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A categoria “Mulher” como dispositivo biopolítico de
educação do corpo
RPGE
–
Revista on line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 26, n. 00, e022131, jan./dez. 2022. e-ISSN: 1519-9029
DOI: https://doi.org/10.22633/rpge.v26i00.16805
1
A CATEGORIA “MULHER” COMO DISPOSITIVO BIOPOLÍTICO DE
EDUCAÇÃO DO CORPO
1
LA CATEGORÍA "MUJER" COMO DISPOSITIVO BIOPOLÍTICO PARA LA
EDUCACIÓN DEL CUERPO
THE CATEGORY “WOMAN”
AS A BIOPOLITICAL DEVICE FOR BODY
EDUCATION
Aurea Maria Pires RODRIGUES
2
Fabio ZOBOLI
3
RESUMO
: Com a metodologia cartográfica, que diz de um traçar de linhas que compõem a
produção das subjetividades, este texto objetiva traçar as linhas que produzem a mulher
enquanto dispositivo biopolítico, através de políticas públicas, em especial a Política Nacional
de Assistência Social, que produz e retroalimenta um Estado Neoliberal, economicamente
moralizador, como nos diz Donzelot (1980). O traçar das linhas se dará através da cartografia
das práticas de uma psicóloga de um Centro de Referência Especializado da Assistência Social,
o qual atua com crianças, adolescentes, mulheres, idosos, deficientes, comunidade LGBTQI+
vítimas de violações de direitos, entre elas: violências físicas, sexuais, psicológicas. O conceito
de dispositivo parte da leitura foucaultiana de poder, segundo a qual são as relações de
poder/saber que atravessam as existências, no caso em tela, por meio da biopolítica, que
segundo o mesmo autor, nos diz de estratégias de governamentalidade de fazer viver e deixar
morrer.
PALAVRAS-CHAVE
: Biopolítica. Cartografia. Dispositivo. Mulher. Políticas públicas.
RESUMEN
: Este texto pretende trazar las líneas que producen a la mujer como dispositivo
biopolítico a través de políticas públicas, en particular la Política Nacional de Asistencia
Social en Brasil. Esta forma de política pública produce y retroalimenta un Estado Neoliberal,
económicamente moralizante como nos dice Donzelot (1980). Fue aplicada la metodología
cartográfica por una psicóloga de un Centro de Referencia Especializado en Asistencia Social,
una metodología que habla de trazar líneas que componen la producción de subjetividades.
Esta institución trabaja con niños(as), adolescentes, mujeres, adultos(as) mayores, personas
con discapacidad, comunidad LGBTQI+ víctimas de vulneración de derechos, entre ellos:
violencia física, sexual y psicológica. El concepto de Dispositivo parte de la lectura
Foucaultiana del Poder. Según él, son las relaciones de poder/saber que atraviesan las
1
Este artigo foi apoiado com recursos do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGED) da Universidade
Federal de Sergipe (UFS), do Programa de apoio ao Pesquisador à Pós-Graduação (Proap) e da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
2
Universidade Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão
–
SE
–
Brasil. Doutoranda em Educação pelo Programa
de Pós-graduação em Educação. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2461-8502. E-mail:
adinharodrigues@hotmail.com
3
Universidade Federal de Sergipe (UFS), São Cristóvão
–
SE
–
Brasil. Professor do Programa de Pós-graduação
em Educação. Doutorado em Educação (UFBA). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5520-5773. E-mail:
zobolito@gmail.com
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Aurea Maria Pires RODRIGUES e Fabio ZOBOLI
RPGE
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Revista on line de Política e Gestão Educacional, Araraquara, v. 26, n. 00, e022131, jan./dez. 2022. e-ISSN: 1519-9029
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existencias, en este caso, a través de la biopolítica. De acuerdo con el mismo autor, nos habla
de estrategias de gubernamentalidad de hacer vivir y dejar morir.
PALABRAS CLAVE
:
Biopolítica. Cartografía. Dispositivo. Mujer. Políticas públicas.
ABSTRACT
: This text aims to trace the lines that produce the woman as a biopolitical device
through public policies, particularly the National Policy of Social Assistance in Brazil. This
policy compounds and feeds back a Neoliberal State, economically moralizing, as Donzelot
states (1980). I applied the cartographic methodology, which traces lines that make up the
production of subjectivities. I performed this study as a psychologist from a Specialized
Reference Center for Social Assistance, which works with children, adolescents, women, the
elderly, the disabled, and the LGBTQI+ community victims of violations of rights. They went
through physical, sexual, and psychological violence. The concept of Device comes from the
Foucauldian reading of Power. According to him, the relations of power/knowledge cross our
existences through biopolitics in this case. Besides, according to the same author, these
relations tell us about governmentality strategies of make live and let die.
KEYWORDS
:
Biopolitics. Cartography. Device. Women. Public policies.
Introdução
O presente texto busca problematizar o fazer em políticas públicas, em especial o da
Política Nacional de Assistência Social, em um Centro de Referência Especializado da
Assistência Social (CREAS), por uma psicóloga, com mulheres vítimas de violações de
direitos. O objetivo, assim, é por meio da cartografia, no seu modo de traçar linhas que
produzem certos perfis de subjetivação, pensar como Mulheres, de uma população pobre e
marginalizada, são atravessadas por linhas biopolíticas, por meio do próprio fazer das políticas
e, o quanto esse modo produzem-nas enquanto objetos, ao mesmo tempo em que
retroalimentam o modelo neoliberal de Estado.
O Centro de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS), equipamento
4
da Rede de Média Proteção da Política Nacional de Assistência Social (PNAS), atua com
crianças, adolescentes, mulheres, idosos, deficientes, comunidade LGBTQI+ vítimas de
violações de direitos, dentre elas: violências físicas, sexuais, psicológicas, maus tratos,
negligência. Realiza acompanhamento psicossocial, de modo que, suas equipes técnicas são
compostas por psicólogos e assistentes sociais, que buscam atuar com as famílias que passaram
por contexto de violência, com o objetivo de superar a situação e fortalecer os vínculos
familiares fragilizados, uma vez que a maioria das violações se dá em âmbito intrafamiliar, ou
4
Este termo se refere aos locais nos quais as usuárias são assistidas, desde o CREAS, ao CRAS, as Unidades
Básicas de Saúde.
