Maria Zélia Borba ROCHA2 Shayane Cristina MORAES3
RESUMEN: El proyecto político-pedagógico es un documento de gestión escolar, obligatorio para las escuelas públicas, establecido en la legislación federal brasileña.El objetivo de la investigación realizada fue desvelar la ideología y la utopía subyacentes a los proyectos político-pedagógicos. La investigación empírica de metodología mixta fue realizada en dos períodos: 2010-2012 y 2018-2019, y empleó, como método cuantitativo, el método inductivo, y en la base cualitativa, la Hermenéutica de Profundidad. El método inductivo proporcionó los criterios de cohorte en la recolección de los datos y la Hermenéutica de Profundidad propició el desvelado de la ideología y de la utopía ocultos en los contenidos de los proyectos político-pedagógicos. El análisis cualitativo, por intermedio de la Hermenéutica de Profundidad, recurrió a los conceptos de ideología y de utopía en la perspectiva mannheimiana. El análisis logró identificar cuatro componentes ideológicos y un componente utópico.
PALABRAS CLAVE: Gestión escolar. Gestión democrática. Planificación estratégica. Hermenéutica profunda. Teoría mannheimiana.
1 A primeira versão deste trabalho foi apresentada no VI Congresso Iberoamericano de Política e Administração da Educação, realizado simultaneamente com o IX Congresso Luso-Brasileiro de Política e Administração da Educação, na Universidade de Lleida, Espanha, no período de 28 de maio a 1 de junho de 2018.
ABSTRACT: The political-pedagogical project is a school management document, mandatory for public schools, established in Brazilian federal legislation. The objective of the research was to unveil the ideology and utopia underlying the political-pedagogical projects. The empirical research of mixed methodology was carried out in two periods: 2010-2012 and 2018-2019, and employed, as a quantitative method, the inductive method, and in the qualitative basis, the Hermeneutic of Depth. The inductive method provided the cohort criteria in the data collection and the Hermeneutic of Depth provided the unveiling of the ideology and utopia hidden in the contents of the political-pedagogical projects. The qualitative analysis, through the Hermeneutic of Depth, resorted to the concepts of ideology and utopia in the Mannheimian perspective. The analysis was able to identify four ideological components and one utopian component.
KEYWORDS: School management. Democratic management. Strategic planning. Depth hermeneutics. Mannheimian theory.
Este artigo descreve e analisa os resultados de pesquisa empírica realizada no Distrito Federal, no período inicial de 2010-2012, com continuação em 2018-2019.
O objetivo geral da pesquisa foi identificar a ideologia e a utopia subjacentes em projetos políticos-pedagógicos de escolas públicas. O problema de pesquisa que norteou a investigação foi o de saber como e se a ideologia e a utopia estão subsumidas nas práticas escolares, de tal forma que se consubstanciam no conteúdo do planejamento estratégico das escolas.
O artigo subdivide-se em cinco partes: (i) gestão democrática, planejamento estratégico e projeto político pedagógico; (ii) percursos metodológicos; (iii) ideologia e utopia; (iv) Hermenêutica de Profundidade: ideologia e utopia subjacentes; e (v) considerações finais.
O modelo de gestão adotado na rede pública de educação básica brasileira é a gestão democrática, estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988 (CF 88) e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1966 (LDB 96). O Distrito Federal referendou a gestão democrática como modelo em seu subsistema público de ensino por intermédio de lei distrital de 2012.
A literatura acadêmico-científica do setor educacional, que tem por objeto de estudo a gestão escolar, é unânime em considerar a necessidade e a importância do projeto político-
pedagógico como instrumento da gestão democrática, pois este define a missão da unidade escolar; esclarece os princípios norteadores que fundamentam as práticas escolares; estabelece os objetivos que a escola almeja alcançar; determina metas e estratégias a serem atingidas; organiza os critérios da avaliação institucional. Com isso, o PPP auxilia a escola a delinear sua identidade e a construir a autonomia pedagógica e de gestão da escola.
Como instrumento de gestão democrática, trata-se de planejamento estratégico porque consiste em um “[...] esforço disciplinado e consistente, destinado a produzir decisões fundamentais e ações que guiam a organização escolar, em seu modo de ser e de fazer, orientado para resultados, com forte visão de futuro” (LÜCK, 2000, p. 10). No processo de elaboração do PPP, toda a organização escolar é repensada e analisada: a estrutura física; os recursos materiais e humanos; as atividades a serem desenvolvidas. A organização escolar é repensada e analisada em função da proposta curricular; em relação ao contexto político- social local no qual a escola está inserida; em relação às estruturas de poder regionais e nacionais às quais a escola está submetida; em direção dos objetivos pedagógicos a serem atingidos pela comunidade.
O projeto político-pedagógico (PPP) é um instrumento da gestão estratégica de cada escola pública de educação básica no Brasil e, como tal, trata-se de documento obrigatório a partir da promulgação da lei federal nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que estabelece no inciso I do art. 12 que compete aos estabelecimentos de ensino “elaborar e executar sua proposta pedagógica”. O PPP constitui planejamento estratégico porque os elementos constitutivos desse modelo de planejamento encontram-se presentes no documento: organização da rotina do trabalho; existência de objetivos; existência de metas, estratégias e prazos de execução; visão de futuro; definição de mecanismos de avaliação do trabalho. O PPP, como planejamento estratégico, na fase da avaliação, organiza e coleta dados objetivos para o contínuo trabalho de reelaboração do planejamento, da organização escolar e mesmo da comunidade local, no entorno da unidade escolar.
O PPP está também estabelecido na lei distrital nº 4.751, de 07 de fevereiro de 2012, que dispõe sobre o sistema de ensino e a gestão democrática do subsistema de ensino público do Distrito Federal, que obriga as escolas públicas de educação básica do Distrito Federal a “[...] formular e implementar seu projeto político-pedagógico, em consonância com as políticas educacionais vigentes e as normas e diretrizes da rede pública de ensino do Distrito Federal” (DISTRITO FEDERAL, 2012, art. 4º, caput). Assim, o PPP é um instrumento de orientação para as ações das unidades escolares pelo período de quatro anos (DISTRITO
FEDERAL, 2012, art. 17). Cada grupo gestor, ao assumir a direção do estabelecimento, deve elaborar o seu plano de ação para o período de gestão.
Fator importante na gestão democrática é a participação da comunidade nas decisões da unidade escolar. A elaboração do PPP, portanto, é definida como coletiva pela legislação: “cabe à unidade escolar, considerada a sua identidade e de sua comunidade escolar, articular o projeto político-pedagógico” (DISTRITO FEDERAL, 2012, art. 4º, Parágrafo único). O Projeto Político-Pedagógico é elemento estrutural do modelo de gestão democrática, pois o PPP provoca reflexões sobre o cotidiano escolar e, ao mesmo tempo, constitui um reflexo deste. Esta reflexão é ação que necessita tempo e continuidade para se consolidar. Para que esta reflexão seja profunda e espelhe com fidedignidade a realidade da unidade escolar, seus objetivos e valores, é mister a participação de todos os segmentos da comunidade escolar na elaboração do PPP: docentes, discentes, funcionários, técnico-administrativos e de apoio e equipe gestora.
Por ser instrumento do modelo de gestão democrática, o PPP não pode e não deve ser elaborado apenas pela equipe gestora da unidade escolar. A participação coletiva é importante para consolidar a autonomia e a identidade da comunidade escolar (VEIGA, 2011). Por todo o exposto, o PPP é o planejamento estratégico da escola ao mesmo tempo de caráter político e pedagógico.
O PPP é um documento político porque sua ação é intencional, de sentido explícito, e com um compromisso definido coletivamente. Está articulado aos interesses e necessidades sociopolíticos da comunidade escolar, assim como com o compromisso de formação das gerações futuras, para a sociedade da qual a escola é parte integrante. O PPP é um planejamento estratégico sociopolítico das atividades pedagógicas que contribuem para o desenvolvimento das funções sociais, pedagógicas e políticas da escola e, por ser um planejamento estratégico que abarca a totalidades das atividades escolares, requer participação consciente e intencional de cada segmento da comunidade escolar, em relação à missão e aos objetivos que a unidade escolar almeja atingir.
O PPP é também um documento pedagógico porque subsume, em seu conteúdo, os elementos constitutivos do trabalho pedagógico escolar. Os elementos constitutivos e integrantes do trabalho pedagógico escolar são seis: as finalidades da escola; a estrutura organizacional; o currículo (os conteúdos); o tempo; os processos decisórios internos; e a avaliação. Como planejamento estratégico, o PPP questiona, analisa, organiza, delineia e explicita todos os elementos partícipes do trabalho pedagógico escolar.
As finalidades que a escola pode desempenhar junto à comunidade que a compõe e entorna sua territorialidade estão relacionadas aos objetivos sociopolíticos que a escola se atribui e também às finalidades sociais, culturais e educacionais que a sociedade e a comunidade lhe atribuem. O processo de elaboração coletiva do PPP deve ponderar sobre esses aspectos, os deliberando e os definindo nesse planejamento estratégico.
