O “LUGAR” DO LIBERALISMO NO BRASIL DO SÉCULO XIX


EL "LUGAR" DEL LIBERALISMO EN EL BRASIL DEL SIGLO XIX THE “PLACE” OF LIBERALISM IN BRAZIL OF THE 19TH CENTURY


Lucas Flôres VASQUES1


RESUMO: O “lugar” do liberalismo no Brasil do século XIX é alvo de grandes debates na filosofia política (RICUPERO, 2007). Assim, temos como objetivo mapear esse debate e fornecer uma síntese dessas posições. Para isso, faremos, primeiro, um retorno ao contexto de surgimento do liberalismo na Inglaterra e, posteriormente, avançaremos para seus princípios filosóficos em John Locke. Em seguida, demonstraremos como esses princípios filosóficos foram interpretados no Brasil em três posições: primeiro como “ideia fora do lugar” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), segundo como “uma ideia tende a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e terceiro como uma “ideia que está em seu devido lugar” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


PALAVRAS-CHAVE: Liberalismo. Filosofia política. Liberdades. Século XIX.


RESUMEN: El “lugar” del liberalismo en el Brasil del siglo XIX es objeto de grandes debates en filosofía política (RICUPERO, 2007). Por lo tanto, nuestro objetivo es trazar un mapa de este debate y ofrecer una síntesis de estas posiciones. Para ello, primero haremos un retorno al contexto de la irrupción del liberalismo en Inglaterra y, posteriormente, avanzaremos a sus principios filosóficos en John Locke. Luego, demostraremos cómo estos principios filosóficos fueron interpretados en Brasil en tres posiciones: primero como “idea fuera de lugar” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), segundo como “una idea tiende a encontrar su lugar” (COUTINHO, 2000) y tercero como una “idea que está en su debido lugar” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


PALABRAS CLAVE: Liberalismo. Filosofía política. Libertades. Siglo XIX.


ABSTRACT: The “place” of liberalism in Brazil of the 19th century had been the subject of major debates in the Social Sciences. Thus, we aim to map this debate and provide a summary of these positions. To do this, we will first make a return to the context of the emergence of liberalism in England, then we will advance to its philosophical principles in John Locke. Then, we will demonstrate how these philosophical principles were interpreted in Brazil in three positions: First as an “idea out of place” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), second as “an idea tends to find its place” (COUTINHO, 2000) and third as an “idea that is in its right place” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


KEYWORDS: Liberalism. Political philosophy. Freedom. 19th century.


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1 Universidade Estadual Paulista (UNESP), Araraquara – SP – Brasil. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1124-8506. E-mail: lucas.vasques@unesp.br

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Introdução


Segundo Raymundo Faoro (1987), o pensamento político não pode ser resumido à filosofia política, ciência política ou ideologia. O pensamento político, assim, é dotado de uma existência própria, autônoma. Desse modo, reduzir o pensamento político a uma mera filosofia política leva a uma desfiguração da própria história, bem como a um descolamento da realidade. As filosofias políticas, tal como o liberalismo, representam uma ferramenta teleológica, um objetivo abstrato a ser perseguido. Já o pensamento político é a sua materialização. Faoro (1987, p. 15) afirma que “O pensamento político está dentro da experiência política, incorporado à ação, fixando-se em muitas abreviaturas, em corpos teóricos, instituições e leis”.

O objetivo do presente artigo o objetivo do presente artigo é compreender como o debate em torno da filosofia política do liberalismo inglês se estrutura enquanto pensamento político no Brasil no século XIX2. Para esse objetivo, o presente artigo é composto por duas partes. Na primeira parte faremos um retorno para entender o contexto de formação do liberalismo inglês. Superada essa questão, avançaremos para a compreensão dos princípios da filosofia política liberal através dos escritos de John Locke (1994). Introduzido seu contexto e princípios, verificaremos como a filosofia política liberal no Brasil é interpretada e debatida.

Com esse objetivo, o texto mais conhecido e amplamente referenciado, é o de Bernardo Ricupero (2007), intitulado Da formação à forma: Ainda as “idéias fora do lugar”. Todavia, tal texto não é capaz de fornecer um panorama geral dos debates acerca do tema ao excluir a posição de Marco Aurélio Nogueira (1976) acerca do tema. Além disso, o texto de Ricupero (2007) divide as posições acerca do tema em dois eixos opostos: “As ideias fora do lugar” (SCHWARZ, 2000) e “As ideias estão no seu devido lugar” (BOSI, 2010; COUTINHO, 2000; FRANCO, 1976), simplificando a posição adotada por Carlos Nelson Coutinho (2000). Como demonstraremos a seguir, a posição de Coutinho (2000) nesse debate não deve ser simplificada no chavão “As ideias estão em seu lugar” sob risco de essencializar


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2 Tratamos do liberalismo inglês apenas como uma forma de recorte teórico e empírico. Afinal, se considerarmos o liberalismo em sua versão francesa, o liberalismo doutrinário, os termos de debate se complexificam. Afinal, se considerarmos a atuação de pensadores como José Bonifácio de Andrada e Silva, verificaremos que sua trajetória filosófica e política fora marcada pela contestação da escravidão. Escravidão essa, que fora argumento de contestação do “lugar” do liberalismo no século XIX, como veremos à frente. José Bonifácio de Andrada e Silva teve suas ideias liberais sempre em atrito com a sociedade brasileira escravocrata e senhorial. Profundamente influenciado pelas teses de John Locke, empenhou-se na abolição gradual da escravidão na expansão do ensino básico e secundário e defendeu, também, a expansão do país para o interior do continente. Propôs a integração do índio à sociedade civil, também com a miscigenação como um fato de integração e de identidade nacional. Este intelectual se consagra como grande inspirador da busca por uma identidade nacional, inspirando debates até três séculos depois de escrever suas teses. Defensor do Estado centralizado, influenciou a independência do Brasil.

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a discussão e passar a falsa impressão de que se trata de uma discussão linear, composta apenas de duas posições binárias.

Para constituir uma leitura sistemática dessa discussão, destacamos que não existem apenas duas posições binárias no debate, mas na realidade três vertentes que marcam posições diferentes sobre o liberalismo no Brasil: 1) “As ideias fora do lugar” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976); 2) “As ideias tendem a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e 3) “As ideias estão em seu devido lugar” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010). Com intuito de compreender como se constitui essa problemática, avançaremos primeiro ao contexto de construção do liberalismo.


O contexto de surgimento do liberalismo


O contexto de surgimento do pensamento liberal remete ao século XVII nas disputas dos absolutistas com a burguesia ascendente. Soma-se a essa disputa, católicos, anglicanos, presbiterianos e puritanos também lutavam pela hegemonia religiosa na Inglaterra. Esse quadro político e social culminaria em 1640 em um conflito armado entre as forças militares do rei Carlos I e o parlamento inglês. Denominada de Revolução Puritana, a batalha terminou com a vitória dos parlamentaristas e a execução de Carlos I.