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seja, dentro do contexto familiar. As principais ferramentas de intervenção técnica são visitas
domiciliares, quando as equipes vão até as casas dos usuários, com o objetivo de fortalecer os
vínculos; acolhimentos individualizados e grupais (com núcleo familiar); reuniões com as
famílias acompanhadas; reuniões com outros equipamentos da Rede, como os da própria
Assistência, como o CRAS (Centro de Referência Especializado da Assistência Social), que
atua com as questões socioeconômicas em situação de vulnerabilidade econômica, a Casa
Acolhedora, na qual crianças e adolescentes são institucionalizados quando há situação de
extrema violência e, de outras Redes, como Unidades Básicas de Saúde, Centro de Atendimento
Psicossocial (CAPS), assim como participa de audiências tanto no Ministério Público (MP),
quanto no Tribunal de Justiça (TJ).
E é nesse ínterim de caminhos costurados nos diálogos, ou na falta deles, com as
famílias, outros equipamentos e Redes, que o trabalho da Assistência Social, assim como de
outras políticas, seja da saúde ou da própria Educação, atuam por meio de estratégias de
governamentalidade biopolítica, na tomada de certa população marginalizada enquanto objeto
de atuação. Esta, contudo, se erigiu a partir de uma mentalidade, que Foucault (1979) chamou
de economia política e Donzelot (1980) de moralidade econômica, a qual suprimindo a
miserabilidade, individualiza questões sociais e traz para os agentes/técnicos das políticas
públicas o dever de “tratar” os desviantes em termos relacionais, educacionais e porque não
os
chamá-los pedagógicos, em sua dimensão mais pedagogizante de captura (LARROSA, 2016).
“Uma prática técnica,
definitivamente, em que o resultado deve se produzir segundo o que foi
previsto antes de iniciar” (
LARROSA, 2016, p. 193).
Com o objetivo de traçar o máximo de atravessamentos das Políticas Públicas pelo
público assistido
–
as Mulheres
–
as práticas descritas focarão em três famílias, compostas por
mulheres que são acompanhadas por vários equipamentos, inclusive pelo Ministério Público e
pelo Tribunal de Justiça, que possuem histórico de várias violações de direitos, dentre elas:
violência sexual, doméstica e, que tiveram histórico de acolhimento institucional de alguma
criança e/ou adolescente. Esses critérios foram escolhidos, também, por serem compreendidos
dentro dos círculos dos técnicos, que fazem as Políticas, como falha, ineficiência das próprias
Políticas Públicas, ou melhor, dos casos onde o Estado não chegou. Todavia, será que não
chegou? Ou foi o próprio modelo de Estado que fez desse público um povo inacessível no jogo
biopolítico do fazer viver
–
deixar morrer? (FOUCAULT, 2005).
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Essas famílias, porém, compostas pelas chamadas mães solos
5
, únicas responsáveis por
sua manutenção e de sua prole, compõem-se em um formato chamado de monoparentalidade.
O conceito contemporâneo de parentalidade, e todos os formatos familiares que ele possibilita,
une a vida social cada vez mais ao modo como as famílias regulam suas vidas, ao atualizar a
individualização das questões sociais, uma vez que, o interesse da criança é colocado como
superior. Interesse este produzido por entre os especialismos médicos, psicológicos e
pedagógicos construídos com o objeto infância, de modo a colocar a educação cada vez mais
sob a individualidade dos pais, ocultando as próprias possibilidades educativas parentais, uma
vez que as relações sociais nas quais os pais estão imersos não são consideradas. De forma que
o conceito de parentalidade constrói-
se enquanto conceito neoliberal, haja vista que “eu vos
lembro que o neoliberalismo se caracteriza pela vontade de aplicar um referencial econômico a
todo o conjunto da gestão social e não somente à economia (SOUZA; FONTELLA, 2016, p.
115).
E, nessa conjuntura, que apesar do histórico de violência sexual contra alguma criança
e/ou adolescente dessas famílias, as questões que fizeram com que elas fossem inseridas nas
Políticas e, especialmente no Poder Judiciário, foram situações de negligência dessas
mulheres/mães contra suas filhas. Elas
–
as mulheres/mães
–
passaram a arroladas em
procedimentos do Ministério Público, a processo do Tribunal de Justiça por deixarem suas
filhas pelas ruas, de não as alimentarem devidamente, de elas não terem frequência escolar
regular. Essas foram as questões que levaram essas famílias a objetos de atuação de inúmeros
equipamentos e de diversas Redes: saúde, educação, assistência social. É, assim, que a
moralidade econômica vai se inscrevendo na vida de mulheres que mal sabem ler, que são
completamente dependentes economicamente de Programas de Assistência Social, que
cresceram e residem em um bairro que poucas casas possuem banheiro e outras menos ainda
possuem água encanada, fato este, porém, que oferece ao Estado o direito de assumir sua
dimensão moral.
A escolha metodológica da Cartografia caminha com a escolha do conceito-força
dispositivo, uma vez que, ao problematizar o conceito foucaultiano de dispositivo, Deleuze
(1990, p. 1) diz que:
“Desenredar as linhas de um dispositivo, em cada caso, é construir um
mapa, cartografar, percorrer terras desconhecidas, é o que ele chama de «trabalho de terreno»”,
haja vista que, como ainda aponta Deleuze (1990, p. 155-156),
“o poder é a terceira dimensão
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Esse termo é utilizado para romper com o termo mãe solteira, o qual atrela a condição da mulher ao status civil.
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do espaço, interior ao dispositivo, variável com os dispositivos. É uma linha composta com o
saber, tal como o poder”.
Assim sendo, desenredar um dispositivo, naquilo que o faz estratégia de
governamentalidade que produzem subjetividades, ou seja, modos de ser e estar no mundo, é
traçar as linhas que atravessam esses modos, de forma a tencionar outros tantos modos.
Desenredar as linhas, que fazem das mulheres objetos de atuação de tantas políticas públicas, é
desenredar aquilo que as fazem dispositivo de governamentalidade de certo modelo estatal, bem
como desenredar o modo de ser e estar no mundo dessas mulheres, ao mesmo tempo em que,
se abrem brechas para a produção de outros modos, outras mulheres, outras práticas que
potencializem sujeitos mais autônomos.
Problematizando, também, o conceito foucaultiano dispositivo, Agamben (2009, p. 13)
amplia a discussão da produção de subjetividade com questões contemporâneas, ao afirmar que:
Generalizando posteriormente a já amplíssima classe dos dispositivos
foucaultianos, chamarei literalmente de dispositivo qualquer coisa que tenha
de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar,
modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os
discursos dos seres viventes.
Por qualquer coisa, Agamben (2009, p. 13
) cita: “a caneta, a escritura, a literatura, a
filosofia, a agricultura, o cigarro, a navegação, os computadores, os telefones celulares e -
porque não - a lingu
agem mesma...”. De modo que o dispositivo se configura enquanto uma
máquina de produzir subjetividades, sendo assim, uma máquina de governo.