A estrutura organizacional, segundo elemento constitutivo, é composta por dois tipos de estrutura: administrativa e pedagógica. A estrutura administrativa assegura a organização, a alocação e a gestão de recursos humanos, prediais, materiais e financeiros. A estrutura pedagógica organiza as funções educativas, interrelacionando pessoas, conhecimento, tempo e atividades.
Os conteúdos disciplinares são o terceiro elemento constitutivo do trabalho pedagógico escolar e precisam ser considerados não como conhecimento neutro, mas como espaço de poder, de controle social, de transmissão ideológica, de interrelações entre fronteiras culturais, de formação de identidades e de diferenças (MACEDO, 2006). O PPP, como planejamento estratégico do trabalho escolar, questiona, reflete e também minudencia as formas como o currículo será operacionalizado, enriquecido e adaptado, por e para àquela comunidade.
O quarto elemento constitutivo do trabalho pedagógico escolar, o tempo, está diretamente relacionado à qualidade do trabalho pedagógico e ao bem-estar dos atores do processo educacional. O planejamento estratégico deve prever períodos de tempo de trabalho individual; de reflexão coletiva; de atividades lúdicas; de intervalos ociosos; e para cada etapa das atividades pedagógicas. A organização do tempo no processo educacional permite, ao mesmo tempo, o controle: dos conteúdos disciplinares, considerando os aspectos de profundidade e de abrangência; do espaço escolar; das relações intersubjetivas; das atividades desenvolvidas, em termos de continuidade e/ou de ruptura.
O penúltimo elemento constitutivo do trabalho pedagógico escolar, os processos decisórios internos, amalgama todos os outros na funcionalidade da unidade escolar. Como se darão as deliberações da comunidade? Quais segmentos terão direito à participação e com qual peso e percentual? Quais tipos de decisões cada segmento terá direito ao voto deliberativo? O planejamento estratégico, que é o PPP, deve minudenciar todos esses aspectos.
Por fim, a avaliação, tanto pedagógica quanto institucional, engloba a criação de mecanismos de acompanhamento, de critérios objetivos nos quais se deve basear qualquer tipo de avaliação, inclusive do próprio PPP. Por conseguir correlacionar todas essas nuanças
do processo educacional, o projeto político-pedagógico é também um instrumento pedagógico da gestão escolar.
A pesquisa adotou a metodologia mista na análise do objeto de estudo e processou-se em duas fases: de 2010 a 2012, e de 2018 a 2019. A primeira fase da pesquisa (2010-2012) possibilitou conhecer o universo e distinguir as categorias presentes nos Projetos Políticos Pedagógicos. A segunda fase da pesquisa (2018-2019) permitiu um mergulho mais profundo na cultura e na identidade de cada escola pesquisada. A comparação das duas fases possibilitou comprovar simetrias e assimetrias de valores e mentalidades de cada comunidade escolar investigada. Este procedimento metodológico propiciou uma visão geral da ideologia e utopia presentes na rede escolar pública do Distrito Federal. Os métodos empregados, nas duas fases, foram o indutivo e a Hermenêutica de Profundidade (HP).
A metodologia mista empregou, como método quantitativo, o indutivo, que possibilitou a generalização dos resultados para o universo pesquisado, a partir da amostragem utilizada para a coleta dos documentos. A amostra usada foi a aleatória por conglomerados. Escolheu-se as regiões administrativas do Distrito Federal com maior contingente populacional e, nessas, coletou-se os PPP’s nas escolas públicas urbanas com maior quantidade de matrículas no ensino médio propedêutico.
O DF tinha, em 2012, o universo de 557 escolas públicas urbanas. Entretanto, esta rede contempla 17 categorias de escolas que ministram diferentes níveis, etapas e modalidades de ensino. As categorias que ministram ensino médio propedêutico regular eram e ainda são: Centro Educacional e Centro de Ensino Médio. Assim, o universo pesquisado era de 78 escolas (CODEPLAN, 2013) e a amostra deste subuniverso foi dez unidades escolares, concentrando-se naquelas que apresentavam maior número de matrículas nesta etapa da Educação Básica.
No período de 2018 a 2019 o DF apresenta o total de 603 escolas públicas urbanas, donde se constata que houve crescimento de 8,2% no quantitativo dessa categoria de escolas, segundo o Censo Escolar de 2019 (DISTRITO FEDERAL, 2019). Dentre essas, 88 são de ensino médio propedêutico. Nessa segunda etapa, a amostra manteve-se nas mesmas dez unidades pesquisadas no período anterior, a fim de analisar mudanças e/ou continuidades de conteúdo nos documentos institucionais.
No total, foram coletados vinte PPP’s, mas a computação dos dados deu-se por unidades escolares, uma vez que os dados foram coletados nas mesmas escolas nos dois períodos. Contabilizar os dados em duplicidade inflaria os valores, o que falsearia a realidade. A utilização das mesmas técnicas nos dois períodos diferentes de tempo possibilitou detectar continuidades e/ou descontinuidades de valores, de identidade, de mentalidades dos atores institucionais que atuam na rede pública de ensino médio propedêutico do DF.
A abordagem qualitativa deu-se por intermédio da Hermenêutica de Profundidade (THOMPSON, 2009), que propiciou desvelar os componentes ideológicos e utópicos ocultos nos conteúdos objetivos. O estudo da ideologia e utopia presentes e atuantes em determinado contexto histórico e manifestos em determinadas formas simbólicas somente tem sentido se se busca atingir a matriz de pensamento de determinada sociedade ou de determinados grupos sociais, ainda que estes tenham reverberações individuais.
A matriz de pensamento da Hermenêutica de Profundidade (HP) é o mannheimiano, a partir da concepção total de ideologia. Mannheim (1976) explica que a ideologia é um fenômeno total que constitui o substrato o qual amalgama as interações societais ao mesmo tempo que cria uma nuvem a ensombrecer o pensamento humano e a sua compreensão da realidade:
As ideologias são as idéias (sic) situacionalmente transcendentes que jamais conseguem de facto a realização de seus conteúdos pretendidos. Embora se tornem com frequência motivos bem intencionados (sic) para a conduta subjetiva do indivíduo, seus significados, quando incorporados efetivamente à prática, são na maior parte dos casos, deformados (MANNHEIM, 1976, p. 218).
Devido a essa especificidade da ideologia, Mannheim fincou as bases epistemológicas para estudá-la. Como fenômeno total, a ideologia deve ser pesquisada, primeiramente, a partir de suas raízes sociais e sem qualquer conotação valorativa do fenômeno em si. A aplicação desses dois princípios epistemológicos permite chegar à estrutura da mentalidade de determinada sociedade e/ou grupo social, em determinado tempo histórico. Restringir-se às manifestações individuais da ideologia seria manter-se na superficialidade e na incompletude do fenômeno, sem chegar ao substrato que explica os valores e comportamentos sociais, grupais e individuais.
A partir deste solo, Thompson (2009) delimitou os procedimentos metodológicos para estudar as manifestações simbólicas da ideologia e da utopia no pensamento contemporâneo: a Hermenêutica de Profundidade. O método está, portanto, fincado em território mannheimiano.
A HP estrutura-se em três fases: análise sócio-histórica, análise formal ou discursiva, e a interpretação/reinterpretação. A análise sócio-histórica da ideologia e da utopia considera que as manifestações simbólicas, eivadas de ideologia e/ou de componentes utópicos, são constructos abstratos criados para responder a necessidades e interesses das ambiências socioculturais ou dos grupos que lhes estruturaram. A análise sócio-histórica da ideologia e da utopia deve observar a produção, a circulação e a recepção das formas simbólicas em estudo, considerando tanto os aspectos institucionais, quanto os grupais e individuais, além de atentar-se para as relações de dominação que as formas simbólicas consolidam ou rompem. A pesquisa contemplou essa fase ao mostrar a relação entre o conteúdo dos PPP’s e as fontes teórico-científicas das quais tiraram os conceitos e os princípios.
A segunda fase da Hermenêutica de Profundidade - a análise formal ou discursiva - prende-se à forma de manifestação do fenômeno: linguagem; padrões; regras. Esta fase foi contemplada na pesquisa por meio da análise de conteúdo e categorização, o que permitiu destrinchar o conteúdo dos PPP’s em oito categorias de análise diferentes4.
A última fase da HP é a interpretação da doxa ideológica e/ou utópica, explicando o significado dos conteúdos objetivos a partir de suas relações com a estrutura social e com os objetivos dos grupos, ou seja, com a ambiência social que produziu àquele tipo de pensamento. Isso foi o que foi realizado na pesquisa, pois analisar o conteúdo dos Projetos Político-Pedagógicos permitiu desvelar os componentes ideológicos e utópicos subjacentes ao conteúdo.