Assim, após um regicídio, instaurou-se o governo republicano de Oliver Cromwell (1599-1658), cujos excessos e opressões embasaram Thomas Hobbes (1588-1679) na escrita, em 1651, de O Leviatã. A ditadura de Oliver Cromwell (1599-1658) prosperou militarmente e comercialmente até sua morte em 1958. Como seu sucessor, seu filho Richard Cromwell não teve o mesmo sucesso, sendo deposto com apenas 18 meses de governo. Sua deposição mergulhou a Inglaterra novamente em uma crise política e social que terminaria em uma guerra civil, cujo resultado foi o retorno da monarquia Stuart ao poder. Nesse período, ocorreu o retorno das tensões entre Coroa e Parlamento, na medida em que o último era contrário as tomadas de posição pró-católica dos absolutistas Stuart.

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O retorno da monarquia ao poder só aconteceu com a coroação de Carlos II (1630- 1685), que aceitou a prerrogativa dos parlamentaristas de ter seus poderes reduzidos. Todavia, por adotar posições favoráveis a liberdade religiosa, o rei entrou em choque com o parlamento, levando a dissolução do último em 1681. O reinado de Carlos II durou até sua morte, em 1685, quando pela ausência de um herdeiro, foi sucedido por seu irmão, Jaime II (1633-1701).

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A exemplo de seu irmão, Jaime II demonstrava inclinações pelo exercício pleno do absolutismo. Essas inclinações de Jaime, levaria a uma união de políticos ingleses, dos mais diversos espectros políticos, como uma forma de retirá-lo do poder. Com a intenção de concretizar esse plano, políticos ingleses conspiram com Guilherme III (1650-1702), príncipe de Orange. Em 1688 o parlamento coroa Guilherme como rei da Inglaterra, sem derramamento de sangue, após a fuga de Jaime II para França. Sobre a alcunha de Revolução Gloriosa, esse período histórico demarcava o triunfo de um conjunto de ideias e práticas políticas que receberiam o nome de liberalismo, através de seu maior expoente, John Locke (1632-1704).


John Locke, o fundador do liberalismo


John Locke (1632-1704), opositor da monarquia Stuart, é exilado e retorna a Inglaterra somente com a concretização da Revolução Gloriosa. Nesse interim, foi publicado O segundo tratado (LOCKE, 1994) como justificação e legitimação da Revolução Gloriosa. A base dessa defesa foi o direito à resistência, em que o povo poderia resistir ao soberano caso julgasse necessário. Seu retorno para Inglaterra ocorre sobre o clamor e reconhecimento do rei Guilherme de Orange (WEFFORT, 2001).

Para compreender o liberalismo para além de seu contexto histórico, faremos uma incursão através de suas principais concepções filosóficas: lei natural, estado de natureza, propriedade privada, dinheiro, estado de guerra, contrato, sociedade política e governo (VARNAGY, 2006). A concepção de John Locke de lei natural consiste na crença de que certas leis da natureza também governam e que podem ser desvendadas com o uso da razão. Com isso, para o autor existiria uma racionalidade inscrita no coração dos homens. Tal racionalidade, seria inculcada nos homens através das ações próprias de um Deus, na medida em que cumpririam o propósito do discernimento entre o bem e o mal, enquanto um instinto de preservação da própria vida, liberdade e propriedade, direitos irrenunciáveis (LOCKE, 1994).

Embora a lei natural é constituída por um imperativo político que não cessa com a formação da sociedade. Pelo contrário, na perspectiva de Locke (1994), tornar-se-á mais rigorosa pela ação do direito e das leis. Assim, as leis naturais seriam dotadas de um poder coercitivo para com aqueles que a infringem.

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Já o estado de natureza no liberalismo de John Locke é um imperativo filosófico para se pensar o estado natural dos seres humanos. Assim, para Locke (1994), os seres humanos,

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enquanto uma criação divina, viveriam em um estado primeiro de perfeita igualdade e liberdade natural. Nesse estado, toda subordinação e vassalagem não existiria, sendo os seres humanos submetidos apenas a força das leis naturais, sem a existência do direito.

Outro princípio importante do liberalismo é a noção de propriedade privada. Segundo Varnagy (2006, p. 60), a noção de propriedade privada em Locke é polissêmica: “[...] em sentido amplo e geral, implica “vida, liberdade e terra” (II, 87, 123, 173) e, num sentido mais estrito, bens, o direito à herança, e a capacidade de acumular riquezas”. Para tanto, a propriedade em Locke (1994) não é ilimitada, pois para ele a posse depende intimamente da quantidade de trabalho depositada no objeto ou local. Assim, o autor (LOCKE, 1994) vincula o trabalho ao valor de determinado objeto. Quanto mais trabalho é realizado - este limitado pelas capacidades individuais - maior o é valor do produto.

Na questão do dinheiro, Locke (1994) argumenta que graças à sua criação, os homens conseguiram criar além de sua própria subsistência. Assim, os homens conseguiram acumular suas posses e seu próprio excedente. Para isso, o dinheiro torna-se um instrumento durável que o homem poderia guardar sem o risco temporal de seu apodrecimento, tal como os alimentos produzidos em suas terras. Isso se deve, também, ao pacto aceito tacitamente que garantiu ao dinheiro esse status.

Como consequência desse processo, houve um acúmulo e concentração de bens e terras. Na medida em que a sociedade comercial se complexifica, começam a existir conflitos pela posse de bens que resultará no fim do estado de natureza. Como resultado desse processo, fara-se necessário a construção do direito, das leis e do próprio Estado, como um meio de regulação de conflitos. Desse modo, o Estado em Locke (1994), além de garantir a posse de propriedade, deve ser responsável pela penalização dos indivíduos que transgridam as leis. Desse modo, Tomas Varnagy (2006) propõe uma divisão do estado de natureza de John Locke em duas etapas: a primeira, referente a propriedade limitada, baseada no trabalho e a segunda, da propriedade ilimitada, mediada pela existência do dinheiro:


É possível então estabelecer períodos referentes ao estado de natureza, no qual há sociedade e reina a lei natural, em duas etapas: na primeira, a propriedade é limitada pelo trabalho e a vida é agradável e aprazível; na segunda, que surge com o aparecimento do dinheiro, dá-se tanto a possibilidade de acumulação ilimitada quanto a desigualdade em relação às posses (VARNAGY, 2006, p. 63).


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Apesar desse estado de natureza pacífico e harmonioso, surge a necessidade de homens se organizarem em sociedade. Assim, com os problemas decorrentes do surgimento

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do dinheiro, os homens se organizam em um governo civil como uma forma de proteção mútua, com a segurança de suas vidas, bens e propriedades.


Em síntese, o propósito principal da sociedade política é proteger os direitos de propriedade em sentido amplo, ou seja, a vida, a liberdade e os bens. Como esses direitos existem antes da constituição da sociedade e inclusive na própria sociedade política, não pode haver nenhum direito a impor, por exemplo, impostos sem o consentimento de seus membros (VARNAGY, 2006, p. 68).


Como consequência, segundo Locke (1994), os homens entram em um governo civil para se protegerem e protegerem seus bens. Todavia, sempre que um legislador ou governante se voltar contra os interesses dos homens e violar suas propriedades, o povo teria o chamado “direito de resistência”. Na medida em que se esvazia a confiança no legislador, os cidadãos poderiam, em comum acordo, dissolver sua autoridade.