Deleuze nos fala, ainda, da potência do dispositivo, a qual segundo Silva (2014) está na
mobilidade, variação e dinamismo do mesmo. Ao apontar uma filosofia do Dispositivo, Deluze
(1990) traz a potência dos dispositivos no repúdio aos universais, com o qual ao se pensar o
humano através das experiências concretas nos encontros, processos singulares podem ser
criados.
“O Uno, o Todo, o Verdadeiro, o objeto, o sujeito não são universais, mas processos
singulares, de unificação, de totalização, de verificação, de objetivação, de subjetivação
imanentes a dado dispositivo” (
DELEUZE, 1990, p. 157). É o movimento que Agambem
(2005) chama de profanação, segundo o qual, Silva (2014, p. 149) afirma que a
“superação ou
desativação dos dispositivos se ancora na retomada daquilo que foi capturado pelas estratégias
políticas”. Assim sendo, dispositivo é o entre as relações de poder,
saber e os processos de
subjetivação e dessubjetivação.
Segundo Foucault (2005), a biopolítica compõe-se por estratégias de
governamentalidade que passaram a incidir no homem enquanto espécie, ou seja, nos processos
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de nascimento, morte, de organização das cidades, em um processo que passou a incidir em
uma massificação do homem enquanto uma espécie social, mantendo, porém, o processo de
individualização dos corpos. Processo de fazer viver e deixar morrer.
Depois da anátomo-política do corpo humano, instaurada no decorrer do
século XVIII, vemos aparecer, no fim do mesmo século, algo que já não é uma
anátomo-política do corpo humano, mas que eu chamaria de urna "biopolítica"
da espécie humana (FOUCAULT, 2005 p. 289).
Desenredar, assim, um dispositivo é desenredar a biopolítica que o atravessa, traçando
as linhas de poder e saber que se fizeram enquanto máquinas de governo incidentes em certos
corpos, no caso aqui em questão o da mulher. Assim sendo, não haverá aqui um conceito de
mulher, mas sim o traçado que faz de certa população de mulheres objeto de incidência
biopolítica.
Para lograr com o objetivo já anunciado deste escrito o apresentamos a partir de um
tópico que desencadeará outros dois momentos:
1. Mulher
–
Dispositivo Biopolítico por entre
políticas públicas
, o qual discutirá como esses sujeitos são tomados enquanto objetos/usuárias
de Políticas Públicas, dentre o fazer de práticas psicossociais no CREAS com as famílias, no
subtópico:
1.1 No fazer com as famílias
, no qual serão apresentadas práticas como visitas
domiciliares, reuniões de grupos com as famílias, e; com outros equipamentos e Redes, no
subtópico
1.2 No fazer com outros equipamentos e Redes
, que contará com a atuação com
outros equipamentos, participações em Audiências tanto no MP, quanto no TJ, para assim,
ensejarmos as estratégias biopolíticas que incidem sobre essas vidas.
Categoria “mulher” –
dispositivo biopolítico por entre políticas públicas
O projeto de higienização da sociedade capitalista no século XIX, através do controle
das populações, enquanto prática de produção e proliferação do biopoder, em todas as
dimensões da vida (FOUCAULT, 1979), revestiu o corpo feminino em objeto de saber/poder
biomédico
–
o corpo Biofeminino (RODRIGUES, 2014).
Educação e Saúde são dois dos campos de conhecimentos e práticas que
produzem, atualizam e repetem, incessantemente, o que a mãe é ou deve ser e
sua ‘autoridade científica’ constitui uma importante estratégia de
naturalização e universalização de tais definições (MEYER, 2003, p. 34).
As diferenças entre os corpos de homens e mulheres, descritas pela medicina, eram
especificadas a partir da sexualidade, aliando à sexualidade feminina as funções de mãe e
esposa. “A política dos corpos (a politização da anatomia) em sua rede de s
ignificações remete
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o sexo ao poder binário e equívoco de um sobre o outro” (
SWAIN, 2011, p. 404). Deste modo
o sexo-categoria se tornou prisão e a sexualidade exigida os grilhões que transformaram o
humano em mulheres e homens, enclausurados em poder e submissão (SWAIN, 2011). Assim,
as diferenças sexuais corpóreas tornaram-se base para as prescrições do papel social de
mulheres e homens. As mulheres, com desejo sexual por “natureza menor” do que o dos homens
e responsáveis pela reprodução, tornaram-se centro da esfera privada da família; já os homens,
da esfera pública: trabalho, política, comércio (COSTA
et al
., 2006).
Esse projeto biopolítico, de produção do corpo feminino, se compôs por meio de outros
tantos processos sociais, políticos e econômicos. A própria tessitura da sexualidade, enquanto
campo científico, é um dos pontos citados por Foucault (1988). O ator aponta que com uma
incitação política, econômica, técnica ao se falar do sexo, por volta do séc. XVIII, se constituiu
uma racionalidade em torno desse assunto, através de análises que se deram por vias de
pesquisas quantitativas, de classificações, enquanto uma “Polícia do sexo: isto é, necessidade
de regular o sexo por meio de discursos úteis e públicos e não pelo rigor de uma proibição”
(FOUCAULT, 1988, p. 28). E foi, também, com o surgimento do conceito de população que
essas tecnologias racionais em torno do sexo puderam ser forjadas. Sendo a população um
problema econômico e político, “surge a análise das condutas sexuais, de suas determinaçõ
es e
efeitos, nos limites entre o biológico e o econômico” (
FOUCAULT, 1988, p. 29). O sexo é
assim constituído enquanto campo de saber, um objeto de verdade, para a organização de uma
população, um Estado.
Refutando a teoria de que o sexo passou a âmbito de um lugar de repressão, Foucault
(1988) nos aponta como foi tomado enquanto
scientia sexualis
, mesmo que tenha havido ao
longo do séc. XIX registro de dois saberes distintos, um biológico, pensado a partir de um
discurso científico em torno da reprodução, em um movimento de fisiologização do sexo, e
outro de uma medicina do sexo, que a princípio parecia buscar uma vontade de não saber. Este
se apoiava em uma racionalidade, que acaba estando intrínseca a uma vontade da verdade. E é
nesse emaranhado de tecn
ologias de poder, em torno do sexo, compondo assim o “dispositivo
sexualidade”,
em que os corpos são tomados em certa individualidade, em um processo de
fisiologização, tornando-se objetos de uma ciência, que a cada movimento vai compondo o
traçado das subjetividades, naquilo que Foucault (1985) aponta enquanto cuidado de si, ao
trazer na História da Sexualidade III todo um arcabouço analítico, que assinala como um certo
saber se compõe explicando os corpos por meio do sexo, dos prazeres, da reprodução. Assim,
a sexualidade vai de forma micro sendo marcada nos corpos, na forma como estes se
relacionam, especialmente em termos conjugais, já que esse “dispositivo de sexualidade” passa
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a ser a marca da produção de outra conjugalidade, que interpõe os sujeitos à necessidade de
uma atenção consigo, com o outro, com a vida a dois. E, dessa forma, enquanto corpo
reprodutivo, o corpo feminino é atravessado por esses campos: o científico, que potencializa as
políticas de controle e regulação da natalidade, da mortalidade; o da moral, em torno dos
prazeres, que se instala nos discursos de como esses corpos devem ser no âmbito maternal,
conjugal, social.
