CULTURA ESCOLAR E SUA RELAÇÃO COM O SABER MATEMÁTICO: OS SENTIDOS DA DOCÊNCIA REVELADOS NOS CADERNOS DE ANOTAÇÕES DE UMA PROFESSORA PRIMÁRIA


LA CULTURA ESCOLAR Y SU RELACIÓN CON EL CONOCIMIENTO MATEMÁTICO: LOS SIGNIFICADOS DE LA ENSEÑANZA DESVELADOS EN LOS CUADERNOS DE UN MAESTRO DE PRIMARIA


SCHOOL CULTURE AND ITS RELATIONSHIP TO MATHEMATICAL KNOWLEDGE: THE SENSES OF TEACHING REVEALED IN THE NOTEBOOKS OF A PRIMARY TEACHER


Iracema Campos CUSATI1


RESUMO: Nesse artigo são analisados aspectos da memória educativa, cultural e social do sertão nordestino brasileiro, tendo como fonte de pesquisa os cadernos de anotações de professores primários para compreender o ensino de matemática desenvolvido nos anos iniciais do ensino fundamental no período compreendido entre 1950 e 1990. Os cadernos escolares permitem produzir conhecimentos por conter histórias, contextos socioeconômicos, políticos, culturais e educacionais gestados em temporalidades diversas. O objetivo deste estudo é identificar os conteúdos abordados na escola e aspectos relacionados aos saberes elementares de matemática. Como referências teóricas foram adotadas a concepção de cultura escolar defendida por Viñao Frago (2008) e o conceito de relação com o saber de Bernard Charlot (2000; 1996) que traz a noção de relação entendida como conjunto de significados e espaço de atividades do sujeito, inscritos num tempo. Adotando como referencial teórico-metodológico a História Cultural a partir das proposições de Roger Chartier (1990) e considerando as pesquisas no âmbito da história das disciplinas escolares, empreendidas por André Chervel (1990), o texto ainda considera o paradigma indiciário, de Carlo Ginzburg (1989), na busca da representação do passado e do presente da educação matemática na formação de professores.


PALAVRAS-CHAVE: História da educação matemática. Cadernos escolares. Cultura escolar.


RESUMEN: En este artículo se analizan aspectos de la memoria educativa, cultural y social del hinterland nororiental brasileño, teniendo como fuente primaria de investigación los cuadernos de apuntes de maestros de primaria para comprender la enseñanza de las matemáticas desarrollada en los primeros años de la escuela primaria en el período. entre 1950 y 1990. Los cuadernos escolares permiten producir conocimiento porque contienen historias, contextos socioeconómicos, políticos, culturales y educativos generados en diferentes momentos. El objetivo de este estudio es identificar los contenidos cubiertos en la escuela y los aspectos relacionados con los conocimientos elementales de la matemática. Como referentes teóricos se adoptaron el concepto de cultura escolar defendido por Viñao Frago (2008) y el


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1 Universidade de Pernambuco (UPE), Petrolina – PE – Brasil. Professora Permanente dos Programas de Pós- Graduação em Formação de Professores e Práticas Interdisciplinares (PPGFPPI) e Educação Matemática e Tecnológica (EDUMATEC). Doutorado em Educação (USP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4812-8412. E-mail: iracema.cusati@upe.br


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concepto de relación con el conocimiento de Bernard Charlot (2000; 1996) que trae la noción de relación entendida como un conjunto de significados y espacio de actividades del sujeto, inscrito en un tiempo. Adoptando la Historia Cultural como marco teórico-metodológico a partir de las proposiciones de Roger Chartier (1990) y considerando la investigación en el contexto de la historia de las asignaturas escolares, realizada por André Chervel (1990), el texto sigue considerando el paradigma de acusación de Carlo Ginzburg (1989), en la búsqueda de la representación del pasado y presente de la educación matemática en la formación del profesorado.


PALABRAS CLAVE: Historia de la educación matemática. Cuadernos escolares. Cultura escolar.


ABSTRACT: In this article, aspects of the educational, cultural and social memory of the Brazilian Northeastern hinterland are analyzed, using the notebooks of primary teachers as a research source to understand the teaching of mathematics developed in the early years of elementary school in the period between 1950 and 1990. School notebooks make it possible to produce knowledge because it contains stories, socioeconomic, political, cultural and educational contexts created in different time periods. The aim of this study is to identify the content covered in the school and aspects related to elementary knowledge of mathematics. School notebooks allow us to produce knowledge because they contain historical, socioeconomic, political, cultural and educational contexts which were gestated in different time periods. The goal is to identify the contents covered and aspects related to elementary knowledge of mathematics. As theoretical references were adopted the understanding of Viñao Frago (2008) about school culture and the concept of Bernard Charlot (2000; 1996) about relationship with knowledge that brings the notion of relationship understood as a set of meanings and space for the subject's activities, inscribed at a certain time. Adopting Cultural History as a theoretical-methodological framework based on the propositions of Roger Chartier (1990) and considering research in the context of the history of school subjects, undertaken by André Chervel (1990), the text still considers Carlo Ginzburg's evidential paradigm (1989), in the search for representing the past and the present of mathematical education in teacher education.


KEYWORDS: History of mathematical education. School notebooks. School culture.


Introdução


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Os cadernos escolares, guardiões de memórias, permitem desenvolver pesquisa e produzir conhecimentos pois neles estão registradas variadas formas de saber e fazer, histórias, contextos socioeconômicos, políticos, culturais e educacionais gestados em temporalidades diversas. Os cadernos em questão também permitem construir interpretações acerca da educação matemática disseminada em diferentes momentos históricos e apreender um conjunto de situações, fatos e experiências singulares do cotidiano escolar vivenciado pelos professores atuantes no período investigado, entre 1950 e 1990.


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O presente estudo suscita discussões teórico-metodológicas na área da história da educação e, mais especificamente, da história da educação matemática que, fundantes nas publicações de Valente (2014; 2008; 2006), colocam em evidência a multiplicidade de temas e possibilidades de pesquisa e de produção de conhecimento, ao considerar os contextos sócio- históricos nos quais os referidos cadernos se inserem.

O pressuposto de que os arquivos escolares são mediadores de múltiplos sentidos na História propicia caminhos de investigação e de formação dos estudantes para lidarem com a memória e a história da educação. Os cadernos escolares permitem conhecer a escola por dentro em suas especificidades, seus saberes, sua forma de organização e suas práticas curriculares.

A cultura escolar entendida como o conjunto de teorias, normas, ideias, princípios, regras, rituais, rotinas, hábitos, práticas, formas de fazer e de pensar propicia aproximação das tradições, regularidades e regras que são partilhadas nas instituições de ensino pelos envolvidos no processo educativo. Por meio dos arquivos escolares é possível conhecer o interior da escola, suas especificidades, seus saberes, sua organização e suas práticas curriculares. Em contato com os estudantes que participam de projetos de iniciação científica há a possibilidade de questionar e criar novos saberes a partir do diálogo com as fontes, rompendo com uma visão linear da história, relativizando suas verdades e problematizando conceitos muitas vezes consolidados e veiculados em materiais didáticos.

O principal objetivo dessa pesquisa foi utilizar os cadernos escolares como fontes para a compreensão de como ocorreu o ensino de matemática em escolas primárias no sertão e, mais especificamente, analisar sinais do que era ensinado à época, identificando os conteúdos abordados e os aspectos relacionados aos saberes elementares da matemática. Como referência teórica, é utilizada a compreensão de Viñao Frago (2008) sobre cultura escolar, de Bernard Charlot (2000) sobre o saber e de Carlo Ginzburg (1989) sobre o paradigma indiciário na busca de uma representação do passado e do presente do cotidiano escolar. Ao analisar os cadernos buscou-se também compreender as concepções de ensino e as estratégias adotadas em relação à matemática escolar e às orientações veiculadas por obras e autores influenciados pelo ideário do Movimento da Matemática Moderna.

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Mogarro (2005, p. 104), contribui com nossa reflexão ao retratar que por meio dos arquivos e das informações cunhadas nos documentos escolares é possível compreender “os vários discursos produzidos pelos atores educativos – professores, alunos, funcionários e autoridades locais e nacionais, pois têm representações diversas sobre a escola”. A autora nos revela que os arquivos registram a informação sobre a escola como um conjunto homogêneo


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que “ocupa um lugar central e de referência no universo das fontes de informação que podem ser utilizadas” (p. 104).