Somados todos esses princípios, como sintetizar o liberalismo? Thomas Varnagy (2006) afirma que essa seria uma tarefa extremamente árdua. Todavia, em um sentido amplo, liberalismo significa enfatizar as liberdades individuais frente às sanções externas. Assim, ser liberal, em sentido amplo na filosofia política, significa enfrentar todas as formas que buscam retirar dos indivíduos suas liberdades.


Como definir o liberalismo? (...). Num sentido amplo, enfatiza a liberdade do indivíduo diante das restrições externas (Igreja, Estado, tradições, sociedade). Nos séculos XVIII e XIX, baseava-se na idéia do livre mercado e procurava limitar os poderes do governo através de mecanismos tais como o federalismo e a separação de poderes, embora não implicasse necessariamente a democracia (VARNAGY, 2006, p. 77).


A despeito dessa dificuldade em se definir o termo “liberalismo”, essa filosofia política acabou por ser lida no Brasil sobre três eixos de interpretação, no primeiro como uma “ideia fora do lugar” (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000), segundo como uma “ideia que tende a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e, por fim, como uma “ideia que está em seu devido lugar” (BOSI, 2010; FRANCO, 1976).


As ideias fora do lugar


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Roberto Schwarz, em sua tese sobre “as ideias fora do lugar”, na obra Ao Vencedor as Batatas (2000), busca demonstrar quais são as relações entre o liberalismo, filosofia, e seu pensamento político no Brasil. Nela, Schwarz demonstra que há uma lacuna entre teoria e prática no Brasil. Essa lacuna é mediada pela prática do favor. Através da prática do favor,

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toda a estrutura social, política e econômica essencializa-se na figura das elites locais. Assim, a prática política torna-se um instrumento de defesa e perpetuação de interesses pessoais.

O substrato dessa prática política, segundo Schwarz, foi a filosofia liberal. Ao lado do liberalismo, o romance, o sistema parlamentar e as normais jurídicas foram “emprestados de países centrais como forma de “civilizar-se” (RICUPERO, 2008). Ou seja, foram ideias retiradas de seu local de origem, países centrais, e utilizadas em países periféricos, distante de suas condições sociais de produção. Isso resultou em um processo de descolamento de suas práticas primeiras:


Schwarz indica, em outras palavras, que países periféricos, como o Brasil, teriam que tomar emprestado de países centrais formas, como o romance, o sistema parlamentar, as normas jurídicas e tudo mais que os tornassem “civilizados” (Arantes, 1992; Palti, 2007). No entanto, suas condições sociais teriam pouco em comum com as que produziram originalmente essas formas, o que faria com que sofressem “torção”, tornando-se praticamente irreconhecíveis (RICUPERO, 2008, p. 64-65).


Assim, segundo Schwarz (2012), a ideologia liberal assume seu posto de “ideia fora do lugar” em sua prática política no Brasil. Apesar de impulsionar a libertação das colônias em toda América, o liberalismo no Brasil serviu, paradoxalmente, para preservar o legado da escravidão e do monopólio da terra nas mãos dos latifundiários. Afinal, no Brasil, em meados do século XIX, o trabalho escravo e, em especial, o tráfico negreiro, prosperaram como uma forma de organização social. Destaca-se, sobre inspiração liberal, o processo de independência brasileira à metrópole portuguesa. Para Vivaldo Daglione (1961), o liberalismo no Brasil Império tomou para si roupagens aristocráticas, onde travou-se uma batalha política com a burguesia mercantil. Esse processo culminou em 1823 com a constituinte, sob a promessa de uma “nova constituição duplamente liberal”.

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Schwarz (2000) coloca que a ideologia liberal serviu na Europa como uma forma de encobrir a exploração do trabalho sobre as ideias de liberdade de trabalho e igualdade jurídica. Todavia, no Brasil, essa exploração era mais explícita, calcada na escravidão e no tráfico negreiro. Um dos maiores exemplos disso foi a constituição de 1824 que, apesar de se colocar como uma constituição liberal, mantinha a escravidão. Desse modo, o autor argumenta que a predominância do pensamento liberal no comércio internacional ecoou no Brasil, fazendo sua burguesia se assentar sob um raciocínio econômico que visa o lucro. Somado a isso, segundo o autor (SCHWARZ, 2000) a independência brasileira também fora baseada em ideais liberais. Toda essa conjuntura acabou se chocando com o modo de produção escravagista e,

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em especial, aos proprietários de escravizados, os latifundiários e a elite agrária (SCHWARZ, 2000).

Essa relação ambígua ou arlequinal entre liberalismo e prática política serviu para produzir três classes: o latifundiário, o escravizado e o homem livre. Sendo o último inteiramente dependente dos gestos do primeiro. Afinal, se a relação entre latifundiário e escravizado era mediada pela noção de propriedade, do latifundiário e do homem livre era o “favor”. Portanto, o “favor” prevalece como uma mediação que assegura às suas partes a não escravização.


[...] o favor assegurava às duas partes, em especial à mais fraca, de que nenhuma é escrava. Mesmo o mais miserável dos favorecidos via reconhecida nele, no favor, a sua livre pessoa, o que transformava prestação e contraprestação, por modestas que fossem, numa cerimônia de superioridade social, valiosas em si mesma (SCHWARZ, 2000, p. 8).


O “favor” coloca-se enquanto um mecanismo de reprodução das classes dos homens livres e dos proprietários. Uma mediação relacional cuja explicitação na dependência da pessoa e na remuneração de serviços pessoais. Para tanto, as classes incompatíveis, ou melhor, produtivamente antagônicas, de proprietários e homens livres, acordam tacitamente em cooperar para benefício mútuo. Essa cooperação vem para assegurar para ambas as partes que nenhuma delas é escrava e, portanto, privada de suas liberdades. Para Scharwz (2000), até mesmo o “mais miserável dos favorecidos” vê no favor o reconhecimento de suas liberdades, de sua pessoa.

Outro cientista a considerar o liberalismo como “ideia fora do lugar” fora Marco Aurélio Nogueira (1976), estudando a figura histórica de Joaquim Nabuco. Nesse estudo, defende que liberalismo no Brasil sempre foi muito vazio de inspirações igualitárias. Dessa forma, ainda segundo Nogueira, o liberalismo no Brasil é mais uma liberdade de nação do que uma liberdade do indivíduo. O liberalismo, portanto, assume-se como uma prática política contraditória, que não foi capaz de encontrar na colônia, bases sociais, políticas e econômicas para sua plena realização.


As ideias tendem a encontrar seu lugar


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Já Carlos Nelson Coutinho assume uma posição intermediária no debate. Para ele, o liberalismo em dado momento fora uma ideia fora do lugar no Brasil, porém com o processo de modernização capitalista, ele tenderia a “encontrar seu lugar”. Para compreender essa posição, devemos fazer um retorno teórico a sua obra Cultura e Sociedade no Brasil (2000),

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Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238

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que destaca a existência de um intimismo à sombra do poder no Brasil. Tal ideia, postulada por Georg Lukács (1972), demonstra a existência de uma forte atração entre os intelectuais e o Estado, tendo o Estado como promotor das transformações sociais. Dessa forma, Lukács (1972) identifica uma revolução conservadora, feita de cima para baixo, sem a participação popular e com forte atração ao autoritarismo, caracterizando uma modernização por “via prussiana3” ou de caráter “intimista”.


