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O discurso pós-crítico de gênero e diversidade: Uma proposta dos direitos humanos
RIAEE
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1888-1903, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
1888
O DISCURSO PÓS-CRÍTICO DE GÊNERO E DIVERSIDADE: UMA PROPOSTA
DOS DIREITOS HUMANOS
EL DISCURSO POSTCRÍTICO DE GÉNERO Y DIVERSIDAD: UNA PROPUESTA DE
DERECHOS HUMANOS
THE POST-CRITICAL DISCOURSE ON GENDER AND DIVERSITY: A HUMAN
RIGHTS PROPOSAL
Éden Santos de CASTRO
1
Íris Vanessa de Sousa SILVA
2
José Paulo Gomes BRAZÃO
3
RESUMO
: O presente artigo pretende desenvolver um debate sobre o discurso pós-crítico de
gênero e diversidade, ao considerar a proposta sobre os mesmos na perspectiva dos direitos
humanos, partindo do objetivo de compreender o discurso pós-crítico de gênero e diversidade
no âmbito dos Direitos Humanos. Também busca entender a relação entre a Declaração
Universal dos Direitos Humanos com a discussão sobre gênero e diversidade, analisando o que
são direitos humanos e qual a proposta estabelecida pela Declaração ao tratar das relações de
gênero instituídas e vivenciadas por várias sociedades, bem como averiguar a distorção entre o
discurso e a prática na temática apresentada. Esta é uma pesquisa bibliográfica realizada através
de leituras, resumos, fichamentos. Conclui-se que as questões de gênero e diversidade foram
silenciadas ao longo da história dos direitos humanos.
PALAVRAS-CHAVE
: Direitos humanos. Diversidade. Gênero.
RESUMEN
: Este artículo pretende desarrollar un debate sobre el discurso postcrítico de
género y diversidad, considerando la propuesta sobre ellos desde la perspectiva de los
derechos humanos, partiendo del objetivo de comprender el discurso postcrítico de género y
diversidad en el campo de los derechos humanos. También busca comprender la relación entre
la Declaración Universal de los Derechos Humanos y la discusión sobre género y diversidad,
analizando qué son los derechos humanos y cuál es la propuesta que establece la Declaración
al tratar las relaciones de género instituidas y experimentadas por diversas sociedades, así
como verificar la distorsión entre discurso y práctica en el tema presentado. Esta es una
investigación bibliográfica realizada a través de lecturas, resúmenes, registros. Se concluye
1
Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC), Quixabeira
–
BA
–
Brasil. Coordenador Pedagógico, Colégio
Estadual Professora Terezinha Gonçalves Novais. Membro Fundador e vice-diretor da Academia Quixabeirense
de Pedagogia (AQPED). Doutorando em Educação (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3601-4899. E-
mail: edendecastro@live.com
2
Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC), Quixabeira
–
BA
–
Brasil. Vice-diretora, Colégio Estadual
Professora Terezinha Gonçalves Novais. Membro fundadora da Academia Quixabeirense de Pedagogia (AQPED).
Mestrado em Estado, Gobierno y Políticas Públicas (FLACSO). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9865-1925.
E-mail: iris.vanessa1989@outlook.com
3
Universidade da Madeira (UMa), Funchal
–
Portugal. Pesquisador do Centro de Investigação em Educação. Pós-
doutorado em Educação (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3575-4366. E-mail: jbrazão@staff.uma.pt
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA e José Paulo Gomes BRAZÃO
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DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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que las cuestiones de género y diversidad han sido silenciadas a lo largo de la historia de los
derechos humanos.
PALABRAS CLAVE:
Derechos humanos. Diversidad. Género.
ABSTRACT
: This article aims to develop a debate on the post-critical discourse of gender and
diversity, by considering the proposal about them from the perspective of human rights, starting
from the objective of understanding the post-critical discourse of gender and diversity within
the framework of human rights. It also seeks to understand the relationship between the
Universal Declaration of Human Rights and the discussion on gender and diversity, analyzing
what are human rights and what is the proposal established by the Declaration when dealing
with gender relations instituted and experienced by various societies, as well as to investigate
the distortion between discourse and practice in the theme presented. This is a bibliographical
research carried out through readings, abstracts, and annotations. We conclude that gender
and diversity issues have been silenced throughout the history of human rights.
KEYWORDS
: Human rights. Diversity. Gender.
Introdução
Ao analisar como as questões pós-críticas de gênero e diversidade são tratadas pela
sociedade, é necessário que façamos uma inquirição de como os Direitos Humanos tratam a
temática supracitada. Para tanto, é importante considerar o que está presente na Declaração
Universal dos Direitos Humanos (UNIC, 2009) e que diz respeito ao tema indicado no presente
trabalho. Pensar as relações de gênero e a diversidade das relações humanas deve passar pela
compreensão de qual seria a proposta dos Direitos Humanos ao tratar o tema. A Declaração
Universal dos Direitos Humanos foi adotada e proclamada em 1948, logo após a Segunda
Guerra Mundial, no intuito de que todas as pessoas, independente de raça, sexo, condição
política ou econômica, crença ou etnia, tivessem seus direitos humanos garantidos e
preservados. Para que isto ocorresse, foi criada a Organização das Nações Unidas
–
ONU,
instituição responsável por auxiliar os Países-Membros na busca da paz e da harmonia
universal.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos em um dos parágrafos do seu preâmbulo
relata que a carta considera importante a fé nos direitos fundamentais dos homens, acredita ser
necessário valorizar a dignidade e o valor da pessoa humana, bem como a “[...] igualdade de
direitos dos homens e das mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores
condições de vida em uma liberdade mais ampla.” (UNIC, 2009, p. 03). Por conseguinte, é
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função primordial da ONU estabelecer que todas as Nações e Estados façam cumprir o que está
disposto na Declaração e que todas as pessoas sejam tratadas de igual forma.
Portanto, o presente trabalho se baseia na necessidade de entendimento entre a
Declaração Universal dos Direitos Humanos com a discussão pós-crítica sobre gênero e
diversidade, buscando compreender o que são direitos humanos e qual a proposta estabelecida
pela Declaração ao tratar das relações de gênero instituídas e vivenciadas por várias sociedades;
neste sentido, o presente artigo se debruçará sobre o entendimento dos direitos humanos a partir
das relações de gênero, bem como averiguará a distorção entre o discurso e a prática na temática
apresentada.
Esta revisão bibliográfica insere-se na investigação qualitativa de um fenômeno
“contemporâneo no contexto da vida real” (Y
IN, 2010, p. 22), que acontece em toda a
sociedade. Yin afirma a necessidade de pesquisas de revisão bibliográfica ao falar que “o
caminho começa com uma revisão minuciosa da literatura” (YIN, 2010, p. 23), pois ela serve
não para “determinar as respostas sobre o que é conhecido sobre um tópico”, mas para
“desenvolver questões mais perspicazes e reveladoras sobre o mesmo tópico” (YIN, 2010, p.
35). Woods também diz que “a consulta de literatura integra o processo de desenvolvimento da
teoria, a qual estimula ideias e dá forma à teoria emergente, criando simultaneamente
oportunidades de crítica e de estímulo ao estudo” (WOODS, 1999, p. 87).
