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Pandemia e habitus de classe:
Análise
de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de
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Araraquara
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e022024
,
2022
.
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ISSN
2358
-
4238
DOI:
https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.17628
1
PANDEMIA E
HABITUS DE CLASSE
: ANÁLISE DE PRÁTICAS SOCIAIS DE
AUTOCUIDADO DURANTE A PANDEMIA DE COVID
-
19 NA REGIÃO
METROPOLITANA DO RECIFE
PANDEMIA Y HABITUS DE CLASE: ANÁLISIS DE LAS PRÁCTICAS DE
AUTOCUIDADO SOCIAL DURANTE LA
PANDEMIA DE LA COVID
-
19 EN LA
REGIÓN METROPOLITANA DE RECIFE
PANDEMIC AND CLASS HABITUS: ANALYSIS OF SOCIAL SELF
-
CARE
PRACTICES DURING THE COVID
-
19 PANDEMIC IN THE METROPOLITAN
REGION OF RECIFE
Bruno Leonardo
FONSECA
1
RESUMO
:
Neste
artigo, por meio de etnografias e biografia sociológica realizada com Jiboia
–
um membro
das classes
populares brasileira
–
,
apresentamos que diante do contexto
pandêmico a utilização de máscaras, realização do isolamento social, vacinação e higienização,
não são apenas respaldadas pelas condições objetivas de vida, mas também, pelos
condicionantes subjetivos de existência quando estes estão associados à
desigualdade
existencial.
Este último, por vez, se estabelece na desigual alocação de respeito, dignida
de e
valorização da própria vida.
PALAVRAS
-
CHAVES
:
P
and
e
mia.
C
lasses populares.
D
esigualdade.
H
abitus de classe.
Pierre Bourdieu.
RESUMEN
:
En este artículo, a través de etnografías y biografía sociológica realizadas con
Jiboia
–
miembro de las
clases populares brasileñas
–
, presentamos que, ante el contexto de
pandemia, el uso de mascarillas, el aislamiento social, la vacunación y la higiene, no son sólo
sustentada en las condiciones objetivas de vida, pero también en las condiciones subjetivas d
e
existencia cuando éstas se asocian a la desigualdad existencial. Este último, a su vez, se
establece en la desigual asignación del respeto, la dignidad y el aprecio por la vida misma.
PALABRAS
CLAVE
:
P
andemia.
C
lases populares.
D
esigualdad.
H
abitus de c
lase. Pierre
Bourdieu.
ABSTRACT
:
In this article, through ethnographies and sociological biography carried out
with Jiboia
–
a member of the Brazilian popular classes
–
, we present that, in the face of the
pandemic context, the use of masks, social isolation, vaccination and hygiene, are not only
supported by the objective conditions of life, but also by the subjective condit
ions of existence
when these are associated with existential inequality. The latter, in turn, is established in the
unequal allocation of respect, dignity and appreciation of life itself.
KEYWORDS
:
Pandemic. Popular classes. Inequality.
Class habitus. Pie
rre Bourdieu.
1
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
, Recife
–
PE
–
Brasil.
Arquiteto e Urbanista
,
mestrando em
Sociologia pelo Programa de Pós Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco
(PPGS/UFPE).
ORCID
:
https://orcid.org/0000
-
0001
-
7149
-
857X
.
E
-
mail: brunofonsecaln@gmail.com
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2
Introdução
Ao longo dos últimos três anos de pandemia, as práticas de utilização de máscaras,
higienização das mãos, isolamento social, vacinação, busca por atendimento médico quando
necessário, tem se tornado práticas cotidianas fundament
ais para lidar com os perigos e ameaças
advindos do Coronavírus. Tais práticas, nomeadas neste presente artigo de
práticas de proteção
pandêmica,
são atravessadas por questões relativas às desigualdades sociais concernentes à luta
de classes e, não estão,
sob nenhuma hipótese, acessíveis de modo socialmente justo para todas
e todos.
Amartya Sen (2001) nos ensina que para formularmos uma dada dimensão a ser
analisada de uma desigualdade social qualquer, carecemos da evocação do seguinte
questionamento:
“des
igualdade de que?”,
para assim, como estratégia de pesquisa,
formularmos os “espaços de avaliação", isto é, a seleção dos critérios relevantes que serão
utilizados para analisarmos uma determinada desigualdade social.