[...] as transformações ocorridas em nossa história não resultaram de autênticas revoluções, de movimentos provenientes de baixo para cima, envolvendo o conjunto da população, mas se processaram sempre através de uma conciliação entre os representantes dos grupos opositores economicamente dominantes, conciliação que se expressa sob a figura política de reformas “pelo alto” (COUTINHO, 2000, p. 50).


Ao operacionalizar tal conceito, utilizando também a noção de “revolução passiva” de Gramsci, Coutinho faz uma análise do “lugar das ideias” no Brasil e, em especial, do papel dos intelectuais nesse processo. Aponta que as revoluções modernizadoras no Brasil assumiram um caráter passivo em que os intelectuais foram cooptados para realizá-las. Desse modo, através da conciliação entre frações das classes dominantes, com a conservação do latifúndio e a manutenção da dependência ao capital internacional, as camadas populares se viram excluídas das decisões políticas tomadas no Brasil, através de um processo denominado “revolução passiva” (COUTINHO, 1980).

Em suma, Coutinho (1980) demonstra que existe no Brasil um cooptação dos intelectuais pela elite para construção de uma revolução passiva. Para tanto, os intelectuais se colocaram de forma “íntima ao poder” das elites e do Estado. Na medida em que esse processo “intimista” avança, a modernização capitalista, impulsionando e sendo impulsionada por um desenvolvimento prussiano, acaba por colocar as ideias no seu “devido lugar”. Ou seja, na medida em que o processo de cooptação dos intelectuais e do desenvolvimento capitalista avança, a sociedade vai se tornando mais aderente às realidades e aos interesses de classe que tentam expressar.

Para Coutinho, conquanto o processo de modernização avança, mais parecida a sociedade brasileira fica à sociedade capitalista geral, tendo maior sensibilidade às ideias lá formuladas e aqui importadas. Portanto, seguindo a perspectiva do autor, o liberalismo tende a


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3 O conceito de “via prussiana” fora formulado por Lenin e utilizado tanto por Lukács e Coutinho, expressa, para Vladmir Lenin, o processo de modernização “pelo alto” ocorrido na Alemanha, Itália e o Japão. Para conhecer mais sobre o assunto ler Cultura e Sociedade no Brasil, capítulo II, de Carlos Nelson Coutinho, publicado em 2000 pela editora DP&A.


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Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238

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se tornar uma “ideia no lugar” no Brasil na medida em que o processo intimista de modernização capitalista avança.

Diferentemente da posição a seguir, adotada por Franco (1976) e Bosi (2010), Coutinho (1980) coloca uma dimensão temporal e processual na questão do liberalismo como ideia “em seu lugar”. Entretanto, enquanto Franco (1976) e Bosi (2010) colocam o liberalismo como uma ideia “fixa” que independe do tempo e “lugar”, Coutinho (1980) demonstra as relações “intimas” entre a ideia de liberalismo e o processo de modernização das elites brasileiras, bem como o papel central dos intelectuais nesse processo. Na medida em que esse processo avança, o liberalismo “tende a encontrar seu devido lugar” no desenvolvimento do capitalismo.


As ideias estão em seu devido lugar


Maria Sylvia de Carvalho Franco, partindo de uma perspectiva marxista em seu artigo As idéias estão em seu lugar (1976), defende que tanto em países de periferia quanto centro fazem parte da mesma ordem, ou seja, do mesmo sistema de produção, que tem por objetivo primordial, gerar lucro, ou seja, extrair a mais-valia do trabalho. Todavia, Carvalho Franco afirma que o liberalismo é o mesmo, tanto no Brasil quanto na Europa, adequando-se a uma lógica mundial de acumulação de capital. A integração do Brasil em uma lógica mundial, segundo a autora, nada tem de um liberalismo enquanto “ideia fora do lugar”.

A exemplo de Carvalho Franco, Alfredo Bosi na obra Ideologia e Contra ideologia (2010), aponta que o liberalismo nunca foi “uma ideia fora do lugar” tanto no Brasil, como em qualquer outro país, seja periférico ou não. Sua análise parte do pressuposto de que na primeira metade do século XIX, a ideologia liberal foi hegemônica em todo Ocidente, explorando tanto o trabalhador das colônias (escravizado) ou das metrópoles. Ou seja, para o autor, o capitalismo explorou a mais-valia do trabalho em suas mais diversas expressões nesses lugares. Seja em ritmo ou local diferentes, “Velho Continente” ou “Novo Mundo”, experimentaram a exploração capitalista impulsionada pelo liberalismo.


Considerações finais


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Finalmente, nosso percurso metodológico consistiu em visitar o contexto histórico de emergência da filosofia liberal na Inglaterra. Nele, entendemos como em um momento na Inglaterra, em um contexto específico, a exaltação e a defesa das liberdades individuais

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resultaram em um processo de constituição de uma filosofia política que permanece como uma construção teleológica buscada pelas mais diversas democracias republicanas espalhadas pelo mundo.

Com a tomada do poder por Guilherme de Orange, o pensador político John Locke pôde retornar a Inglaterra após exílio na Holanda. Com isso, conseguiu concluir a redação de suas obras que serviriam de apoio à interpretação do liberalismo. Em um movimento de exaltação de defesa das liberdades individuais, do respeito à pessoa e a propriedade, o liberalismo enquanto uma filosofia política se espalhou por uma gama variada de países no século XIX, chegando até mesmo nos países periféricos, como o Brasil.

Essa chegada no Brasil é interpretada das mais diversas formas, seja como uma “ideia fora do lugar” (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000) ou “uma ideia que tende a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e até mesmo como “uma ideia que está em seu devido lugar” (BOSI, 2010; FRANCO, 1976). Tal polêmica, destrinchada anteriormente nesse artigo, movimentou o cenário intelectual brasileiro nas últimas décadas. O fato é que tais visões se distinguem em três eixos teóricos, aqueles tais como Roberto Schwarz (2000) e Marco Aurélio Nogueira (1976), que consideram o liberalismo enquanto uma filosofia política inglesa (logos) que não encontrou no Brasil as mesmas condições sociais para realizar-se tal como encontrou na Inglaterra. Assim, sua praxis fora arlequinal e incompleta, fazendo uso apenas de aspectos convenientes às elites.

O segundo eixo teórico de interpretação é baseado em Maria Sylvia de Carvalho Franco e Alfredo Bosi, segundo qual consideram o liberalismo apenas em prática política. Ou seja, independente do seu local original e condições específicas de produção, ele seria o mesmo em sua prática (praxis). Afinal, todos integramos o mesmo modelo de produção, o capitalismo.

A terceira via, representada por Carlos Nelson Coutinho, trabalha em um meio termo, oscila na compreensão do liberalismo entre as duas perspectivas anteriores. Considera que o liberalismo, apesar de estar descolado de seu contexto primeiro inglês, tenderia a colocar-se no Brasil, na medida em que se desenvolve, como uma “ideia no lugar”.