Segundo Mogarro (2005) a cultura escolar é constituída por um conjunto de teorias, saberes, ideias e princípios, normas, regras, rituais, rotinas, hábitos e práticas; que nos remetem às formas de fazer e de pensar, aos comportamentos sedimentados ao longo do tempo e que se apresentam como tradições, regularidades e regras, muitas vezes mais subentendidas do que expressas no compartilhamento feito pelos atores educativos no seio das instituições. Essa cultura constitui um substrato formado, ao longo do tempo, por camadas entrelaçadas que demandam análise num processo historiográfico de investigação sobre a cultura escolar e as influências recebidas.

Portanto, olhar para o sertão como um universo cultural no semiárido nordestino, num intenso diálogo com as fontes, com a historiografia renovada e com os estudos culturais, oportunizou interrogar os elementos constituintes e as percepções dos atores sociais conectados numa base territorial com vínculos de afinidades, práticas sociais e econômicas, interações internas e articulações exteriores preservadas num cenário da totalidade histórica.

Desse modo, a história e a educação estarão sempre em construção em função de sua relevância para a formação de cidadãos, dos questionamentos que contribuirão para desenvolver uma consciência crítica que, inevitavelmente, conduzirá modos de ser e de agir que impulsionam a transformação social e a perspectiva de uma nova história da educação matemática.


Revisão bibliográfica


Antes de tratar dos dados encontrados na pesquisa em cadernos escolares, vale destacar alguns pesquisadores que há muito discutem sobre pesquisas com cadernos escolares. Eles apresentam o conceito de caderno de formas distintas e conforme Viñao Frago (2008) utiliza, o conceito estrito de caderno é adotado como um suporte comum aos alunos da escola. Contudo, sua utilização tornou-se generalizada apenas no século XIX.

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Chartier (2007, p. 23) acrescenta que “essa fonte é, ao mesmo tempo, fascinante e enigmática, difícil de tratar e de interpretar, justamente por sua aparente banalidade”. De fato, apesar de compor o cotidiano escolar os cadernos escolares são, em sua grande maioria, descartados ao final do ano letivo ou, antes, quando as folhas que são atribuídas a escrita se esgotam. Também, as pessoas os utilizam como se fossem ahistóricos e, talvez por isso, os pesquisadores tenham demorado para percebê-los como fonte de investigação.


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Quanto ao campo denominado de História da Educação Matemática, Valente (2014) identificou as dificuldades de elaboração de conceitos e modelos teóricos que parametrizassem problemáticas próprias de pesquisa do campo assegurando que


A maioridade da história da educação matemática, ao que tudo indica, terá como caminho a trilhar aquele de transformar-se da condição de especialidade, seja da História da Matemática, da Educação Matemática, ou mesmo da História/História da Educação, para a plenitude de um campo científico, erigindo-se como uma disciplina. E para isso será necessário a ultrapassagem de objetos de pesquisa – que hoje, em boa medida, vêm sendo tomados do real empírico, de sua aparência fenomenológica (níveis de escolaridade do ensino de matemática, conteúdos de ensino matemático, formação de professores de matemática, metodologias etc. são exemplos disso) (...) para a construção teórica de objetos de conhecimento (VALENTE, 2014, p. 330).


Por meio desse estudo, evidencia-se que os cadernos escolares proporcionam uma gama de possibilidades de pesquisa no campo da História da Educação, da Alfabetização e da Educação Matemática em relação a uma diversidade de abordagens e pontos de vista. Todavia, dependendo do tema a ser tratado, os cadernos escolares apresentam limites, ao serem utilizados como única fonte de pesquisa, pois eles não permitem observar o que acontece no cotidiano das salas de aula.

No caderno escolar, em geral, é destacado o registro dos conteúdos selecionados pelo professor. Contudo, não consta no caderno, por exemplo, apontamentos de como foi desenvolvida determinada atividade ou o tempo que ela levou para ser concluída, nem quais foram os membros participantes e o que foi discutido durante o processo de sua construção. Nesse sentido, a afirmação de Viñao Frago (2008, p. 25) é plausível para uma reflexão sobre currículo:


[...] Nem tudo está nos cadernos. Eles silenciam, não dizem nada sobre as intervenções orais ou gestuais do professor e dos alunos, sobre seu peso e o modo como ocorrem e se manifestam, sobre o ambiente ou clima da sala de aula, sobre as atividades que não deixam pistas escritas ou de outro tipo, como os exercícios de leitura (a leitura em voz alta, por exemplo) e todo o mundo oral.


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Com certeza, há de se descartar a possibilidade de reconstrução de um currículo real a partir dos estudos nos cadernos escolares. Porém, como em toda operação histórica, a intenção nesta investigação é aproximar do passado e reconstruí-lo de modo parcial e com um enfoque determinado pois, ainda apoiando em Viñao Frago (2008), os cadernos não são utilizados da mesma forma em lugares diferentes, pois é o olhar do pesquisador que permitirá emergir os dados.

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Outra reflexão necessária alimentada pelo pesquisador é que os cadernos “não são apenas um produto da atividade realizada [...] e da cultura escolar, mas também uma fonte que fornece informação – por meio, sobretudo, de redações e composições escritas – da realidade material da escola e do que nela se faz” (VIÑAO FRAGO, 2008, p. 16).

Nesse sentido, o uso dos cadernos escolares nas pesquisas acadêmicas vem ganhando espaço seja como fonte de pesquisa ou como objeto de estudo para o entendimento de temas relacionados à educação pois, da materialidade e dos registros, neles contidos e que podem ser problematizados; são constituídos o núcleo da investigação.

Os cadernos escolares possibilitam compreender as culturas escolares, a transmissão de valores e modos de pensar, a história do currículo, a cultura escrita, as reformas e as inovações educativas (VIÑAO FRAGO, 2008).

Neste artigo, com enfoque de análise nos valores que permearam as práticas escolares, a cultura material é considerada “parte integrante da cultura escolar e coloca os espaços educativos, os edifícios escolares, o mobiliário e os materiais de ensino na agenda de investigação, como objeto de estudo fundamental para a compreensão dos processos educativos e das práticas de ensino” (MOGARRO, 2010, p. 92).

Desse modo, os cadernos escolares são considerados portadores de sentidos ligados ao “sistema de valores e representações sociais que ultrapassam a função de objeto destinado, somente, ao registro do processo de aprendizagem” (CORDOVA, 2016, p. 209). Nesse tocante, podem ser analisados por diferentes perspectivas e podem ser portadores de vários sentidos: “como escritas ordinárias, testemunhos de uma construção de si; relíquias conectadas com uma sensibilidade nostálgica[...]” (CUNHA; SOUZA, 2015, p. 13). Podem, ainda, depor “sobre uma pluralidade de significações: orientação do ato educativo, em que se captam objetivos políticos e sociais, além de teorias pedagógicas, [...] estética da ilustração dos modelos de escrita e, finalmente, as interfaces econômicas [...]” (FERNANDES, 2008, p. 50-51).

Ao concordar com a afirmação de Meneses (1998, p. 95) “toda operação com documentos, portanto, é de natureza retórica”, a intenção é ampliar a reflexão no que se refere à retórica do dito e do não dito pois, ainda segundo a autora, os cadernos trazem marcas de registro que sinalizam posições em um quadro social, mas omitem situações tais como: os acordos feitos por meio da oralidade, as formas de apropriação dos alunos e professores e o tempo dedicado às atividades documentadas.

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Por último, vale destacar que os cadernos escolares não são neutros, mas sim, resultados da cultura escolar de um determinado lugar, de um determinado tempo histórico, pois são fontes tão complexas quanto outras e que, por isso, se tornam objetos de pesquisa interessantes por

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serem suportes utilizados pelas crianças, a partir de um processo diário que permite registro de interações que se estabelecem durante as atividades desenvolvidas nas aulas. Neles constam imagens e representações sociais sobre a infância, a escola, a família, entre outros temas similares que explicitam aculturação escrita.

A perspectiva da história cultural, tal como a entende Chartier (1990), tendo como objeto a ciência e a história, “tem por principal objeto identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade cultural é construída, pensada, dada a ler”. (CHARTIER, 1990, p. 17).