Esta revisão iniciou-se com a seleção das literaturas próprias para a construção da base
metodológica da pesquisa, leituras dos autores de referência estritamente necessários à
construção desta teoria e à compreensão sobre aquilo que era necessário refletir, criar e
descrever através da produção de fichamentos e resumos. Esta parte de estrita importância
durante o percorrer
da pesquisa foi realizada com base na ideia de Macedo quando diz que “para
o pesquisador qualitativo, não há quadro teórico inquestionável” (MACEDO, 2009, p. 92), ou
seja, as leituras não podem ser compreendidas pelo pesquisador como verdades a serem
seguidas, mas sim como inspiração para que outras verdades surjam.
Afinal, o que são os direitos humanos?
Após a Segunda Guerra Mundial, nos anos de 1945, foram estabelecidas as Nações
Unidas: os horrores do segundo grande conflito bélico mundial deram origem à instituição, que
tem dentre seus principais objetivos promover e encorajar povos e nações ao respeito mútuo e
dos direitos humanos, conforme o que foi estipulado na Carta das Nações Unidas, assinada na
cidade de São Francisco, Califórnia, nos Estados Unidos da América, em outubro de 1945.
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA e José Paulo Gomes BRAZÃO
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De acordo com a própria ONU, “Direitos Humanos são inerentes a todos os seres
humanos, independente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra
condição” (ONU, 2019). Os direitos humanos contemplam ainda uma série de direitos e
liberdades, tais como: à vida, liberdade de opinião e expressão, direito ao trabalho, à educação,
entre outros. Todos e todas merecem estes direitos, sem nenhum tipo de sanção ou
discriminação. Assim, a ONU determina que:
Os direitos humanos são comumente compreendidos como aqueles direitos
inerentes ao ser humano. O conceito de Direitos Humanos reconhece que cada
ser humano pode desfrutar de seus direitos humanos sem distinção de raça,
cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outro tipo, origem social ou
nacional ou condição de nascimento ou riqueza. Os direitos humanos são
garantidos legalmente pela lei de direitos humanos, protegendo indivíduos e
grupos contra ações que interferem nas liberdades fundamentais e na
dignidade humana (ONU, 2019).
O direito internacional, a partir dos Tratados Internacionais, considerando a legislação
dos direitos humanos, determina que os Estados ajam de determinada maneira, proibindo-os ou
não de algumas ações, mas essa mesma legislação não determina o que são os direitos humanos.
Desse modo, entende-se que os direitos humanos são direitos inerentes a cada indivíduo pelo
simples fato do mesmo ser um humano. Os tratados internacionais e outras modalidades que
tratam de direitos civis costumam ser utilizados para garantir a proteção formal dos direitos de
pessoas ou grupos contra ações ou abandono de governos, que possam interferir direta ou
indiretamente em seus direitos enquanto seres humanos. Para melhor compreensão, o sítio
eletrônico das Organizações das Nações Unidas estabelece algumas características importantes
para a definição dos direitos humanos:
Os direitos humanos são fundados sobre o respeito pela dignidade e o valor
de cada pessoa;
Os direitos humanos são universais, o que quer dizer que são aplicados de
forma igual e sem discriminação a todas as pessoas;
Os direitos humanos são inalienáveis, e ninguém pode ser privado de seus
direitos humanos; eles podem ser limitados em situações específicas. Por
exemplo, o direito à liberdade pode ser restringido se uma pessoa é
considerada culpada de um crime diante de um tribunal e com o devido
processo legal;
Os direitos humanos são indivisíveis, inter-relacionados e interdependentes,
já que é insuficiente respeitar alguns direitos humanos e outros não. Na
prática, a violação de um direito vai afetar o respeito por muitos outros;
Todos os direitos humanos devem, portanto, ser vistos como de igual
importância, sendo igualmente essencial respeitar a dignidade e o valor de
cada pessoa (ONU, 2019).
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O discurso pós-crítico de gênero e diversidade: Uma proposta dos direitos humanos
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Portanto, os direitos humanos dizem respeito a tudo aquilo que se refere à dignidade
humana: ao violar qualquer fundamento moral ou legal no tocante à vida humana, de certo que
algum direito humano estará sendo violado, pois eles são indivisíveis, inter-relacionados e
interdependentes.
Direitos humanos e direitos sociais: como as mulheres foram representadas?
A partir do processo de independência das 13 Colônias britânicas da América, hoje
Estados Unidos, houve a discussão acalorada sobre a questão dos direitos, especialmente no
que se refere aos direitos sociais. Na segunda metade do século XVIII, desviando a lógica da
maioria das colônias europeias pelo mundo, as 13 Colônias adentram um processo de separação
da sua metrópole, a Inglaterra. Com uma guerra travada entre colônia e metrópole, em 1776
surge então o que conhecemos hoje por Estados Unidos da América. Apesar do caráter
revolucionário, visto que se considera historiograficamente como uma revolução contra a
submissão política e econômica à metrópole, surge então o pioneirismo da Revolução
Americana ao tratar sobre os direitos humanos. Pelas palavras de Singer (2012, p. 201):
A Revolução Americana foi pioneira na formação dos direitos humanos. Pela
primeira vez, um povo fundamenta sua aspiração à independência nos
princípios da cidadania, ou seja, coloca como finalidade primordial do Estado
a preservação das liberdades dos integrantes do povo. Elevados à condição de
sujeitos políticos.
Apesar do pioneirismo da Declaração de Independência dos Estados Unidos no que diz
respeito aos direitos humanos, na prática estavam excluídos os índios, que continuavam sendo
dizimados, os negros, que permaneciam sob o regime de escravidão, especialmente ao sul do
país, e as mulheres, que jaziam sob a ausência de direitos políticos e civis. Mesmo sendo
evidente o protagonismo das mulheres em diversos tipos de atividades (domésticas, nas
fazendas, como parteiras etc.), civil e politicamente eram esquecidas e excluídas do processo
que considerasse os direitos políticos e não eram incluídas em qualquer noção de igualdade
civil.
Apesar do que foi dito acima, dos três grupos totalmente excluídos na prática dos
direitos humanos, pioneira nos Estados Unidos, as mulheres é que vão se tornar pioneiras nas
lutas abolicionistas em meados do século XIX. Segundo Hole e Levine (1973, p. 4-5, apud
SINGER, 2012, p. 202):
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DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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Foi no movimento abolicionista dos 1830, no entanto, que o movimento pelos
direitos das mulheres teve suas origens políticas. Quando as mulheres
começaram a trabalhar seriamente pela abolição da escravidão, elas
rapidamente aprenderam que não poderiam atuar como politicamente iguais
com seus amigos abolicionistas masculinos. [...] Os ataques incessantes e
brutais (algumas vezes físicos) às mulheres convenceram as [irmãs] Grimkés
que as questões da liberdade para escravos e da liberdade para as mulheres
estavam inextricavelmente ligadas.
