EL DEPARTAMENTO DE PATRIMONIO HISTÓRICO DE SÃO PAULO BAJO LA ADMINISTRACIÓN DE LUIZA ERUNDINA: CUESTIONES CONCEPTUALES
THE DEPARTMENT OF HISTORICAL HERITAGE OF SÃO PAULO UNDER LUIZA ERUNDINA'S ADMINISTRATION: CONCEPTUAL ISSUES
Sergio Ricardo RETROZ2
RESUMEN: El Departamento de Patrimonio Histórico (DPH), organismo de la ciudad de São Paulo vinculado a la Secretaría Municipal de Cultura (SMC), desarrolló su actividad de preservación del patrimonio parcialmente vinculada al concepto de patrimonio ambiental urbano. Durante la administración municipal de Luiza Erundina, el SMC, encomendado a Marilena Chauí, comenzó a trabajar con el concepto de ciudadanía cultural. El DPH, en esos años bajo la dirección de Déa Ribeiro Fenelon, comenzó a conciliar el concepto de patrimonio ambiental urbano con el de ciudadanía cultural, lo que proporcionó un campo fértil de trabajo y desarrollo conceptual del patrimonio.
PALABRAS CLAVE: Patrimonio. Políticas públicas culturales. Memoria. Ciudadanía.
ABSTRACT: The Department of Historical Heritage (DPH), an agency in the city of São Paulo linked to the Municipal Department of Culture (SMC), developed its heritage preservation activity partially linked to the concept of urban environmental heritage. During the municipal administration of Luiza Erundina, the SMC, entrusted to Marilena Chauí, started to work with the concept of cultural citizenship. The DPH, in those years under the direction of Déa Ribeiro Fenelon, began to reconcile the concept of urban environmental
1 O presente artigo é resultado parcial da pesquisa de doutorado, sob financiamento da CAPES.
2 Universidade de São Paulo (USP), São Paulo – SP – Brasil. Graduado em História (USP), Mestrado em História (FGV) e Doutorado em Museologia (UNIRIO/MAST). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2933- 0260. E-mail: sretroz@yahoo.com.br
heritage with that of cultural citizenship, which provided a fertile field of work and conceptual development of the heritage.
KEYWORDS: Heritage. Cultural public policies. Memory. Citizenship.
Com essas páginas busco mostrar o encontro de dois conceitos nas atividades de trabalho de um órgão de patrimônio. De um lado, o conceito de patrimônio ambiental urbano, forjado por intelectuais como Ulpiano Menezes de Bezerra e Eduardo Yázigi nos órgãos de planejamento urbano e de patrimônio da cidade e do Estado de São Paulo. Do outro lado, o conceito de cidadania cultural, pensado e colocado em prática por Marilena Chauí3 quando esteve à frente da Secretaria Municipal de Cultura (SMC). O local desse encontro foi o Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) da Cidade de São Paulo, sob a direção da historiadora Déa Ribeiro Fenelon4. E o tempo em que isso se deu foi o da administração municipal da Prefeita Luiza Erundina, entre 1989 e 1992.
O conceito de cidadania cultural, implementado na SMC, chegou ao seu órgão subordinado, o DPH, cujo trabalho já vinha sendo pautado pelo conceito de patrimônio ambiental urbano. No nosso entendimento, o encontro desses conceitos no DPH propiciou uma fertilidade de ideias em torno do patrimônio e do reposicionamento dos técnicos do órgão frente ao trabalho que desempenhavam.
Ao longo das décadas de 1970 e 1980, convencionou-se falar em patrimônio cultural, no lugar de patrimônio arquitetônico e patrimônio histórico, ampliando os valores correlatos aos bens. O valor patrimonial de determinado bem deixava de ser validado apenas pela sua qualidade artística e arquitetônica ou por sua relação com acontecimentos históricos e personagens políticos, passando a ser considerada também a dimensão antropológica e social. O patrimônio migrava de um significado concatenado com o discurso de nação, para um
3 Professora Titular de Filosofia Moderna na USP, desde 1986. Sua pesquisa sobre a história da filosofia volta-se para temas como democracia, política, direitos, cidadania e lutas de classes. Fonte: Currículo na Plataforma Lattes do CNPq. Disponível em: http://lattes.cnpq.br/1116101797671415. Acesso em: 25 jun. 2021.
4 Professora de história na PUC/SP, desde 1984, sua pesquisa volta-se para a história social, teoria da história, memória e patrimônio. Durante toda a gestão de Luiza Erundina foi diretora do DPH e presidente do CONPRESP. Fonte: Currículo na Plataforma Lattes do CNPq. Disponível em: http://lattes.cnpq.br/6632546692030321. Acesso em: 25 jun. 2021.
significado ligado às diversas localidades e grupos sociais, migração consolidada, no caso brasileiro, na Constituição Federativa de 1988. O patrimônio passava a ser associado às questões da memória e do meio ambiente, considerado importante à qualidade de vida nas cidades. Começava a ser entendido como fato social imbricado com a dinâmica urbana e, por isso, sua preservação deveria ser considerada no planejamento urbano.
No entendimento de Juliana Prata (2009), o conceito de patrimônio passou por três fases. A primeira, denominada pela autora por monumentalista, é marcada pela constituição dos ícones da nação e dos imóveis preservados de maneira isolada, devido a seu valor de excepcionalidade. A segunda, chamada de centro historicista, em voga no período após a II Guerra Mundial, é quando as nações europeias se mobilizaram para a reconstituição de seus centros históricos. Por último, a fase da cidade contemporânea, em voga a partir da década de 1970:
Há um entendimento que a visão do monumento, enquanto um edifício isolado, ainda que considerando seu “entorno” ou vizinhança”, não dá mais conta da dinâmica urbana nos anos de 1970 – metrópoles e industrialização. E não basta tratar o conjunto urbano, como um grande monumento. Outros elementos entram em jogo como a mobilização social contra a destruição de determinados bens, a reivindicação social pela questão da memória, a questão ambiental, a qualidade de vida e a participação da sociedade civil nos processos de decisão política (PRATA, 2009, p. 20).
O conceito de patrimônio ambiental urbano, forjado nos anos 1970 e 1980 por intelectuais paulistas em órgãos públicos do Estado, funde esses novos entendimentos de patrimônio e aponta para uma prática de preservação alinhada com as discussões internacionais. O novo conceito tem por base o reconhecimento do patrimônio enquanto referência material para a reprodução da memória, bem como seu valor na preservação do meio ambiente e na garantia da qualidade de vida. Dessa maneira, o novo conceito ultrapassa os tradicionais conceitos de excepcionalidade e de valoração de bens isolados e de valor notável, passando a compreender o patrimônio enquanto conjunto e em ações de preservação por áreas de interesse.
Marco nesse desenvolvimento conceitual de patrimônio foi a realização, em 1974, do Curso de Restauração e Conservação de Monumentos e Conjuntos Históricos, promovido pelos parceiros IPHAN, CONDEPHAAT e USP (ANDRADE, 2012). O curso contou com grandes nomes da intelectualidade e dos órgãos de preservação do patrimônio no Brasil, além da participação de Hugues de Varine, na época secretário do International Council of Museums (ICOM). A contribuição de Varine (2013) estava relacionada à sua concepção de
que o patrimônio era composto por três elementos: o patrimônio ambiental, criado pela natureza e pela intervenção do homem; o patrimônio intangível, constituído pelo saber, crenças e costumes; e os bens culturais, compostos por objetos, artefatos e construções forjados pelo homem ou pela natureza. Varine, inspirado no pensamento de Paulo Freire, admite a existência de um aspecto educacional do patrimônio e coloca a sociedade como sujeito primordial que muito tem a dizer aos gestores das instituições culturais. Ideia avançada, talvez muito avançada, para um país que ainda era governado por uma ditadura militar que mantinha freio à participação da sociedade nas decisões do governo.