Intimamente imbricadas nesse processo, encontram-se as relações identitárias da formação e da profissionalidade docente, que implicam em determinadas formas de se engajar nos processos de ensino e de aprendizagem. Charlot (2000, p. 72) essencialmente nos adverte que “[...] qualquer relação com o saber comporta também uma dimensão de identidade: aprender faz sentido por referência à história do sujeito, às suas expectativas, à sua concepção de vida, às suas relações com os outros [...]”.

Charlot (2000; 1996) auxilia a aprofundar a reflexão sobre a relação com o saber ao abordar que, embora sendo de um sujeito, essa relação é também social. A relação com o saber e com o aprender de um grupo de sujeitos explica o contexto da maneira de lidar com a vida, que é marcada pela busca de construir possibilidades de agir, de ações possíveis no espaço do cotidiano.

Outro importante ponto que Charlot (2000, p. 68) alerta é para o fato de que “o saber só pode assumir a forma de objeto através da linguagem; melhor ainda, da linguagem escrita [...]”. Diante da panorâmica dos teóricos citados nesta seção, que consideram os cadernos escolares como fonte e objeto de pesquisa, e, entendendo que estes constituem relevante fonte documental para a análise das culturas e práticas escolares no estudo de instituições escolares,

é apresentado a seguir o levantamento de dados que foi realizado na presente pesquisa.


Metodologia


O contexto que abarca este trabalho, um convite para aproximar dos materiais que há anos fazem parte da vida escolar, para retirá-los de sua rotina diária e colocá-los numa posição de destaque, é permeado pela pretensão de resgatar o sentido das práticas escolares a partir de sua cotidianidade.

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Ao propor uma perspectiva diferenciada, considerando as marcas (indícios) da singularidade cultural presente nos cadernos escolares, sejam por anotações, desenhos ou


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figuras recortadas e neles coladas, fornecem indícios de usos e convidam a um processo de interpretação que transforma o objeto usual num bem de valor pessoal e singular que narra a história.

Também é levado em consideração que os materiais só adquirem uma existência porque estão diretamente ligados à produção de determinado conhecimento escolar e por isso são percebidos no campo de representações e imagens dos alunos.

Para esse estudo, de natureza qualitativa e ontológica, foram selecionados 8 (oito) dos 27 (vinte e sete) cadernos escolares do acervo da Professora Maria Franca Pires. A professora, popularmente conhecida como Franca Pires, nasceu em 5 de novembro de 1921, na cidade de Remanso no Sertão da Bahia, diplomou-se professora em 1939 na Escola Rural Nossa Senhora Maria Auxiliadora em Petrolina-PE. Em 1943 foi aprovada no concurso para o Magistério Primário da rede estadual de ensino da Bahia e nomeada em Salvador em 1947. Em 1950 regressou a sua terra natal e em 1951 solicitou transferência para Juazeiro onde atuou e permaneceu até seu falecimento em 1988.

Os cadernos da professora têm registradas anotações que retratam suas inúmeras experiências, como memórias da infância, a morte prematura da mãe, a trajetória no colégio de freiras Maria Auxiliadora, o curso de magistério em Salvador, pautas de reuniões, planos de aula, entrevistas com integrantes e lideranças de grupos culturais, planejamentos semestrais e anuais das disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática e Ciências. Essas anotações desvelam indícios sobre como Franca Pires aproxima de diferentes contextos (político-social-cultural) da cidade de Juazeiro (BA) e de regiões circunvizinhas, que possibilitaram a produção de novos saberes e fazeres pautados em suas vivências.

Em relação aos cadernos escolares, fontes dessa investigação, foram selecionados aqueles que apresentavam registros e representações de conteúdos matemáticos por considerar que as análises dos cadernos revelam vestígios sobre o que os professores privilegiavam ao ensinar, o método, as atividades, as estratégias atreladas ao contexto social e econômico no qual foram produzidos.

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A pergunta que se coloca é: quais vestígios da influência do Movimento da Matemática Moderna (MMM) na práxis da Professora Maria Franca Pires e quais registros traduzem traços da constituição da educação matemática enquanto campo de pesquisa? A partir das análises minuciosas nos 8 cadernos considerados para esse estudo, serão explicitados os indícios de representações matemáticas que apontam para uma aproximação ao ideário do MMM na busca de compreensão da influência desse movimento na formação e profissionalização da professora Franca Pires.

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A prática da historiografia pode ser comparada a atividades que necessitam da análise de indícios para tecer explicações. O italiano Carlo Ginzburg sistematizou esse tipo de saber e cunhou a expressão “paradigma indiciário” tanto para a história quanto para as outras áreas do conhecimento que partilham da prática de “rastreamento de sinais, indícios, signos” que remetem a algum evento, mas sem captá-lo em sua integridade.

A História da Educação Matemática nesse estudo caracteriza como elemento orientador na busca de referências para compreender os registros de situações práticas do cotidiano da professora e as particularidades que foram destacadas são apenas pequenos indícios das muitas análises desta natureza.


Resultados e discussão


A preocupação com métodos de ensino que possibilitassem dirimir as dificuldades no ensino e na aprendizagem em escolas primárias, embora tema recorrente na literatura, encontra no acervo em estudo indícios de recepção, circulação e apropriação de concepções pedagógicas de seu tempo.

Para Valente (2006), há a necessidade de que sejam construídos referenciais da Educação Matemática levados a cabo em grande parte da segunda metade do século XX no Brasil e, para tanto, é imprescindível intensificar as pesquisas, objetivando atingir a maior proximidade possível do que efetivamente representou o Movimento da Matemática Moderna (MMM) na sua época e as influências que, porventura, ainda exerçam nas ações pedagógicas dos professores de Matemática.

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O MMM ocorreu num momento histórico em que o mundo passava por grandes mudanças culturais, políticas, sociais e econômicas. No Brasil, esse momento histórico caracterizava-se por um período de transição da base econômica e política em que, sob um regime de ditadura, todos os discursos eram voltados para a ideia de modernização e de desenvolvimentismo, apesar do país apresentar problemas sociais graves. Os acontecimentos que ocorriam no campo da economia e da política mantinham estreitas ligações com o campo científico-tecnológico e fundamentavam as ideias de mudanças apresentadas pelo Movimento da Matemática Moderna que legitimava o conceito de “moderna” por considerar que a “nova matemática” superaria os limites estabelecidos pela antiga matemática. Logo, a construção desses referenciais se torna fundamental para que seja mais elaborada a ideia da abrangência dos fatos produzidos por esse movimento e as implicações desses fatos nas práticas escolares.



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Para Silva e Valente (2008), os cadernos escolares podem traduzir muito sobre o processo de ensino e de aprendizagem que ocorreu em outras épocas.

Na busca por vestígios para a escrita dessa trajetória histórica, os cadernos de anotações da professora Franca Pires, constitutivos da cultura escolar, ampliam a possibilidade de compreender tanto a história da educação matemática na região do submédio São Francisco quanto o que se passava no interior das instituições escolares. Também se busca a compreensão acerca das apropriações das propostas para o magistério primário no momento de vigência do Movimento da Matemática Moderna.

Tentando entender o currículo e as práticas dos professores, atuantes na segunda metade do século XX, em relação às aproximações, distanciamentos e entrecruzamentos com a cultura escolar vigente, foram identificados vestígios de regras e práticas da matemática que se formalizou na escola primária nos cadernos do acervo investigado.

A década de 1960 foi marcada por grandes mudanças no ensino de matemática em todo o Brasil, devido ao Movimento da Matemática Moderna (MMM). Surgido na Europa e nos Estados Unidos, o ideário do MMM chegou ao Brasil no início da década de 1960 caracterizado por ter sido um movimento de reformulação do currículo da matemática para o ensino básico cuja principal particularidade, manifestada pelos representantes do movimento, era a discussão nos grupos da nova proposta de democratização do ensino da matemática tornando-a mais prática e mais contextualizada bem como estabelecendo formas de implementação nas escolas. Vários grupos de professores se formaram nesse período em diversas regiões do Brasil com o objetivo de conhecer, estudar e compreender para colocar em prática a matemática moderna.

Nesses novos ares que pairavam sobre a cidade de Juazeiro, Franca Pires criou e presidiu a Associação de Pais e Mestres que viria a desenvolver ações por 20 anos, período em que a professora teve a oportunidade real de pôr em prática seu aprendizado e tornar viável essa identificação, como é possível verificar nas fontes de pesquisa utilizadas nessa investigação e nos vestígios no tempo presente relativos à história da matemática escolar.