Portanto, para as mulheres abolicionistas dos EUA, não havia como lutar pela liberdade
dos negros sem, ao mesmo tempo, lutar pela própria liberdade. Na sequência da Revolução
Americana, ocorreu em solo europeu a Revolução Francesa, desencadeada por questões sociais
e políticas que moveram boa parte da população francesa da época. Uma forte crise econômica
desencadeou em 1789 uma volumosa revolução na França. Apesar de cronologicamente estar
datada em 1789, a revolução começa bem antes, nos idos dos anos 1774, quando da coroação
de Luís XVI, que coincide com uma vasta crise econômica enfrentada especialmente pelas
populações social e economicamente vulneráveis do país, principalmente no interior e nos
campos.
A Revolução Francesa, que foi precedida por uma revolução social e posteriormente de
cunho político, se tornou extremamente importante no que se refere aos direitos sociais e
humanos. Em agosto de 1789 foi aprovada a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
reconhecida pela então Assembleia Nacional, que em alguns aspectos se assemelhava à
Declaração de Independência dos EUA. Ela
traz em seu Artigo 1º a seguinte afirmação: “Art.1º.
Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem
fundamentar-
se na utilidade comum” (USP, 2020). Mas, afinal, de fato, a partir da presente
afirmativa da Declaração, todos os franceses possuíam os mesmos direitos? Constata-se que
não. A Constituição francesa de 1791 seguiu a mesma lógica das declarações anteriormente
citadas, não sendo generosa quanto à atribuição dos direitos civis e políticos dos franceses.
Nas palavras de Singer (2012, p. 214-215):
Ela distinguia entre cidadãos ativos, com todos os direitos, e passivos, com
direitos legais e humanos, mas não políticos. Eram destituídos do direito de
votar e ser votado as mulheres, os menores de 25 anos, os que não possuíam
domicílio legal num cantão, em que não pagavam algum imposto [...] porque
alegadamente seriam incapazes de votar livremente.
Isto posto, cabe uma consideração sobre a ausência dos direitos das mulheres, bem como
a exclusão ou invisibilidade dos menos favorecidos no que se refere aos direitos civis e
políticos. Esta observação se faz necessária, pois, tanto a Declaração de Independência dos
EUA quanto as novas legislações francesas foram consideradas pioneiras no que diz respeito
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aos direitos humanos, porém, se vê que houve uma seletividade na abrangência desses direitos,
os mesmos estavam à disposição dos homens, brancos e da elite, mesmo sendo a Revolução
Francesa um movimento de cunho social e político, não houve uma abertura direta sobre a
discussão da inclusão das mulheres e dos mais pobres em sua legislação.
Cabe sinalizar também os iluministas do século XVIII. Movimento extremamente
importante para determinar o enfraquecimento do Antigo Regime na Europa, foi fundamental
para que os indivíduos passassem a valorizar cada vez mais o conhecimento científico:
houve
um longo debate entre os favoráveis à continuidade aos governos monarquistas e aqueles que
não concordavam mais com uma administração que não tivesse a participação da população nas
decisões políticas, mesmo que timidamente; assim, por considerar o conhecimento como item
fundamental para o desenvolvimento da cidadania, o século XIX ficou historicamente
conhecido como o “Século das Luzes”. Apesar de o movimento Iluminista debater em
profundidade a presença dos cidadãos na esfera política e pública, “A maior parte dos homens
das Luzes ressaltou o ideal tradicional de mulher silenciosa, modesta, casta, subserviente e
condenou as mulheres independentes e poderosas” (PINSKY
; PEDRO, 2012, p. 267). Assim,
mesmo considerando a liberdade de pensamento e de ação dos indivíduos, as mulheres não
estavam incluídas nesta perspectiva cidadã.
Guardadas as proporções, pode-se citar o caso brasileiro, mesmo após a Proclamação
da Independência em 1822 e a Proclamação da República em 1889, em ambos os períodos, não
foram incluídos totalmente nas legislações ora vigentes as mulheres, os negros e os
empobrecidos: a lógica do voto censitário, que fora a base para as constituições napoleônicas e
tantas outras que vieram ao longo da história, também fez parte das legislações brasileiras, que
excluíam, durante a Primeira República (1889-1930), por exemplo, praticamente 80% da
população brasileira dos processos políticos, incluindo as mulheres, negros (escravizados, ex-
escravizados, libertos etc.) e pessoas economicamente desfavorecidas. No caso brasileiro, o
cenário exposto acima começa a sofrer mudanças com a chegada de Getúlio Vargas ao poder a
partir de 1930, quanto o mesmo institui o primeiro Código Eleitoral em 1932, ofertando às
mulheres totais direitos políticos, de votarem e serem votadas.
Gênero e diversidade na perspectiva dos direitos humanos
Como visto até aqui, mesmo diante de tantas inovações no campo jurídico, não se
observou, na prática, uma demonstração de preocupação à proteção das minorias, que não foram
integradas no que se pretendia e pretende debater sobre os direitos humanos, resguardando
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA e José Paulo Gomes BRAZÃO
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inteira e totalmente os direitos sociais e civis das minorias sociais
–
mulheres, índios, LGBTs,
negros etc. Ao analisar os aspectos gerais dos documentos e leis expostas acima, nota-se um
caráter universal no que se refere aos direitos sociais. Sobre a questão dos travestis, transexuais
e transgêneros, Hogemann (2014, p. 218) aponta que:
A Constituição brasileira institui a proteção da dignidade do ser humano
enquanto tal e o respeito às diferenças individuais e de grupos sociais em
observância à ordem social. Nesse domínio de tutela de direitos de homem e
do cidadão a devida adequação da designação nominativa de travestis,
transexuais e transgêneros aponta ao nosso país integração e coerência com
nossa Constituição Federal, em necessária observância aos preceitos dos
Direitos Humanos e do Direito Internacional.
Mesmo diante da observância das leis ao que diz o Direito Internacional sobre a temática
trabalhada no artigo em questão, a autora observa que não há uma legislação especifica que
respeite integralmente os direitos sociais dos denominados trans, em especial se tratando de
cirurgias de mudança de sexo e a questão do uso de nomes sociais, havendo necessidade de
encaminhamentos em via judicial, ficando essas pessoas expostas e à mercê de cada julgador
“[...] com a possibilidade de o resultado ser penetrado por valores, costum
es, moralismos e
preconceitos vinculados à condição de indivíduo que existe por trás de cada toga”
(HOGEMANN, 2014, p. 218).
De acordo com o Artigo 5º da Constituição Federal brasileira:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-
se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta
Constituição; [...]
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação; [...] (BRASIL, 1988)
Citando apenas dois parágrafos (I e X) da CF/88 (BRASIL,1988), percebe-se que, diante
da Lei, todos e todas deveriam ser tratados de uma mesma maneira no que cabe aos direitos
civis e sociais, visto que a mesma legislação assegura os direitos dos cidadãos e cidadãs
brasileiras, porém, o que se percebe no cotidiano é uma lacuna entre a teoria e a prática.
Portanto, mesmo as Leis estando de acordo e dialogando com o que o Direito Internacional
precede sobre o assunto, na prática, os Direitos Humanos vão sendo relevados dia a dia.