Fundamental na difusão dessas ideias expressas por Varine é o livro de Carlos A. C. Lemos, intitulado O que é patrimônio histórico, cuja primeira edição data de 1981. Lemos constrói uma ideia de patrimônio configurada nos elos entre meio ambiente, saber e artefato, numa reformulação do tripé de Varine, como dito, composto por patrimônio ambiental, intangível e bens culturais. Lemos está preocupado com a preservação dos usos e costumes populares e com a superação de um patrimônio construído pela “classe dominante”. Está atento ao valor social dos bens culturais e, nisso, afirma seu entendimento de patrimônio ambiental urbano:
O núcleo urbano é um bem cultural composto de mil e um artefatos relacionados entre si, que vão desde aqueles de uso individual, passando por outros de utilidade familiar, a começar pelas moradias, até aos demais de interesse coletivo. Assim, vemos que um conglomerado urbano se resume num local onde se desenrolam concomitantemente infinitas atividades exercidas através de infinitos artefatos dispostos no espaço segundo suas funções ou atribuições, e interessam à compreensão do que seja “Patrimônio ambiental urbano” somente os bens ou as coisas, móveis ou imóveis, que caracterizam ou permitam o bom desempenho do gregarismo ali existente (LEMOS, 2000, p. 47).
Apesar do avanço conceitual de patrimônio ambiental urbano, de acordo com Andréa Tourinho e Marly Rodrigues (2016) essa prática até hoje foi incapaz de influenciar significativamente os procedimentos e a metodologia de preservação. Estes continuaram por priorizar uma ação voltada à leitura da cidade, da preservação do ambiente urbano enquanto imagem, em detrimento de uma preservação que considere o patrimônio enquanto fato social, criado pelas coletividades, ligado às questões socioculturais, feito nas relações entre o material e o simbólico. O conceito, embora inovador segundo essas autoras, enfraqueceu ao longo do tempo e, na década de 1990, praticamente desapareceu dos discursos patrimoniais, que preferiram falar em patrimônio imaterial e paisagem cultural. Todavia, as autoras se unem a Ulpiano Bezerra de Meneses – intelectual que atuou no CONDEPHAAT, conselho estadual
para as decisões de tombamento, e contribuiu para a conceituação de patrimônio ambiental urbano, principalmente no seu entendimento enquanto fato social – na defesa em se retomar esse conceito, por considerar nas práticas de preservação os “anseios sociais de reconhecimento de identidades diversas” (TOURINHO; RODRIGUES, 2016, p. 89).
O conceito de patrimônio ambiental urbano, todavia, penetrou em iniciativas pontuais de preservação, desempenhadas por órgãos públicos na cidade de São Paulo, chegando inclusive nos trabalhos do DPH. A aplicação do conceito em práticas de preservação se deu por iniciativa de alguns técnicos, atuantes em órgãos municipais, preocupados em incluir a preservação do patrimônio no leque das preocupações do planejamento urbano, apesar da dificuldade de desenvolver plenamente tais tentativas em um ambiente marcado pelo autoritarismo e inflexibilidade institucional.
As primeiras iniciativas de proteção do patrimônio na cidade de São Paulo se deram na década de 1970, pela Coordenadoria Geral de Planejamento (COGEP)5, criada em 1972 com a função de pensar a reurbanização da cidade tendo em vista a implementação do metrô (PRATA, 2009). Apoiada no Plano Urbanístico Básico do Município de São Paulo (PUB), de 1968, que previa a criação das chamadas zonas especiais, as Z8, a COGEP passou a eleger zonas que, no entendimento dos técnicos, requeriam maiores análises para a compreensão de sua função na cidade (ANDRADE, 2012). A COGEP classificou como zonas especiais os bairros da Bela Vista, Luz e Brás, por serem considerados zonas em processo de deterioração, demandantes de maiores estudos para definição de seus desempenhos no desenvolvimento da cidade, tendo em vista o valor histórico de certas edificações. A modernização da cidade, com a implantação do metrô, a abertura de vias expressas e a construção de viadutos, era vista como solução para a recuperação das áreas ditas degradadas. Contudo, nas décadas de 1960 e 1970, diante do contexto internacional, não se podia mais modernizar as cidades sem considerar os centros históricos e a valorização de bairros antigos, em uma noção de patrimônio, segundo Andrade (2012, p. 63), ainda em “processo de entendimento, digestão e amadurecimento”.
A metodologia do COGEP de inventariar os bens culturais da cidade desemboca no DPH, até porque os órgãos chegaram a trabalhar conjuntamente no que seria o primeiro inventário produzido pelo DPH, realizado no segundo ano de sua criação. Trata-se do
5 Tal qual o COGEP na esfera municipal, a Secretaria de Estado de Economia e Planejamento (SEP) buscou implementar o conceito de patrimônio ambiental urbano no planejamento sob responsabilidade do governo estatual. Na esfera federal, também não podemos nos esquecer do Programa Integrado de Reconstrução das Cidades Históricas (PCH), criado em 1973, e o Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC), de 1975, ambos conectados com essa ampliação conceitual do patrimônio e que se fundem em 1979 no IPHAN.
Inventário do Patrimônio Ambiental Urbano da Zona Metrô Leste, elaborado entre 1977 e 1978, idealizado e coordenado pelo COGEP, tendo o DPH como responsável pelos estudos de preservação, conservação e revitalização (ANDRADE, 2012). O inventário tinha por objetivo selecionar os bens culturais que deveriam ser preservados nas obras de construção do metrô no eixo Brás-Bresser. Nos critérios de seleção, foi dada prioridade às construções de fábricas e vilas operárias do final do século XIX e início do XX, período em que se deu a primeira industrialização da cidade, realizada naquela região. Segundo Andrade, os estilos arquitetônicos, formais ou estéticos em momento algum foram critérios para seleção dos bens culturais, que se pautou sempre pela representatividade desses bens para a história local, prioridade em harmonia com o conceito de patrimônio ambiental urbano, como afirma a autora:
O caráter de representatividade da histórica local, tomado como principal argumento, critério de abordagem e de seleção, assim como a dedicação ao estudo do conjunto urbano, do reconhecimento de um ambiente a ser preservado como testemunho da história [utilizados no eixo Brás-Bresser], são elementos que nos apontam ao conceito de “patrimônio ambiental urbano” em processo de afirmação nesse período (ANDRADE, 2012, p. 134).
Essa experiência forjou no DPH uma metodologia de inventário da cidade, testada de maneira independente pelo órgão no bairro da Liberdade, em 1978, trabalho que mais tarde serviria de modelo para o Inventário Geral do Patrimônio Ambiental, Cultural e Urbano de São Paulo (IGEPAC), iniciado em 1983 e desenvolvido pelo órgão até a atualidade. Ou seja, podemos verificar em uma atividade central do DPH, o IGEPAC-SP, desenvolvido pela então Divisão de Preservação, a filiação ao conceito de patrimônio ambiental urbano.
O DPH, enquanto órgão do patrimônio subordinado à Secretaria Municipal de Cultura (SMC), estava ligado às políticas culturais implementadas pela gestão municipal. Durante a administração de Luiza Erundina, entre 1989 e 1992, a SMC foi confiada à Marilena Chauí, que já vinha travando no interno do Partido dos Trabalhadores (PT) discussões acerca das políticas culturais. Chauí concebeu para a SMC o conceito de cidadania cultural, tendo por base a ampliação de direitos. O novo conceito se fundamenta no direito à participação na condução das políticas públicas, possível por meio de uma gestão participativa. No direito de acesso aos bens culturais da cidade, como teatros, cinemas, bibliotecas e museus. No direito
de usufruir dos meios de produção da cultura, de forma a permitir que os mais diversos grupos da sociedade possam encontrar os meios materiais para reprodução de sua cultura. No direito de reconhecimento de cada cidadão e de cada coletividade enquanto sujeitos capazes de produzir cultura, superando uma ideia de cultura normalmente vinculada à erudição.
Se por um lado a cidadania cultural condensa uma série de diretrizes de políticas culturas, ela também se pretende uma nova cultura política. Ou seja, visa engendrar na sociedade uma cultura política tipicamente cidadã, de participação política e de abertura a constante criação de novos direitos, a partir das demandas provindas da própria sociedade. Neste sentido, a cidadania cultural é pensada enquanto conjunto de valores de cidadania, fundada na participação e na legitimidade da luta por direitos.