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Fruto de um aprendizado da época da Escola Normal, a professora primava pela ideia de que o relacionamento escola-família era indispensável ao bom andamento dos trabalhos escolares e à formação de cidadãos era premente na escola. Também vislumbrava uma Educação Matemática cidadã, “na qual o conhecimento apreendido, certamente, deverá contribuir para que os estudantes possam adquirir competências e habilidades capazes de imputar-lhes ações que convirjam para a melhoria da qualidade de vida de cada um, individual e coletivamente” (MENDES, 2009, p. 16).


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O ideal da matemática, seu ensino e saber, estão registrados nos cadernos de números 3, 4. 7, 8, 9, 10, 20 e 22 que compõem o acervo da professora Franca Pires. Nestes cadernos se entrelaçam os conteúdos curriculares e as propostas de ensino documentadas pela professora em planejamentos semestrais e anuais e também nos planos de aulas, quais sejam: teoria dos conjuntos, conjunto dos naturais e dos racionais e suas operações, sistema métrico decimal, perímetro, área, volume, sólidos geométricos, planificações, classificação de figuras planas, noções de estatística, resolução de problemas e avaliação em matemática.

Notadamente, era uma professora preocupada em habilitar os alunos no rigor do raciocínio lógico e na linguagem clara e precisa, além de ressaltar a ênfase em terminologia e conceituação que eram prerrogativas da teoria dos conjuntos e das medidas em geometria. Esses aspectos eram enfatizados em anotações de fim de página, de orelha e em pequenos registros em destaque ao longo das anotações nos variados cadernos. O estudo desses cadernos poderá revelar importantes elementos constituintes de uma trajetória histórica da disciplina escolar (CHERVEL, 1990), nesse caso da matemática ensinada na escola.

Iniciando pelo caderno de número 3, vale destacar que é um caderno pequeno medindo 21,1 cm x 14,8 cm, aramado, contendo 364 páginas, capa colorida com a imagem de um sapato com cachorrinhos dentro e flores ao lado; há, ainda na capa, uma figura colada retratando um ambiente urbano. Na parte central está manuscrito número 3. As contracapas contêm anotações diversas de endereços, frases e contas matemáticas. Diversas entrevistas gravadas com representantes de variados setores da comunidade estão transcritas neste caderno abordando os seguintes temas: carnaval de 1914 (lista com nomes de pessoas que saíram nos carros de “Embaixadores de Veneza”); sobre concurso de Rainha do Carnaval e relação com o Bazar Royal; participação de entrevistado no grupo Novos Baianos; história de assombração; barragem São Geraldo; divisão de Águas do Rio São Francisco; enchentes; localização do ponto mais alto de Juazeiro; informações sobre extinção do corpo musical da Apolo, cinema Ideal; serviço de água encanada, origem de Juazeiro, desenvolvimento econômico, imprensa, religiões, política, educação, cultura e instalações da Santa Casa.

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O caderno de número 4 é pequeno, mede 20,5 cm x 14,7 cm, aramado, contém 138 folhas, capa colorida nas cores branco, rosa e amarelo, destinado a anotações de promoção de Cursos e de organização da produção e da venda de artesanato. No centro da capa está colado um pedaço de papel onde encontra-se manuscrito “1980” e por cima o número 4; no local da capa destinado à identificação do caderno está manuscrito “Maria Franca Pires – 1980”. Os registros nesse caderno contêm anotações da reunião com professoras, datada de 14/01/1980, sobre respostas ao questionário da FUNDESCOLA e assuntos da pré-escola. Há anotações de

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planejamento de cursos de artesanato nos projetos de Juazeiro nas localidades Maniçoba, Mandacaru, Curaçá, Tourão; lista com nomes de instrutoras por curso, datada de 28/01/1980; anotações de produção dos cursos por semana nos municípios e contas matemáticas. Há também listas de produção dos cursos de crochê, bordado à mão, corte e costura, bonecas e animais de pano, tapeçaria. Finaliza com anotações sobre Feira e Posto de artesanato.

O caderno de número 7, pequeno, com dimensões 22 cm x 16 cm, contém 47 folhas, capa de papel flexível na cor laranja. A capa traz a palavra COMPANHEIRO, impressa na cor azul e a imagem de um menino sorridente agachado brincando com um carrinho de polícia na terra. Além disso, ainda na capa, está manuscrito “Catecismo” e “Maria Pires”. O fundo do caderno traz um desenho e um texto educativos sobre a energia elétrica.

O caderno de número 8, tem registrados planejamentos de aulas, eventos e reuniões. Sua descrição é de um caderno pequeno com medidas 21,7 cm x 15,5 cm, aramado, que contém 77 folhas, capa quadriculada e colorida em azul, cinza e branco. No centro da capa está manuscrito, como um título, “Lendas e outros”; ainda na capa, no espaço destinado à identificação, está manuscrito “Planejamentos diversos – Maria Franca Pires – 1971”. Nas contracapas, encontram-se manuscritos citações de pensamentos, lembretes e anotação de um endereço. Os planejamentos de ensino são de religião, gincana de aniversário de Juazeiro, matemática, informações sobre catataus, entrevistas sobre candomblé, toré, bailes, ternos, reis de boi, congos.

O caderno de número 9 é pequeno, mede 22 cm x 16 cm, aramado, contém 92 folhas, capa colorida em branco, azul e rosa. Na capa, no local destinado à identificação do caderno está manuscrito “Maria Franca Pires – ‘Pesquisas’ – Cons. Luiz Viana, 101 – Juazeiro-Bahia”. Na contracapa encontram-se anotadas sete frases e uma relação de retratos e nomes de três pessoas (Lilina, Chico Cabana e Blandina).

O caderno de número 10 é pequeno com dimensões 21 cm x 14,5 cm, brochura, contém 75 folhas, capa colorida na cor verde, contendo uma imagem ao centro com duas crianças loiras brincando na areia de uma praia. No topo da capa está gravada a palavra “companheiro” na cor vermelha e no local destinado à identificação do caderno está manuscrito “Clube de mães: Piranga e Maria Goretti” e logo abaixo, em letras menores, “Ao uso de: Mª F. Pires”. Neste, constam anotações de organização de Clube de Mães: listas de nomes, reuniões, prestação de contas, cursos oferecidos, estatuto do Clube de Mães etc. Também há anotações de cursos para o ano de 1979 (porém, não há nenhum curso relacionado).

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O caderno de número 20 é pequeno, com medidas de 22 cm x 15 cm, aramado, contém 69 folhas, capa lisa na cor bege. No local da capa destinado à identificação do caderno está

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manuscrito “Planejamento – Maria Franca Pires – 1972”. Os planejamentos registrados são de excursão, aulas e reuniões; informações sobre Folclore, no Brasil e em Juazeiro; de Semana da Proclamação da República e da Bandeira; a Semana da Criança; questionário sobre alguém (parece ser feito por crianças a Maria Franca Pires); rascunho de carta ao Capitão Esmeraldo, chefe da Companhia de Navegação do São Francisco, datada de 17 de julho de 1972; datas de nascimento de José Ronaldo Dewilson Oliveira, José Robério Dewilson Oliveira, Maria Tereza Dewilson Oliveira, Maria Olívia Dewilson Oliveira; além de histórias e poemas. Há o Planejamento de aula do dia 31/08/72: provas, ensaio, exercício de Matemática e assunto de propriedades da adição. Há anotações datadas do dia 12/09/72: planejamento de aula sobre poesias, lembretes, letras do Hino da Proclamação da República e do Hino à Bandeira.

O último caderno a analisar, o de número 22, também um caderno pequeno com dimensões 23 cm x 16 cm, aramado, contém 85 folhas, apresenta capa quadriculada e colorida em marrom e branco. No local da capa destinado à identificação do caderno está manuscrito “Maria Franca Pires – Apontamentos de Cursos – 1971”. Nestas anotações constam etapas de desenvolvimento dos cursos composta pelos registros: Criatividade, Dinâmica de Grupo, Reforma de Ensino, Memorização, Relações Humanas, O Poder da Mente, Folclore; frases, pensamentos e citações; questionário sobre Rui Barbosa; planejamento para competição “Meu Bairro é o maior”; poemas, histórias e letras de músicas.