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Direitos das minorias em conquista
As minorias sociais são várias, como já explicitadas anteriormente há uma contradição
ou confusão no conceito de minoria. Em muitos casos, há uma distorção quanto à palavra que,
segundo o dicionário Aurélio, vai trazer algumas definições importantes que esclarecem o
entendimento geral: “mi.no.ria: 1 inferioridade numérica. 2. A parte menos numerosa duma
corporação deliberativa, etc.” (FERREIRA, 2008, p. 556). Assim, a grande maioria dos
indivíduos acaba se concentrando nesta parte do significado da palavra minoria, porém, a
significância da mesma vai além: “[...] 3.
Antrop. Sociol.
Subgrupo que, dentro de uma
sociedade, se considera e/ou é considerado diferente do grupo dominante, e que não participa,
em igualdade
de condições, da vida social” (FERREIRA, 2008, p. 556). Portanto, esses grupos
(mulheres, negros, indígenas, LGBTs etc.), embora representem quantitativamente um número
expressivo de sujeitos, não são tratados enquanto cidadãos e cidadãs que são, o que interfere
diretamente em seu cotidiano.
Gênero e diversidade no currículo escolar: uma perspectiva pós-crítica
A história da educação é marcada por pressupostos e conceitos que orientam e
fundamentam o seu caminho. O contexto histórico de uma sociedade e a concepção de homem
que ela possui estabelecem, desde seu princípio, as bases pelas quais se justificam a prática de
sua educação através de teorias e metodologias destinadas ao desenvolvimento humano. Essas
ações de caráter epistemológico e didático definem determinados períodos através dos quais é
possível perceber a relação estabelecida entre a educação e a sua concepção de homem e de
sociedade.
No entanto, à medida que a história transcorre em seu curso, mudanças vão acontecendo
tanto no interior dos indivíduos quanto no contexto social no qual estão inseridos. Disso resulta
a mudança do sentido que se atribui à educação, provocando novos pensamentos e novas ações.
Sendo então a educação carregada de intencionalidades, essas teorias pedagógicas vão se
reconfigurando e adquirindo novas formas, o que nos remete a pensar sobre a reconfiguração
do próprio currículo, pois “todas as teorias pedagógicas são também teorias sobre currículo”
(SILVA, 2009). No entanto, o que caracteriza uma nova tendência não é sempre a extinção de
uma anterior, mas a evolução desta, que pode dar-se pela quebra ou transformação da primeira.
Essa adaptação transformadora das intencionalidades pedagógicas se caracteriza pela
mudança social, pela crítica acerca do modelo anterior de educação, bem como da visão sobre
a sociedade modificada e sobre o homem desta sociedade. Daí então o caminho educativo ser
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trilhado, a partir das primeiras décadas do século XX,
sobre “estudos sobre currículo” (Silva,
2009), com a publicação de
The curriculum
, de Bobbitt, livro considerado como um “marco no
estabelecimento do currículo como um campo especializado de estudos” (SILVA, 2009), d
e
onde vieram as teorias tradicionais, preocupadas com a “natureza da aprendizagem”,
perpassan
do pelas teorias críticas, focadas na “natureza humana” e estando hoje direcionadas
pelas teorias pós-críticas,
que evidenciam a consideração da educação sobre a “natureza do
conhecimento, cultura e sociedade”, essencialmente ligadas à “...nossa identida
de...nossa
subjetividade” (SILVA, 2009).
O homem e a sociedade característicos da contemporaneidade, partes fundamentais do
novo processo de transformação humana, social, política e econômica, mobilizam inquietações
sobre novas formas e novos modelos de se pensar e se fazer educação. Essa ruptura do
paradigma educativo nos permite observar “um movimento intelectual que proclama que
estamos vivendo numa nova época histórica, a Pós-Modernidade, radicalmente diferente da
anterior, a Modernidade” (SILVA, 2009
). Sendo então a escola, ainda, um referencial do
sentido conceitual de educação, encontra-se, há muito, defasada do contexto atual, pois que,
sendo ela um símbolo da modernidade, nós, enquanto sociedade, já ultrapassamos essa época.
Como diz Silva:
Nossas noções de educação, pedagogia e currículo estão solidamente fincadas
na Modernidade e nas ideias modernas. A educação tal como a conhecemos
hoje é a instituição moderna por excelência. Seu objetivo consiste em
transmitir o conhecimento científico, em formar um ser humano supostamente
racional e autônomo [...]. Nesse sentido, o questionamento pós-modernista
constitui um ataque à própria ideia de educação (2009, p. 111-112)
O fenômeno educativo não pode ser compreendido como uma realidade acabada.
Mizukami nos vem afirmar que o fenômeno educativo é, antes de tudo, “um fenômeno humano,
histórico e multidimensional” que não “se dá a conhecer de forma única e precisa em seus
múl
tiplos aspectos” (
MIZUKAMI, 1986), embora que, por muito tempo, para cada período,
tenha focado seu olhar em apenas uma das múltiplas dimensões. Num modelo clássico de
educação, o foco na matéria e no método valorizaram a dimensão técnica do processo. Por outra
via conceitual, a definição de objetivos, conteúdos, métodos e avaliação, numa forma linear e
sistêmica, idealizava uma educação estrategista findada em comportamentos especificados e
observáveis; nesse modelo, avalia-se o aluno somente. No entanto, há que se considerar a
existência de um modelo que não se finda na avaliação do aluno, mas que, de forma cíclica,
avalia também o processo e o método.
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O discurso pós-crítico de gênero e diversidade: Uma proposta dos direitos humanos
RIAEE
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1888-1903, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587
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1898
Este último modelo considera o sistema educativo como resultado de um sistema
didático que concebe avaliação, conteúdos, objetivos e métodos, mas que possui relação com o
sistema psicológico do ser, preocupando-se com desenvolvimento, aprendizagem, memória e
motivação. Essa perspectiva crítica advém da compreensão de que o sistema educativo não é
isolado de outros tantos sistemas que o circundam, como o científico, tecnológico, religioso,
cultural, ideológico, econômico e político. Daí resulta as ideias pós-críticas sobre o currículo,
que compreendem a escola como território de embates “que pressionam, ai
nda, para que entrem
no território do conhecimento legítimo as experiências e os saberes dessas ações coletivas, para
que sejam conhecidos sujeitos coletivos de memórias, história e culturas” (ARROYO, 2011).
O conhecimento está, pois, convertido em “um território de disputas” (ARROYO, 2011).
O embate atual resultante da necessária mudança paradigmática e da gritante realidade
ainda existente com moldes de ensino fincados em conceitos equivocados sobre a relação
simbiótica que deve haver entre escola e sociedade faz surgir uma questão delicada, profunda
e que exige uma resposta em caráter emergencial: o que deve fundamentar a ação docente num
período em que o território sociocultural emerge dentro da escola? Outra questão que aprofunda
essa reflexão é a seguinte: até quando estará a sociedade modificando-se conceitualmente e os
ideais esperados pela educação estarão buscando acompanhar esse ritmo acelerado da mudança
enquanto
a prática docente, a sua realidade, continua de olhos vendados? “Estamos em um
processo promissor de repensarmos como profissionais. Nosso trabalho é mais complexo. O ser
professor tornou-
se mais tenso” (ARROYO, 2011).