Chauí também entendeu a memória como um direito dos cidadãos e dos diferentes grupos sociais e, neste aspecto, localizou a memória no campo das disputas sociopolítica- culturais. No que diz respeito à intersecção entre memória e patrimônio, Chauí (1994 (1979),
p. 19) denuncia a constante destruição dos “suportes materiais da memória”, o que acaba por comprometer as referências espaciais, impedindo o cidadão de refazer o percurso de sua trajetória. A autora entente os “suportes materiais da memória” não apenas como as referências paisagísticas da cidade e dos objetos pertencentes aos grupos sociais, mas também como as condições de existência material, uma vez que a autora se fundamenta em uma leitura marxista da sociedade. Esse conceito de “suportes materiais da memória”, portanto, funde a dimensão material e imaterial do patrimônio. Isso fica ainda mais claro quando Chauí (2006, p. 114) explicita que os “suportes da memória” se trata dos monumentos, documentos, coleções e objetos como formas de “expressão objetivada da lembrança coletiva”. Esses suportes da memória, numa visão de Chauí baseada na leitura de Krisztoff Pomian, seriam admitidos como patrimônio histórico e cultural na categoria de semióforos, sendo estes coisas cujos valores não são mensurados por sua materialidade, mas pela sua força simbólica, pela capacidade em “estabelecer uma mediação entre o visível e o invisível, o sagrado e o profano, o presente e o passado, os vivos e os mortos” (CHAUÍ, 2006, p. 117), e, por esse motivo, destinadas à exibição e contemplação. Por isso, Chauí atribui importância à garantia de condições sociais de transmissão da memória, assim como a preservação das referências físicas na cidade, de forma a permitir a reativação da memória dos indivíduos e grupos sociais.
Essas ideias de Chauí encontram sintonia com as ideias de Déa Ribeiro Fenelon, que assume a direção do DPH e a presidência do CONPRESP, órgão municipal de preservação. Fenelon traz para os órgãos do patrimônio da municipalidade as diretrizes e valores da
cidadania cultural. Aponta para a superação de um discurso técnico do patrimônio dissociado do seu contexto político, e, neste sentido, reconhece as diversas forças sociais que nortearam as práticas preservacionistas até então realizadas. Em contraponto, Fenelon almeja dar um sentido coletivo ao patrimônio, tendo em vista a cidadania cultural, e o faz correlacionando a cidadania às bases do conceito de patrimônio ambiental urbano, ao se referir à memória, à qualidade de vida e ao meio ambiente:
Quando propomos o debate e a reflexão sobre as políticas de patrimônio histórico, queremos tratá-lo não apenas no âmbito restrito das técnicas de intervenção ou dos critérios de identificação e preservação e seus conceitos operacionais. Para além desses aspectos, é preciso politizar o tema, reconhecendo as condições históricas em que se forjaram muitas das suas premissas – e articulando-as com as lutas pela qualidade de vida, pela preservação do meio ambiente, pelos direitos à pluralidade e sobretudo pelo direito à cidadania cultural. Com isso esperamos retomar um sentido de patrimônio histórico que nos permita entendê-lo como prática social e cultural de diversos e múltiplos agentes (FENELON, 1992, p. 31).
Essas ideias encontram sintonia com o pensamento de técnicos do DPH e do grupo de intelectuais acadêmicos que passa a trabalhar no órgão. Cássia Magaldi6, por exemplo, constrói sua defesa pela preservação do patrimônio sobre o pilar da cidadania cultural. A autora entende a memória como direito dos mais diversos grupos sociais e subscreve a preservação do patrimônio na “função social da propriedade” e no campo das disputas sociais, como fica explícito no texto:
E, entre as muitas demandas dos múltiplos agentes que produzem a cidade, aquela que diz respeito à preservação da memória é tão importante quanto qualquer outra: se não está ligada diretamente a “interesses”, incide sobre a identidade cultural e social dos habitantes da cidade, sobre o controle do seu passado em suas relações com o tempo presente, em seus direitos de cidadania (indissociáveis da dimensão temporal) que implicam a luta de apropriação e gestão dos espaços urbanos para todos os cidadãos, na luta pela democracia. Se estes direitos não podem estar subordinados a nenhum outro, então não constitui nenhuma heresia afirmar que ele pode mesmo sobrepor-se ao sagrado direito do uso do solo urbano. Amém (MAGALDI, 1992, p. 24).
Vemos essa fusão dos conceitos de patrimônio ambiental urbano e de cidadania cultural também no pensamento de Maria Célia Paoli7. Ao evidenciar o quadro de conflito e de disputa pela memória, a autora entende que são os aspectos da cultura plural que deveriam provocar a noção de patrimônio enquanto dimensão de um “passado vivo”, no qual acontecimentos e coisas “merecem ser preservadas porque são coletivamente significativas em sua diversidade” (PAOLI, 1992, p. 25). As atividades preservacionistas, segundo a autora, referindo-se ao patrimônio arquitetônico, são comumente marcadas seja por uma ideia de passado enquanto antigo e superado, e neste caso se preservariam exemplares a partir de categorias proeminentemente estéticas, seja de passado enquanto antigo e perdido, e, neste caso, a preservação estaria pautada pela nostalgia e pelo medo da perda. Em ambos os sentidos preservacionistas, um mais em busca do exemplar excepcional e o outro pela totalidade da preservação, cairiam no mesmo erro de ignorar a “inscrição do significado coletivo de ‘legado’ do passado”, o que apontaria “claramente para uma sociedade destituída de cidadania, em seu sentido pleno, se por esta palavra entendermos a formação, informação e participação múltiplas na construção da cultura, da política, de um espaço e de um tempo coletivos” (PAOLI, 1992, p. 26).
Paoli propõe, neste sentido, que o trabalho de preservação passe pela significação coletiva e plural do patrimônio, a fim de contribuir ao desenvolvimento da cidadania. Esta nova via seguiria uma tendência historiográfica de priorizar a história dos vencidos e não a dos vencedores, o que explicitaria “o quanto o poder desorganizou a posse de um sentido das participações coletivas, destruindo a possibilidade de um espaço público diferenciado” (PAOLI, 1992, p. 27). A autora, ao defender essa nova postura nas atividades de preservação do patrimônio incorpora, enfim, os princípios da cidadania cultural:
O reconhecimento do direito ao passado está, portanto, ligado intrinsecamente ao significado presente da generalização da cidadania por uma sociedade que evitou até agora fazer emergir o conflito e a criatividade como critérios para a consciência de um passado comum. Reconhecimento que aceita os riscos da diversidade, da ambigüidade das lembranças e esquecimentos, e mesmo das deformações variadas das demandas unilaterais (PAOLI, 1992, p. 27, grifo nosso).
É possível perceber, portanto, no pensamento em voga no DPH do período, uma ideia de patrimônio emergida do conceito de patrimônio ambiental urbano, uma vez que reiteradas vezes se fala na conciliação entre preservação patrimonial e planejamento urbano, se assume a
7 Professora no Departamento de Sociologia da USP, desde 1988, sua pesquisa em sociologia é voltada para temas como trabalho, cidadania e cidade. Fonte: Currículo na Plataforma Lattes do CNPq. Disponível em: http://lattes.cnpq.br/6818139016806030. Acesso em: 25 jun. 2021.
importância do patrimônio para a memória, para a qualidade de vida nas cidades, e se aponte para uma preservação que leva em conta o meio ambiente como um todo. Nesse pensamento, vemos também que o patrimônio é entendido no campo das disputas sociais, assim como a memória é compreendida na sua relação com a identidade de sujeitos e grupos sociais em sua diversidade. A memória e a preservação do patrimônio, neste sentido, são entendidas como direito dos mais variados grupos sociais, sendo priorizado aqueles que tradicionalmente são alijados desse direito. Nestes aspectos, o patrimônio tem foco no direito do cidadão, é importante na consolidação da cidadania. O patrimônio, portanto, é visto sob a ótica da cidadania cultural e essas ideias ficam ainda mais explícitas quando vemos a documentação produzida pelo DPH no período.