Entretanto, calcado no princípio epistemológico de que o sujeito cognoscente é, também, um sujeito imerso em determinada ambiência social e, portanto, sofre influências destas, Thompson (2009) alerta que intentar uma interpretação é sempre projetar um significado dentre os vários possíveis, pois a reinterpretação da doxa ideológica e utópica depende das interações do sistema de pensamento com os demais aspectos da realidade: é uma questão de perspectiva. Assim, é mister explicar que a interpretação que esta pesquisa empreendeu consiste em uma perspectiva correlacionada à ambiência social na qual estão inseridos, tanto os atores criadores do fenômeno estudado, quanto os sujeitos cognoscentes, produtores do conhecimento. Coloca-se, assim, em prática, o princípio metodológico thompsoniano, cuja fonte, na verdade, é Mannheim (2001). O rigor metodológico empregado objetivou alcançar um relativo distanciamento e, portanto, aproximar-se da validade científica, pois, como ensinou Weber (1992), a matriz desta linhagem de pensamento, a
4 Esta parte da pesquisa foi objeto de outro artigo, submetido a outro periódico pois, por ser muito extensa, não cabia nas dimensões deste artigo.
neutralidade científica nunca será alcançada, mas terá sempre que ser perseguida por intermédio do rigor metodológico.
O conceito de ideologia utilizado neste trabalho é o cunhado por Mannheim (1976), o qual adota a concepção epifenomênica marxista, considerando-a um fenômeno total que somente pode ser compreendido em íntima conexão com o contexto social que a produziu. Para este, na palavra ideologia está implícita “a noção de que, em certas situações, o inconsciente coletivo de certos grupos obscurece a condição real da sociedade, tanto para si como para os demais, estabilizando-a” (MANNHEIM, 1976, p. 66).
Para Mannheim (1976), o conceito de ideologia não carrega em si conotação negativa, pois o significado do mundo que compõe uma estrutura historicamente determinada somente pode ser alcançado por meio de uma análise não-valorativa da ideologia que constitui o universo cultural de determinada realidade social. Com esta posição epistemológica, consegue-se captar o fluxo das realidades em constantes mudanças.
Já utopia é o pensamento que constitui uma variação do presente, na busca de um futuro ideal. A utopia aspira por um ideal ou por um estado atual melhorado. Não se pode reduzi-la a um impulso psicológico, sonho, fantasia, desejo ou vontade. A utopia não significa a busca da vida perfeita, mas um projeto que pode ser alcançado a depender da ação coletiva. O pensamento utópico consiste em uma crítica social com projeção de saída do estado atual das coisas na direção de um futuro almejado (MANNHEIM, 1976).
Um pensamento é considerado utópico quando está fundado na experiência e na prática, mas orienta-se para objetos que não existem na realidade, no tempo atual, ao contrário, estão sempre projetados para o futuro. As utopias são orientações que vão além da realidade e que tendem a transformar comportamentos que estremecem a ordem das coisas naquele determinado tempo e espaço histórico. Quando uma orientação propõe acabar com a ordem existente, ela se torna utópica (MANNHEIM, 1976).
Há necessidade de se compreender e distinguir as orientações utópicas das ideológicas, pois estas têm funções diferentes no meio social. As ideologias, por mais que possam transcender em relação à ordem existente, não oferecem possibilidades revolucionárias; por outro lado, elas justificam o status quo, uma vez que buscam manter o pensamento social atual. Mesmo assim uma ideologia pode tornar-se utópica, quando esta é incorporada a
imagens que exprimem uma vontade e conduzem a uma mudança de comportamento (MANNHEIM, 1976).
A ordem operante baseia-se em uma estrutura política e econômica e contém concepções que podem ser consideradas transcendentes ou irreais. As ideologias são ideias transcendentes que jamais conseguem realizar os conteúdos pretendidos. O indivíduo sente-se forçado e preso a uma conduta particular, podendo estar dentre uma série de mentalidades ideológicas, que são: mentalidade bem intencionada transcendente; mentalidade hipócrita e mentalidade ideológica. A mentalidade bem intencionada transcendente é o pensamento socialmente determinado na ambiência social e no tempo histórico que produziu este tipo de mentalidade. Neste tipo de mentalidade, o ator social está impedido de tomar consciências das incongruências da realidade porque os valores, as crenças, as representações, as pressões sociais caem sobre ele com todo o peso de ser a verdade estabelecida e ideal. A mentalidade hipócrita tem consciência das assimetrias, contradições e paradoxos da mentalidade vigentes, mas não faz a crítica, o questionamento e a propositura de alternativas porque está preso a algum interesse emocional ou político ou econômico ou ético ou moral ou filosófico ou ideológico. A mentalidade ideológica constitui uma fraude consciente, pois oculta das as assimetrias, contradições, paradoxos e desigualdades sociais, ao mesmo tempo que cria coesão entre os indivíduos ao fornecer uma base axiológica para fundamentar, justificar e explicar, tanto a realidade, quanto suas próprias ações (MANNHEIM, 1976).
As utopias também transcendem a situação atual, mas se diferenciam quando conseguem transformar a realidade histórica. Mannheim (1976) afirma que diferenciar se um pensamento é ideológico ou utópico, é extremamente difícil, pois é um conceito que envolve valores e padrões. Para fazer esta diferenciação o pesquisador deve partilhar dos sentimentos e motivações dos grupos em luta, na realidade histórica.
A Hermenêutica de Profundidade (HP), criada por Thompson (2009) a partir da hermenêutica clássica e da concepção mannheimiana de ideologia e utopia, realiza a reconstrução do significado da forma simbólica em estudo a partir da contextualização da mesma no cenário social na qual está inserida. O objetivo final da HP é compreender5 como
5 A matriz primeira da metodologia thompsoniana e da teoria mannheimiana é a lógica do pensamento weberiano na qual as Ciências da Cultura devem buscar a compreensão da ação social e seus significados (WEBER, 1992).
as formas simbólicas são utilizadas em interações político-sociais que se configuram na esfera pública.
Neste estudo, a HP foi adaptada, e contemplará a interpretação que os atores escolares elaboram da doxa ideológica e utópica vigente na sociedade. Interpretação corporificada nos projetos políticos pedagógicos das escolas públicas de ensino médio do Distrito Federal, no Brasil, nos períodos de 2012 a 2014 e de 2017 a 2019:
Negligenciar esses contextos da vida quotidiana, e as maneiras como as pessoas situadas dentro delas interpretam e compreendem as formas simbólicas que eles produzem e recebem, é desprezar uma condição hermenêutica fundamental da pesquisa [...] (THOMPSON, 2009, p. 364)
A terceira fase da HP – a interpretação/reinterpretação –, utilizada nesta pesquisa, busca desvendar as interrelações existentes entre o significado do conteúdo reproduzido na forma simbólica em estudo e as concepções de mundo hegemônicas da sociedade que as criou. É mister enfatizar que se trata sempre de um esforço de ressíntese criativa, intentando uma explicação do significado da doxa vigente inscrita na forma simbólica.
Verificou-se que os PPP’s analisados incorporam princípios e valores presentes nos instrumentos normativos e nas teorias científicas, incidindo muito pouco em componentes ideológicos. Foram detectados os seguintes princípios norteadores que não podem ser considerados, de todo, componentes ideológicos porque são oriundos de análises acadêmico- científicas: a) educação como força de mudança social; b) escola como instituição capaz de diminuir desigualdades sociais; c) participação comunitária como meio de resolução de conflitos e; d) ciência como guia de ações humanas. O principal componente utópico encontrado nos projetos políticos-pedagógicos analisados é a democracia como valor.
COMPONENTES IDEOLÓGICOS | COMPONENTE | ||||
UTÓPICO | |||||
ESCOLAS | Educação como força de mudança social | Escola como instituição capaz de diminuir desigualdades | Participação comunitária como meio de resolução de | Ciência como guia de ações humanas | Democracia como valor |
sociais | conflitos | ||||
Alfa | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
Beta | 1 | 1 | 1 | 1 | --- |
Gama | 1 | 1 | 1 | --- | 1 |
Delta | 1 | --- | 1 | 1 | 1 |
Epsílon | --- | --- | --- | 1 | 1 |
Dzeta | --- | --- | 1 | --- | 1 |
Eta | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
Teta | 1 | 1 | 1 | --- | 1 |
Iota | 1 | 1 | 1 | --- | --- |
Capa | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
TOTAL | 8 | 7 | 9 | 6 | 8 |
Fonte: Dados da pesquisa
Esses elementos não podem ser considerados, totalmente, componentes ideológicos, mas, ao mesmo tempo, o são. Trata-se de fenômeno dialético: ao mesmo tempo que são, também não são. Não podem ser considerados princípios ideológicos porque são oriundos de análises acadêmico-científicas e de legislação. Mas ao mesmo tempo são porque nem a legislação, nem o conhecimento acadêmico-científico são fortalezas inexpugnáveis à influência ideológica. Também porque se constata que, pelo menos dois deles (a, b) desempenham duas funções sociais: criam explicação para as assimetrias, desigualdades, paradoxos e contradições sociais; e constituem-se em crenças em torno das quais se aglutinam o fazer pedagógico dos atores escolares.