Portanto, vale ressaltar que nesses arquivos, além de documentos pessoais, também foram encontrados documentos de caráter pedagógico e institucional de fundamental importância para a historiografia do espaço escolar. Tais documentos, planejamentos e planos de aulas, atas de reuniões, fotos, cadernos de classe de ex-alunos e os cadernos de anotações da professora Franca Pires, revelam uma realidade pouco apreendida nos documentos oficiais.

De acordo com Vidal e Faria Filho (2005, p. 24), é preciso reconhecer que não há prática escolar desvinculada das condições materiais de sua efetivação. Nesse sentido, o acervo preservado de Franca Pires porta indícios das múltiplas maneiras como a professora constituiu a sua profissionalidade e suscita a investigação sobre as diferentes formas de apropriação de conhecimentos e saberes, “oferecendo ao pesquisador índices sobre as relações pretéritas dos sujeitos com a materialidade escolar ou sobre a formalidade das práticas escolares, e fazendo- o recordar que as situações pedagógicas se constroem muito frequentemente por formas orais de socialização.”

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Essas considerações permitem concluir que os cadernos de Maria Franca Pires vinculam políticas educacionais regionais e nacionais, discurso escolar e científico sobre a aprendizagem


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da Matemática e como os saberes se articulam na trama dos cadernos, revelando uma cultura escolar.


Considerações finais


As atividades escolares trazem indícios dos saberes, dos valores morais e das condutas estimuladas no cotidiano escolar e que, portanto, fizeram parte das culturas escolares das instituições escolares nas quais foram desenvolvidas. As práticas escolares, vale ressaltar, são permeadas pelos programas, pelos decretos, pelas ideias pedagógicas em circulação e também pelas organizações do corpo docente, pelas oportunidades de formação destes, pelos espaços físicos e materiais. Por fim, é no ambiente escolar que são oportunizados espaços de usos criativos e inventivos, permeados pelas culturas escolares.

Nesse trabalho foi percebida a complexidade que investigações desse tipo acarretam. A análise empreendida não é e nem intenciona ser conclusiva nem definitiva, mas sugere a possibilidade de que em outros trabalhos de pesquisa possa ser ampliado, completado ou mesmo confrontado com o que foi feito até aqui. Enfim, esse trabalho tentou ilustrar uma investigação no campo da cultura material escolar evidenciando elementos das práticas escolares que configuram facetas predominantes de processos e fatos de cunho histórico-cultural dos afazeres do cotidiano escolar.

A partir dos cadernos analisados é possível verificar vestígios que apontam para o conhecimento e engajamento da professora Franca Pires com as discussões referentes ao ensino de matemática que refletem nas opções que foram feitas por ela em relação a sua vinculação e fixação no sertão. Seu trabalho avançou no sentido de aprofundar estudos e promover ações que contribuíram desde a seleção de pesquisadores com vasta produção na área para as formações em docência até as discussões com os pares em relação a educação matemática.

A educação, linha que teceu e conduziu a vida da professora em foco, costura e atravessa

- plural, inclusiva, criativa, desbravadora e inovadora - os registros de Maria Franca Pires com a coerência que marcou sua existência e ethos profissional que constituiu a professora.


REFERÊNCIAS


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Como referenciar este artigo


CUSATI, I. C. Cultura escolar e sua relação com o saber matemático: os sentidos da docência revelados nos cadernos de anotações de uma professora primária. Revista on line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 25, n. 2, p. 1119-1134, maio/ago. 2021. e-ISSN:1519-

9029. DOI: https://doi.org/10.22633/rpge.v25i2.15157


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Submetido em: 27/05/2021 Aprovado em: 15/06/2021 Publicado em: 01/08/2021



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SCHOOL CULTURE AND ITS RELATIONSHIP TO MATHEMATICAL KNOWLEDGE: THE SENSES OF TEACHING REVEALED IN THE NOTEBOOKS OF A PRIMARY TEACHER


CULTURA ESCOLAR E SUA RELAÇÃO COM O SABER MATEMÁTICO: OS SENTIDOS DA DOCÊNCIA REVELADOS NOS CADERNOS DE ANOTAÇÕES DE UMA PROFESSORA PRIMÁRIA


LA CULTURA ESCOLAR Y SU RELACIÓN CON EL CONOCIMIENTO MATEMÁTICO: LOS SIGNIFICADOS DE LA ENSEÑANZA DESVELADOS EN LOS CUADERNOS DE UN MAESTRO DE PRIMARIA


Iracema Campos CUSATI1


ABSTRACT: In this article, aspects of the educational, cultural and social memory of the Brazilian Northeastern hinterland are analyzed, using the notebooks of primary teachers as a research source to understand the teaching of mathematics developed in the early years of elementary school in the period between 1950 and 1990. School notebooks make it possible to produce knowledge because it contains stories, socioeconomic, political, cultural and educational contexts created in different time periods. The aim of this study is to identify the content covered in the school and aspects related to elementary knowledge of mathematics. School notebooks allow us to produce knowledge because they contain historical, socioeconomic, political, cultural and educational contexts which were gestated in different time periods. The goal is to identify the contents covered and aspects related to elementary knowledge of mathematics. As theoretical references were adopted the understanding of Viñao Frago (2008) about school culture and the concept of Bernard Charlot (2000; 1996) about relationship with knowledge that brings the notion of relationship understood as a set of meanings and space for the subject's activities, inscribed at a certain time. Adopting Cultural History as a theoretical-methodological framework based on the propositions of Roger Chartier (1990) and considering research in the context of the history of school subjects, undertaken by André Chervel (1990), the text still considers Carlo Ginzburg's evidential paradigm (1989), in the search for representing the past and the present of mathematical education in teacher education.


KEYWORDS: History of mathematical education. School notebooks. School culture.


RESUMO: Nesse artigo são analisados aspectos da memória educativa, cultural e social do sertão nordestino brasileiro, tendo como fonte de pesquisa os cadernos de anotações de professores primários para compreender o ensino de matemática desenvolvido nos anos iniciais do ensino fundamental no período compreendido entre 1950 e 1990. Os cadernos escolares permitem produzir conhecimentos por conter histórias, contextos socioeconômicos,


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1 University of Pernambuco (UPE), Petrolina – PE – Brazil. Permanent Professor of the Postgraduate Programs in Teacher Formation and Interdisciplinary Practices (PPGFPPI) and Mathematics and Technology Education (EDUMATEC). Doctorate in Education (USP). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-4812-8412. E-mail: iracema.cusati@upe.br


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políticos, culturais e educacionais gestados em temporalidades diversas. O objetivo deste estudo é identificar os conteúdos abordados na escola e aspectos relacionados aos saberes elementares de matemática. Como referências teóricas foram adotadas a concepção de cultura escolar defendida por Viñao Frago (2008) e o conceito de relação com o saber de Bernard Charlot (2000; 1996) que traz a noção de relação entendida como conjunto de significados e espaço de atividades do sujeito, inscritos num tempo. Adotando como referencial teórico- metodológico a História Cultural a partir das proposições de Roger Chartier (1990) e considerando as pesquisas no âmbito da história das disciplinas escolares, empreendidas por André Chervel (1990), o texto ainda considera o paradigma indiciário, de Carlo Ginzburg (1989), na busca da representação do passado e do presente da educação matemática na formação de professores.


PALAVRAS-CHAVE: História da educação matemática. Cadernos escolares. Cultura escolar.


RESUMEN: En este artículo se analizan aspectos de la memoria educativa, cultural y social del hinterland nororiental brasileño, teniendo como fuente primaria de investigación los cuadernos de apuntes de maestros de primaria para comprender la enseñanza de las matemáticas desarrollada en los primeros años de la escuela primaria en el período. entre 1950 y 1990. Los cuadernos escolares permiten producir conocimiento porque contienen historias, contextos socioeconómicos, políticos, culturales y educativos generados en diferentes momentos. El objetivo de este estudio es identificar los contenidos cubiertos en la escuela y los aspectos relacionados con los conocimientos elementales de la matemática. Como referentes teóricos se adoptaron el concepto de cultura escolar defendido por Viñao Frago (2008) y el concepto de relación con el conocimiento de Bernard Charlot (2000; 1996) que trae la noción de relación entendida como un conjunto de significados y espacio de actividades del sujeto, inscrito en un tiempo. Adoptando la Historia Cultural como marco teórico-metodológico a partir de las proposiciones de Roger Chartier (1990) y considerando la investigación en el contexto de la historia de las asignaturas escolares, realizada por André Chervel (1990), el texto sigue considerando el paradigma de acusación de Carlo Ginzburg (1989), en la búsqueda de la representación del pasado y presente de la educación matemática en la formación del profesorado.