Alguns documentos da gestão do DPH deste período nos permitem ver como esse vínculo entre cidadania cultural e patrimônio ambiental urbano opera nos projetos e trabalhos do órgão. O elemento central na concepção de patrimônio da gestão é o seu elo indissolúvel com a memória, entendida enquanto direito do cidadão em sua diversidade de sujeitos e grupos sociais. O trabalho de preservação patrimonial, justamente por seu vínculo com a memória, escapa de ser uma mera execução de técnicas de conservação e restauração, sendo agora entendido como interferência nos suportes materiais da memória e no valor simbólico das coisas, cerne do campo da cultura. A gestão, logo no seu primeiro planejamento de atividades, reconheceu a importância dos trabalhos tradicionalmente operados pelo órgão, de restauro e recuperação de bens arquitetônicos, de catalogação e inventário de monumentos, acervos e edificações e de construção de critérios para a preservação. Entendeu, todavia, que essas atividades se encontravam limitadas a uma prática voltada à preservação arquitetônica, dissociadas das questões sociais inerentes ao patrimônio:
Tradicionalmente, no Brasil, uma política em relação ao patrimônio histórico é entendida como uma política de catalogação, identificação e preservação das condições físicas de bens móveis ou imóveis considerados significativos em termos históricos, a partir de critérios que validam a cristalização de um passado longínquo passível de ser exposto em termos museológicos. Na prática, esta política acaba se limitando a uma concepção arquitetônica de restauração e preservação e, nesta concepção, as práticas e os fazeres culturais e simbólicos estão esquecidos ou postos à margem. As atividades desenvolvidas pelo D.P.H. nos últimos anos não têm escapado destes limites, apesar das tentativas em sentido contrário por parte de setores do próprio Departamento. Assim, uma das primeiras tarefas desta administração é promover a crítica destas concepções dominantes de patrimônio histórico,
construindo uma noção ampla que abarque práticas, fazeres e memórias individuais e coletivas e, ao mesmo tempo, possibilitar que esta discussão não restrinja aos funcionários do D.P.H. e da S.M.C., mas que primordialmente se faça através da participação de setores da sociedade diretamente envolvidos e da população em geral (SÃO PAULO, 1989, p. 3).
A preocupação do DPH passava, naquela gestão, a ser aquela ligada à memória e ao fazer cultural, preocupação que deveria ser basilar de todas as operações técnicas de preservação que o órgão viria a exercer, como fica claro quando se aguça a crítica especificamente ao trabalho da Divisão de Preservação do DPH:
A Divisão de Preservação, embora tenha ampliado seu interesse em elaborar programas de valorização de determinadas partes históricas da cidade, tem se limitado a continuar o trabalho de restauro e conservação de Casas-Museu, quando há verbas e disposição em aplicá-las (SÃO PAULO, 1989, p. 5).
No documento de planejamento do DPH para o ano de 1991, as ações do órgão foram distribuídas por temas e prioridades de acordo com as diretrizes da SMC, o que evidencia que o órgão buscava se alinhar às metas estipuladas pelo projeto da SMC, o qual foi desenhado a partir do conceito de cidadania cultural. O tema “Qualidade de vida na cidade: viver e morrer em São Paulo” teve por prioridade, no documento, a “Preservação do Patrimônio Ambiental e Cultural Urbano”, ou seja, a preservação do patrimônio é entendida como principal ação do órgão vinculada à garantia da qualidade de vida na metrópole. A gestão do patrimônio na cidade de São Paulo passava a ter por objetivo claro conter o movimento desenvolvimentista do espaço urbano, conduzido pela especulação imobiliária, por isso pensar o patrimônio junto ao planejamento urbano, a fim de garantir qualidade de vida aos cidadãos. Essas preocupações com a qualidade de vida na cidade e com a conciliação entre planejamento urbano e preservação patrimonial, em certa maneira, retomam ideias centrais do conceito de patrimônio ambiental urbano e nos remete às primeiras iniciativas de preservação do DPH, de meados dos anos 1970, frustradas pelas decisões autoritárias características do período de ditadura militar.
Outros documentos da gestão expressam pontos centrais do conceito de patrimônio ambiental urbano, como o de garantia da qualidade de vida na cidade em detrimento de uma pura conformação do espaço ao desenvolvimento do capital. E esses conceitos vêm evidenciados sob a ótica da cidadania cultural, por reconhecer as disputas sociais e priorizar camadas sociais normalmente alijadas do direito à cidade. Entre esses documentos destacamos um que se intitula “DPH, Memória, Preservação e Tombamento: contribuições para uma política urbana” (SÃO PAULO, 1991, s/p.), emitido entre 1991 e 1992. O
documento é organizado em quatro partes e funciona como um compêndio de outros documentos produzidos ao longo da gestão. A primeira parte é constituída por um texto descritivo da contribuição do DPH ao trabalho de preservação, tombamento e de política urbana para a cidade. A segunda, denominada “textos de apoio”, é composta pela resolução do “Congresso Patrimônio Histórico e cidadania: o direito à memória”, realizado em agosto de 1991, e por uma palestra de Riccardo Mariani. A terceira, contém o projeto de lei de reestruturação do CONPRESP e a relação dos bens tombados ou em análise, o que nos faz crer que o documento data de 1991. A quarta, denominada Anexos, possui um documento intitulado “DPH: Origens, Atividades e Atribuições”. Gostaríamos de nos ater à primeira e à última parte desse documento, por historicizar o trabalho do DPH e do CONPRESP e apontar para o projeto empregado na gestão.
O texto parte da constatação de que a cidade teve um processo de expansão “caracterizado pela violência contra a maioria de seus habitantes” (SÃO PAULO, 1991, s/p). Nesse processo, as camadas mais pobres foram constantemente expulsas do centro e empurradas para a periferia, e as obras realizadas privilegiavam a necessidade de circulação de mercadorias e pessoas, sendo conduzidas por uma lógica do capital em detrimento do bem- estar na cidade. A gestão, diante desse quadro, ainda segundo o documento, se viu diante de um desafio, uma vez que seu compromisso com a classe trabalhadora implicava em “reverter uma arraigada cultura de submissão aos desígnios dos incorporadores”. O recurso fundamental para o enfrentamento desse desafio, no que tange ao planejamento urbano, foi a elaboração do Plano Diretor da cidade, único documento redigido pela gestão neste setor que encontrava ainda entraves para aprovação pela Câmara Municipal, por relativizar o direito individual sobre a propriedade privada diante do direito “dos cidadãos em seu conjunto”, além de criar “canais de participação popular nas decisões” (SÃO PAULO, 1991, s/p).
A iniciativa de tombamento e de preservação do patrimônio é entendida, no documento, sob quatro aspectos. O primeiro refere-se à qualidade de vida na cidade, entendendo o tombamento como maneira de legitimar o patrimônio, recurso considerado central à atividade preservacionista, mas denunciado, no próprio texto, por seus usos equivocados, por privilegiar, tradicionalmente, nas políticas públicas, os marcos da “história oficial” e os exemplares de “excepcional valor”, gerando uma “decoração” da cidade ao gosto das classes dominantes. O documento entende que a garantia da qualidade de vida passa pela preservação de “testemunhos físicos das múltiplas e contraditórias vozes do passado”, conectando, mais uma vez, memória, em sua diversidade, com a qualidade de vida. O texto acusa ainda a degradação do centro da cidade como resultado da conjunção entre descaso
público e especulação imobiliária, cuja tônica é a destruição de imóveis e construção de novos, a abertura de vias e o consequente comprometimento da vida em seu entorno.
O segundo aspecto do patrimônio refere-se ao dito sagrado direito à propriedade, característicos de uma “noção vulgar de modernização”, marcada pela constante renovação urbana, pelo “território arrasado e limpo”. O documento afirma que as ações de preservação incomodam porque ferem o direito da propriedade privada e buscam manter a classe trabalhadora em áreas de elevado valor imobiliário. Como exemplo, o documento cita os casarões demolidos na Avenida Paulista que deram lugar a estacionamentos, permitindo a exploração capitalista do imóvel com reduzido benefício à coletividade.
O terceiro aspecto aponta para a conciliação entre preservação e renovação, fator considerado como ideal, uma vez que esses termos não estão em oposição, como comumente se compreende. A gestão exemplifica este ponto citando o SESC Pompeia e a Casa das Rosas, admitindo que a solução obtida para esta última seja passível de discussão. Cita ainda a Mansão Matarazzo que, na época, havia sido tombada, decisão revertida em 1994, o que permitiu a demolição do imóvel, em 1996, para construção do Shopping Cidade de São Paulo, inaugurado apenas em 2015. Como se vê, o documento esbarra na dificuldade de encontrar exemplos de conciliação entre preservação e renovação, exaltando entre os exemplos uma conquista passível de crítica e outra posteriormente nulificada, restando apenas o SESC Pompeia como exemplo válido. De qualquer maneira, a conciliação entre preservação e renovação é central no conceito de patrimônio ambiental urbano e é aqui entendido no campo das disputas sociais, central no conceito de cidadania cultural.