A educação como força que propulsiona a mudança social no sentido da diminuição das desigualdades sociais é tema recorrente nas ciências sociais e na Ciência da Educação. Em ambas as subáreas de conhecimento, a compreensão de que a educação formal é mola propulsora da mudança social foi desenvolvida considerando-se os aspectos econômicos, sociais, políticos, culturais. O tema da educação como força capaz de diminuir as desigualdades sociais remonta aos estudos clássicos de diversos matizes teóricos, desde as primeiras décadas do século XX. O processo de generalização do conhecimento científico o transforma em senso comum e, até mesmo em componente ideológico, quando os dados da realidade contradizem a crença que o conhecimento instituiu como ideologia6.
Este componente ideológico é encontrado em 70% dos PPP’s, que consideram essa possibilidade como resultado das interações sociais, enfatizando mais os aspectos culturais do que o conhecimento como insumo para formação do mercado de trabalho. O conteúdo dos PPP’s analisados oculta a mensagem ideológica que a escola é um espaço relacional capaz de contribuir para a mudança social e, portanto, para a redução das desigualdades sociais, mas formando o cidadão consciente para um contexto democrático e não, necessariamente, por democratizar o conhecimento científico:
6 Mannheim (1976) explica que uma das funções da ideologia é justificar as lacunas existentes entre as crenças e a realidade, não adotando a conotação negativa e valorativa de ideologia.
[...] a construção de uma escola pública que eduque de fato para o exercício pleno da cidadania e seja instrumento real de transformação social, espaço em que se aprenda a aprender, a conviver e a ser com e para os outros, contrapondo-se ao atual modelo gerador de desigualdades e exclusão social que impera das políticas educacionais de inspiração neoliberal (SEEDF, 2010b, p. 39).
Constata-se que esses documentos institucionais ignoram ou desconhecem a realidade da juventude brasileira contemporânea, na qual 70% da população jovem não está inserida nem em relações de trabalho formal, nem em espaços de educação formal. Trata-se de uma inatividade que atinge a maioria da juventude de 16 a 24 anos, com concentração nas mulheres, pobres, pretas e mães (MDSCF, 2013). A pesquisa denominou esta geração como “nem, nem”, que significa ‘nem estuda, nem trabalha’ ou ‘neither in employment nor in education or trainning’ (NEET). Esse dado estarrecedor comprova que a escolaridade e o trabalho não são valores para a geração contemporânea de jovens brasileiros. A crença na educação como mola propulsora de ascensão social ficou nas gerações mais velhas.
Nos PPP’s analisados, encontramos, na categoria missão, que a função das escolas é formar cidadãos críticos e atuantes para a vida, para a sociedade democrática e para o mercado de trabalho: “Formar cidadãos participativos, através da ação educacional, de práticas e princípios éticos aliados ao respeito à dignidade humana [...]” (SEEDF, 2019, p. 60). A Educação é concebida nessas missões, como força catalizadora para a mudança individual e, consequentemente, para a mudança social, ao fornecer aos indivíduos os instrumentais cognitivos e de conhecimentos para se inserirem na vida produtiva, política e cultural de forma ativa, agindo como atores na direção da mudança social. A escola é, nessa concepção, a instituição responsável por democratizar esses insumos. Mannheim (1972) caminha no rastro deste pensamento ao conceber a educação como uma ‘técnica social’ imprescindível na constituição de uma sociedade democrática e planejada.
No Brasil, a escolarização ainda é vista como fator de redução das desigualdades
sociais e, portanto, de mudança social. Entretanto, essa crença embute a falsa noção que as “[...] desigualdades de renda são diretamente ligadas às diferenças de qualificação” (SOBRAL, 1980, p. 41). Estudos provam que há fatores estruturais que mantêm e reproduzem as desigualdades sociais e que a educação, por si só, não constitui força suficiente para transformar a sociedade brasileira em uma sociedade com menos desigualdade social e com mais justiça social:
Vários são os fatores que podem estar determinando a diferença de renda não explicada pelo diferencial de escolaridade, entre os quais podemos citar
a expectativa de vida dos habitantes, fatores étnicos, estrutura etária da população, qualidade da infraestrutura existente, presença/ausência de estímulos ao desenvolvimento e fatores históricos (SALVATO; FERREIRA; DUARTE, 2010, p. 783).
Em realidade, a correlação de fatores é inversa do que está inscrito nos projetos político-pedagógicos. Em média, as condições econômicas de renda são condicionantes para o acesso à escolaridade, em especial à mais elevada: “o nível de escolarização atingido pelos jovens seja predito pelos fatores indicativos da situação socioeconômica, do capital cultural e do capital social acessível a suas famílias” (SILVA; HASENBALG, 2000, p. 10).
O que se constata é que a crença impressa em 80% dos PPP’s analisados contrasta com a realidade brasileira, tanto que, a fim de diminuir a brutal desigualdade de educação, cinco governos e meio7 implementaram políticas públicas educacionais para diminuir as desigualdades educacionais no Brasil e tiveram êxito, mas as estruturas socioeconômicas, tanto como político-culturais que mantêm a desigualdade econômica não foram tocadas. Os estudos científicos, de várias décadas diferentes, corroboram que o poder da educação para diminuição das desigualdades é limitado: “as simulações indicam também que, mesmo no longo prazo, há limites claros para os impactos que a educação pode ter sobre a distribuição de renda” (MEDEIROS; BARBOSA; CARVALHAES, 2019, p. 45).
O modelo de gestão democrática, tanto da sociedade, quanto da escola, é encontrado em 50% dos PPP’s. Neste, enfatiza-se o papel da participação dos indivíduos e dos grupos. A participação nos processos decisórios escolares, comunitários e societais é considerada ato de liberdade, momento de igualdade, e espaço relacional de poder. Por outro lado, nos documentos institucionais analisados, 90% consideram a participação como meio de resolução de conflitos. Esta crença anda de mãos dadas com a missão da escola de formar cidadãos críticos e atuantes que “passem a protagonizar o desenvolvimento da cidade, nas lutas por melhores condições para suas quadras, seu bairro, sua rua” (SEEDF, 2010b, p. 08).
A crença pode ser considerada componente ideológico porque desconsidera as injunções objetivas que a economia, a política, a cultura impõem aos indivíduos e aos grupos.
7 Os governos foram: Fernando Henrique Cardoso (1995-1999 e 1999-2003); Luís Inácio – Lula – da Silva (2003-2007 e 2007-2011; e Dilma Vana Roussef (2011-2014 e 2014-2016). As políticas educacionais foram: Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – FUNDEF (1996- 2008); Programa Nacional de Renda Mínima vinculada à educação - Bolsa Escola (2001-2004); Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – FUNDEB (2009- 2020); Programa Bolsa Família (2004-*); Programa Universidade para Todos – Prouni (2005-*); Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – Reuni (2007-2012). * Os governos pós 2016 mantiveram essas políticas públicas de educação porque algumas foram consubstanciadas como políticas de Estado, aprovadas pelo Legislativo federal, transformadas em emendas constitucionais e em leis federais.
O distanciamento entre a crença e a realidade objetiva é uma das idiossincrasias da ideologia, alocando o poder de mudança social nos indivíduos que participam, ou seja, recai no individualismo.
A partir da Revolução Industrial e da Revolução Francesa, a escola, no mundo ocidental, consolida-se como espaço de difusão do conhecimento científico, ainda que promovendo sua simplificação, adaptando-o ao nível de escolaridade e à faixa etária do público alvo. Esta compreensão corrente de uma das funções sociais da escola está atrelada à concepção de ciência como guia das ações humanas, vigente no mundo ocidental moderno e contemporâneo.
A ciência e a tecnologia passaram, cada vez mais, a serem valorizadas em diversos grupos sociais, sendo concebida como possibilidade de explicação da realidade e de resolução de problemas sociais. A crença no poder da ciência moderna e do conhecimento científico perpassa diversas sociedades na contemporaneidade, num crescendo, após a segunda guerra mundial e após a terceira revolução tecnológica da década de setenta do século XX (SHWARTZMAN, 2008).
Esta concepção ideológica foi encontrada em 60% dos projetos político-pedagógicos analisados. Afirmam que a educação voltada para a formação de cidadãos atuantes deve proporcionar conhecimentos científicos a fim de que os questionamentos sobre o mundo possam ser mais bem respondidos e os problemas solucionados. Tal concepção da função social do conhecimento científico e da escola como difusora deste é explícita em vários PPP’s: “evidenciar através do domínio dos fundamentos científicos-tecnológicos, a importância da pesquisa e do avanço das ciências, no sentido de responder aos desafios e questionamento do mundo moderno” (SEEDF, 2010a, p. 08).