A criação do conceito infância e todo o arcabouço teórico-científico que se instalou em
torno desse público, é outro traçado que atravessa a produção da Mulher, enquanto dispositivo
biopolítico. A Mulher, carregada com a insígnia do lar, da família, do cuidado dos filhos, foi
assim produzida em um entre saber-poder dentro da produção desse Estado. Porém,
diferentemente da mulher burguesa, que segundo Donzelot (1980), com uma aliança
privilegiada com os saberes médicos e educacionais, os quais as fizeram educadoras auxiliares
médicas, através de certa literatura médica higienista, à mulher popular ficou a responsabilidade
em manter certa regulação de sua família, para que ela não seja rebaixada à necessidade da
Assistência Pública.
Apesar de tecnologias e funções aparentemente diferentes, vai se inscrevendo no corpo
dessas mulheres o lugar de onde se emana certa infância e certa família. Mentalidade erigida
naquilo que Foucault (1979) chamou de economia política e, Donzelot (1980) de moralidade
econômica, a qual se atrela a um saber/poder que se diz liberal economicamente, mas que incide
com certa moralidade na vida das pessoas, especialmente na parcela que se encontra à margem
dos processos econômicos, é uma “conexão sistemática entr
e a moral e a economia que
implicará uma vigilância contínua da família, uma penetração integral em todos os detalhes de
sua vida” (
DANZELOT, 1980, p. 61), principalmente, por meio das Ciências Humanas,
enquanto grande campo para a regulação dessa moralidade, através dos trabalhadores sociais,
que possuem como objetivo dentro das Políticas Públicas, em especial nas da Assistência
Social, inserir certas populações no modelo socioeconômico liberal. Haja vista que,
nada é mais raro do que exercer sobre os pobres uma influência que não resulte
do medo ou da esperança e, contudo, isso é o que é mais necessário. Trata-se,
portanto, de persuadi-los de que são senhores de si para recusarem aquilo que
se lhes pede (DONZELOT, 1980, p. 57).
De modo consoante com as análises europeias de Foucault (1979) e Donzelot (1980),
Bulcão (2006) ao dissertar sobre a realidade brasileira, nos diz que o montante de indigentes,
nascidos do pauperismo, deu ao Estado o papel de reorganizar o corpo social, a partir dos
discursos de ofertar a essa parcela o direito à assistência e à educação. Ao citar os princípios
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ético-políticos que regularam a própria formação da República no Brasil, a autora diz da
implantação de uma nova ordem social, tendo como base os ideais de ordem-progresso-
civilização, que seria resultante de uma racionalidade da dignidade do trabalho, já a ociosidade,
fruto das paixões, causariam desordem-atraso-barbárie.
A elite intelectual brasileira da época da Proclamação da República, misto de
cientistas e políticos, pesquisadores, literatos e acadêmicos, estava convencida
de sua “missão patriótica” na construção de uma Nação.
Suas propostas
objetivavam o “saneamento moral” do país, onde a “degradação moral”
passou a ser associada à pobreza, pois esta, com seus vícios, não condizia com
o ideal de nação que se tentava produzir.
As noções de “classes pobres” e
“classes perigosas”, no início do século XX, referiam
-se a uma mesma
realidade (BULCÃO, 2006, p. 32).
E a mulher brasileira, assim, foi um importante alvo, para a formação de uma geração
civilizada e próspera. As práticas burguesas de puericultura são disseminadas nas populações
de baixa renda, para tanto, a autora cita a instituição do Instituto de Proteção e Assistência à
Infância do Rio de Janeiro, em 1899, no qual para além da prestação de serviços básicos de
saúde, a população assistida era obrigada a frequentar palestras sobre higiene e, as doações, que
não poderiam ser em dinheiro, eram convertidas em bens de consumo, como leite, roupas,
alimentos, remédios e calçados. Tomada enquanto uma questão social, para manter a coesão
social e assim produzir uma nação, o pauperismo torna-se uma anomalia do proletariado, que
nasceu de uma má formação moral, necessitando assim de uma reabilitação da classe
trabalhadora, como se esta acometida por uma doença, tivesse que ser tratada de forma incisiva
e ortopédica, sendo a mulher o principal canal para tal empreitada.
Mulher, infância, família tornam-se, desse modo, uma tecnologia de
governamentalidade dentro da biopolítica que produz o Estado Neoliberal, atualizada no modo
de atuação dos trabalhadores sociais que visitam as casas dessas famílias, para tratarem dos
vínculos familiares, que participam de audiências em instâncias jurídicas, para decidirem sobre
tutela de crianças e adolescentes, tendo como argumento para tal situação o modo como as
famílias
criam
seus filhos. No caso das famílias que aqui serão citadas, como dito acima, mesmo
com o histórico de violência doméstica e sexuais intrafamiliares, não cometidas por elas, suas
vidas viraram Procedimentos no Ministério Público e Processos no Tribunal de Justiça por
questões de “negligência”. Vestidas por negligentes, essas Mulheres/Mães são tomadas por
individualizações, julgadas e inquiridas pelo modo como praticam suas vidas maternais e
femininas, esquecidas enquanto público que o “Estado não alcançou”, assoladas por situações
de violências, são suas condutas que são objetos das políticas, para tanto, abaixo serão trazidos
alguns exemplos, descritos em primeira pessoa, uma vez que são frutos de diários de campo da
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psicóloga, para ampliar a compreensão desse emaranhado de linhas e atravessamentos
biopolíticos.
No fazer com as famílias
A atuação com as famílias é recheada de práticas educativas, naquilo que Larrosa (2016)
chama de pedagogia da captura, em um formato que pensa o modelo educativo, em um processo
sob o humano, despontencializando-o, uma vez que, antes de o nascer já é interposto inúmeras
insígnias aos sujeitos, inclusive às mães.