O quarto aspecto, por fim, trata da preservação como ferramenta da democracia, por garantir a sobrevivência material de referências da memória das comunidades, em sua diversidade. Como exemplo de política bem-sucedida, o documento cita o tombamento da Fábrica de Cimento Portland e da vila operária Triângulo, no bairro do Perus, por fazer uso dos conhecimentos da população local, bem como da maneira como essa população apreende o espaço e suas edificações, para a seleção dos bens dignos de preservação patrimonial.
A última parte do documento, intitulada “O DPH: Origens, Atividades e Atribuições”, narra todo o percurso institucional da área cultural e do patrimônio no município, tendo por função propor algumas questões para se pensar a reestruturação do atual DPH e do CONPRESP. Da leitura depreendemos que a trajetória institucional de política patrimonial da cidade se pautou seja pelo discurso da “história oficial” e do patrimônio enquanto necessário ao fortalecimento da identidade nacional, seja por uma valorização da arte e da cultura erudita. Diante disso, a reestruturação do órgão deveria partir do questionamento da própria
concepção de patrimônio histórico, sendo que o documento dá algumas indicações nesse sentido:
Cremos que se trata de superar a antiga concepção – presente aqui desde o projeto de Mário de Andrade – que pensa o patrimônio histórico como “a memória do rei” capaz de civilizar o da plebe. No campo da arquitetura, por exemplo, sucessivas definições apontam em direção do abandono de concepção monumentalista e do cuidado com edificações isoladas de “excepcional valor arquitetônico e artístico”: trabalhar com o espaço urbano em seu conjunto, tendo seus significados pela importância histórica, social e ambiental que assumem para os cidadãos, atentando sobretudo para a questão da qualidade da vida urbana e para a preservação dos sinais físicos da memória social (SÃO PAULO, 1991, s/p, grifo nosso).
O trecho citado concentra todos os aspectos do conceito de patrimônio ambiental urbano na sua confluência com cidadania cultural. Leva em conta o valor cultural do bem e sua construção simbólica, sua importância para a coletividade e relevância enquanto elemento da memória social, e sua preservação enquanto garantia da qualidade de vida na cidade. O conceito de patrimônio histórico aqui empregado distingue-se daquele que entende o patrimônio enquanto elemento da “história oficial”, afasta-se de uma valorização puramente estética e de uma concepção que entende a preservação patrimonial apenas como necessária a uma leitura da cidade e de seus elementos construtivos. Na acepção adotada pelo órgão, patrimônio histórico está vinculado à memória e à qualidade de vida da sociedade. Visa, de um lado, a garantia de espaços de memória e de reprodução de narrativas em sua diversidade, de outro lado, visa a qualidade de vida para a população em seu conjunto, dando prioridade aos grupos normalmente suplantados pela especulação imobiliária e por gestões de governos pouco atentos às coletividades.
Em suma, o conceito de cidadania cultural, em certa medida, retoma e potencializa o conceito de patrimônio ambiental urbano, por remeter às preocupações com a qualidade de vida, com o planejamento urbano e com a memória, em voga nesse conceito de patrimônio. Ao mesmo tempo, o conceito de cidadania cultural avança, por trazer à tona o seu cerne, o direito à memória enquanto constitutivo da cidadania, por se referir à sociedade em seu conjunto, de forma a priorizar narrativas ofuscadas pela memória oficial. O novo conceito assume as disputas sociais em jogo e busca contribuir também na garantia de bem estar a sujeitos comumente ignorados no planejamento urbanístico da cidade. Esse encontro entre patrimônio ambiental urbano e cidadania cultural proporcionou um campo fértil de trabalho e de pensamento sobre patrimônio, fertilidade que ainda tem muito a nos dizer para as práticas
de preservação patrimonial, principalmente se levarmos em conta o papel do patrimônio na consolidação da cidadania e da democracia em nosso país.
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O DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO DE SÃO PAULO NA ADMINISTRAÇÃO DE LUIZA ERUNDINA: QUESTÕES CONCEITUAIS1
EL DEPARTAMENTO DE PATRIMONIO HISTÓRICO DE SÃO PAULO BAJO LA ADMINISTRACIÓN DE LUIZA ERUNDINA: CUESTIONES CONCEPTUALES
Sergio Ricardo RETROZ2
RESUMO: O Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), órgão do município de São Paulo ligado à Secretaria Municipal de Cultura (SMC), desenvolveu sua atividade de preservação patrimonial parcialmente ligada ao conceito de patrimônio ambiental urbano. Durante a administração municipal de Luiza Erundina, a SMC, confiada à Marilena Chauí, passou a trabalhar com o conceito de cidadania cultural. O DPH, naqueles anos sob a direção de Déa Ribeiro Fenelon, passou a conciliar o conceito de patrimônio ambiental urbano com aquele de cidadania cultural, o que proporcionou um campo fértil de trabalho e de desenvolvimento conceitual do patrimônio.
PALAVRAS-CHAVE: Patrimônio. Políticas públicas culturais. Memória. Cidadania.
RESUMEN: El Departamento de Patrimonio Histórico (DPH), organismo de la ciudad de São Paulo vinculado a la Secretaría Municipal de Cultura (SMC), desarrolló su actividad de preservación del patrimonio parcialmente vinculada al concepto de patrimonio ambiental urbano. Durante la administración municipal de Luiza Erundina, el SMC, encomendado a Marilena Chauí, comenzó a trabajar con el concepto de ciudadanía cultural. El DPH, en esos años bajo la dirección de Déa Ribeiro Fenelon, comenzó a conciliar el concepto de
1 This article is a partial result of a doctoral research, funded by CAPES.
2 University of São Paulo (USP), São Paulo – SP – Brazil. Graduated in History (USP), Master's in History (FGV) and PhD in Museology (UNIRIO/MAST). ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2933-0260. E-mail: sretroz@yahoo.com.br
patrimonio ambiental urbano con el de ciudadanía cultural, lo que proporcionó un campo fértil de trabajo y desarrollo conceptual del patrimonio.
PALABRAS CLAVE: Patrimonio. Políticas públicas culturales. Memoria. Ciudadanía.
With these pages I seek to show the meeting of two concepts in the work activities of a heritage body. On the one hand, the concept of urban environmental heritage, forged by intellectuals such as Ulpiano Menezes de Bezerra and Eduardo Yázigi in urban planning and heritage bodies in the city and state of São Paulo. On the other hand, the concept of cultural citizenship, thought and put into practice by Marilena Chauí3 when she was in charge of the Municipal Department of Culture (SMC). The venue for this meeting was the Department of Historical Heritage (DPH) of the City of São Paulo, under the direction of historian Déa Ribeiro Fenelon. And the time when this happened was that of the municipal administration of Mayor Luiza Erundina, between 1989 and 1992.
The concept of cultural citizenship, implemented at the SMC, reached its subordinate body, the DPH, whose work had already been guided by the concept of urban environmental heritage. In our understanding, the meeting of these concepts in the DPH provided a fertility of ideas around the heritage and the repositioning of the body's technicians in the face of the work they performed.
Throughout the 1970s and 1980s, it was conventional to speak of cultural heritage, instead of architectural heritage and historical heritage, expanding the values related to goods. The patrimonial value of a given asset was no longer validated only by its artistic and architectural quality or by its relationship with historical events and political characters, but also the anthropological and social dimension. Heritage migrated from a meaning linked to the discourse of the nation, to a meaning linked to different locations and social groups, consolidated migration, in the Brazilian case, in the Federative Constitution of 1988. Heritage became associated with issues of memory and the environment, considered important to the
quality of life in cities. It began to be understood as a social fact intertwined with urban dynamics and, therefore, its preservation should be considered in urban planning.
According to Juliana Prata (2009), the concept of heritage went through three phases. The first, named by the author as monumentalist, is marked by the constitution of the icons of the nation and the properties preserved in isolation, due to their exceptional value. The second, called the historicist center, in vogue in the period after World War II, is when European nations mobilized to reconstitute their historic centers. Finally, the phase of the contemporary city, in vogue from the 1970s onwards:
There is an understanding that the view of the monument, as an isolated building, even considering its “surroundings” or neighborhood, no longer accounts for the urban dynamics in the 1970s – metropolises and industrialization. And it is not enough to treat the urban complex as a great monument. Other elements come into play, such as social mobilization against the destruction of certain goods, the social demand for the issue of memory, the environmental issue, the quality of life and the participation of civil society in political decision-making processes (PRATA, 2009, p. 20, our translation).