A democracia é apresentada, nos PPP’s analisados, como componente primordial para se alcançar uma sociedade mais justa e igualitária, para a mudança não só a gestão da escola, como também da educação, da política, mas, principalmente, da sociedade. A democracia é afirmada como ideal a ser plasmado nas diferentes instituições sociais:
Garantir o diálogo e a relação de troca com a comunidade escolar para uma educação libertadora e inclusiva com fins à transformação política das realidades de desigualdade social, em suas transversalidades, e à garantia dos processos democráticos na escola e na sociedade (SEEDF, 2018, p. 20).
O componente utópico da democracia como valor é encontrado em 80% dos PPP’s analisados, nos quais se encontra a concepção que a democracia é fator primordial para a formação de cidadãos críticos e atuantes; para a consolidação de uma escola pública de
qualidade; e para “[...] desenvolver as capacidades e as habilidades voltadas para uma participação responsável e solidária na sociedade, através de uma prática democrática, visando o pleno exercício da cidadania” (SEEDF, 2010a, p. 08).
A democracia, no caso brasileiro, constitui um norte para onde os movimentos sociais, as políticas, as práticas escolares almejam chegar. A sociedade e o Estado brasileiro, assim com a educação formal, não podem ser, de todo, consideradas efetivamente democráticas, posto que há atores sociais excluídos desses processos, sem participação real, sem direitos de cidadania. Então, no caso brasileiro, a democracia ainda é um projeto de futuro a ser plasmado nas práticas sociais e escolares.
Encontrar a democracia como componente utópico a ser incorporado cotidianamente nas práticas escolares, para ser plasmado nas instituições sociais não é surpresa, uma vez que os PPP’s se fundamentam em teorias científicas e em documentos legais que adotam o modelo de gestão democrática na escola, a democracia como valor para o social, e a interrelação entre ambos: “[...] a gestão democrática é um passo importante para o aprendizado da democracia” (SEEDF, 2018, p. 04).
Para Mannheim (1976), o pensamento é determinado socialmente, de acordo com o grupo social que o produziu. O pensamento produz manifestações individuais e por subgrupos em uma sociedade, mas não se trata, em absoluto, de fenômeno individual.
A análise de conteúdo e a hermenêutica de profundidade realizadas nos conteúdos dos projetos políticos-pedagógicos de escolas públicas de ensino médio do Distrito Federal nos períodos de 2010 a 2012 e de 2018 a 2019 propiciou capturar o pensamento coletivo dos segmentos sociais que se constituem sujeitos do processo pedagógico nessa instituição. A análise dos PPP’s coletados evidenciou que estes estão fundamentados em documentos legais e em teorias científicas das áreas de humanas e sociais. A fundamentação legal ancora-se na Constituição Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (9.394/1996), nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, nos Parâmetros Curriculares Nacionais e no Currículo de Educação Básica do Distrito Federal.
Em suma, os componentes ideológicos subjacentes nos PPP’s analisados ancoram-se na crença de que a educação oferecida na escola pode resolver os problemas da sociedade. Creem que a escola tem como missão, objetivos e/ou princípios formar o cidadão que atue de
maneira crítica e que transforme o mundo atual, na direção de uma sociedade democrática, apoiada em conhecimentos racionais.
Entretanto, o que se vê na contemporaneidade é o contrário, com múltiplas manifestações de ódio pelas chamadas mídias sociais8; com movimentos negacionistas9 da ciência, da democracia, da pandemia provocada pelo coronavírus, de vacinas; e com grupos terraplanistas10. Os documentos institucionais relegam à secundariedade fatores essenciais para a transformação das estruturas sociais tais como a eliminação da imensa concentração de riquezas que caracteriza o Brasil desde o processo colonial; a promoção de uma distribuição de renda mais justa e menos desigual; à promoção do acesso às benesses sociais como trabalho, moradia, saúde, infraestrutura urbana e a própria escolaridade formal. Os PPP’s analisados incorrem na crença ingênua que os conhecimentos fornecidos na escola são suficientes para mudar essa realidade social.
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8 Ver: Stroppa e Rothenburg (2015), Stein, Nodari e Salvagni (2018) e Sarlet (2019). 9 Ver: Pivaro e Júnior (2020), Ramalho (2020), Vignoli, Rabello e Almeida (2021). 10 Ver De Albuquerque e Quinan (2019) e Marineli (2020).
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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO DISTRITO FEDERAL. Proposta
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Maria Zélia Borba ROCHA2
Shayane Cristina MORAES3
RESUMO: O projeto político-pedagógico é um documento de gestão escolar, obrigatório para as escolas públicas, estabelecido na legislação federal brasileira. O objetivo da pesquisa realizada foi desvelar a ideologia e a utopia subjacentes aos projetos político- pedagógicos. A pesquisa empírica de metodologia mista foi realizada em dois períodos: 2010-2012 e 2018-2019, e empregou, como método quantitativo, o método indutivo, e na base qualitativa, a Hermenêutica de Profundidade. O método indutivo forneceu os critérios de coorte na coleta dos dados e a Hermenêutica de Profundidade propiciou o desvelamento da ideologia e da utopia ocultos nos conteúdos dos projetos político-pedagógicos. A análise qualitativa, por intermédio da Hermenêutica de Profundidade, recorreu aos conceitos de ideologia e de utopia na perspectiva mannheimiana. A análise conseguiu identificar quatro componentes ideológicos e um componente utópico.
PALAVRAS-CHAVE: Gestão escolar. Gestão democrática. Planejamento estratégico. Hermenêutica de profundidade. Teoria mannheimiana.
1 The first version of this work was presented at the VI Iberoamerican Congress on Education Policy and Administration, held simultaneously with the IX Luso-Brazilian Congress on Education Policy and Administration, at the University of Lleida, Spain, from 28 May to 1 June 2018.
RESUMEN: El proyecto político-pedagógico es un documento de gestión escolar, obligatorio para las escuelas públicas, establecido en la legislación federal brasileña.El objetivo de la investigación realizada fue desvelar la ideología y la utopía subyacentes a los proyectos político-pedagógicos. La investigación empírica de metodología mixta fue realizada en dos períodos: 2010-2012 y 2018-2019, y empleó, como método cuantitativo, el método inductivo, y en la base cualitativa, la Hermenéutica de Profundidad. El método inductivo proporcionó los criterios de cohorte en la recolección de los datos y la Hermenéutica de Profundidad propició el desvelado de la ideología y de la utopía ocultos en los contenidos de los proyectos político-pedagógicos. El análisis cualitativo, por intermedio de la Hermenéutica de Profundidad, recurrió a los conceptos de ideología y de utopía en la perspectiva mannheimiana. El análisis logró identificar cuatro componentes ideológicos y un componente utópico.
PALABRAS CLAVE: Gestión escolar. Gestión democrática. Planificación estratégica. Hermenéutica profunda. Teoría mannheimiana.
This article describes and analyzes the results of empirical research carried out in the Federal District, in the initial period of 2010-2012, with continuation in 2018-2019.
The general objective of the research was to identify the underlying ideology and utopia in political-pedagogical projects of public schools. The research problem that guided the investigation was to know how and if ideology and utopia are subsumed in school practices, in such a way that they are embodied in the content of the strategic planning of schools.
The article is divided into five parts: (i) democratic management, strategic planning and pedagogical political project; (ii) methodological paths; (iii) ideology and utopia; (iv) Depth Hermeneutics: underlying ideology and utopia; and (v) final remarks.
The management model adopted in the Brazilian public basic education network is democratic management, established in the Constitution of the Federative Republic of Brazil, of 1988 (CF 88) and in the Law of Directives and Bases of National Education, of 1966 (LDB 96). The Federal District endorsed democratic management as a model in its public education subsystem through a 2012 district law.
The academic-scientific literature of the educational sector, whose object of study is school management, is unanimous in considering the need and importance of the political- pedagogical project as an instrument of democratic management, as it defines the mission of
the school unit; clarifies the guiding principles that underlie school practices; establishes the goals that the school aims to achieve; determines goals and strategies to be achieved; organizes institutional evaluation criteria. With this, the PPP helps the school to delineate its identity and to build the pedagogical and management autonomy of the school.
As an instrument of democratic management, it is about strategic planning because it consists of a “[...] disciplined and consistent effort, destined to produce fundamental decisions and actions that guide the school organization, in its way of being and doing, guided by for results, with a strong vision of the future” (LÜCK, 2000, p. 10, our translation). In the process of elaborating the PPP, the entire school organization is rethought and analyzed: the physical structure; material and human resources; the activities to be developed. The school organization is rethought and analyzed according to the curricular proposal; in relation to the local political-social context in which the school is inserted; in relation to the regional and national power structures to which the school is subject; towards the pedagogical objectives to be achieved by the community.
The political-pedagogical project (PPP) is an instrument of the strategic management of each public school of basic education in Brazil and, as such, it is a mandatory document from the enactment of federal law no. 9,394, of 20 December 1996 , the Law of Guidelines and Bases for National Education, which establishes in item I of art. 12 that it is up to educational establishments to “elaborate and execute their pedagogical proposal”. The PPP constitutes strategic planning because the constitutive elements of this planning model are present in the document: organization of the work routine; existence of goals; existence of objectives, strategies and execution deadlines; future vision; definition of work evaluation mechanisms. The PPP, as strategic planning, in the evaluation phase, organizes and collects objective data for the continuous work of re-elaboration of the planning, of the school organization and even of the local community, in the surroundings of the school unit.