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Compreendendo esses três eixos de interpretação, como nos propomos, através da análise de Raymundo Faoro (1987) sobre o pensamento político, entendemos o liberalismo como um logos capaz de fornecer orientação teleológicas para a prática (praxis) do pensamento político. Assim, o liberalismo seria um sistema nomoempírico de filosofia política, surgido na Inglaterra através da prática (praxis) política da sociedade inglesa, imersa em contexto político, cultural e econômico específicos. Afinal, se na Inglaterra, a praxis política precedeu o exercício filosófico de sistematização escrita, no Brasil o logos fora

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enviado de uma forma que serviu, através da prática do favor e da escravização, como instrumento de concentração de poder político e econômico nas mãos das elites.

A segunda via teórica, expressa por Maria Sylvia de Carvalho Franco e Alfredo Bosi, apesar de fornecerem uma interpretação macroestrutural do sistema capitalista, coloca o liberalismo como o mesmo produto em termos de filosofia política (logos) e prática política (praxis). Assim, essencializa-se a filosofia política como subproduto do pensamento político (práxis) de outro contexto histórico (brasileiro século XIX), político e econômico, em detrimento daquele expresso na Inglaterra do século XVIII.

Roberto Schwarz (2012) também respondeu às considerações realizadas pelo Franco e Bosi sobre sua teoria das “ideias fora do lugar”. Para o autor, seus críticos acabaram por se embasar em dicotomias inexistentes em suas obras, como se por objetivar que o liberalismo se formou enquanto uma filosofia política, estivesse negligenciando sua praxis no Brasil. Ainda assim, Schwarz (idem) afirma que as ideias podem sim ainda estarem “fora do lugar”, mesmo servindo ao propósito da exploração capitalista, enquadrada numa lógica global do sistema de produção capitalista.

Em suma, esse artigo contribui com a discussão acerca do debate do “lugar” das ideias liberais no Brasil na medida em que se distancia da sistematização proposta por Bernardo Ricupero (2007) sobre uma primeira posição intitulada As ideias fora do lugar (SCHWARZ, 2000) e sua crítica As ideias estão no seu devido lugar (BOSI, 2010; COUTINHO, 2000; FRANCO, 1976). Na tentativa de superar essa visão dicotômica do debate, sistematizamos o “lugar” do liberalismo no Brasil em três posições distintas, das quais a primeira posição seria “As ideias fora do lugar” (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000), a segunda em que “As ideias tendem a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e, por fim, “as ideias estão em seu devido lugar” (BOSI, 2010; FRANCO, 1976).


AGRADECIMENTOS: Agradeço à FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) pelo apoio.


REFERÊNCIAS


BOSI, A. O Pano de Fundo Ideológico: O liberalismo excludente. In: Ideologia e contraideologia: temas e variações. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.


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CARVALHO, M. As ideias estão no lugar. Cadernos de Debate, v. 1, p. 61-64, 1976.

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COUTINHO, C. Cultura e Sociedade no Brasil: ensaio sobre idéias e formas. Rio de Janeiro: DP&A, 2000.


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Como referenciar este artigo


VASQUES, L. F. O “lugar” do liberalismo no Brasil do século XIX. Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238. DOI: https://doi.org/10.29373/sas.v10i00.15186


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Submetido em: 09/05/2021 Aprovado em: 07/06/2021 Publicado em: 30/06/2021

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THE “PLACE” OF LIBERALISM IN BRAZIL OF THE 19TH CENTURY O “LUGAR” DO LIBERALISMO NO BRASIL DO SÉCULO XIX

EL "LUGAR" DEL LIBERALISMO EN EL BRASIL DEL SIGLO XIX


Lucas Flôres VASQUES1


ABSTRACT: The “place” of liberalism in Brazil of the 19th century had been the subject of major debates in the Social Sciences. Thus, we aim to map this debate and provide a summary of these positions. To do this, we will first make a return to the context of the emergence of liberalism in England, then we will advance to its philosophical principles in John Locke. Then, we will demonstrate how these philosophical principles were interpreted in Brazil in three positions: First as an “idea out of place” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), second as “an idea tends to find its place” (COUTINHO, 2000) and third as an “idea that is in its right place” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


KEYWORDS: Liberalism. Political philosophy. Freedom. 19th century.


RESUMO: O “lugar” do liberalismo no Brasil do século XIX é alvo de grandes debates na filosofia política (RICUPERO, 2007). Assim, temos como objetivo mapear esse debate e fornecer uma síntese dessas posições. Para isso, faremos, primeiro, um retorno ao contexto de surgimento do liberalismo na Inglaterra e, posteriormente, avançaremos para seus princípios filosóficos em John Locke. Em seguida, demonstraremos como esses princípios filosóficos foram interpretados no Brasil em três posições: primeiro como “ideia fora do lugar” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), segundo como “uma ideia tende a encontrar seu lugar” (COUTINHO, 2000) e terceiro como uma “ideia que está em seu devido lugar” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


PALAVRAS-CHAVE: Liberalismo. Filosofia política. Liberdades. Século XIX.


RESUMEN: El “lugar” del liberalismo en el Brasil del siglo XIX es objeto de grandes debates en filosofía política (RICUPERO, 2007). Por lo tanto, nuestro objetivo es trazar un mapa de este debate y ofrecer una síntesis de estas posiciones. Para ello, primero haremos un retorno al contexto de la irrupción del liberalismo en Inglaterra y, posteriormente, avanzaremos a sus principios filosóficos en John Locke. Luego, demostraremos cómo estos principios filosóficos fueron interpretados en Brasil en tres posiciones: primero como “idea fuera de lugar” (SCHWARZ, 2000; NOGUEIRA, 1976), segundo como “una idea tiende a encontrar su lugar” (COUTINHO, 2000) y tercero como una “idea que está en su debido lugar” (FRANCO, 1976; BOSI, 2010).


PALABRAS CLAVE: Liberalismo. Filosofía política. Libertades. Siglo XIX.


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1 São Paulo State University (UNESP), Araraquara – SP – Brazil. Master's Student in Social Sciences. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1124-8506. E-mail: lucas.vasques@unesp.br

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Introduction


According to Raymundo Faoro (1987), political thought cannot be summarized to political philosophy, political science or ideology. Political thought, thus, is endowed with its own autonomous existence. In this way, reducing political thought to a mere political philosophy leads to a disfiguration of history itself, as well as to a detachment from reality. Political philosophies, such as liberalism, represent a teleological tool, an abstract goal to be pursued. Political thought, on the other hand, is its materialization. Faoro (1987, p. 15, our translation) states that "Political thought is inside political experience, incorporated to action, fixing itself in many abbreviations, in theoretical bodies, institutions and laws".

The objective of the present article is to understand how the debate around the political philosophy of English liberalism is structured as political thought in Brazil in the 19th century2. To this end, the present article is composed of two parts. In the first part we will return to understand the context of formation of English liberalism. Once this question is overcome, we will advance to the understanding of the principles of liberal political philosophy through the writings of John Locke (1994). Having introduced its context and principles, we will verify how liberal political philosophy in Brazil is interpreted and debated. To this end, the best known and widely referenced text is that of Bernardo Ricupero (2007), entitled From formation to form: still the "misplaced ideas". However, this text is not able to provide an overview of the debates on the subject by excluding Marco Aurélio Nogueira's (1976) position on the subject. Moreover, Ricupero's text (2007) divides the positions on the subject into two opposing axes: "The ideas out of place" (SCHWARZ, 2000) and "The ideas are in their proper place" (BOSI, 2010; COUTINHO, 2000; FRANCO, 1976), simplifying the position adopted by Carlos Nelson Coutinho (2000). As we will demonstrate below, Coutinho's (2000) position in this debate should not be simplified into the slogan "Ideas are in their place" at the risk of essentializing the discussion and giving the false

impression that it is a linear discussion, composed only of two binary positions.