Há, dentro do CRAS (Centro de Referência da Assistência Social, por exemplo, um
grupo de Gestantes, formado por mulheres que são beneficiárias de Programas de Transferência
de Renda, que “necessitam”, assim, de uma maior “atenção” e “cuidados”. Aquelas que
participam desse grupo possuem o direito do Benefício Eventual Kit Enxoval
6
. Neste grupo, as
Mulheres/mães participam de intervenções, as quais contam com rodas de conversa e palestras
sobre gravidez, puerpério, cuidados com os bebês. Assim como, há alguns anos, realizávamos
dentro do CREAS, um grupo com as famílias, o qual era majoritariamente formado por
mulheres, e tínhamos, também, rodas de conversa e palestras, as quais giravam em torno das
condicionalidades do Programa Bolsa Família
7
, ou seja, condições que as famílias necessitavam
cumprir para receberam o benefício. Levamos enfermeira da Estratégia de Saúde da Família,
para falar sobre a vacinação das crianças, saúde da mulher, planejamento familiar; assistente
social para falar sobre o que eram as condicionalidades do Bolsa. Esse modo, de vinculação de
um trabalho educativo das famílias, como condição para acesso a Benefícios aponta o formato
biopolítico de atravessamento na composição das Políticas, frente a uma população que
necessita ser inserida economicamente e moralizada socialmente, uma vez que, os pobres
[...]traziam o perigo de contágio pois, enquanto as crianças pobres
permanecessem expostas aos vícios de seus pais, as classes perigosas
continuariam a se reproduzir. Assim, para se erigir uma Nação, era necessário
que toda a sociedade participasse dessa cruzada saneadora e civilizatória
contra o mal que se encontrava no seio da pobreza. Os pobres
–
trabalhadores
e ex-escravos e, portanto, majoritariamente negros
–
encarados c
omo “classe
perigosa”, transformam
-
se prioritariamente em “objetos de sciencia”.
Para
6
Esse benefício estar entre os ofertados pelo município, o qual é ofertado a mulheres gestante e conta com
utensílios para o cuidado com o bebê, como roupas, banheira, entre outros.
7
Maior Programa de Transferência de Renda que existia, segundo o qual as famílias tinham que seguir algumas
condicionalidades, como frequência regular das crianças na escola, acompanhamento regular na Estratégia de
Saúde da Família, o qual foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil, no ano de 2021, sofrendo uma fragmentação,
haja vista que não há mais uma vinculação com as condicionalidades, muito menos com programas de geração de
renda.
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enfrentar esse problema, a estratégia mais imediata visava reprimir os hábitos
de não-trabalho dos adultos (BULCÃO, 2006, p. 32).
No Planejamento Familiar, nas condicionalidades dos Programas de Transferência de
Renda, nos Programas de Geração de Renda, a chamada Oportunidade de mudança de vida
estar, também, na mudança de hábitos, os quais arraigados aos discursos científicos vão
atravessando essas vidas e criando os objetos para o Estado.
Dentro das Políticas Públicas, seja nos acompanhamentos psicossociais da Assistência
Social, seja no da Saúde, através das Equipes de Saúde da Família, ou mesmo das equipes de
Busca Ativa das escolas, que objetivam diminuir a evasão escolar, visitas domiciliares às
famílias assistidas são uma importante ferramenta de atuação. Psicólogos, assistentes sociais,
enfermeiros, agentes comunitários de saúde, pedagogos transitam por inúmeros lares,
adentrando rotinas, casas, relações. Segue descrições do diário de campo da psicóloga do
CREAS, sobre a realização de visitas domiciliares as três famílias escolhidas para
problematização.
Lembro-me de um dia que realizei visita domiciliar junto com alguns
Conselheiros Tutelares e técnicos da Casa Acolhedora, E a cada visita, parecia
que havia um gravador, repetindo as falas, a realidade e o nosso fazer. As
queixas das mães para com suas filhas eram basicamente as mesmas. Suas
filhas que não as obedeciam. Falta de diálogo. Discussões. Meninas pelas ruas.
E com possíveis namoros. Nós, com o tão corriqueiro atravessamento judicial
que há nos casos, saímos pontuando sobre os acordos feitos nas audiências e,
as consequências de não serem cumpridos. Saíamos das visitas com a certeza
de que a situação continuaria caótica, mas nós sequer ouvimos a repetição dos
discursos e, se quer buscamos entender a mecânica dessa realidade Mulher,
tão instaladas naqueles corpos (DIÁRIO DE CAMPO, 2019).
Apesar das três mulheres/mães terem modos bem diferentes de me receberem
em suas casas, durante as visitas domiciliares, é bem explícito o quanto elas
se justificam mesmo quando não são diretamente inquiridas. Maria
8
costuma
já ir se queixando das filhas, o quanto elas não a obedecem; Joana
9
, com um
discurso que parece prontamente ensaiado, sempre inicia suas falas apontando
como ela é uma excelente mãe, e faz tudo por suas filhas; já Olga
10
vai abrindo
a porta com toda a rispidez de quem estar sendo muito incomodada e, para
além das queixas dos filhos, tem as de sua família, que segundo ela não a
ajuda, principalmente durante os dois últimos anos, diante das prisões
recorrentes do ex-companheiro envolvido com tráfico de drogas (DIÁRIO DE
CAMPO, 2020).
As visitas domiciliares, as quais possuem como principal objetivo tencionar um
ambiente de diálogo entre a família, bem como de interação com a comunidade, acabou
8
Nome fictício para resguardar a identidade da usuária.
9
Nome fictício para resguardar a identidade da usuária.
10
Nome fictício para resguardar a identidade da usuária.
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tornando-se além de vigilância, uma dimensão policialesca, de caráter inquisidor, na qual as
usuárias defendem-se antes de serem questionadas, já que a presença dos trabalhadores sociais
parece carregar o peso das audiências, de culpas que elas mesmas parecem não compreender
quais são. A tecnologia do inquérito, dessa forma, no fazer com as famílias pobres, tornou-se
“
uma fórmula extensiva de um controle social cujos agentes serão mandatados por instâncias
coletivas e se apoiarão na rede administrativa e disciplinar do Estado.” (
DONZELOT, 1980, p.
99). Donzelot (1980) nos fala, assim, da tecnologia inquérito social instaurado em uma
conjunção de duas linhas de controle sobre a família
–
a assistência e a repressão, fato que
tencionou a própria ampliação do “social”.