Ao tratar das questões pós-críticas do currículo, o que deve chamar a atenção docente é
que Silva (2009), em seu livro
Documentos de Identidade
, nos traça um panorama das
complexas questões decorrentes da atualidade que devem ser contempladas no currículo:
multiculturalismo, relações de gênero, etnia e raça, teoria
queer
. Ele considera que a
fundamentação da ação docente diante de uma realidade pós-crítica deve ponderar que o que
realmente “conta como conhecimento oficial” não é o currículo hegemônico, uma vez que sob
o fenômeno do multiculturalismo, “a igualdade não se obtém simplesmente através da
igualdade de acesso” a es
se currículo, mas sim na modificação dele para que sejam
contempladas ações que valorizem a identidade dos “grupos culturais dominados” (SILVA,
2009).
Outra questão crucial no papel docente frente ao combate às desigualdades está pautada
nas relações de gê
nero e na pedagogia feminista. Ao quebrar com a ideia de um “currículo
educacional” que “refletia e reproduzia os estereótipos da sociedade mais ampla” (SILVA,
2009), tanto disciplinas consideradas naturalmente masculinas ou naturalmente femininas, bem
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA e José Paulo Gomes BRAZÃO
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DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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como profissões e funções sociais direcionadas especificamente ao homem ou à mulher, fazem
emergir a necessidade de reconceituação da função docente para que vá além da dinâmica de
classe, sendo capaz de refletir “de forma equilibrada, tanto a experiência mas
culina quanto a
feminina” (SILVA, 2009), garantindo às mulheres não só o “acesso às instituições e formas de
conhecimento do patriarcado” (SILVA, 2009), mas também de garantir
-lhes oportunidade de
transformação desses espaços, uma vez que o acesso simplesmente as introduziria num lugar
construído sob conceitos masculinizados.
Outro aspecto bastante presente nas discussões contemporâneas acerca das
transformações ocorridas na sociedade diz respeito não só ao pensamento acerca de gênero e
na quebra da cultura masculinizada estabelecida histórica e culturalmente, que não perpassam
pura e simplesmente os fatores biológicos que nos definem como homens e mulheres, mas em
toda uma construção conceitual que estabelece e segrega os gêneros como se, por serem
b
iologicamente distintos, socialmente eles deveriam “funcionar”, também, de forma distinta. O
fator discursivo em questão envolve a sexualidade que, “embora fortemente presente na escola,
raramente faz parte do currículo” (SILVA, 2009), está também fincado
sobre o livre caminho
entre as fronteiras sexuais ao conceber a homossexualidade não como um “desvio da
sexualidade dominante, hegemônica, ‘normal’”, mas para “questionar, problematizar, contestar
todas as formas bem-comportadas de conhecimento e de identi
dade” (SILVA, 2009).
A palavra
queer
significa “estranho”, “esquisito”, “singular”, “excêntrico”, “suspeito”,
mas que, no movimento homossexual, enquanto teoria, é recuperada e, apesar da aparência
pejorativa que a mesma possa transparecer ao tratar de homossexualidade como algo
“estranho”, “esquisito”, é vista como “forma positiva de autoidentificação” (SILVA, 2009)
,
porque não trata especificamente sobre as conotações sexuais, mas tem por objetivo “complicar
a questão da identidade sexual e, indiretamente, também a questão da identidade cultural e
social. Através da “estranheza”, quer
-
se perturbar a tranquilidade da ‘normalidade’”
(SILVA,
2009).
Da mesma forma que a teoria
queer
, a pedagogia
queer
pretende, de maneira mais geral,
e aqui também é focado o trabalho docente de forma mais específica, compreender as questões
de identidade sexual e da sexualidade numa “questão mais ampla do conhecimento” (SILVA,
2009), forçando
[...] os limites das epistemes dominantes: um currículo que não se limita a
questionar o conhecimento como socialmente construído, mas que se aventura
a explorar aquilo que ainda não foi construído. A teoria queer
–
esta coisa
“estranha” –
é a diferença que pode fazer diferença no currículo (SILVA,
2009, p. 109)
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O discurso pós-crítico de gênero e diversidade: Uma proposta dos direitos humanos
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Da perspectiva pós-moderna e pós-estruturalista, o currículo a ser construído deve
romper com o modelo da Modernidade ao considerar o conhecimento não através de matérias
estanques, segmentadas, objetivistas e realistas, mas sim pela subjetividade, pela relação entre
conhecimento científico e conhecimento do cotidiano, por uma epistemologia que não segregue
os grupos sociais de forma rígida entre “‘alta’ cultura e ‘baixa’ cultura” (SILVA, 2009), que
lute para além da emancipação e libertação do sujeito individual e coletivo, que tire da situação
confortável todos os conceitos radicalizados e todas as concepções dominantes de
conhecimento, pois “o pós
-modernismo assinala o fim da pedagogia crítica e o começo da
pedagogia pós-
crítica” (SILVA, 2009).
Sob a perspectiva pós-estruturalista, o discurso feito por uma teoria não o define como
algo que simplesmente a descreve, mas que a produz, pois ao descrever linguisticamente e
simbolicamente, o teórico na verdade torna-se autor de um objeto que é novo, resultado de sua
produção descritiva e reflexiva. Não cabe mais a visão de que a teoria simplesmente seria
responsável por representar uma realidade existente fora dela, findando seu dever na mera
descrição de um objeto pré-existente e exterior. A ideia de teoria, sob a concepção de discurso
numa visão pós-estruturalista, concebe que os efeitos de realidade ocorrem a partir daquilo que
o teórico define como realidade, pois os efeitos de realidade, na verdade, acabam por produzir
uma nova realidade.
Dessa forma, sob a concepção docente, a função deste profissional frente às questões
pós-críticas do currículo não é o de mero representador de uma realidade ou de conhecimentos
pré-estabelecidos ou ditados por fonte exterior, mas o de produtor de um currículo novo e
autoral, com base em sua própria experiência docente em relação direta com a vivência dos
demais atores e autores do processo educativo, valorizando a dimensão humana dos seres que
é também social, cultural, ideológica, política, econômica e identitária, pois é no discorrer sobre
esse currículo que “acabamos por nos tornar o que somos”, pois
[...] nas discussões cotidianas, quando pensamos em currículo, pensamos
apenas em conhecimento, esquecendo-nos de que o conhecimento que
constitui o currículo está, inextricavelmente, centralmente, vitalmente,
envolvido naquilo que somos, naquilo que nos tornamos: na nossa identidade,
na nossa subjetividade (SILVA, 2009, p. 15)
A visão de um currículo
Queer
conduz os docentes e estudantes ao questionamento e ao
estranhamento do
status quo
. Essa ação resulta num olhar “desconstruído” sobre as questões de
género.