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2 We deal with English liberalism only as a form of theoretical and empirical cut-off. After all, if we consider liberalism in its French version, the doctrinal liberalism, the terms of the debate become more complex. After all, if we consider the work of thinkers such as José Bonifácio de Andrada e Silva, we will verify that his philosophical and political trajectory was marked by the contestation of slavery. Slavery was an argument to contest the "place" of liberalism in the 19th century, as we will see below. José Bonifácio de Andrada e Silva's liberal ideas were always in friction with the slaveholding Brazilian society. Deeply influenced by the theses of John Locke, he was committed to the gradual abolition of slavery, to the expansion of primary and secondary education, and also defended the expansion of the country to the interior of the continent. He proposed the integration of the Indian into civil society, also with miscegenation as a fact of integration and national identity. This intellectual became a major inspiration in the search for a national identity, inspiring debates up to three centuries after writing his theses. A defender of the centralized state, he influenced Brazil's independence.

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Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238

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To constitute a systematic reading of this discussion, we point out that there are not only two binary positions in the debate, but actually three strands that mark different positions about liberalism in Brazil: 1) "Ideas out of place" (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000); 2) "Ideas tend to find their place" (COUTINHO, 2000) and 3) "Ideas are in their place" (BOSI, 2010; FRANCO, 1976). In order to understand how this problematic is constituted, we will first advance to the context of the construction of liberalism.


The Context of Liberalism's Emergence


The context of the emergence of liberal thought goes back to the 17th century in the disputes between the absolutists and the ascendant bourgeoisie. In addition to this dispute, Catholics, Anglicans, Presbyterians and Puritans were also fighting for religious hegemony in England. This political and social framework would culminate in 1640 in an armed conflict between King Charles I's military forces and the English Parliament. Called the Puritan Revolution, the battle ended with the victory of the Parliamentarians and the execution of Charles I.

Thus, after a regicide, the republican government of Oliver Cromwell (1599-1658) was established, whose excesses and oppression prompted Thomas Hobbes (1588-1679) to write The Leviathan in 1651. The dictatorship of Oliver Cromwell (1599-1658) prospered militarily and commercially until his death in 1958. As his successor, his son Richard Cromwell was not as successful, being deposed with only 18 months of rule. His deposition plunged England again into a political and social crisis that would end in a civil war, the result of which was the return of the Stuart monarchy to power. During this period, tensions between the Crown and Parliament returned, as the latter was opposed to the pro-Catholic positions taken by the Stuart absolutists.

The return of the monarchy to power only occurred with the coronation of Charles II (1630-1685), who accepted the parliamentarians' prerogative to have his powers reduced. However, by adopting positions favorable to religious freedom, the king clashed with parliament, leading to the dissolution of the latter in 1681. The reign of Charles II lasted until his death in 1685, when, in the absence of an heir, he was succeeded by his brother, James II (1633-1701).

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Like his brother, James II showed inclinations for the full exercise of absolutism. These inclinations of James, would lead to a union of English politicians, from various political spectrums, as a way to remove him from power. With the intention of accomplishing

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this plan, English politicians conspire with William III (1650-1702), Prince of Orange. In 1688, the parliament crowns William as king of England, without bloodshed, after James II flees to France. Under the nickname of the Glorious Revolution, this historical period marked the triumph of a set of political ideas and practices that would receive the name of liberalism, through its greatest exponent, John Locke (16321704).


John Locke, the founder of liberalism


John Locke (1632-1704), opponent of the Stuart monarchy, was exiled and returned to England only after the Glorious Revolution. In the meantime, The Second Treatise (LOCKE, 1994) was published as a justification and legitimization of the Glorious Revolution. The basis of this defense was the right to resistance, in which the people could resist the sovereign if they deemed it necessary. His return to England occurs over the clamor and recognition of King William of Orange (WEFFORT, 2001).

To understand liberalism beyond its historical context, we will make an incursion through its main philosophical conceptions: natural law, state of nature, private property, money, state of war, contract, political society and government (VARNAGY, 2006). John Locke's conception of natural law consists of the belief that certain laws of nature also govern and can be unraveled through the use of reason. Thus, for the author, there would be a rationality inscribed in the hearts of men. Such rationality would be inculcated in men through the actions of a God, insofar as they would fulfill the purpose of discernment between good and evil, as an instinct to preserve life itself, freedom and property, inalienable rights (LOCKE, 1994).

Although natural law is constituted by a political imperative that does not cease with the formation of society. On the contrary, in Locke's (1994) perspective, it will become more rigorous through the action of law and laws. Thus, natural laws would be endowed with a coercive power toward those who infringe it.

The state of nature in John Locke's liberalism is a philosophical imperative to think about the natural state of human beings. Thus, for Locke (1994), human beings, as a divine creation, would live in a state of perfect equality and natural freedom. In this state, all subordination and vassalage would not exist, and human beings would be subject only to the force of natural laws, without the existence of law.

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Another important principle of liberalism is the notion of private property. According to Varnagy (2006, p. 60), the notion of private property in Locke is polysemic: "[...] in a

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broad and general sense, it implies 'life, liberty, and land' (II, 87, 123, 173) and, in a stricter sense, property, the right to inherit, and the ability to accumulate wealth." To this end, property in Locke (1994) is not unlimited, because for him possession depends closely on the amount of labor put into the object or place. Thus, the author (LOCKE, 1994) links labor to the value of a given object. The more work is performed - this limited by individual capabilities - the greater is the value of the product.

On the issue of money, Locke (1994) argues that thanks to its creation, men were able to create beyond their own subsistence. Thus, men were able to accumulate their possessions and their own surplus. To this end, money becomes a durable instrument that men could store without the temporal risk of its rotting, just like the food produced on their land. This is also due to the tacitly accepted pact that guaranteed money this status.

As a consequence of this process, there was an accumulation and concentration of goods and land. As commercial society became more complex, conflicts began to exist over the ownership of goods, which would result in the end of the state of nature. As a result of this process, it became necessary to build the law, the laws, and the State itself, as a means of regulating conflicts. Thus, the State in Locke (1994), in addition to guaranteeing the possession of property, should be responsible for penalizing individuals who transgress the laws. Thus, Tomas Varnagy (2006) proposes a division of John Locke's state of nature into two stages: the first, referring to limited property, based on labor, and the second, to unlimited property, mediated by the existence of money:


It is then possible to establish periods referring to the state of nature, in which there is society and natural law reigns, in two stages: in the first, property is limited by labor and life is pleasant and enjoyable; in the second, which arises with the appearance of money, there is both the possibility of unlimited accumulation and inequality in relation to possessions (VARNAGY, 2006, p. 63, our translation).


Despite this peaceful and harmonious state of nature, the need arises for men to organize themselves into a society. Thus, with the problems arising from the emergence of money, men organize themselves into a civil government as a form of mutual protection, with the security of their lives, goods and property.