The concept of urban environmental heritage, forged in the 1970s and 1980s by São Paulo intellectuals in public agencies of the State, merges these new understandings of heritage and points to a preservation practice aligned with international discussions. The new concept is based on the recognition of heritage as a material reference for the reproduction of memory, as well as its value in preserving the environment and guaranteeing quality of life. In this way, the new concept goes beyond the traditional concepts of exceptionality and the valuation of isolated assets of remarkable value, starting to understand the heritage as a whole and in preservation actions by areas of interest.
A milestone in this conceptual development of heritage was the holding, in 1974, of the Course on Restoration and Conservation of Monuments and Historic Sites, promoted by partners IPHAN, CONDEPHAAT and USP (ANDRADE, 2012). The course had great names of intellectuals and heritage preservation agencies in Brazil, in addition to the participation of Hugues de Varine, at the time secretary of the International Council of Museums (ICOM). Varine's (2013) contribution was related to his conception that heritage was composed of three elements: environmental heritage, created by nature and by human intervention; the intangible heritage, constituted by knowledge, beliefs and customs; and cultural goods, composed of objects, artifacts and constructions forged by man or nature. Varine, inspired by the thought of Paulo Freire, admits the existence of an educational aspect of heritage and places society as a primordial subject that has a lot to say to the managers of cultural
institutions. An advanced idea, perhaps a very advanced one, for a country that was still ruled by a military dictatorship that kept a check on society's participation in government decisions. Fundamental in the dissemination of these ideas expressed by Varine is the book by
Carlos A. C. Lemos, entitled O que é patrimônio histórico (What is historical heritage), whose first edition dates from 1981. Lemos builds an idea of heritage configured in the links between environment, knowledge and artifact, in a reformulation of the Varine's tripod, as said, composed of environmental, intangible and cultural assets. Lemos is concerned with the preservation of popular uses and customs and with the overcoming of a heritage built by the “ruling class”. He is attentive to the social value of cultural assets and, in this, he affirms his understanding of urban environmental heritage:
The urban nucleus is a cultural asset composed of a thousand and one artifacts related to each other, ranging from those for individual use, passing through others of family utility, starting with housing, to others of collective interest. Thus, we see that an urban conglomerate is summarized in a place where infinite activities are carried out concurrently, carried out through infinite artifacts arranged in space according to their functions or attributions, and to the understanding of what “urban environmental heritage” is only the goods or things, movable or immovable, are of interest, which characterize or allow the good performance of the gregariousness existing there (LEMOS, 2000, p. 47, our translation).
Despite the conceptual advance of urban environmental heritage, according to Andréa Tourinho and Marly Rodrigues (2016) this practice has so far been unable to significantly influence the procedures and methodology of preservation. These continued to prioritize an action aimed at reading the city, preserving the urban environment as an image, to the detriment of a preservation that considers heritage as a social fact, created by collectivities, linked to sociocultural issues, made in the relations between the material and the symbolic. The concept, although innovative according to these authors, weakened over time and, in the 1990s, practically disappeared from heritage discourses, which preferred to talk about intangible heritage and cultural landscape. However, the authors join Ulpiano Bezerra de Meneses – an intellectual who worked at CONDEPHAAT, the state council for the decisions of tipping, and contributed to the conceptualization of urban environmental heritage, mainly in its understanding as a social fact – in the defense of resuming this heritage concept, considering in preservation practices the “social yearnings for the recognition of diverse identities” (TOURINHO; RODRIGUES, 2016, p. 89, our translation).
The concept of urban environmental heritage, however, penetrated specific conservation initiatives, carried out by public bodies in the city of São Paulo, including the
work of the DPH. The application of the concept in preservation practices took place at the initiative of some technicians, working in municipal bodies, concerned with including the preservation of heritage in the range of concerns of urban planning, despite the difficulty of fully developing such attempts in an environment marked by authoritarianism and institutional inflexibility.
The first heritage protection initiatives in the city of São Paulo took place in the 1970s, by the General Planning Coordinator (COGEP)4, created in 1972 with the aim of thinking about the reurbanization of the city with a view to implementing the subway (PRATA, 2009). Supported by the Basic Urban Plan of the Municipality of São Paulo (PUB), of 1968, which foresaw the creation of the so-called special zones, the Z8, COGEP began to elect zones that, in the opinion of the technicians, required further analysis to understand their function in the city (ANDRADE, 2012). The COGEP classified the Bela Vista, Luz and Brás neighborhoods as special zones, as they are considered areas in the process of deterioration, demanding further studies to define their performance in the development of the city, in view of the historical value of certain buildings. The modernization of the city, with the implementation of the subway, the opening of expressways and the construction of viaducts, was seen as a solution for the recovery of the so-called degraded areas. However, in the 1960s and 1970s, given the international context, cities could no longer be modernized without considering the historic centers and the appreciation of old neighborhoods, in a notion of heritage, according to Andrade (2012, p. 63), still in “the process of understanding, digestion and maturation”.
COGEP's methodology of inventorying the city's cultural assets leads to the DPH, not least because the bodies came to work together on what would be the first inventory produced by the DPH, carried out in the second year of its creation. This is the Inventory of the Urban Environmental Heritage of the East Metro Zone, prepared between 1977 and 1978, designed and coordinated by COGEP, with the DPH responsible for the preservation, conservation and revitalization studies (ANDRADE, 2012). The inventory aimed to select the cultural assets that should be preserved in the construction works of the subway on the Brás-Bresser axis. In the selection criteria, priority was given to the construction of factories and workers' villages in the late 19th and early 20th centuries, a period in which the city's first industrialization took place in that region. According to Andrade, architectural, formal or aesthetic styles were at no
4 Like COGEP at the municipal level, the State Secretariat for Economy and Planning (SEP) sought to implement the concept of urban environmental heritage in planning under the responsibility of the state government. At the federal level, we cannot forget the Integrated Program for the Reconstruction of Historic Cities (PCH), created in 1973, and the National Cultural Reference Center (CNRC), from 1975, both connected with this conceptual expansion of heritage and which merged in 1979 into IPHAN.
time criteria for the selection of cultural assets, which was always guided by the representativeness of these assets for local history, a priority in harmony with the concept of urban environmental heritage, as the author states:
The representative character of the local history, taken as the main argument, approach and selection criteria, as well as the dedication to the study of the urban set, the recognition of an environment to be preserved as a testimony of history [used in the Brás-Bresser axis], are elements that point us to the concept of “urban environmental heritage” in the process of affirmation in this period (ANDRADE, 2012, p. 134, our translation).
This experience forged in the DPH a methodology for an inventory of the city, independently tested by the agency in the neighborhood of Liberdade, in 1978, work that would later serve as a model for the General Inventory of Environmental, Cultural and Urban Heritage of São Paulo (IGEPAC), started in 1983 and developed by the agency to date. In other words, we can verify in a central activity of the DPH, the IGEPAC-SP, developed by the then Division of Preservation, the affiliation to the concept of urban environmental heritage.
The DPH, as a heritage body subordinated to the Municipal Department of Culture (SMC), was linked to cultural policies implemented by municipal management. During Luiza Erundina's administration, between 1989 and 1992, the SMC was entrusted to Marilena Chauí, who was already having discussions about cultural policies within the Workers' Party (PT). Chauí conceived the concept of cultural citizenship for SMC, based on the expansion of rights. The new concept is based on the right to participate in the conduct of public policies, possible through participatory management. The right of access to the city's cultural assets, such as theaters, cinemas, libraries and museums. In the right to enjoy the means of production of culture, in order to allow the most diverse groups of society to find the material means for the reproduction of their culture. In the right of recognition of each citizen and each collectivity as subjects capable of producing culture, overcoming an idea of culture normally linked to erudition.