Entre a Assistência Social e o Judiciário, o inquérito
social surge como importante tecnologia de poder para produzir a família enquanto mecanismo,
atravessado por um Estado que através de suas ditas políticas públicas controlam as instâncias
no mais micro das relações cotidianas dos sujeitos. Iniciando com a proteção à infância em
perigo, passando para a assistência de gestantes pobres, a famílias pobres quando o pai é
internado em estabelecimento médico, ou prisão,
O inquérito social é, assim, o principal instrumento técnico destinado a
ordenar a nova logística do trabalho social: a possibilidade de retirar ou
restituir as crianças, a intervenção na família com fins de reeducação
(DONZELOT, 1980, p. 98).
Assumimos, assim, o que Marcelino (2008) cita como modo de subjetivação
contemporânea policialesca, enquanto atitudes assumidas por qualquer um, sem relação direta
com a função policial, na direção de uma sociedade saudável, especialmente voltada para os
contratempos dos pequenos delitos, como a mendicância, a jogatina, a embriaguez, atentados
aos bons costumes. E é, assim, que constantemente, os trabalhadores sociais
–
do SUAS
–
são
acionados enquanto aqueles que detendo a ferramenta da visita domiciliar, possuem a
capacidade de adentrar, vigiar, inquirir.
Essas linhas duras (DELEUZE; PARNET, 1998), compostas nos mecanismos de
inquirição e alimentadas no modo policialesco das visitas domiciliares, não encerra o Poder
enquanto tecnologia de completa dominação e captura, há no fazer das Políticas, no jogo do
Poder, como nos diz o conceito foucaultiano, possibilidades de resistências e produção de outras
linhas de subjetivação. Para tanto, segue outro registro de diário de campo, o qual trata de uma
ação em grupo com famílias acompanhadas.
Tivemos, também, momentos de falar sobre afetos. Um dia em especial,
levamos um vídeo sobre um domador de cavalos dos Estados Unidos da
América, o qual havia sofrido muita violência do pai quando criança,
chegando a ter inúmeros ossos fraturados. Tínhamos como objetivo, nesse dia,
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trabalhar uma educação não violenta e uma relação familiar dialógica. Após
passarmos o vídeo, no qual o domador falava do seu modo de cuidado com os
cavalos, que na maioria das vezes eram bravos e ariscos, pela forma violenta
que foram domados, falava sobre sua infância violenta, um silêncio se abateu
na sala e, todos assistiram com muita atenção. Quando acabou, começamos a
conversar sobre a vivência dos cavalos e do domador, vários foram os relatos
de violência sofridos por todos e, em especial, pelo único pai que lá estava.
Este nos contou inúmeros episódios de sua infância, na qual foi extremamente
agredido. Esse dia foi muito intenso para nós, sentimos até uma sensação de
dever cumprido, enquanto técnicos da Assistência Social, ao tratarmos de
questões relacionais dentro daquelas famílias. Esse grupo funcionou por quase
um ano, acontecia mais ou menos uma vez ao mês e, havia nele algo peculiar,
como uma forma de tencionarmos a adesão, pedimos à Promotora da época,
que assinasse o “convite” de participação. Problematiza
ndo hoje nossa
proposta, não sei ao certo dizer se foi boa ou ruim, e na própria busca de
escapar dessa dualidade, penso que tivemos momentos de muita pedagogia
capturante, na busca de ensinar aqueles corpos a serem saudáveis e imersos a
uma lógica burguesa de família, ao mesmo tempo em que, tivemos momentos
catárticos, nos quais pessoas tão pouco ouvidas e/ou existentes puderam falar
de suas dores, puderam trocar experiências, puderam construir amizades. O
encerramento do ano, desse grupo, aconteceu no Ministério Público, com a
Promotora. O nosso objetivo era que ela falasse sobre o papel do MP, para que
pudéssemos diminuir as fronteiras entre eles, e levar essas pessoas para serem
vistas de certa forma pelo Direito, em outro momento que não nas audiências.
Convidamos os conselheiros tutelares, também, conseguimos lanche, bolo,
refrigerante. E o evento acabou se dando com as famílias assistidas, assistindo
à Promotora e aos Conselheiros Tutelares falarem (DIÁRIO DE CAMPO,
2016).
E, é nesse jogo de disputas de poder que se pode repensar a Ética. Esta, a partir de uma
perspectiva de Espinoza (2017), que nos diz de uma produção de normas, de uma produção de
outros modos, e é nesse emaranhando de capturas e durezas que as equipes caminham,
capturando e sendo capturadas, potencializando resistências, movimentos outros, vidas outras.
No fazer com outros equipamentos e redes
Adentro a sala de Audiência da Vara da Infância e, ao redor da mesa de
conciliação encontravam-se: a excelentíssima senhora Juíza, na cabeceira, de
um lado a mulher Requerida no Processo
–
Maria, do outro os três pais de
cinco das suas oito filhas e, nas cadeiras em frente à mesa, a Rede de Proteção
(conselheiros tutelares, psicólogos e assistentes sociais de equipamentos das
Secretarias Municipais de Assistência Social, Educação e Saúde). Essa é mais
uma audiência, entre as várias que participo, tão corriqueiramente, enquanto
braço do Estado
–
psicóloga do CREAS. Conheço Maria desde que assumi o
lugar de Psicóloga no CREAS, já aqueles homens, apenas um eu conhecia.
Até então, tudo parecia comum. As cinco meninas menores encontravam-se
acolhidas, na Casa Acolhedora do município, em decorrência de negligência
por parte da mãe. Ao longo da audiência, porém, um incômodo foi tomando
conta de mim, olhava para aquela mesa e não enxergava a mesmice cansativa
das audiências. Passei a observar melhor a disposição de cada um na mesa, a
quem e sobre quem eram referidas as falas e, a cada nova observação um nó
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tomava conta de minha garganta. Foi muito difícil falar, quando acionada pela
Juíza naquele dia. Enquanto aparato estatal apresentava-se ali, quase como
polícia, ao apontar as negligências de Maria e, todas as vulnerabilidades que
aquelas cinco meninas estavam expostas na rua mais pobre e esquecida do
município. Como em uma Inquisição, aquela Mulher que sequer sabia
escrever seu nome, não teve suas filhas de volta. Esquadrinhada, teve sua vida
determinada por entre um território atravessado por “n” saberes
-poderes, tão
estranhos a ela, por sinal. O paradoxo interposto a mim, ali naquela mesa de
audiência, ficou mais indigesto quando a excelentíssima senhora juíza pediu
para um dos pais sair da mesa e deixar a cadeira livre para mim. Com um nó
na garganta e sem exclamar nenhuma palavra sobre o que ali se delineava
–
uma mulher Requerida pelo Estado, pelos pais/homens. Sentei-me bem
próxima a excelentíssima Juíza, onde ela solicitou. Ali fui inquirida, e como
que tomada por uma febre, não me lembro ao certo quais as perguntas e, muito
menos ainda, quais as minhas respostas, lembro-me, porém, que os discursos
atravessavam aquele corpo/Mulher apontando-a como o problema (DIÁRIO
DE CAMPO, 2020).