The PPP is also established in District Law No. 4,751, of 7 February 2012, which provides for the education system and democratic management of the Federal District's public education subsystem, which obliges public elementary schools in the Federal District to “[...] formulate and implement its political-pedagogical project, in line with current educational policies and the norms and guidelines of the public education network in the Federal District” (DISTRITO FEDERAL, 2012, art. 4, caput, our translation). Thus, the PPP is an instrument to guide the actions of school units for a period of four years (DISTRITO FEDERAL, 2012, art. 17). Each management group, when taking over the management of the establishment, must prepare its action plan for the management period.
An important factor in democratic management is the participation of the community in the decisions of the school unit. The elaboration of the PPP, therefore, is defined as collective by the legislation: “it is up to the school unit, considering its identity and that of its school community, to articulate the political-pedagogical project” (DISTRITO FEDERAL, 2012, art. 4, Sole Paragraph, our translation). The Political-Pedagogical Project is a structural element of the democratic management model, as the PPP provokes reflections on the school routine and, at the same time, constitutes a reflection of it. This reflection is an action that needs time and continuity to consolidate. For this reflection to be profound and to faithfully reflect the reality of the school unit, its objectives and values, it is necessary to have the participation of all segments of the school community in the elaboration of the PPP: teachers, students, employees, technical-administrative and support and management team.
As an instrument of the democratic management model, the PPP cannot and should not be prepared only by the management team of the school unit. Collective participation is important to consolidate the autonomy and identity of the school community (VEIGA, 2011). For all the above, the PPP is the strategic planning of the school, at the same time of a political and pedagogical character.
The PPP is a political document because its action is intentional, with an explicit meaning, and with a collectively defined commitment. It is articulated with the socio-political interests and needs of the school community, as well as with the commitment to the formation of future generations, for the society of which the school is an integral part. The PPP is a socio-political strategic planning of pedagogical activities that contribute to the development of the school's social, pedagogical and political functions and, as it is a strategic plan that encompasses all school activities, it requires conscious and intentional participation from each segment of the school community, in relation to the mission and objectives that the school unit aims to achieve.
The PPP is also a pedagogical document because it subsumes, in its content, the constitutive elements of school pedagogical work. There are six constitutive and integral elements of school pedagogical work: the school's purposes; the organizational structure; the curriculum (the contents); the time; internal decision-making processes; and the evaluation. As a strategic plan, the PPP questions, analyses, organizes, outlines and explains all the elements involved in the school pedagogical work.
The purposes that the school can play with the community that composes it and surrounds its territoriality are related to the sociopolitical objectives that the school attributes to itself and also to the social, cultural and educational purposes that society and the
community attribute to it. The process of collective elaboration of the PPP must consider these aspects, deliberating and defining them in this strategic planning.
The organizational structure, the second constitutive element, is composed of two types of structure: administrative and pedagogical. The administrative structure ensures the organization, allocation and management of human, building, material and financial resources. The pedagogical structure organizes the educational functions, interrelating people, knowledge, time and activities.
Disciplinary contents are the third constitutive element of school pedagogical work and need to be considered not as neutral knowledge, but as a space of power, social control, ideological transmission, interrelationships between cultural boundaries, the formation of identities and differences (MACEDO, 2006). The PPP, as a strategic planning of school work, questions, reflects and also details the ways in which the curriculum will be operationalized, enriched and adapted, by and for that community.
The fourth constitutive element of school pedagogical work, time, is directly related to the quality of pedagogical work and the well-being of the actors in the educational process. Strategic planning must provide for individual work time periods; of collective reflection; of recreational activities; of idle intervals; and for each stage of the pedagogical activities. The organization of time in the educational process allows, at the same time, the control of: disciplinary content, considering the aspects of depth and scope; of the school space; of intersubjective relationships; of the activities developed, in terms of continuity and/or rupture. The penultimate constitutive element of the school pedagogical work, the internal decision-making processes, amalgamates all the others in the functionality of the school unit. How will community deliberations take place? Which segments will be entitled to participate and with what weight and percentage? What types of decisions will each segment be entitled
to a deliberative vote? Strategic planning, which is the PPP, must detail all these aspects.
Finally, evaluation, both pedagogical and institutional, encompasses the creation of monitoring mechanisms, of objective criteria on which any type of evaluation must be based, including the PPP itself. By being able to correlate all these nuances of the educational process, the political-pedagogical project is also a pedagogical instrument of school management.
The research adopted the mixed methodology in the analysis of the object of study and was processed in two phases: from 2010 to 2012, and from 2018 to 2019. The first phase of the research (2010-2012) made it possible to know the universe and distinguish the categories present in Pedagogical Political Projects. The second phase of the research (2018-2019) allowed a deeper dive into the culture and identity of each researched school. The comparison of the two phases made it possible to prove symmetries and asymmetries of values and mentalities of each investigated school community. This methodological procedure provided an overview of the ideology and utopia present in the public-school network of the Federal District. The methods used in both phases were inductive and Depth Hermeneutics (DH).
The mixed methodology used the inductive method as a quantitative method, which made it possible to generalize the results to the researched universe, based on the sampling used to collect the documents. The sample used was random by clusters. The administrative regions of the Federal District with the largest population were chosen and, in these, the PPPs were collected in urban public schools with the highest number of enrollments in propaedeutic high school.
In 2012, the DF had a universe of 557 urban public schools. However, this network includes 17 categories of schools that provide different levels, stages and teaching modalities. The categories that provide regular propaedeutic high school were and still are: Educational Center and High School Center. Thus, the universe surveyed consisted of 78 schools (CODEPLAN, 2013) and the sample of this sub-universe was ten school units, focusing on those with the highest number of enrollments in this stage of Basic Education.
In the period from 2018 to 2019, the DF has a total of 603 urban public schools, which shows that there was a growth of 8.2% in the number of this category of schools, according to the 2019 School Census (DISTRITO FEDERAL, 2019). Among these, 88 are in secondary education. In this second stage, the sample remained in the same ten units surveyed in the previous period, in order to analyze changes and/or continuities of content in the institutional documents.
In total, twenty PPPs were collected, but the data were computed by school units, since the data were collected in the same schools in both periods. Counting the data in duplicate would inflate the values, which would distort reality. The use of the same techniques in the two different periods of time made it possible to detect continuities and/or
discontinuities of values, of identity, of mentalities of the institutional actors who work in the public network of propaedeutic secondary education in the DF.
The qualitative approach took place through the Depth Hermeneutics (THOMPSON, 2009), which allowed to reveal the ideological and utopian components hidden in the objective contents. The study of ideology and utopia present and active in a given historical context and manifested in certain symbolic forms only makes sense if one seeks to reach the matrix of thought of a given society or of certain social groups, even if these have individual reverberations.
The thought matrix of Depth Hermeneutics (DH) is the Mannheimian, from the total conception of ideology. Mannheim (1976) explains that ideology is a total phenomenon that constitutes the substrate which amalgamates societal interactions while creating a cloud to overshadow human thought and its understanding of reality:
Ideologies are situationally transcendent ideas (sic) that never actually achieve the realization of their intended contents. Although they often become well-meaning motives (sic) for the individual's subjective conduct, their meanings, when effectively incorporated into practice, are in most cases distorted (MANNHEIM, 1976, p. 218, our translation).
Due to this specificity of ideology, Mannheim laid the epistemological foundations to study it. As a total phenomenon, ideology must be researched, first of all, from its social roots and without any evaluative connotation of the phenomenon itself. The application of these two epistemological principles makes it possible to arrive at the structure of the mentality of a given society and/or social group, in a given historical time. Restricting oneself to individual manifestations of ideology would be to remain in the superficiality and incompleteness of the phenomenon, without reaching the substrate that explains social, group and individual values and behaviors.
From this ground, Thompson (2009) delimited the methodological procedures to study the symbolic manifestations of ideology and utopia in contemporary thought: the Depth Hermeneutics. The method is, therefore, rooted in Mannheimian territory.
DH is structured in three phases: socio-historical analysis, formal or discursive analysis, and interpretation/reinterpretation. The socio-historical analysis of ideology and utopia considers that symbolic manifestations, riddled with ideology and/or utopian components, are abstract constructs created to respond to the needs and interests of sociocultural environments or the groups that structured them. The socio-historical analysis of ideology and utopia must observe the production, circulation and reception of the symbolic
forms under study, considering both institutional, group and individual aspects, in addition to paying attention to the relations of domination that symbolic forms consolidate or break. The research contemplated this phase by showing the relationship between the content of the PPPs and the theoretical-scientific sources from which the concepts and principles were taken.
