidos en un entorno natural, con la comunidad, viendo los efectos
en la vida de las personas, tal y como le sucedió a él que, en un "sencillo taller" de tocar y
construir pífanos aprendió sobre ecología, biología, matemáticas, física, convivencia social,
cultura y actividades artísticas. En su caso, la música era un río que estallaba en un mar de otros
conocimientos. Vanildo Franco señaló que
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Elinaldo Menezes BRAGA; Belijane Marques FEITOSA; Marizete LUCINI y Alfrancio Ferreira DIAS
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[...] además de dejar las cuatro paredes, la escuela también necesita llevar a la