PALABRAS CLAVE: Historia de la educación matemática. Cuadernos escolares. Cultura escolar.


Introduction


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School notebooks, custodians of memories, allow research to be developed and knowledge production, as various forms of knowing and doing are recorded in them, stories, socioeconomic, political, cultural and educational contexts generated in different temporalities. The notebooks in question also allow the construction of interpretations about mathematics education disseminated in different historical moments and apprehend a set of


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situations, facts and unique experiences of the daily school life experienced by teachers working in the period investigated, between 1950 and 1990.

This study raises theoretical-methodological discussions in the area of the history of education and, more specifically, in the history of mathematics education which, founded on Valente's publications (2014; 2008; 2006), highlight the multiplicity of themes and research possibilities and knowledge production, when considering the socio-historical contexts in which these notebooks are inserted.

The assumption that school archives are mediators of multiple meanings in History provides avenues for investigation and formation of students to deal with the memory and history of education. School notebooks allow to know the school from the inside in its specificities, knowledge, form of organization and curricular practices.

School culture, understood as a set of theories, norms, ideas, principles, rules, rituals, routines, habits, practices, ways of doing and thinking provides approximation of traditions, regularities and rules that are shared in educational institutions by those involved in the educational process. Through school files, it is possible to know the interior of the school, its specificities, knowledge, organization and curricular practices. In contact with students who participate in scientific initiation projects, there is the possibility of questioning and creating new knowledge from the dialogue with sources, breaking with a linear view of history, relativizing its truths and problematizing concepts that are often consolidated and conveyed in materials didactic.

The main objective of this research was to use school notebooks as sources for understanding how the teaching of mathematics in primary schools in the hinterland took place and, more specifically, to analyze signs of what was taught at the time, identifying the content covered and the aspects related to elementary knowledge of mathematics. As a theoretical reference, the understanding of Viñao Frago (2008) on school culture, Bernard Charlot (2000) on knowledge and Carlo Ginzburg (1989) on the evidential paradigm is used in the search for a representation of the past and present of school's everyday life. By analyzing the notebooks, it was also sought to understand the teaching concepts and the strategies adopted in relation to school mathematics and the guidelines conveyed by works and authors influenced by the ideas of the Modern Mathematics Movement.

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Mogarro (2005, p. 104, our translation), contributes to our reflection by portraying that through files and information coined in school documents it is possible to understand “the various discourses produced by educational actors – teachers, students, employees and local and national authorities, because they have different representations about the school”. The

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author reveals that archives record information about the school as a homogeneous set that “occupies a central and reference place in the universe of information sources that can be used” (p. 104, our translation).

According to Mogarro (2005) school culture is constituted by a set of theories, knowledge, ideas and principles, norms, rules, rituals, routines, habits and practices; that lead us to ways of doing and thinking, to behaviors settled over time and that present themselves as traditions, regularities and rules, often more implied than expressed in the sharing made by educational actors within institutions. This culture constitutes a substrate formed, over time, by intertwined layers that demand analysis in a historiographical process of investigation on school culture and the influences received.

Therefore, looking at the hinterlands as a cultural universe in the semiarid region of the Northeast, in an intense dialogue with sources, with renewed historiography and with cultural studies, provided an opportunity to interrogate the constituent elements and perceptions of social actors connected on a territorial basis with affinities, social and economic practices, internal interactions and external articulations preserved in a scenario of historical totality.

In this way, history and education will always be under construction due to their relevance to the formation of citizens, the questions that will contribute to developing a critical awareness that will inevitably lead to ways of being and acting that drive social transformation and perspective of a new history of mathematics education.


Bibliographical revision


Before dealing with the data found in the research on school notebooks, it is worth highlighting some researchers who have been discussing research with school notebooks for a long time. They present the concept of notebook in different ways and, as Viñao Frago (2008) uses, the strict concept of notebook is adopted as a common support for students at the school. However, its use became widespread only in the 19th century.

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Chartier (2007, p. 23, our translation) adds that “this source is, at the same time, fascinating and enigmatic, difficult to treat and interpret, precisely because of its apparent banality”. In fact, despite being part of everyday school life, school notebooks are, for the most part, discarded at the end of the school year or, rather, when the pages assigned to writing run out. Also, people use them as if they were ahistorical and, perhaps for this reason, researchers have taken a long time to perceive them as a source of investigation.



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As for the field called History of Mathematics Education, Valente (2014) identified the difficulties in the development of theoretical concepts and models that would parameterize the field's own research problems, ensuring that


Most of the history of mathematics education, it seems, will have as a path to follow that of transforming itself from the condition of a specialty, whether from the History of Mathematics, of Mathematics Education, or even of the History/History of Education, to fullness of a scientific field, emerging as a discipline. And for this it will be necessary to go beyond research objects - which today, to a large extent, have been taken from the empirical reality, from its phenomenological appearance (levels of education in mathematics teaching, mathematics teaching content, formation of mathematics teachers, methodologies etc. are examples of this) (...) for the theoretical construction of knowledge objects (VALENTE, 2014, p. 330, our translation).


Through this study, it is evident that school notebooks provide a range of research possibilities in the field of History of Education, Literacy and Mathematics Education in relation to a diversity of approaches and points of view. However, depending on the topic to be addressed, school notebooks have limits, when used as the only source of research, as they do not allow us to observe what happens in the daily life of classrooms.

In the school notebook, in general, the record of the contents selected by the teacher is highlighted. However, the notebook does not contain, for example, notes of how a certain activity was developed or the time it took to be completed, nor who were the participating members and what was discussed during the process of its construction. In this sense, the statement by Viñao Frago (2008, p. 25, our translation) is plausible for a reflection on curriculum:


[...] Not everything is in the notebooks. They are silent, do not say anything about the oral or gestural interventions of the teacher and the students, about their weight and the way they occur and manifest themselves, about the environment or atmosphere of the classroom, about activities that leave no written or another type, such as reading exercises (reading aloud, for example) and the whole oral world.


Certainly, the possibility of reconstructing a real curriculum based on studies in school notebooks must be discarded. However, as in any historical operation, the intention in this investigation is to approach the past and reconstruct it in a partial way and with a determined focus because, still supporting Viñao Frago (2008), notebooks are not used in the same way in different places, as it is the researcher's gaze that will allow the data to emerge.

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Another necessary reflection fed by the researcher is that the notebooks “are not only a product of the activity carried out [...] and of the school culture, but also a source that provides


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information – through, above all, written essays and compositions – about reality school material and what is done there” (VIÑAO FRAGO, 2008, p. 16, our translation).

In this sense, the use of school notebooks in academic research has been gaining ground either as a source of research or as an object of study for the understanding of issues related to education, because of the materiality and records contained therein and that can be problematized; are constituted the nucleus of the investigation.

School notebooks make it possible to understand school cultures, the transmission of values and ways of thinking, the history of the curriculum, written culture, educational reforms and innovations (VIÑAO FRAGO, 2008).

In this article, with an analysis focus on the values that permeated school practices, material culture is considered “an integral part of school culture and places educational spaces, school buildings, furniture and teaching materials in the research agenda as a fundamental study object for the understanding of educational processes and teaching practices” (MOGARRO, 2010, p. 92, our translation).

In this way, school notebooks are considered bearers of meanings linked to the “system of values and social representations that go beyond the function of an object intended only for recording the learning process” (CORDOVA, 2016, p. 209, our translation). In this regard, they can be analyzed from different perspectives and can carry different meanings: “as ordinary writings, testimonies of a construction of the self; relics connected with a nostalgic sensitivity [...]” (CUNHA; SOUZA, 2015, p. 13, our translation). They can also testify “on a plurality of meanings: orientation of the educational act, in which political and social objectives are captured, in addition to pedagogical theories, [...] aesthetics of the illustration of writing models and, finally, economic interfaces [...]” (FERNANDES, 2008, p. 50-51, our translation).

By agreeing with the statement by Meneses (1998, p. 95, our translation) “every operation with documents, therefore, is of a rhetorical nature”, the intention is to expand the reflection regarding the rhetoric of what is said and what is not said, because, still according to the author, the notebooks bear registration marks that signal positions in a membership, but omit situations such as: agreements made through orality, forms of appropriation by students and teachers, and the time devoted to documented activities.