Lembro-me de uma audiência de uma das filhas de Joana, quando uma estava
institucionalizada, devido uma situação de violência doméstica, que passara
aos trezes anos. Quando cheguei na sala de espera da sala de audiência, lá
estava o pai delas, aquele sujeito, que parecei tanto com a filha fisicamente,
me causou um profundo estranhamento. Lembro que fiquei parada olhando
para ele, meio atônita, não esperava ele ali, até porque como Joana tem vários
filhos de vários pais, estes pareciam inexistentes nas falas da rede. Ele, durante
a audiência, foi logo dizendo que residia em outro município, que morava de
favor e que não tinha condições nenhuma de acolher a filha. Esta que quando
chegou eu já estava lá, olhou para o pai, pediu-
lhe a benção, dizendo: “benção
pai” e, ele baixinho respondeu: “Deus lhe abençoe”, não chegou em nenhum
momento perto do pai, ou trocaram alguma outra palavra. Toda essa cena me
doeu muito nesse dia, para mim era um distanciamento afetivo muito grande,
e me questionava de o porquê deixávamos esses homens passarem ilesos dos
processos e procedimentos, como eles não eram pais de fato. Atravessada pelo
dispositivo de parentalidade me vejo agora (DIÁRIO DE CAMPO, 2018).
Os pais quase nunca são citados, nem nas convocações para as audiências, a não ser
quando a situação já se complexificou demais e as intervenções com as mães não estão dando
resolutividade
, como nos casos em questão, muito menos arrolados como os Requeridos pelos
poderes judiciais
.
Arroladas em todos os processos, as mulheres/mães inquiridas, atravessadas
pela tecnologia do inquérito que compõem esses espaços, foram a cada ano de seus
acompanhamentos sendo tomadas enquanto o problema individual de suas filhas e famílias.
Enredadas na insígnia da família, da infância protegida e civilizada, elas são lançadas
constantemente à moralidade neoliberal.
A ação da Campanha do 18 de maio
11
, do ano de 2020, que em decorrência da
pandemia do “corona vírus”, ocorreu de forma remota, com toda a Rede de
11
Instituído pela Lei Federal 9.970/00, o dia 18 de maio foi escolhido como o Dia Nacional de Combate ao Abuso
e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, em alusão ao crime bárbaro contra a menina Araceli, de apenas
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Proteção, qual seja: DAGV, MP, CRAS, Conselhos Tutelares, foi bem
peculiar, ao mesmo tem em que, trouxe bem o modo biopolítico de
compreensão da realidade de nossas usuárias. Em uma fala feita pela
Delegada, ela disse-nos que sua preocupação principal é com a saúde mental
da criança, que este é o seu foco, enquanto a grande maioria dos casos não
saem das gavetas da DAGV para o MP, por suas investigações serem sem
consubstancialidade suficiente para a abertura de Processos Judiciais. Essa
fala, da Delegada, ressoou em mim por vários dias, já que com seu foco na
saúde mental das crianças e não na investigação das denúncias de violência
sexual, o CREAS se sobrecarrega com urgências. Com esse foco desfocado,
tanto a DAGV, quanto o MP nos enviam casos com solicitações de relatórios
de acompanhamento urgente, relatórios estes que com “seus focos” na saúde
mental dos usuários, transparecem em seus pedidos o caráter moralizador para
que resolvamos os conflitos das famílias e, os seus focos investigativos em
torno das violências sexuais se desintegram em culpabilizações em torno das
famílias. Houve denúncias de violência sexual contra dois filhos de Olga, de
exploração sexual contra as filhas de Maria e de Joana, mas essas denúncias
perderam-se com o foco na negligência delas para com seus filhos. E as
audiências passaram a espaços de análise do comportamento delas e, de busca
de soluções pela rede para que as essas mães tenham autoridade e afeto por
seus filhos e filhas (DIÁRIO DE CAMPO, 2020).
A condução das questões das violências para as condutas das famílias, em especial das
Mulheres/mães compõem-se por entre diversas ferramentas, como já foram algumas citadas.
Porém, o poder erigido ao psicologismo, atrela-se, também, ao que Foucault (2008b) cunhou
de Poder Pastoral. Oliveira (2018, p. 39), ao citar Foucault, menciona
que “o poder pastoral que
se exerceu como poder é sem dúvida algo de que ainda não no libertamos
”. Enquanto
exercícios, o poder nos produz em modos de ser. Poder soberano, poder pastoral, poder
disciplinar, biopoder não seguem uma linha ténue de produção e exercício, inventam-se,
deformam-se, se diluem com e nas relações. De modo que, Oliveira (2018) busca pensar como
as estratégias do poder pastoral se exercem na contemporaneidade, a partir das práticas da
psicologia, ao apontar que a condução das almas, em busca de uma salvação, passa com o
aparecimento da forma Estado, aos especialismos, especialmente, com a própria produção do
conceito de um humano, o qual embasando os direitos universais, fomenta processos de
homogeneização e normalização, de indivíduos que se querem dóceis e obedientes a certo modo
de ser, conduzido por entre as práticas que lhe fazem humanos. Nessa perspectiva, na luta pela
humanização dos sujeitos vulneráveis, violados, as práticas que produzimos se exercem
enquanto um governo de condutas, desses sujeitos que escapam à lógica neoliberal de modos-
de-ser-indivíduo (COIMBRA; NASCIMENTO, s.d.).
oito anos, que em 18 de maio de 1973, na cidade de Vitória/ES, foi raptada, estuprada, morta e carbonizada por
jovens da classe média alta da cidade. Este crime continua impune até os dias de hoje. Disponível em:
https://www.tjpa.jus.br/PortalExterno/institucional/Infancia-e-Juventude/563289-campanha-18-de-maio.xhtml.
Acesso em: 30 ago. 2021.
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Aurea Maria Pires RODRIGUES e Fabio ZOBOLI
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Especialismos que adentram as práticas e as intervenções com essas famílias
constantemente. Que autorizam o Estado a tomar certos corpos como problema e, a buscarem
saberes/poderes que lhe anestesiem e lhes incorporem outro modo de ser. A audiência de Maria,
que foi descrita parcialmente acima, ainda, contou com uma intervenção extremamente
ortopédica.