Queerizar
a Escola é proporcionar ao ambiente escolar uma visão crítica do seu
currículo (DIAS; BRAZÃO, 2021). Acresce ainda que o desenvolvimento de um currículo
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Queer
pode minimizar desigualdades nas relações de gênero e do corpo na escola. Do ponto de
vista das políticas das diferenças e dos processos identitários, surgem assim novas
possibilidades para a promoção de culturas inclusivas para as práticas pedagógicas, na forma
de cidadania crítica (DIAS; BRAZÃO, 2021).
Em suma, a essência do que deve constar no currículo é a própria essência humana, com
todas as suas minuciosidades, disputas, conflitos, realizações, conquistas e prazeres. A ação
docente deve ser uma oportunidade à voz dos indivíduos. A educação, sob essa perspectiva,
ganha nova cor, nova vida, porque o conteúdo da vida somos nós, as disciplinas da vida são
nossas vivências e experiências, as pinturas da vida são os retratos de nossa própria história
construída com luta, com suor, com significado. “O conteúdo da pintura não pode ser separado
da sensação de sua superfície” (DUMAS
4
apud SILVA, 2009), nem tampouco o conteúdo da
vida pode estar separado de seus viventes.
Considerações finais
Diante do exposto, vale ressaltar que as conquistas dos direitos civis e sociais das
minorias, muitas vezes, necessitam ser debatidos de forma a garanti-los com maior ênfase. Qual
a razão de salientar esta questão: a sociedade atual vive em um contexto político e social que,
apesar de haver uma série de leis que garantem os direitos sociais, políticos e civis dos
indivíduos, em muitos momentos, se veem obrigados a lutar pela garantia dos direitos que já
estão firmados legalmente. Assim, existe uma luta constante na manutenção da garantia e,
também, uma ação para que a efetividade desses direitos seja realizada.
Através do exposto, pode-se considerar que as questões de gênero e diversidade foram
silenciadas ao longo da história dos direitos humanos. Mesmo os conjuntos de leis considerados
pioneiros no que se refere aos direitos sociais, civis e políticos, para as mulheres em sua
diversidade, foi relegado o espaço da invisibilidade e do silêncio; cabe sinalizar aqui, nas
palavras das autoras Pinsky e Pedro,
que: “Em determinados momentos de ampliação de
direitos e progressos democráticos, as mulheres não foram favorecidas do mesmo modo que os
ho
mens” (PINSKY; PEDRO, 2012, p. 265). Refletindo a partir da negação aos direitos civis e
políticos que consideraram as questões de gênero, cabe um questionamento: quando, de fato,
as questões de gênero e diversidade foram incorporadas como pauta para os direitos humanos?
4
Marlene Dumas é a autora das pinturas que ilustram a capa do livro de Tomaz Tadeu da Silva aqui referenciado.
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O discurso pós-crítico de gênero e diversidade: Uma proposta dos direitos humanos
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1888-1903, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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sjrj/arquivo/508-2259-1-pb.pdf. Acesso em: 13 jan. 2021.
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA e José Paulo Gomes BRAZÃO
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1888-1903, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587
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Como referenciar este artigo
CASTRO, E. S.; SILVA, I. V. S.; BRAZÃO, J. P. G. O discurso pós-crítico de gênero e
diversidade: Uma proposta dos direitos humanos.
Revista Ibero-Americana de Estudos em
Educação
, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1888-1903, jul./set. 2022. e-ISSN: 1982-5587. DOI:
https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
Submetido em
:
11/02/2022
Revisões requeridas em
: 28/04/2022
Aprovado em
: 19/06/2022
Publicado em
: 01/07/2022
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
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El discurso postcrítico de género y diversidad: Una propuesta de derechos humanos
RIAEE
–
Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1896-1911, jul/sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
1896
EL DISCURSO POSTCRÍTICO DE GÉNERO Y DIVERSIDAD: UNA PROPUESTA
DE DERECHOS HUMANOS
O DISCURSO PÓS-CRÍTICO DE GÊNERO E DIVERSIDADE: UMA PROPOSTA DOS
DIREITOS HUMANOS
THE POST-CRITICAL DISCOURSE ON GENDER AND DIVERSITY: A HUMAN
RIGHTS PROPOSAL
Éden Santos de CASTRO
1
Íris Vanessa de Sousa SILVA
2
José Paulo Gomes BRAZÃO
3
RESUMEN
: Este artículo pretende desarrollar un debate sobre el discurso postcrítico de género
y diversidad, considerando la propuesta sobre ellos desde la perspectiva de los derechos
humanos, partiendo del objetivo de comprender el discurso postcrítico de género y diversidad
en el campo de los derechos humanos. También busca comprender la relación entre la
Declaración Universal de los Derechos Humanos y la discusión sobre género y diversidad,
analizando qué son los derechos humanos y cuál es la propuesta que establece la Declaración
al tratar las relaciones de género instituidas y experimentadas por diversas sociedades, así como
verificar la distorsión entre discurso y práctica en el tema presentado. Esta es una investigación
bibliográfica realizada a través de lecturas, resúmenes, registros. Se concluye que las cuestiones
de género y diversidad han sido silenciadas a lo largo de la historia de los derechos humanos.
PALABRAS CLAVE
:
Derechos humanos. Diversidad. Género.
RESUMO
: O presente artigo pretende desenvolver um debate sobre o discurso pós-crítico de
gênero e diversidade, ao considerar a proposta sobre os mesmos na perspectiva dos direitos
humanos, partindo do objetivo de compreender o discurso pós-crítico de gênero e diversidade
no âmbito dos Direitos Humanos. Também busca entender a relação entre a Declaração
Universal dos Direitos Humanos com a discussão sobre gênero e diversidade, analisando o
que são direitos humanos e qual a proposta estabelecida pela Declaração ao tratar das
relações de gênero instituídas e vivenciadas por várias sociedades, bem como averiguar a
distorção entre o discurso e a prática na temática apresentada. Esta é uma pesquisa
1
Secretario de Educación del Estado de Bahía (SEC), Quixabeira
–
BA
–
Brasil. Coordinadora Pedagógica,
Colegio Estatal Profesora Terezinha Gonçalves Novais. Miembro Fundador y subdirector de la Academia
Quixabeirense de Pedagogía (AQPED). Estudiante de doctorado en Educación (UFS). ORCID:
https://orcid.org/0000-0002-3601-4899. E-mail: edendecastro@live.com
2
Secretaria de Educación del Estado de Bahía (SEC), Quixabeira
–
BA
–
Brasil. Subdirector, Colegio Estatal
Profesora Terezinha Gonçalves Novais. Miembro y fundadora de la Academia Quixabeirense de Pedagogía
(AQPED). Maestría en Estado, Gobierno y Políticas Públicas (FLACSO). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-
9865-1925. E-mail: iris.vanessa1989@outlook.com
3
Universidad de Madeira (UMa), Funchal
–
Portugal. Investigador del Centro de Investigación en Educación.
Postdoctorado en Educación (UFS). ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3575-4366. E-mail:
jbrazão@staff.uma.pt
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA
y
José Paulo Gomes BRAZÃO
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DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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bibliográfica realizada através de leituras, resumos, fichamentos. Conclui-se que as questões
de gênero e diversidade foram silenciadas ao longo da história dos direitos humanos.