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Finally, it is worth noting that school notebooks are not neutral, but rather results of the school culture of a particular place, of a particular historical time, as they are sources as complex as others and, therefore, become interesting research objects for being supports used by children, from a daily process that allows recording of interactions that are established during


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the activities developed in class. They contain images and social representations about childhood, school, family, among other similar themes that explain written acculturation.

The perspective of cultural history, as Chartier (1990) understands it, having science and history as its object, “has as its main object to identify the way in which in different places and moments a certain cultural reality is constructed, thought, given to read” (CHARTIER, 1990, p. 17, our translation).

Intimately imbricated in this process are the identity relations of teacher education and professionalism, which imply certain ways of engaging in the teaching and learning processes. Charlot (2000, p. 72, our translation) essentially warns us that “[...] any relationship with knowledge also involves a dimension of identity: learning makes sense by reference to the subject's history, expectations, conception of life, to their relationships with others [...]”.

Charlot (2000; 1996) helps to deepen the reflection on the relationship with knowledge by addressing that, although it belongs to a subject, this relationship is also social. The relationship with the knowledge and learning of a group of subjects explains the context of the way of dealing with life, which is marked by the search to build possibilities of action, of possible actions in the everyday space.

Another important point that Charlot (2000, p. 68, our translation) alerts to is the fact that “knowledge can only take the form of an object through language; better still, of written language [...]”.

Given the overview of theorists mentioned in this section, who consider school notebooks as a source and object of research, and, understanding that they constitute a relevant documental source for the analysis of school cultures and practices in the study of school institutions, the survey is presented below. data that was performed in this research.


Methodology


The context that encompasses this work, an invitation to approach the materials that have been part of school life for years, to remove them from their daily routine and place them in a prominent position, is permeated by the intention to rescue the meaning of school practices from their daily life.

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By proposing a differentiated perspective, considering the marks (evidence) of cultural uniqueness present in school notebooks, whether by notes, drawings or figures cut out and pasted on them, they provide evidence of uses and invite an interpretation process that transforms the usual object into a good of personal and unique value that tells the story.


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It is also considered that materials only acquire an existence because they are linked to the production of certain school knowledge and therefore are perceived in the field of representations and images of students.

For this qualitative and ontological study, 8 (eight) of the 27 (twenty-seven) school notebooks were selected from the collection of Teacher Maria Franca Pires. The teacher, popularly known as Franca Pires, was born on 5 November 1921, in the city of Remanso in the Sertão da Bahia and graduated as a teacher in 1939 at the Nossa Senhora Maria Auxiliadora Rural School in Petrolina-PE. In 1943, she was approved in the public exam for the Primary Teaching of the Bahia state education system and was appointed in Salvador in 1947. In 1950, she returned to her native land and in 1951 requested a transfer to Juazeiro, where she worked and remained until her death in 1988.

The teacher's notebooks have notes that portray her numerous experiences, such as childhood memories, the premature death of her mother, her trajectory at the Maria Auxiliadora nuns' school, the teaching course in Salvador, meeting agendas, lesson plans, interviews with members and leaders of cultural groups, biannual and annual planning of the subjects of Portuguese Language, Mathematics and Science. These notes reveal clues about how Franca Pires approaches different contexts (political-social-cultural) of the city of Juazeiro (BA) and surrounding regions, which enabled the production of new knowledge and practices based on her experiences.

In relation to school notebooks, sources of this investigation, those that presented records and representations of mathematical content were selected, considering that the analysis of the notebooks reveal traces of what teachers favored when teaching, the method, activities, strategies linked to the social and economic context in which they were produced.

The question that arises is: what traces of the influence of the Modern Mathematics Movement (MMM) in the praxis of Teacher Maria Franca Pires and which records reflect traces of the constitution of mathematics education as a field of research? From the detailed analysis in the 8 notebooks considered for this study, the evidence of mathematical representations that point to an approximation to the MMM ideology in the search for understanding the influence of this movement on the education and professionalization of teacher Franca Pires will be explained.

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The practice of historiography can be compared to activities that need the analysis of evidence to make explanations. The Italian Carlo Ginzburg systematized this type of knowledge and coined the expression “indicative paradigm” both for history and for other areas of


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knowledge that share the practice of “tracking of signals, indications, signs” that refer to some event, but without capture it in its entirety.

The History of Mathematics Education in this study characterizes as a guiding element in the search for references to understand the records of practical situations in the daily life of the teacher and the particularities that were highlighted are just small indications of the many analyzes of this nature.


Results and discussion


The concern with teaching methods that would make it possible to resolve the difficulties in teaching and learning in primary schools, although a recurrent theme in the literature, finds in the collection under study evidence of reception, circulation and appropriation of pedagogical conceptions of its time.

For Valente (2006), there is a need to build references for Mathematics Education carried out in much of the second half of the 20th century in Brazil and, therefore, it is essential to intensify research, aiming to reach as close as possible to what effectively represented the Modern Mathematics Movement (MMM) at that time and the influences that, perhaps, still exert on the pedagogical actions of Mathematics teachers.

The MMM took place at a historic moment when the world was undergoing major cultural, political, social and economic changes. In Brazil, this historic moment was characterized by a period of transition of the economic and political base in which, under a dictatorship, all speeches were turned to the idea of modernization and developmentalism, despite the country's serious social problems. The events that took place in the field of economics and politics maintained close links with the scientific-technological field and supported the ideas of changes presented by the Modern Mathematics Movement, which legitimized the concept of "modern" because it considered that the "new mathematics" would surpass the limits set by ancient mathematics. Therefore, the construction of these references becomes fundamental for the idea of the scope of the facts produced by this movement and the implications of these facts in school practices to be further elaborated.

For Silva and Valente (2008), school notebooks can translate a lot about the teaching and learning process that took place in other times.

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In the search for traces for the writing of this historical trajectory, teacher Franca Pires' notebooks, constitutive of school culture, expand the possibility of understanding both the history of mathematics education in the lower middle São Francisco region and what happened


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inside the school institutions. Also seeking to understand the appropriations of proposals for primary teaching at the time of the Modern Mathematics Movement.

In an attempt to understand the curriculum and practices of teachers, active in the second half of the 20th century, in relation to the approximations, distances and intersections with the current school culture, traces of rules and practices of mathematics that were formalized in primary school in the notebooks of the investigated collection.

The 1960s were marked by major changes in the teaching of mathematics throughout Brazil, due to the Modern Mathematics Movement (MMM). Emerging in Europe and the United States, the ideas of the MMM arrived in Brazil in the early 1960s, characterized by having been a movement to reformulate the mathematics curriculum for basic education, whose main particularity, manifested by the representatives of the movement, was the discussion in the groups of the new proposal for the democratization of the teaching of mathematics, making it more practical and more contextualized, as well as establishing forms of implementation in schools. Several groups of teachers were formed during this period in different regions of Brazil with the aim of getting to know, study and understand to put modern mathematics into practice. Franca Pires created and chaired the Association of Parents and Teachers, which would develop actions for 20 years, a period in which the teacher had the real opportunity to put her learning into practice and make this viable identification, as it is possible to verify in the research sources used in this investigation and in the vestiges in the present time related to the

history of school mathematics.

The result of an apprenticeship at the time of the Normal School, the teacher excelled in the idea that the school-family relationship was essential for the smooth running of schoolwork and for the formation of citizens was imperative at the school. It also envisioned a citizen Mathematics Education, "in which the knowledge learned should certainly contribute so that students can acquire skills and abilities capable of attributing to them actions that converge to improve the quality of life of each one, individually and collectively" (MENDES, 2009, p. 16, our translation).

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The ideal of mathematics, its teaching and knowledge are registered in notebooks numbers 3, 4, 7, 8, 9, 10, 20 and 22 that make up the collection of professor Franca Pires. These notebooks intertwine the curricular contents and teaching proposals documented by the teacher in semester and annual plans and also in the lesson plans, namely: set theory, set of natural and rational and their operations, decimal metric system, perimeter, area, volume, geometric solids, planes, classification of plane figures, notions of statistics, problem solving and mathematics assessment.