If, on the one hand, cultural citizenship condenses a series of cultural policy guidelines, it is also intended to be a new political culture. In other words, it aims to engender in society a typically citizen political culture, of political participation and openness to the constant creation of new rights, based on demands arising from society itself. In this sense,
cultural citizenship is thought of as a set of citizenship values, based on participation and on the legitimacy of the struggle for rights.
Chauí also understood memory as a right of citizens and different social groups and, in this aspect, located memory in the field of socio-political-cultural disputes. Regarding the intersection between memory and heritage, Chauí (1994 (1979), p. 19) denounces the constant destruction of the “material supports of memory”, which ends up compromising spatial references, preventing the citizen from retracing the path of its trajectory. The author understands the “material supports of memory” not only as the landscape references of the city and objects belonging to social groups, but also as the conditions of material existence, since the author is based on a Marxist reading of society. This concept of “material supports of memory”, therefore, merges the material and immaterial dimension of heritage. This becomes even clearer when Chauí (2006, p. 114) explains that “memory supports” are monuments, documents, collections and objects as forms of “objectified expression of collective memory”. These memory supports, in Chauí's view based on Krisztoff Pomian's reading, would be admitted as historical and cultural heritage in the category of semiophores, being these things whose values are not measured by their materiality, but by their symbolic force, by the ability to " establish a mediation between the visible and the invisible, the sacred and the profane, the present and the past, the living and the dead” (CHAUÍ, 2006, p. 117, our translation), and, for this reason, intended for exhibition and contemplation. Therefore, Chauí attaches importance to guaranteeing social conditions for the transmission of memory, as well as the preservation of physical references in the city, in order to allow the reactivation of the memory of individuals and social groups.
These ideas by Chauí are in harmony with the ideas of Déa Ribeiro Fenelon, who assumes the direction of the DPH and the presidency of CONPRESP, the municipal preservation agency. Fenelon brings the guidelines and values of cultural citizenship to the municipal heritage bodies. It points to the overcoming of a technical discourse of heritage dissociated from its political context, and, in this sense, recognizes the various social forces that guided the preservationist practices carried out until then. In contrast, Fenelon aims to give a collective meaning to heritage, with a view to cultural citizenship, and does so by correlating citizenship to the bases of the concept of urban environmental heritage, when referring to memory, quality of life and the environment:
When we propose the debate and reflection on historical heritage policies, we want to treat it not only in the restricted scope of intervention techniques or of identification and preservation criteria and their operational concepts.
In addition to these aspects, it is necessary to politicize the theme, recognizing the historical conditions in which many of its premises were forged - and articulating them with the struggles for quality of life, for the preservation of the environment, for the rights to plurality and, above all, for the right to cultural citizenship. With this we hope to resume a sense of historical heritage that allows us to understand it as a social and cultural practice of several and multiple agents (FENELON, 1992, p. 31, our translation).
These ideas are in tune with the thinking of DPH technicians and the group of academic intellectuals who started working at the agency. Cássia Magaldi5, for example, builds her defense for the preservation of heritage on the pillar of cultural citizenship. The author understands memory as a right of the most diverse social groups and subscribes to the preservation of heritage in the “social function of property” and in the field of social disputes, as is explicit in the text:
And, among the many demands of the multiple agents that produce the city, the one that concerns the preservation of memory is as important as any other: if it is not directly linked to “interests”, it affects the cultural and social identity of the city's inhabitants, on the control of their past in their relations with the present, in their citizenship rights (inseparable from the temporal dimension) that imply the struggle for appropriation and management of urban spaces for all citizens, in the struggle for democracy. If these rights cannot be subordinated to any other, then it is no heresy to claim that it can even override the sacred right of urban land use. Amen (MAGALDI, 1992, p. 24, our translation).
We see this fusion of the concepts of urban environmental heritage and cultural citizenship also in Maria Célia Paoli's6 thinking. By highlighting the context of conflict and dispute over memory, the author understands that it is the aspects of plural culture that should provoke the notion of heritage as a dimension of a “living past”, in which events and things “deserve to be preserved because they are collectively significant in their diversity” (PAOLI, 1992, p. 25). Preservationist activities, according to the author, referring to architectural heritage, are commonly marked either by an idea of the past as old and outdated, and in this case examples would be preserved from prominently aesthetic categories, or from the past as old and lost, and, in this case, preservation would be guided by nostalgia and fear of loss. In both preservationist senses, one more in search of the exceptional specimen and the other for
5 Architect specialized in restoration, technician at the DPH since 1983. In 1996, she completed a master's degree in history and in 2001 her doctorate, both titles obtained at PUC/SP. Currently, in addition to her activity at the DPH, she is a professor of Architectural Heritage Protection at Assunção University Center – UNIFAI. Source: Curriculum Plataforma Lattes do CNPq. Available: http://lattes.cnpq.br/3754466590350089. Access: 25 June 2021.
the totality of preservation, they would fall into the same mistake of ignoring the “inscription of the collective meaning of 'legacy' of the past”, which would point “clearly to a society destitute of citizenship, in its full sense, if by this word we understand the formation, information and multiple participation in the construction of culture, politics, a collective space and time” (PAOLI, 1992, p. 26, our translation).
Paoli proposes, in this sense, that the work of preservation goes through the collective and plural meaning of heritage, in order to contribute to the development of citizenship. This new path would follow a historiographical trend of prioritizing the history of the losers and not that of the winners, which would explain “how much power has disorganized the possession of a sense of collective participation, destroying the possibility of a differentiated public space” (PAOLI, 1992, p. 27, our translation). The author, in defending this new posture in heritage preservation activities, finally incorporates the principles of cultural citizenship:
The recognition of the right to the past is, therefore, intrinsically linked to the present meaning of the generalization of citizenship by a society that has so far avoided bringing conflict and creativity to the surface as criteria for the awareness of a common past. Recognition that accepts the risks of diversity, of the ambiguity of memories and forgetfulness, and even of the varied deformations of unilateral demands (PAOLI, 1992, p. 27, author’s highlights, our translation).
It is possible to perceive, therefore, in the thinking in vogue in the DPH of the period, an idea of patrimony emerged from the concept of urban environmental patrimony, since it is repeatedly mentioned the conciliation between patrimonial preservation and urban planning, the importance of patrimony for memory, for the quality of life in cities, and aim for a preservation that considers the environment as a whole. In this thought, we also see that heritage is understood in the field of social disputes, as well as memory is understood in its relationship with the identity of subjects and social groups in their diversity. Memory and heritage preservation, in this sense, are understood as a right of the most varied social groups, with priority being given to those who are traditionally excluded from this right. In these aspects, heritage focuses on the right of the citizen, it is important in the consolidation of citizenship. Heritage, therefore, is seen from the perspective of cultural citizenship and these ideas become even more explicit when we see the documentation produced by the DPH in the period.
Some documents from the management of the DPH from this period allow us to see how this link between cultural citizenship and urban environmental heritage operates in the projects and works of the agency. The central element in the conception of heritage management is its indissoluble link with memory, understood as a citizen's right in its diversity of subjects and social groups. The work of heritage preservation, precisely because of its link with memory, escapes from being a mere execution of conservation and restoration techniques, being now understood as interference in the material supports of memory and in the symbolic value of things, the core of the field of culture. The management, in its first planning of activities, recognized the importance of the work traditionally operated by the agency, of restoration and recovery of architectural assets, cataloging and inventory of monuments, collections and buildings and construction of criteria for preservation. It understood, however, that these activities were limited to a practice aimed at architectural preservation, dissociated from the social issues inherent to heritage:
Traditionally, in Brazil, a policy in relation to historical heritage is understood as a policy of cataloguing, identifying and preserving the physical conditions of movable or immovable assets considered significant in historical terms, based on criteria that validate the crystallization of a distant past that can be to be exposed in museological terms. In practice, this policy ends up being limited to an architectural conception of restoration and preservation and, in this conception, cultural and symbolic practices and actions are forgotten or put on the sidelines. The activities developed by the
D.P.H. in recent years they have not escaped these limits, despite attempts to the contrary by sectors of the Department itself. Thus, one of the first tasks of this administration is to promote the critique of these dominant conceptions of historical heritage, building a broad notion that encompasses individual and collective practices, doings and memories and, at the same time, enabling this discussion not to be restricted to D.P.H. and S.M.C., but that is primarily done through the participation of sectors of society directly involved and the population in general (SÃO PAULO, 1989, p. 3, our translation).