PALAVRAS-CHAVE
: Direitos humanos. Diversidade. Gênero.
ABSTRACT
: This article aims to develop a debate on the post-critical discourse of gender and
diversity, by considering the proposal about them from the perspective of human rights, starting
from the objective of understanding the post-critical discourse of gender and diversity within
the framework of human rights. It also seeks to understand the relationship between the
Universal Declaration of Human Rights and the discussion on gender and diversity, analyzing
what are human rights and what is the proposal established by the Declaration when dealing
with gender relations instituted and experienced by various societies, as well as to investigate
the distortion between discourse and practice in the theme presented. This is a bibliographical
research carried out through readings, abstracts, and annotations. We conclude that gender
and diversity issues have been silenced throughout the history of human rights.
KEYWORDS
: Human rights. Diversity. Gender.
Introdução
Al analizar cómo la sociedad aborda las cuestiones postcríticas de género y diversidad,
debemos preguntarnos cómo tratan los derechos humanos
l
a el tema antes mencionado. Para
ello, es importante considerar lo que está presente en la Declaración Universal de Derechos
Humanos (UNIC, 2009) y lo que concierne al tema indicado en este documento. Pensar en las
relaciones de género y la diversidad de las relaciones humanas debe pasar por la comprensión
de lo que sería la propuesta de derechos humanos cuando se trate el tema. La Declaración
Universal de Derechos Humanos fue adoptada y proclamada en 1948, poco después de la
Segunda Guerra Mundial, nque todas las personas, independientemente de su raza, sexo,
condición política o económica, creencia o etnia, derechos humanos garantizados y
preservados. Para que esto ocurriera, fue creada las Organizaciones de las Naciones Unidas
–
ONU, institución encargada de ayudar a los Estados Miembros en la búsqueda de la paz y la
armonía universal.
La Declaración Universal de los Derechos Humanos en uno de los párrafos de su
preámbulo afirma que la carta considera importante la fe en los derechos fundamentales de los
hombres, cree que es necesario valorar la dignidad y el valor de la persona humana, así como
el "[...] la igualdad de derechos de hombres y mujeres, y que han decidido promover el progreso
social y mejores condiciones de vida en una libertad más amplia". (UNIC, 2009, p. 03). Por lo
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tanto, la función principal de la ONU es garantizar que todas las naciones y estados hagan
cumplir lo establecido en la Declaración y que todas las personas sean tratadas por igual.
Por lo tanto, este trabajo se basa en la necesidad de entendimiento entre la Declaración
Universal de los Derechos Humanos y la discusión postcrítica sobre género y diversidad,
buscando comprender qué son los derechos humanos y cuál es la propuesta establecida por la
Declaración al tratar las relaciones de género instituidas y experimentadas por diversas
sociedades;
en este sentido, este artículo se centrará en la comprensión de los derechos
humanos desde las relaciones de género, como se comprobará la distorsión entre el discurso y
la práctica en el tema presentado.
Esta revisión bibliográfica forma parte de la investigación cualitativa de un fenómeno
"contemporáneo en el contexto de la vida real" (YIN, 2010, p. 22), que tiene lugar en toda la
sociedad. Yin afirma la necesidad de una investigación de revisión bibliográfica cuando dice
que "el camino comienza con una revisión exhaustiva de la literatura" (YIN, 2010, p. 23),
porque sirve no para "determinar las respuestas sobre lo que se sabe sobre un tema", sino para
"desarrollar preguntas más perspicaces y reveladoras sobre el mismo tema" (YIN, 2010, p. 35).
Woods también dice que "la consulta bibliográfica integra el proceso de desarrollo de la teoría,
que estimula las ideas y forma la teoría emergente, al tiempo que crea oportunidades para la
crítica y la estimulación del estudio" (WOODS, 1999, p. 87).
Esta revisión comenzó con la selección de las sumas bibliográficas adecuadas para la
construcción de la base metodológica de la investigación, lecturas de los autores de referencia
estrictamente necesarias para la construcción de esta teoría y la comprensión de lo necesario
para reflexionar, crear y describir a través de la producción de registros y resúmenes. Esta parte
de estricta importancia durante el período de investigación se llevó a cabo a partir de la idea de
Macedo cuando dice que "para el investigador cualitativo, no existe un marco teórico
incuestionable" (MACEDO, 2009, p. 92), es decir, las lecturas no pueden ser entendidas por el
investigador como verdades a seguir, sino como inspiración para que surjan otras verdades.
Después de todo, ¿qué son los derechos humanos?
Después de la Segunda Guerra Mundial, en los años 1945, fueron establecidos por las
Naciones Unidas: los horrores del segundo gran conflicto de la segunda guerra mundial dieron
origen a la institución que tiene entre, sus principales objetivos promover y alentar a los pueblos
y naciones al respeto mutuo y a los derechos humanos, según lo estipulado en la Carta de las
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Naciones Unidas, firmada en la ciudad de San Francisco, California, en los Estados Unidos de
América, en octubre de 1945.
Según la propia ONU, "los derechos humanos son inherentes a todos los seres humanos,
independientemente de su raza, sexo, nacionalidad, etnia, idioma, religión o cualquier otra
condición" (ONU, 2019). Los derechos humanos también incluyen una serie de derechos y
libertades, tales como: la vida, la libertad de opinión y expresión, el derecho al trabajo, la
educación, entre otros. Todos y cada uno merece estos derechos, sin ningún tipo de sanción o
discriminación.
Así, la ONU determina que:
Los derechos humanos se entienden comúnmente como aquellos derechos
inherentes al ser humano. El concepto de Derechos Humanos reconoce que
todo ser humano puede disfrutar de sus derechos humanos sin distinción de
raza, color, sexo, idioma, religión, opinión política o de otra índole, origen
social o nacional o condición de nacimiento o riqueza. Los derechos humanos
están legalmente garantizados por el derecho de los derechos humanos,
protegiendo a individuos y grupos de acciones que interfieren con las
libertades fundamentales y la dignidad humana (ONU, 2019).
El derecho internacional, basado en tratados internacionales, considerando el derecho
de los derechos humanos, requiere que los Estados actúen de cierta manera, prohibiéndoles o
no algunas acciones, pero esta misma legislación no determina qué son los derechos humanos.
Así, se entiende que los derechos humanos son derechos inherentes a cada individuo por el
simple hecho de que es un humano. Los tratados internacionales y otras modalidades que se
ocupan de los derechos civiles se utilizan a menudo para garantizar la protección formal de los
derechos de las personas o los grupos contra las acciones o el abandono de los gobiernos, que
pueden interferir directa o indirectamente con sus derechos como seres humanos. Para una
mejor comprensión, el sitio web de las Organizaciones de las Naciones Unidas establece
algunas características importantes para la definición de los derechos humanos:
Los derechos humanos se basan en el respeto de la dignidad y el valor de cada
persona;
Los derechos humanos son universales, lo que significa que se aplican por
igual y sin discriminación a todas las personas;
Los derechos humanos son inalienables y nadie puede ser privado de sus
derechos humanos; pueden estar limitados en situaciones específicas. Por
ejemplo, el derecho a la libertad puede restringirse si una persona es declarada
culpable de un delito ante un tribunal y con las debidas garantías procesales;
Los derechos humanos son indivisibles, interrelacionados e interdependientes,
ya que son insuficientes para respetar algunos derechos humanos y otros no.