The second phase of Depth Hermeneutics - the formal or discursive analysis - is related to the form of manifestation of the phenomenon: language; standards; rules. This phase was included in the research through content analysis and categorization, which allowed the content of PPPs to be broken down into eight different analysis categories4.
The last phase of DH is the interpretation of the ideological and/or utopian doxa, explaining the meaning of the objective contents from their relations with the social structure and with the objectives of the groups, that is, with the social ambience that produced that type of thought. This is what was done in the research, as analyzing the content of the Political- Pedagogical Projects allowed us to reveal the ideological and utopian components underlying the content.
However, based on the epistemological principle that the knowing subject is also a subject immersed in a certain social environment and, therefore, is influenced by them, Thompson (2009) warns that to attempt an interpretation is always to project a meaning among several possible ones, because the reinterpretation of ideological and utopian doxa depends on the interactions of the system of thought with other aspects of reality: it is a matter of perspective. Thus, it is necessary to explain that the interpretation that this research undertook consists of a perspective correlated to the social environment in which both the creators of the phenomenon studied and the knowing subjects, producers of knowledge, are inserted. Thus, the Thompsonian methodological principle is put into practice, whose source, in fact, is Mannheim (2001). The methodological rigor employed aimed at achieving a relative distance and, therefore, approaching scientific validity, because, as Weber (1992) taught, the matrix of this lineage of thought, scientific neutrality will never be achieved, but will always have to be pursued through methodological rigor.
The concept of ideology used in this work is the one coined by Mannheim (1976), which adopts the Marxist epiphenomenal concept, considering it a total phenomenon that can
4 This part of the research was the subject of another article, submitted to another journal because, as it was very extensive, it did not fit into the dimensions of this article.
only be understood in close connection with the social context that produced it. For him, in the word ideology is implicit “the notion that, in certain situations, the collective unconscious of certain groups obscures the real condition of society, both for themselves and for others, stabilizing it” (MANNHEIM, 1976, p. 66, our translation).
For Mannheim (1976), the concept of ideology does not carry a negative connotation, since the meaning of the world that composes a historically determined structure can only be reached through a non-evaluative analysis of the ideology that constitutes the cultural universe of a social reality. With this epistemological position, it is possible to capture the flow of constantly changing realities.
Utopia, on the other hand, is the thought that constitutes a variation of the present, in the search for an ideal future. Utopia aspires to an ideal or an improved current state. It cannot be reduced to a psychological impulse, dream, fantasy, desire or will. Utopia does not mean the search for the perfect life, but a project that can be achieved depending on collective action. Utopian thinking consists of a social critique with a projection from the current state of things towards a desired future (MANNHEIM, 1976).
A thought is considered utopian when it is based on experience and practice, but is oriented towards objects that do not exist in reality, at the present time, on the contrary, they are always projected into the future. Utopias are guidelines that go beyond reality and tend to transform behaviors that shake the order of things in that time and historical space. When an orientation proposes to end the existing order, it becomes utopian (MANNHEIM, 1976).
There is a need to understand and distinguish utopian from ideological orientations, as these have different functions in the social environment. Ideologies, however far they may transcend the existing order, do not offer revolutionary possibilities; on the other hand, they justify the status quo, as they seek to maintain current social thinking. Even so, an ideology can become utopian when it is incorporated into images that express a will and lead to a change in behavior (MANNHEIM, 1976).
The operant order is based on a political and economic structure and contains conceptions that can be considered transcendent or unreal. Ideologies are transcendent ideas that never manage to achieve their intended contents. The individual feels forced and trapped in a particular behavior, and may be among a series of ideological mentalities, which are: transcendent well-intentioned mentality; hypocritical mentality and ideological mentality. The well-meaning transcendent mentality is the socially determined thought in the social environment and historical time that produced this type of mentality. In this type of mentality, the social actor is prevented from becoming aware of the incongruities of reality because
values, beliefs, representations, social pressures fall on him with the full weight of being the established and ideal truth. The hypocritical mentality is aware of the prevailing mentality asymmetries, contradictions and paradoxes, but does not criticize, question and propose alternatives because it is tied to some emotional or political or economic or ethical or moral or philosophical or ideological interest. The ideological mentality constitutes a conscious fraud, as it hides asymmetries, contradictions, paradoxes and social inequalities, at the same time it creates cohesion between individuals by providing an axiological basis to justify and explain both reality and their own actions (MANNHEIM, 1976).
Utopias also transcend the current situation, but they differ when they manage to transform historical reality. Mannheim (1976) states that differentiating whether a thought is ideological or utopian is extremely difficult, as it is a concept that involves values and standards. To make this differentiation, the researcher must share the feelings and motivations of the groups in struggle, in the historical reality.
Depth Hermeneutics (DH), created by Thompson (2009) based on classical hermeneutics and the Mannheimian conception of ideology and utopia, performs the reconstruction of the meaning of the symbolic form under study from its contextualization in the social scenario in which it is inserted. The final objective of DH is to understand5 how symbolic forms are used in political-social interactions that are configured in the public sphere.
In this study, the DH was adapted, and it will contemplate the interpretation that the school actors elaborate on the ideological and utopian doxa prevailing in society. Interpretation embodied in the pedagogical political projects of public high schools in the Federal District, in Brazil, from 2012 to 2014 and from 2017 to 2019:
To neglect these contexts of everyday life, and the ways in which the people situated within them interpret and understand the symbolic forms they produce and receive, is to overlook a fundamental hermeneutical condition of research [...] (THOMPSON, 2009, p. 364, our transaltion)
The third phase of DH – interpretation/reinterpretation –, used in this research, seeks to unravel the interrelationships between the meaning of the content reproduced in the
5 The first matrix of Thompson's methodology and of Mannheim's theory is the logic of Weberian thought in which Cultural Sciences must seek to understand social action and its meanings. (WEBER, 1992).
symbolic form under study and the hegemonic worldviews of the society that created them. It is necessary to emphasize that it is always an effort of creative resynthesis, trying to explain the meaning of the current doxa inscribed in symbolic form.
It was found that the PPPs analyzed incorporate principles and values present in normative instruments and scientific theories, with very little focus on ideological components. The following guiding principles were detected that cannot be considered, at all, ideological components because they come from academic-scientific analyses: a) education as a force for social change; b) school as an institution capable of reducing social inequalities; c) community participation as a means of conflict resolution and; d) science as a guide to human actions. The main utopian component found in the analyzed political-pedagogical projects is democracy as a value.
SCHOOLS | IDEOLOGICAL COMPONENTS | UTOPIAN COMPONENT | |||
Education as a force for social change | School as an institution capable of reducing social inequalities | Community participation as a means of conflict resolution | Science as a guide to human actions | Democracy as a value | |
Alfa | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
Beta | 1 | 1 | 1 | 1 | --- |
Gama | 1 | 1 | 1 | --- | 1 |
Delta | 1 | --- | 1 | 1 | 1 |
Epsílon | --- | --- | --- | 1 | 1 |
Dzeta | --- | --- | 1 | --- | 1 |
Eta | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
Teta | 1 | 1 | 1 | --- | 1 |
Iota | 1 | 1 | 1 | --- | --- |
Capa | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 |
TOTAL | 8 | 7 | 9 | 6 | 8 |
Source: Research data
These elements cannot be considered entirely ideological components, but at the same time they are. It is a dialectical phenomenon: while they are, they are not. They cannot be considered ideological principles because they come from academic-scientific analysis and legislation. But at the same time they are because neither legislation nor academic-scientific knowledge are fortresses impregnable to ideological influence. Also because it can be seen that at least two of them (a, b) perform two social functions: they create an explanation for
asymmetries, inequalities, paradoxes and social contradictions; and they constitute beliefs around which the pedagogical work of school actors is grouped.
Education as a force that drives social change towards the reduction of social inequalities is a recurring theme in the social sciences and in the Science of Education. In both sub-areas of knowledge, the understanding that formal education is a driving force for social change was developed considering economic, social, political and cultural aspects. The theme of education as a force capable of reducing social inequalities dates back to classical studies of different theoretical shades, from the first decades of the 20th century. The process of generalizing scientific knowledge transforms it into common sense and even into an ideological component, when the data of reality contradict the belief that knowledge instituted as an ideology6.
This ideological component is found in 70% of PPPs, which consider this possibility as a result of social interactions, emphasizing cultural aspects more than knowledge as an input for the formation of the labor market. The content of the analyzed PPPs hides the ideological message that the school is a relational space capable of contributing to social change and, therefore, to the reduction of social inequalities, but forming the conscious citizen for a democratic context and not, necessarily, for democratizing scientific knowledge:
[...] the construction of a public school that actually educates for the full exercise of citizenship and is a real instrument of social transformation, a space in which to learn to learn, to live together and to be with and for others, in contrast to to the current model that generates inequalities and social exclusion that prevails in neoliberal-inspired educational policies (SEEDF, 2010b, p. 39, our translation).