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In summary, the main purpose of political society is to protect property rights in the broad sense, i.e., life, liberty and property. Since these rights exist prior to the constitution of society and even in political society itself, there can be no right to impose, for example, taxes without the consent of its members (VARNAGY, 2006, p. 68, our translation).

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As a consequence, according to Locke (1994), men enter into a civil government to protect themselves and their property. However, whenever a legislator or ruler turns against the interests of men and violates their property, the people would have a so-called "right of resistance." To the extent that confidence in the legislator is eroded, the citizens could by mutual agreement dissolve his authority.

Put all these principles together, how can liberalism be synthesized? Thomas Varnagy (2006) states that this would be an extremely difficult task. However, in a broad sense, liberalism means emphasizing individual freedoms in the face of external sanctions. Thus, to be liberal, in a broad sense in political philosophy, means to confront all forms that seek to take away from individuals their freedoms.


How to define liberalism? (...). In a broad sense, it emphasizes the freedom of the individual from external constraints (church, state, traditions, society). In the 18th and 19th centuries, it was based on the idea of the free market and sought to limit the powers of government through mechanisms such as federalism and separation of powers, although it did not necessarily imply democracy (VARNAGY, 2006, p. 77, our translation).


Despite this difficulty in defining the term "liberalism", this political philosophy ended up being read in Brazil on three axes of interpretation, the first as an "idea out of place" (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000), the second as an "idea that tends to find its place" (COUTINHO, 2000), and finally as an "idea that is in its rightful place" (BOSI, 2010; FRANCO, 1976).


Ideas out of place


Roberto Schwarz, in his thesis on "ideas out of place", in the work Ao Vencedor as Batatas (2000), seeks to demonstrate what are the relations between liberalism, philosophy, and political thought in Brazil. In it Schwarz demonstrates that there is a gap between theory and practice in Brazil. This gap is mediated by the practice of favor.

Through the practice of favor the whole social, political and economic structure is essentialized in the figure of the local elites. Thus, political practice becomes an instrument for the defense and perpetuation of personal interests.

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The substratum of this political practice, according to Schwarz, was liberal philosophy. Alongside liberalism, the novel, the parliamentary system and the legal norms were "borrowed from central countries as a way to "civilize" (RICUPERO, 2008). That is, they were ideas taken from their place of origin, central countries, and used in peripheral

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countries, far from their social conditions of production. This resulted in a process of detachment from their first practices:


Schwarz indicates, in other words, that peripheral countries, such as Brazil, would have to borrow from central countries forms, such as the novel, the parliamentary system, the legal norms and everything else that would make them "civilized" (Arantes, 1992; Palti, 2007). However, their social conditions would have little in common with those that originally produced these forms, which would cause them to suffer "twisting", becoming practically unrecognizable (RICUPERO, 2008, p. 64-65).


Thus, according to Schwarz (2012), liberal ideology takes its place as an "out-ofplace idea" in its political practice in Brazil. Despite pushing for the liberation of colonies across America, liberalism in Brazil paradoxically served to preserve the legacy of slavery and the monopoly of land in the hands of landowners. After all, in Brazil in the midnineteenth century, slave labor and especially the slave trade thrived as a form of social organization. The Brazilian independence process from the Portuguese metropolis, under liberal inspiration, stands out. For Vivaldo Daglione (1961), liberalism in Brazil's Empire took on aristocratic garb, where a political battle was waged with the mercantile bourgeoisie. This process culminated in 1823 with the constituent assembly, under the promise of a "new doubly liberal constitution".

Schwarz (2000) states that liberal ideology served in Europe as a way to cover up the exploitation of labor under the ideas of labor freedom and legal equality. However, in Brazil, this exploitation was more explicit, based on slavery and slave trade. One of the greatest examples of this was the constitution of 1824, which, despite presenting itself as a liberal constitution, maintained slavery. Thus, the author argues that the predominance of liberal thought in international trade echoed in Brazil, making its bourgeoisie to settle under an economic rationale that aims at profit. Added to this, according to the author (SCHWARZ, 2000) Brazilian independence was also based on liberal ideals. All this conjuncture ended up clashing with the slave production mode and, in special, with the slave owners, the landowners and the agrarian elite (SCHWARZ, 2000).

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This ambiguous or harlequin relationship between liberalism and political practice served to produce three classes: the landowner, the enslaved, and the free man. The latter being entirely dependent on the gestures of the former. After all, if the relationship between the landowner and the enslaved was mediated by the notion of property, of the landowner and the free man it was the "favor". Therefore, the "favor" prevails as a mediation that assures its parties the non-slavery.

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[...] the favor assured both parties, especially the weaker one, that neither was a slave. Even the most miserable of the favored saw his free person recognized in the favor, which transformed benefit and consideration, however modest, into a ceremony of social superiority, valuable in itself (SCHWARZ, 2000, p. 8).


The "favor" is placed as a mechanism of reproduction of the classes of free men and landlords. It is a relational mediation that is made explicit in the dependence on the person and in the remuneration for personal services. To this end, the incompatible, or rather productively antagonistic, classes of landlords and freemen tacitly agree to cooperate for their mutual benefit. This cooperation comes to ensure for both parties that neither is a slave and therefore deprived of its freedoms. For Scharwz (2000), even the "most miserable of the favored" sees in the favor the recognition of his freedoms, of his person.

Another scientist to consider liberalism as an "out of place idea" was Marco Aurélio Nogueira (1976), studying the historical figure of Joaquim Nabuco. In this study he argues that liberalism in Brazil has always been very empty of egalitarian inspirations. Thus, still according to Nogueira, liberalism in Brazil is more a freedom of the nation than a freedom of the individual. Liberalism, therefore, assumes itself as a contradictory political practice, which was not able to find in the colony, social, political and economic bases for its full realization.


Ideas tend to find their place


Carlos Nelson Coutinho takes an intermediate position in the debate. For him, liberalism at one time was an idea out of place in Brazil, but with the process of capitalist modernization, it would tend to "find its place". To understand this position, we should make a theoretical return to his work Cultura e Sociedade no Brasil (2000), which highlights the existence of an intimism in the shadow of power in Brazil. This idea, postulated by Georg Lukács (1972), demonstrates the existence of a strong attraction between intellectuals and the State, with the State as the promoter of social transformations. In this way, Lukács (1972) identifies a conservative revolution, made from top to bottom, without popular participation and with a strong attraction to authoritarianism, characterizing a modernization by "Prussian way3" or of an "intimate" character.



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3 The concept of "Prussian way" was formulated by Lenin and used by both Lukács and Coutinho, expressing, for Vladimir Lenin, the modernization process "from above" occurred in Germany, Italy and Japan. To know more about the subject read Cultura e Sociedade no Brasil, chapter II, by Carlos Nelson Coutinho, published in 2000 by DP&A.

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Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238

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[...] the transformations that occurred in our history did not result from authentic revolutions, from movements coming from the bottom up, involving the entire population, but were always processed through a conciliation between representatives of the economically dominant opposing groups, a conciliation that is expressed under the political figure of reforms "from above" (COUTINHO, 2000, p. 50, our translation).