En la práctica, la violación de un derecho afectará al respeto de muchos otros;
Por lo tanto, todos los derechos humanos deben considerarse de igual
importancia, y también es esencial respetar la dignidad y el valor de cada
persona (ONU, 2019).
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El discurso postcrítico de género y diversidad: Una propuesta de derechos humanos
RIAEE
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1896-1911, jul/sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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Por lo tanto, los derechos humanos se refieren a todo lo que concierne a la dignidad
humana: al violar cualquier fundamento moral o legal con respecto a la vida humana, estoy
seguro de que se está violando algún derecho humano, ya que son indivisibles, interrelacionados
e interdependientes.
Derechos humanos y derechos sociales: ¿cómo están representadas las mujeres?
Desde el proceso de independencia de las 13 colonias británicas de América, ahora los
Estados Unidos, hubo una acalorada discusión sobre el tema de los derechos, especialmente
con respecto a los derechos sociales. En la segunda mitad del siglo 18, desviando la lógica de
la mayoría de las colonias europeas en todo el mundo, las 13 colonias entran en un proceso de
separación de su metrópoli, Inglaterra. Con una guerra librada entre colonia y metrópoli, en
1776 llega lo que hoy conocemos por Estados Unidos de América. A pesar del carácter
revolucionario, ya que es considerada historiográficamente como una revolución contra la
sumisión política y económica a la metrópoli, entonces surge el pionero de la Revolución
Americana cuando se trata de los derechos humanos. Por palabras del cantante (2012, p. 201):
La Revolución Americana fue pionera en la formación de los derechos
humanos. Por primera vez, un pueblo basa su aspiración a la independencia
en los principios de la ciudadanía, es decir, coloca como propósito primordial
del Estado la preservación de las libertades de los miembros del pueblo.
Elevado a la categoría de sujetos políticos.
A pesar de ser pioneros en la Declaración de Independencia de los Estados Unidos en
materia de derechos humanos, en la práctica se excluyó a los indios, que continuaron siendo
diezmados, a los negros que permanecieron bajo el régimen de esclavitud, especialmente en el
sur del país, , y a las mujeres, que yacían bajo la ausencia de derechos políticos y civiles. A
pesar de que el papel de la mujer en diversos tipos de actividades (domésticas, agrícolas, como
parteras, etc.), civil y políticamente fueron olvidados y excluidos del proceso que consideraba
los derechos políticos y no se incluyeron en ninguna noción de igualdad civil.
A pesar de lo dicho anteriormente, de los tres grupos totalmente excluidos en la práctica
de los derechos humanos iniciados en estados Unidos, las mujeres se convertirán en pioneras
en las s, luchas abolicionistas a mediados del siglo XIX.
Sin embargo, fue en el movimiento abolicionista de la década de 1830 donde
el movimiento por los derechos de las mujeres tuvo sus orígenes políticos.
Cuando las mujeres comenzaron a trabajar seriamente por la abolición de la
esclavitud, rápidamente aprendieron que no podían actuar como políticamente
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Éden Santos de CASTRO; Íris Vanessa de Sousa SILVA
y
José Paulo Gomes BRAZÃO
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1896-1911, jul/sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
DOI: https://doi.org/10.21723/riaee.v17i3.17086
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iguales a sus amigos abolicionistas masculinos. [...] Los incesantes y brutales
ataques (a veces físicos) contra las mujeres convencieron a las [hermanas]
Grimkés de que las cuestiones de la libertad para los esclavos y la libertad para
las mujeres estaban inextricablemente vinculadas.
Por lo tanto, para las mujeres abolicionistas estadounidenses, no había forma de luchar
por la libertad de los negros sin, al mismo tiempo, luchar por su propia libertad. Después de la
Revolución Americana, la Revolución Francesa tuvo lugar en suelo europeo, desencadenada
por cuestiones sociales y políticas que conmovieron a gran parte de la población francesa en
ese momento. Una grave crisis económica desencadenó una revolución masiva en Francia en
1789. Aunque cronológicamente fechada en 1789, la revolución comenzó mucho antes, en los
años 1774, en el momento de la coronación de Luis XVI, que coincide con una gran crisis
económica que enfrentan especialmente las poblaciones social y económicamente vulnerables
del país, principalmente en el interior y en los campos.
La Revolución Francesa, que fue precedida por una revolución social y más tarde de
naturaleza política, se volvió extremadamente importante con respecto a los derechos sociales
y humanos. En agosto de 1789 se adoptó la Declaración de los Derechos Humanos y
Ciudadanos, reconocida por la entonces Asamblea Nacional, que en algunos aspectos se
asemejaba a la Declaración de Independencia de los Estados Unidos. Contiene en el artículo 1
la siguiente declaración: "Art.1. Los hombres nacen y son libres e iguales en derechos. Las
distinciones sociales solo pueden basarse en la utilidad común" (USP, 2020). Pero, después de
todo, de hecho, a partir de la presente declaración de la Declaración, ¿tenían todos los franceses
los mismos derechos? Resulta que no. La Constitución francesa de 1791 siguió la misma lógica
que las declaraciones antes mencionadas, no siendo generosa en cuanto a la atribución de los
derechos civiles y políticos de los franceses.
En palabras de Singer (2012, p. 214-215):
Distinguió entre ciudadanos activos, con todos los derechos, y
responsabilidades, con derechos legales y humanos, pero no políticos. Las
mujeres, menores de 25 años, las que no tenían domicilio legal en un cantón,
donde no pagaban ningún impuesto, eran privadas del derecho a votar y ser
votadas [...] porque supuestamente no podrían votar libremente.
Dicho esto, debe tenerse en cuenta la ausencia de derechos de la mujer, así como la
exclusión o invisibilidad de los desfavorecidos con respecto a los derechos civiles y políticos.
Esta observación es necesaria, porque tanto la Declaración de Independencia de los Estados
Unidos como la nueva legislación francesa fueron consideradas pioneras con respecto a los
derechos humanos, pero se ve que hubo una selectividad en el alcance de estos derechos,
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El discurso postcrítico de género y diversidad: Una propuesta de derechos humanos
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Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação, Araraquara, v. 17, n. 3, p. 1896-1911, jul/sept. 2022. e-ISSN: 1982-5587
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estaban disponibles para hombres, blancos y élite, a pesar de que la Revolución Francesa fue
un movimiento de naturaleza social y política, no hubo apertura directa en el debate sobre la
inclusión de las mujeres y los más pobres en su legislación.
También vale la pena señalar la Ilustración del siglo 18. Movimiento extremadamente
importante para determinar el debilitamiento del Antiguo Régimen en Europa, fue fundamental
para que los individuos valoraran cada vez más el conocimiento científico:
hubo un largo
debate entre los partidarios de la continuidad a los gobiernos monárquicos y los que ya no
estaban de acuerdo con una administración que no tenía la participación de la población en las