These institutional documents ignore or ignore the reality of contemporary Brazilian youth, in which 70% of the young population is not inserted in formal work relationships, nor in formal education spaces. This is an inactivity that affects the majority of youth aged between 16 and 24, with a concentration on women, the poor, black women and mothers (MDSCF, 2013). The research named this generation as “nor, nor”, which means “neither studies nor works” or “neither in employment nor in education or training” (NEET). This startling data proves that schooling and work are not values for the contemporary generation of young Brazilians. The belief in education as a driving force for social ascension remained in the older generations.
6 Mannheim (1976) explains that one of the functions of ideology is to justify the gaps between beliefs and reality, not adopting the negative and evaluative connotation of ideology..
In the PPPs analyzed, we found, in the mission category, that the function of schools is to form critical and active citizens for life, for a democratic society and for the job market: “To form participatory citizens, through educational action, practices and ethical principles allied to respect for human dignity [...]” (SEEDF, 2019, p. 60, our translation). Education is conceived in these missions as a catalyst for individual change and, consequently, for social change, by providing individuals with the cognitive and knowledge instruments to actively insert themselves into productive, political and cultural life, acting as actors towards social change. The school is, in this conception, the institution responsible for democratizing these inputs. Mannheim (1972) walks in the wake of this thought by conceiving education as an essential 'social technique' in the constitution of a democratic and planned society.
In Brazil, schooling is still seen as a factor for reducing social inequalities and, therefore, for social change. However, this belief embeds the false notion that “[...] income inequalities are directly linked to differences in qualification” (SOBRAL, 1980, p. 41, our translation). Studies prove that there are structural factors that maintain and reproduce social inequalities and that education alone is not enough to transform Brazilian society into a society with less social inequality and more social justice:
There are several factors that may be determining the difference in income not explained by the difference in schooling, among which we can mention the life expectancy of the inhabitants, ethnic factors, age structure of the population, quality of the existing infrastructure, presence/absence of incentives to the development and historical factors (SALVATO; FERREIRA; DUARTE, 2010, p. 783, our translation).
In fact, the correlation of factors is the inverse of what is inscribed in political- pedagogical projects. On average, the economic conditions of income are conditions for access to schooling, especially the highest: “the level of schooling reached by young people is predicted by indicative factors of the socioeconomic situation, cultural capital and social capital accessible to their families” (SILVA; HASENBALG, 2000, p. 10, our translation).
What can be seen is that the belief expressed in 80% of the PPPs analyzed contrasts with the Brazilian reality, so much so that, in order to reduce the brutal inequality of education, five and a half7 governments implemented public educational policies to reduce
7 The governments were: Fernando Henrique Cardoso (1995-1999 and 1999-2003); Luís Inácio – Lula – da Silva (2003-2007 and 2007-2011; and Dilma Vana Roussef (2011-2014 and 2014-2016). The educational policies were: National Fund for the Development of Elementary Education and the Appreciation of Teaching – FUNDEF (1996-2008); National Minimum Income Program linked to education - Bolsa Escola (2001-2004); National Fund for the Development of Basic Education and Appreciation of Education Professionals - FUNDEB (2009-2020); Bolsa Família Program (2004- *); University for All Program – Prouni (2005-*); Program to Support Restructuring and Expansion Plans of Federal Universities – Reuni (2007-2012). * Post-2016
educational inequalities in Brazil and were successful, but the socio-economic, as well as political-cultural, structures that maintain economic inequality were not touched. Scientific studies, from several different decades, corroborate that the power of education to reduce inequalities is limited: “simulations also indicate that, even in the long term, there are clear limits to the impacts that education can have on income distribution” (MEDEIROS; BARBOSA; CARVALHAES, 2019, p. 45, our translation).
The democratic management model, both of society and of the school, is found in 50% of PPPs. In this, the role of the participation of individuals and groups is emphasized. Participation in school, community and societal decision-making processes is considered an act of freedom, a moment of equality, and a relational space of power. On the other hand, in the institutional documents analyzed, 90% consider participation as a means of conflict resolution. This belief goes hand in hand with the school's mission to grant the formation of critical and active citizens who “start to play a leading role in the development of the city, in the struggle for better conditions for their blocks, their neighborhoods, their streets” (SEEDF, 2010b, p. 08, our translation).
Belief can be considered an ideological component because it disregards the objective injunctions that economy, politics, culture impose on individuals and groups. The distance between belief and objective reality is one of the idiosyncrasies of ideology, allocating the power of social change to the individuals who participate, that is, it falls back to individualism.
From the Industrial Revolution and the French Revolution, the school, in the western world, consolidates itself as a space for the dissemination of scientific knowledge, although promoting its simplification, adapting it to the level of schooling and the age group of the target audience. This current understanding of one of the social functions of the school is linked to the concept of science as a guide for human actions, prevailing in the modern and contemporary western world.
Science and technology are increasingly being valued in different social groups, being conceived as a possibility to explain reality and solve social problems. The belief in the power of modern science and scientific knowledge permeates several contemporary societies, in a crescendo, after the second world war and after the third technological revolution of the seventies of the twentieth century (SHWARTZMAN, 2008).
governments maintained these public education policies because some were embodied as state policies, passed by the federal legislature, transformed into constitutional amendments and federal laws.
This ideological conception was found in 60% of the analyzed political-pedagogical projects. They claim that education aimed at formation of active citizens should provide scientific knowledge so that questions about the world can be better answered and problems solved. Such conception of the social function of scientific knowledge and of the school as disseminating it is explicit in several PPP's: “to demonstrate, through the domain of scientific- technological foundations, the importance of research and the advancement of science, in the sense of responding to the challenges and questioning of the modern world” (SEEDF, 2010a,
p. 08, our transaltion).
Democracy is presented, in the analyzed PPPs, as a fundamental component to achieve a more just and egalitarian society, for the change not only of school management, but also of education, politics, but, mainly, society. Democracy is affirmed as an ideal to be molded in different social institutions:
Ensuring dialogue and exchange relationships with the school community for a liberating and inclusive education with the aim of politically transforming the realities of social inequality, in its transversalities, and guaranteeing democratic processes at school and in society (SEEDF, 2018,
p. 20, our translation).
The utopian component of democracy as a value is found in 80% of the analyzed PPPs, in which the conception that democracy is a primordial factor for the formation of critical and active citizens is found; for the consolidation of a quality public school; and to “[...] develop capacities and skills aimed at responsible and solidary participation in society, through democratic practice, aiming at the full exercise of citizenship” (SEEDF, 2010a, p. 08, our translation).
Democracy, in the Brazilian case, constitutes a direction towards which social movements, policies and school practices aim to reach. Society and the Brazilian State, as well as formal education, cannot be considered effectively democratic, since there are social actors excluded from these processes, without real participation, without citizenship rights. So, in the Brazilian case, democracy is still a project for the future to be shaped in social and school practices.
Finding democracy as a utopian component to be incorporated daily into school practices, to be shaped in social institutions is not surprising, since PPP's are based on scientific theories and legal documents that adopt the model of democratic management at school, democracy as a value for the social, and the interrelation between them: “[...]
democratic management is an important step in learning democracy” (SEEDF, 2018, p. 04, our translation).
For Mannheim (1976), thought is socially determined, according to the social group that produced it. Thought produces individual and subgroup manifestations in a society, but it is not an individual phenomenon at all.
The content analysis and depth hermeneutics carried out in the contents of the political-pedagogical projects of public high schools in the Federal District in the periods from 2010 to 2012 and from 2018 to 2019 allowed to capture the collective thinking of the social segments that constitute subjects of the pedagogical process in this institution. The analysis of the collected PPPs showed that they are based on legal documents and scientific theories in the human and social areas. The legal foundation is anchored in the Federal Constitution of 1988, in the Law of Directives and Bases of National Education (9,394/1996), in the National Curriculum Guidelines for Basic Education, in the National Curriculum Parameters and in the Basic Education Curriculum of the Federal District.
In short, the underlying ideological components in the analyzed PPPs are anchored in the belief that the education offered at school can solve society's problems. They believe that the school's mission, objectives and/or principles are to form the citizen who acts in a critical way and who transforms the current world, in the direction of a democratic society, supported by rational knowledge.
However, what is seen in contemporary times is the opposite, with multiple manifestations of hatred for the so-called social media8; with movements of denial9 of science, democracy, the pandemic caused by the coronavirus, vaccines; and with flat-earther groups10. Institutional documents relegate to secondary importance essential factors for the transformation of social structures, such as the elimination of the immense concentration of wealth that has characterized Brazil since the colonial process; the promotion of a fairer and less unequal distribution of income; promoting access to social benefits such as work, housing, health, urban infrastructure and formal schooling. The PPPs analyzed incur the naive belief that the knowledge provided at school is sufficient to change this social reality.
8 See: Stroppa and Rothenburg (2015), Stein, Nodari and Salvagni (2018) and Sarlet (2019).
9 See: Pivaro and Júnior (2020), Ramalho (2020), Vignoli, Rabello and Almeida (2021).
10 See De Albuquerque and Quinan (2019) and Marineli (2020).
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