The concern of the DPH started, in that administration, to be the one linked to memory and to cultural practice, a concern that should be the basis of all the technical operations of preservation that the body would carry out, as it becomes clear when the criticism specifically of the work from the DPH Preservation Division is sharpened:
The Preservation Division, although it has expanded its interest in developing programs to value certain historic parts of the city, has limited itself to continuing the restoration and conservation work of Houses- Museum, when there are funds and willingness to apply them. (SÃO PAULO, 1989, p. 5, our translation).
In the DPH planning document for the year 1991, the agency's actions were distributed by themes and priorities according to the SMC guidelines, which shows that the agency sought to align itself with the goals stipulated by the SMC project, which was designed from the concept of cultural citizenship. The theme “Quality of life in the city: living and dying in São Paulo” had as a priority, in the document, the “Preservation of Urban Environmental and Cultural Heritage”, that is, the preservation of heritage is understood as the main action of the body linked to the guarantee of quality of life in the metropolis. Heritage management in the city of São Paulo started to have the clear objective of containing the developmental movement of urban space, driven by real estate speculation, so thinking about heritage together with urban planning, in order to guarantee quality of life for citizens. These concerns with the quality of life in the city and with the conciliation between urban planning and heritage preservation, in a certain way, resume central ideas of the concept of urban environmental heritage and take us back to the first preservation initiatives of the DPH, in the mid-1970s, frustrated by the authoritarian decisions characteristic of the period of military dictatorship.
Other management documents express central points of the concept of urban environmental heritage, such as guaranteeing the quality of life in the city to the detriment of a pure conformation of space to the development of capital. And these concepts are evidenced from the perspective of cultural citizenship, by recognizing social disputes and prioritizing social strata normally excluded from the right to the city. Among these documents, we highlight one entitled “DPH, Memory, Preservation and Landmarking: contributions to an urban policy” (SÃO PAULO, 1991, n/p.), issued between 1991 and 1992. The document is organized into four parts and works as a compendium of other documents produced during the administration. The first part consists of a descriptive text of the contribution of the DPH to the work of preservation, landmarking and urban policy for the city. The second, called “support texts”, comprises the resolution of the “Historical Heritage and Citizenship Congress: the right to memory”, held in August 1991, and a lecture by Riccardo Mariani. The third contains the CONPRESP restructuring bill and the list of listed assets or under analysis, which makes us believe that the document dates from 1991. The fourth, called Annexes, has a document entitled “DPH: Origins, Activities and Assignments”. We would like to stick to the first and last parts of this document, as they historicize the work of the DPH and CONPRESP and point to the project used in the management.
The text starts from the observation that the city had an expansion process
“characterized by violence against the majority of its inhabitants” (SÃO PAULO, 1991, n/p,
our translation). In this process, the poorest strata were constantly expelled from the center and pushed to the periphery, and the works carried out favored the need for the circulation of goods and people, being driven by a logic of capital to the detriment of well-being in the city. The management, faced with this situation, according to the document, was faced with a challenge, since its commitment to the working class implied “reversing an ingrained culture of submission to the designs of the developers”. The fundamental resource for facing this challenge, regarding urban planning, was the elaboration of the Master Plan for the city, the only document written by the management in this sector that still encountered obstacles for approval by the City Council, for relativizing the individual right over property against the rights of “citizens as a whole”, in addition to creating “channels for popular participation in decisions” (SÃO PAULO, 1991, n/p, our translation).
The heritage preservation initiative is understood in the document under four aspects. The first refers to the quality of life in the city, understanding the landmarking as a way of legitimizing the heritage, a resource considered central to the preservationist activity, but denounced, in the text itself, for its mistaken uses, for traditionally privileging public policies, the landmarks of the “official history” and the examples of “exceptional value”, generating a “decoration” of the city to the taste of the ruling classes. The document understands that the guarantee of quality of life involves the preservation of “physical testimonies of the multiple and contradictory voices of the past”, connecting, once again, memory, in its diversity, with the quality of life. The text also accuses the degradation of the city center as a result of the conjunction between public indifference and real estate speculation, whose keynote is the destruction of properties and construction of new ones, the opening of roads and the consequent compromise of life in its surroundings.
The second aspect of heritage refers to the so-called sacred right to property, characteristic of a “vulgar notion of modernization”, marked by constant urban renewal, by the “clean and razed territory”. The document states that preservation actions are uncomfortable because they violate private property rights and seek to keep the working class in areas of high real estate value. As an example, the document cites the demolished houses on Avenida Paulista that gave way to parking lots, allowing the capitalist exploitation of the property with little benefit to the community.
The third aspect points to the conciliation between preservation and renovation, a factor considered ideal, since these terms are not in opposition, as is commonly understood. The management exemplifies this point by citing SESC Pompeia and Casa das Rosas, admitting that the solution obtained for the latter is open to discussion. It also mentions the
Matarazzo Mansion, which, at the time, had been listed, a decision reversed in 1994, which allowed the demolition of the property, in 1996, for the construction of Shopping Cidade de São Paulo, which opened only in 2015. As can be seen, the document encounters the difficulty of finding examples of conciliation between preservation and renovation, extolling among the examples a conquest subject to criticism and another later nullified, leaving only SESC Pompeia as a valid example. In any case, the conciliation between preservation and renovation is central to the concept of urban environmental heritage and is understood here in the field of social disputes, central to the concept of cultural citizenship.
The fourth aspect, finally, deals with preservation as a tool of democracy, as it guarantees the material survival of references to the memory of communities, in their diversity. As an example of a successful policy, the document mentions the listing of the Portland Cement Factory and the Triângulo working village, in the Perus neighborhood, for making use of the knowledge of the local population, as well as the way in which this population perceives the space and its buildings, for the selection of assets worthy of heritage preservation.
The last part of the document, entitled “The DPH: Origins, Activities and Attributions”, narrates the entire institutional course of the cultural and heritage area in the municipality, with the function of proposing some questions to think about the restructuring of the current DPH and CONPRESP. From the reading, we infer that the institutional trajectory of the city's heritage policy was guided either by the discourse of "official history" and heritage as necessary for the strengthening of national identity, or by an appreciation of art and erudite culture. In view of this, the restructuring of the body should start from questioning the very concept of historical heritage, and the document gives some indications in this regard:
We believe that it is a question of overcoming the old conception – present here since Mário de Andrade's project – which thinks of historical heritage as “the memory of the king” capable of civilizing that of the common people. In the field of architecture, for example, successive definitions point towards the abandonment of the monumentalist conception and the care with isolated buildings of “exceptional architectural and artistic value”: working with the urban space as a whole, having its meanings by the historical, social and environmental importance that they have for citizens, paying particular attention to the issue of quality of urban life and the preservation of the physical signs of social memory (SÃO PAULO, 1991, s/p, author’s highlights, our translation).
The quoted passage concentrates all aspects of the concept of urban environmental heritage at its confluence with cultural citizenship. It considers the cultural value of the
property and its symbolic construction, its importance to the community and relevance as an element of social memory, and its preservation as a guarantee of quality of life in the city. The concept of historical heritage used here is different from the one that understands heritage as an element of “official history”, it moves away from a purely aesthetic valuation and from a conception that understands heritage preservation only as necessary for a reading of the city and its constructive elements. In the sense adopted by the agency, historical heritage is linked to the memory and quality of life of society. It aims, on the one hand, to guarantee spaces of memory and reproduction of narratives in their diversity, on the other hand, it aims at the quality of life for the population as a whole, giving priority to groups normally supplanted by real estate speculation and by managements of governments that pay little attention to collectivities.
In short, the concept of cultural citizenship, to a certain extent, resumes and enhances the concept of urban environmental heritage, by referring to concerns about quality of life, urban planning and memory, in vogue in this concept of heritage. At the same time, the concept of cultural citizenship advances, by bringing to light its core, the right to memory as constitutive of citizenship, by referring to society as a whole, in order to prioritize narratives overshadowed by official memory. The new concept assumes the social disputes at stake and also seeks to contribute to guaranteeing the well-being of subjects commonly ignored in the urban planning of the city. This meeting between urban environmental heritage and cultural citizenship provided a fertile field of work and thought about heritage, fertility that still has a lot to say for heritage preservation practices, especially if we consider the role of heritage in the consolidation of citizenship and of democracy in our country.
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