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Notably, she was a teacher concerned with forming students in the rigor of logical reasoning and in clear and precise language, in addition to emphasizing the emphasis on terminology and conceptualization that were prerogatives of set theory and measures in geometry. These aspects were emphasized in notes at the end of the page, in the ear and in small records highlighted along the notes in the various notebooks. The study of these notebooks may reveal important constituent elements of the historical trajectory of the school discipline (CHERVEL, 1990), in this case of mathematics taught at school.

Starting with notebook number 3, it is worth noting that it is a small notebook measuring

21.1 cm x 14.8 cm, wired, containing 364 pages, colored cover with the image of a shoe with puppies inside and flowers on the side; there is, still on the cover, a pasted figure depicting an urban environment. In the central part is written number 3. The back covers contain various notations of addresses, phrases and mathematical accounts. Several recorded interviews with representatives from various sectors of the community are transcribed in this notebook covering the following themes: carnival of 1914 (list with names of people who left in the cars of “Venice Ambassadors”); about the Carnival Queen contest and relationship with the Royal Bazaar; participation of an interviewee in the Novos Baianos group; story of haunting; São Geraldo dam; water division of the São Francisco River; floods; location of the highest point in Juazeiro; information about the extinction of Apolo's musical body, Ideal cinema; piped water service, origin of Juazeiro, economic development, press, religions, politics, education, culture and Santa Casa facilities.

Notebook number 4 is small, measures 20.5 cm x 14.7 cm, wired, contains 138 pages, colored cover in white, pink and yellow, intended for notes on promoting Courses and organizing production and sales of crafts. In the center of the cover is pasted a piece of paper in which is written “1980” and the number 4 on top; “Maria Franca Pires – 1980” is in handwriting on the cover for the identification of the notebook. The records in this notebook contain notes from the meeting with teachers, dated 14/01/1980, on responses to the FUNDESCOLA questionnaire and preschool matters. There are notes on the planning of craft courses in Juazeiro projects in Maniçoba, Mandacaru, Curaçá, Tourão; list with names of instructors by course, dated 28/01/1980; course production notes per week in the municipalities and mathematical accounts. There are also production lists for courses in crochet, hand embroidery, cutting and sewing, cloth dolls and animals, tapestry. It ends with notes on the Crafts Fair and Post.

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Notebook number 7, small, 22 cm x 16 cm, contains 47 pages, flexible paper cover in orange color. The cover features the word COMPANION printed in blue and the image of a

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smiling boy crouched down and playing with a police car on the ground. In addition, still on the cover, it is written “Catechism” and “Maria Pires”. The background of the notebook has a drawing and an educational text about electricity.

Notebook number 8 has class, event and meeting plans recorded. Its description is of a small notebook measuring 21.7 cm x 15.5 cm, wired, containing 77 pages, a checkered cover and colored in blue, gray and white. In the center of the cover is handwritten, like a title, “Legends and others”; also on the cover, in the space destined for identification, is the manuscript “Different Planning – Maria Franca Pires – 1971”. On the back covers are handwritten quotes of thoughts, reminders, and an address note. The teaching plans are for religion, Juazeiro's birthday contest, mathematics, information about catataus, interviews about candomblé, toré, dances, suits, ox kings, congos.

Notebook number 9 is small, measures 22 cm x 16 cm, wired, contains 92 pages, colored cover in white, blue and pink. On the cover, in the place destined to the identification of the notebook, there is the handwriting “Maria Franca Pires – ‘Research’ – Cons. Luiz Viana, 101

– Juazeiro-Bahia”. On the back cover seven sentences and a list of portraits and names of three people (Lilina, Chico Cabana and Blandina) are noted.

Notebook number 10 is small with dimensions 21 cm x 14.5 cm, paperback, contains 75 pages, colored cover in green color, containing an image in the center with two blond children playing in the sand of a beach. At the top of the cover the word “companion” is engraved in red and in the place for the identification of the notebook there is a handwritten “Mothers Club: Piranga e Maria Goretti” and below, in smaller letters, “For the use of: Mª F. Pires". This contains notes on the organization of the Mothers Club: lists of names, meetings, accountability, courses offered, Mothers Club statute, etc. There are also course notes for the year 1979 (but there are no related courses).

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Notebook number 20 is small, measuring 22 cm x 15 cm, wired, contains 69 pages, smooth cover in beige color. The writing “Planning – Maria Franca Pires – 1972” is located on the cover for the identification of the notebook. The registered plans are for excursions, classes and meetings; information about Folklore, in Brazil and in Juazeiro; the Proclamation of the Republic and the Flag Week; Children's Week; questionnaire about someone (it seems to be done by children to Maria Franca Pires); draft letter to Captain Esmeraldo, head of the São Francisco Navigation Company, dated 17 July 1972; birth dates of José Ronaldo Dewilson Oliveira, José Robério Dewilson Oliveira, Maria Tereza Dewilson Oliveira, Maria Olívia Dewilson Oliveira; in addition to stories and poems. There is the Lesson Plan for 31/08/72: exams, essay, Math exercise, and addition properties subject. There are notes dated 12/09/72:

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lesson planning on poetry, reminders, lyrics from the Anthem of the Proclamation of the Republic and the Anthem to the Flag.

The last notebook to be analyzed, number 22, also a small notebook measuring 23 cm x 16 cm, wired, contains 85 pages, has a checkered cover and is colored in brown and white. The manuscript “Maria Franca Pires – Course Notes – 1971” is located on the cover for the identification of the notebook. These notes contain stages of development of the courses composed by the records: Creativity, Group Dynamics, Teaching Reform, Memorization, Human Relations, The Power of the Mind, Folklore; phrases, thoughts and quotes; questionnaire about Rui Barbosa; planning for “My Neighborhood is the best” competition; poems, stories and song lyrics.

Therefore, it is noteworthy that in these files, in addition to personal documents, documents of a pedagogical and institutional nature of fundamental importance for the historiography of the school space were also found. Such documents, lesson plans and plans, meeting minutes, photos, ex-students' class notebooks and teacher Franca Pires' notebooks reveal a reality little understood in official documents.

According to Vidal and Faria Filho (2005, p. 24, our translation), it is necessary to recognize that there is no school practice disconnected from the material conditions of its implementation. In this sense, the preserved collection of Franca Pires bears evidence of the multiple ways in which the teacher constituted her professionality and prompts investigation into the different forms of appropriation of knowledge and knowing, “offering the researcher indices on the past relationships of subjects with materiality school or on the formality of school practices and reminding him that pedagogical situations are very often constructed by oral forms of socialization”.

These considerations allow us to conclude that Maria Franca Pires' notebooks link regional and national educational policies, school and scientific discourse on Mathematics learning and how knowledge is articulated in the plot of notebooks, revealing a school culture.


Final considerations


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School activities bring evidence of knowledge, moral values and behaviors stimulated in daily school life and which, therefore, were part of the school cultures of the school institutions in which they were developed. School practices are permeated by programs, decrees, pedagogical ideas in circulation and also by the organizations of the teaching staff, by their formative opportunities, by physical and material spaces. Finally, it is in the school


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environment that spaces for creative and inventive uses are provided, permeated by school cultures.

In this work, the complexity that investigations of this type entail was perceived. The analysis undertaken is neither intended to be conclusive nor definitive but suggests the possibility that in other research works it may be extended, completed or even confronted with what has been done so far. Finally, this work tried to illustrate an investigation in the field of school material culture, evidencing elements of school practices that configure predominant facets of historical-cultural processes and facts of daily school activities.

From the analyzed notebooks, it is possible to verify traces that point to the knowledge and engagement of Teacher Franca Pires with the discussions regarding the teaching of mathematics that reflect on the choices that were made by her in relation to her attachment and fixation in the hinterland. Her work has advanced in the sense of deepening studies and promoting actions that have contributed from the selection of researchers with vast production in the area for teaching formations to discussions with peers in relation to mathematics education.

Education, a thread that wove and led the teacher's life in focus, sewing and crossing - plural, inclusive, creative, pioneering and innovative - Maria Franca Pires' records with the coherence that marked her existence and the professional ethos that constituted the teacher.


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How to reference this article


CUSATI, I. C. School culture and its relationship to mathematical knowledge: the senses of teaching revealed in the notebooks of a primary teacher. Revista on line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 25, n. 2, p. 1117-1132, May/Aug. 2021. e-ISSN:1519-9029. DOI: https://doi.org/10.22633/rpge.v25i2.15157


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Submitted: 27/05/2021 Approved: 15/06/2021 Published: 01/08/2021


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