A excelentíssima senhora Juíza “prescreveu” terapia cognitivo
comportamental (TCC) para a Requerida, alegando que a problemática eram
os comportamentos e os hábitos inadequados da Mulher, explicando para mim
que diante da compreensão dela, enquanto juíza, como o problema se tratava
de um desvio de conduta da Mulher que não se fazia mãe exemplar, era com
a TCC que o enquadramento daquela Mulher seria feito e o problema, enfim,
resolvido. Como eu sabia que nada disso fazia sentido, e o problema iria
postergar mais e mais, sorri de deboche, ouvi as explicações e, me recolhi à
minha despontencialização frente aos lugares de poder ali institucionalmente
compostos. O ofício para a Secretaria da Saúde foi então expedido solicitando
TCC para aquela Mulher “problemática”, mas como já era de se esperar não
houve adesão por parte da Mulher (DIÁRIO DE CAMPO, 2020).
Tomar os comportamentos e os hábitos de Maria como
O
problema
é a resposta mais
neoliberal que o Estado pode dar-se. É individualizar a questão social naquele corpo desfocado
das insígnias civilizadas e progressistas de mãe e família. Mandar aquele corpo para terapia na
abordagem TCC, para que os comportamentos e os hábitos sejam modificados, é tomar a
própria psicologia como lugar de enquadramento; é tratar um sujeito, que não sabe o que é
terapia, como um objeto abjeto, sem vontade, sem potência, sem vida. Todavia:
Compreende-se a oportunidade do psicologismo nesse terreno, sua aptidão
para substituir o jurídico na coordenação das atividades normalizadoras... O
psiquiatra-psicanalista controla, para isso, o exercício do trabalho social; não
intervém diretamente, já que a demanda das famílias é monopolizada por
preocupações materiais e porque o encargo implica uma parte de coerção
direta. Mas, ao mesmo tempo, ele designa o limiar, a partir do qual, a família
pode funcionar como instância contratual (DONZELOT, 1980, p. 131).
Assim sendo, ver-se como linhas duras (DELEUZE; PARNET, 1998), produzidas pelos
poderes/saberes que edificam a biopolítica, produzem certos corpos. Linhas estas que são as
próprias propulsoras para a produção dos especialismos que geraram os trabalhadores sociais.
É, assim, que populações se mantêm sob certos processos socioeconômicos. É assim, que o
fazer viver e o deixar morrer se atualizam constantemente.
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Considerações finais
Esta escrita, assim, a qual buscou problematizar o fazer em políticas públicas com
mulheres vítimas de violações de direitos, através das práticas de uma psicóloga de um CREAS,
com a metodologia da cartografia, traçando linhas biopolíticas que produzem essas mulheres
enquanto objeto de políticas, caminhou com autores como Foucault (1979, 2005, 2008a), com
quem se trabalhou os conceitos de dispositivo, o qual embasou o próprio modo cartográfico,
uma vez que, segundo Deleuze (1990) desenredar um dispositivo é traçar um mapa; de
biopolítica, o qual nos diz de tecnologias de governamentalidade que tomam os sujeitos
enquanto homem-espécie; discussões que se ampliaram com Donzelot (1980), com quem o
conceito de moralidade econômica dialogou com o de biopolítica, ao apontar como todo um
referencial econômico se instaura pelas relações sociais. Referencial este que oportuniza ao
próprio Estado, o poder de adentrar as casas e as vidas das pessoas. Discussão trazida no tópico
1 (Mulher: dispositivo biopolítico por entre políticas públicas), que contou com dois subtópicos
que buscaram por meio das práticas da psicóloga, descritas em diários de campo, apontar
intervenções com as famílias, como visitas domiciliares e reuniões grupais, e, com outros
equipamentos e redes, por meio das audiências e reuniões com a rede, de modo a dialogar com
as tecnologias biopolíticas.
Com o fazer com as famílias viram-se como as visitas domiciliares podem servir
enquanto espaço, também de inquérito, no qual as equipes atuam como porta voz de um modelo
policialesco, oriundo, principalmente, dos próprios atravessamentos jurídicos, que se dá com a
tomada dessas famílias, por suas ulheres/mães negligentes, produzidas enquanto um dos
principais mecanismos de governamentalidade biopolítica. O modo como as visitas se dão,
consoante com o próprio modo como as famílias e a equipe se posicionam, apresentam como a
economia de um modelo de Estado se permite moralizar com os saberes erigidos,
especialmente, nos especialismos que se pautam em discursos de direitos para uma sociedade
civilizada e progressista.
No fazer com a Rede, com outros equipamentos, viu-se como nas audiências são
instados espaços de um poder tão amorfo às vidas que estão atravessando, de modo tão
organizado com os saberes. Viu-se como o uso dos saberes foi erigido na linha dura de produção
biopolítica.
Viram-se, também, como espaços de falas e discussões com as famílias podem
potencializar resistências. E o quanto o trabalho social, de políticas que se fizeram ortopedia de
uma massa social é espaço de linhas outras, de processos também de problematização da própria
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vida. E é, aqui, que pode caber aos trabalhadores sociais, sejam os da Assistência Social, sejam
os da saúde, ou os da Educação, que pensar e repensar seu lugar dentro do emaranhando
contemporâneo estatal é pensar sua função e, abrir brechas para outras práticas, para outros
lugares e, assim outros sujeitos, que possam ser vivenciados em suas vidas como produtores
delas. É compreender que não há uma subversão completa do seu lugar, mas que há como
tencionar o seu fazer, haja vista que,
Quando um trabalhador de saúde se encontra com um usuário, no interior de
um processo de trabalho, em particular clinicamente dirigido para a produção
dos atos de cuidar, estabelece-se entre eles um espaço intercessor que sempre
existirá nos seus encontros, mas só nos seus encontros, e em ato (MERYH,
2002, p. 57).
REFERÊNCIAS
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: AGAMBEN, G.
O que é o contemporâneo?
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DELEUZE, G. Que és un dispositivo?
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Tradução: Wanderson Flor do Nascimento. Barcelona: Gedisa, 1990.
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Como referenciar este artigo
RODRIGUES, A. M. P.; ZOBOLI, F. A categoria “Mulher” como dispositivo biopolítico de
Educação do Corpo.
Revista on line de Política e Gestão Educacional
, Araraquara, v. 26, n.
00, e022131, jan./dez. 2022. e-ISSN: 1519-9029. DOI:
https://doi.org/10.22633/rpge.v26i00.16805
Submetido em
: 21/04/2022
Revisões requeridas em
: 09/06/2022
Aprovado em
: 11/08/2022
Publicado em
: 30/09/2022
Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.
Revisão, formatação, normalização e tradução.
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