By operationalizing this concept, also using Gramsci's notion of "passive revolution", Coutinho analyzes the "place of ideas" in Brazil and, in particular, the role of intellectuals in this process. He points out that the modernizing revolutions in Brazil assumed a passive character in which intellectuals were co-opted to carry them out. In this way, through the conciliation between fractions of the dominant classes, with the preservation of the latifundium and the maintenance of dependence on international capital, the popular layers were excluded from the political decisions taken in Brazil, through a process called "passive revolution" (COUTINHO, 1980).

In sum, Coutinho (1980) demonstrates that there is in Brazil a cooptation of intellectuals by the elite for the construction of a passive revolution. To this end, intellectuals have placed themselves in a manner "intimate with the power" of the elites and the state. As this "intimate" process progresses, capitalist modernization, driving and being driven by Prussian development, eventually put ideas in their "proper place." That is, as the process of co-opting intellectuals and capitalist development progresses, society becomes more adherent to the realities and class interests they are trying to express.

For Coutinho, as the modernization process advances, the more similar Brazilian society becomes to the general capitalist society, having greater sensitivity to the ideas formulated there and imported here. Therefore, following the author's perspective, liberalism tends to become an "idea in place" in Brazil as the intimate process of capitalist modernization advances.

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Unlike the following position adopted by Franco (1976) and Bosi (2010), Coutinho (1980) places a temporal and procedural dimension on the question of liberalism as an idea "in its place." However, while Franco (1976) and Bosi (2010) place liberalism as a "fixed" idea that is independent of time and "place," Coutinho (1980) demonstrates the "intimate" relations between the idea of liberalism and the modernization process of the Brazilian elites, as well as the central role of intellectuals in this process. As this process advances, liberalism "tends to find its proper place" in the development of capitalism.

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The ideas are in their place


Maria Sylvia de Carvalho Franco, from a Marxist perspective, in her article As idéias estão em seu lugar (1976), defends that both peripheral and central countries are part of the same order, that is, the same production system, whose primary objective is to generate profit, that is, to extract surplus value from labor. However, Carvalho Franco states that liberalism is the same, both in Brazil and in Europe, adapting to a global logic of capital accumulation. The integration of Brazil in a global logic, according to the author, has nothing to do with liberalism as an "out-of-place idea".

Following Carvalho Franco's example, Alfredo Bosi in Ideologia e Contraideologia (2010), points out that liberalism was never "an idea out of place" in Brazil, as in any other country, whether peripheral or not. His analysis is based on the assumption that in the first half of the 19th century, liberal ideology was hegemonic throughout the West, exploiting both the workers in the colonies (enslaved) and in the metropolis. That is, for the author, capitalism exploited the surplus value of labor in its most diverse expressions in these places. Whether at a different pace or place, "Old Continent" or "New World" experienced capitalist exploitation driven by liberalism.


Final considerations


Finally, our methodological path consisted in visiting the historical context of the emergence of liberal philosophy in England. In it, we understand how in a specific moment in England, in a specific context, the exaltation and defense of individual liberties resulted in a process of constitution of a political philosophy that remains as a teleological construction sought by the most diverse republican democracies spread throughout the world.

With William of Orange's seizure of power, political thinker John Locke was able to return to England after exile in Holland. With this, he was able to conclude the writing of his works that would serve as support for the interpretation of liberalism. In a movement exalting the defense of individual liberties, respect for the person and property, liberalism as a political philosophy spread through a wide range of countries in the 19th century, reaching even peripheral countries such as Brazil.

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This arrival in Brazil is interpreted in the most diverse ways, either as an "idea out of place" (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000) or "an idea that tends to find its place" (COUTINHO, 2000), and even as "an idea that is in its rightful place" (BOSI, 2010;

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FRANCO, 1976). This polemic, discussed earlier in this article, has moved the Brazilian intellectual scene in recent decades. The fact is that such views are distinguished in three theoretical axes, those such as Roberto Schwarz (2000) and Marco Aurélio Nogueira (1976), who consider liberalism as an English political philosophy (logos) that did not find in Brazil the same social conditions to realize itself as it found in England. Thus, its praxis was harlequial and incomplete, making use only of aspects convenient to the elites.

The second theoretical axis of interpretation is based on Maria Sylvia de Carvalho Franco and Alfredo Bosi, who consider liberalism only in political practice. That is, regardless of its original place and specific conditions of production, it would be the same in its practice (praxis). After all, we all integrate the same production model, capitalism.

The third way, represented by Carlos Nelson Coutinho, works in a middle ground, oscillating in the understanding of liberalism between the two previous perspectives. He considers that liberalism, despite being detached from its first English context, would tend to place itself in Brazil, as it develops, as an "idea in place".

Understanding these three axes of interpretation, as we propose, through Raymundo Faoro's (1987) analysis of political thought, we understand liberalism as a logos able to provide teleological guidance for the practice (praxis) of political thought. Thus, liberalism would be a nomoempirical system of political philosophy, which emerged in England through the political practice (praxis) of English society, immersed in a specific political, cultural and economic context. After all, if in England the political praxis preceded the philosophical exercise of written systematization, in Brazil the logos had been sent in a way that served, through the practice of favor and enslavement, as an instrument of concentration of political and economic power in the hands of the elites.

The second theoretical path, expressed by Maria Sylvia de Carvalho Franco and Alfredo Bosi, despite providing a macro-structural interpretation of the capitalist system, places liberalism as the same product in terms of political philosophy (logos) and political practice (praxis). Thus, political philosophy is essentialized as a by-product of the political thought (praxis) of another historical context (nineteenth century Brazil), political and economic, to the detriment of the one expressed in eighteenth century England.

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Roberto Schwarz (2012) also responded to the considerations made by Franco and Bosi about their theory of "ideas out of place". For the author, their critics ended up basing themselves on dichotomies that do not exist in their works, as if by objectifying that liberalism was formed as a political philosophy, they were neglecting its praxis in Brazil. Still, Schwarz (idem) affirms that ideas can indeed still be "out of place", even if they serve

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the purpose of capitalist exploitation, framed in a global logic of the capitalist system of production.

In short, this article contributes to the discussion about the debate of the "place" of liberal ideas in Brazil insofar as it distances itself from the systematization proposed by Bernardo Ricupero (2007) about a first position entitled As ideias fora do lugar (SCHWARZ, 2000) and his criticism As ideias estão no seu devido lugar (BOSI, 2010; COUTINHO, 2000; FRANCO, 1976). In an attempt to overcome this dichotomous view of the debate, we systematized the "place" of liberalism in Brazil into three distinct positions, of which the first position would be "The ideas out of place" (NOGUEIRA, 1976; SCHWARZ, 2000), the second in which "Ideas tend to find their place" (COUTINHO, 2000) and, finally, "Ideas are in their rightful place" (BOSI, 2010; FRANCO, 1976).


ACKNOWLEDGEMENTS: I thank FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) for the support.


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How to reference this article


VASQUES, L. F. The “place” of liberalism in Brazil of the 19th century. Rev. Sem Aspas, Araraquara, v. 10, e021010, jan./dez. 2021. e-ISSN 2358-4238. DOI: https://doi.org/10.29373/sas.v10i00.15186


Submitted: 09/05/2021 Approved: 07/06/2021 Published: 30/06/2021


Responsible for the translation: Editora Ibero-Americana de Educação.

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Translated by: Alexander Vinicius Leite da Silva - ORCID: https://orcid.org/0000-0002- 4672-8799.

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