No caso desta pesquisa, analisamos no
s “espaços de avaliações” a reconstrução dos
sentidos que os agentes sociais atribuem aos seus atos. A
prática de proteção pandêmica
aqui
analisada a partir das desigualdades sociais que residem entre as
condições objetivas de vida
e
as
condicionantes subj
etivas de existência
. Esta última, posta no sentido bourdiesiano de
ethos
de classe
2
,
compreendido aqui sob o conceito de Therborn (2011) de
desigualdades existenciais
-
relativo às questões de baixa dignidade,
autoestima
social e valorização da própria vida.
Para tanto, utilizamos como metodologia as análises etnográficas e, principalmente,
biografias sociológicas fincadas em Bernard Lahire (2004), na qual utilizamos, além dos
conceitos que serão apresentados em breve, t
rês roteiros de entrevistas
semiestruturados
. A
pesquisa revela que as práticas
de proteção pandêmica
não são apenas respaldadas por
desigualdades materiais e econômicas. Ao reconstruir os sentidos que os agentes atribuem a
tais práticas, inferimos que os
condicionantes subjetivos relativos à desigualdade
existencial
são determinantes sociais. Assim, após apreendermos as disposições subjetivas de Jiboia em
diversos contextos sociais, diacrônicos e sincrônicos, compreendemos que no contexto
pandêmico
as ques
tões relativas à baixa valorização da própria vida figuram
como
determinantes para as baixas
práticas de proteção pandêmica
no caso de Jiboia.
2
O conceito
bourdieusiano
de
habitus
é aqui fragmentado para atender com melhor precisão os interesses desta
pesquisa, embora Pierre Bourdieu ao longo da sua trajetória acadêmica tenha abdicado desta fragmentação.
Tratamos do conceito de
habitus
a partir de três partes constitutivas: o
eidos
,
conjunto de esquemas lógicos de
avaliação e ação; o
hexis
relativo à corporificação, no sentido das disposições que se tornaram corpo, posturas,
gesto; e o
ethos,
como um conjunto axiológico e sistemático de disposições da dimensão ética, nas formas de s
er
e estar no mundo social. Nesta pesquisa utilizamos especialmente
habitus
e
ethos.
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As três entrevistas foram realizadas ao longo dos anos de 2021 e 2022, contou com um
gravador de áudio e um blo
co de papel para tomadas de notas, ambos autorizados por Jiboia. A
entrevista ocorreu em sua casa, mais especificamente no espaço destinado para o seu
mercadinho, enquanto atendia os poucos clientes. Jiboia foi informado que a pesquisa tratava
da vida dos
moradores de ocupações urbanas e que os dados colhidos não seriam
necessariamente utilizados; além disso, o entrevistado foi informado que qualquer questão que
levasse ao reconhecimento de sua verdadeira identidade seria
mantida
sob sigilo.
Desigualdade
Existencial e Habitus de classe no Brasil
Acerca da disposição na sociologia disposicionalista, de acordo com Pierre Bourdieu
(2001, p. 171), após um jogo de palavras
heideggeriano, “disposição é exposição”
e, isto
ocorre, justamente porque o corpo está exposto às exterioridades do espaço social: aos perigos,
aos acolhimentos, às complacências ou constrangimentos do mundo social que o cerca, a
começar pelas imposições das condições materiais de existência, c
omo por exemplo, os agentes
sociais residentes nos bairros populares
–
os quais apresentam os baixos índices das
práticas
de proteção pandêmica
–
que carecem de toda uma condição material que os distanciam do
cumprimento das recomendações do isolamento s
ocial, uso de máscaras, vacinação etc.
Assim, é a partir de uma determinada
posição objetiva
-
principalmente através da classe
social
-
ocupada no espaço social que os agentes sociais compreendem o espaço social que os
engloba, e assim vão se condicionand
o a uma classe de
habitus
que os orientam pelos
condicionantes deste mundo social específico. O
habitus
se encontra ajustado às regularidades
da posição no mundo social, funcionando como estrutura estruturante e estrutura estruturada,
isso porque as estrut
uras sociais utilizadas pelos agentes para compreender o mundo são ao
mesmo tempo o produto incorporado desse mesmo mundo estruturado e estruturante que o
cerca, pois, como se sabe, os agentes sociais apenas compreendem o mundo social que os
engloba, engen
drando neste sentido
“produtos de uma sistematicidade não desejada e
inconsciente a si mesma”
(BOURDIEU, 2007, p. 45); e que, por vez, estão aptas a orientar os
indivíduos por práticas sociais comuns e cotidianas, sendo estas mais ou menos homólogas
entre
os membros da mesma fração e classe social. Isso significa que os agentes sociais ao
tomarem suas decisões acerca das
práticas de proteção pandêmica
não escolhem o princípio
de suas escolhas, que é o
habitus classe.
Na
praxiologia bourdieusiana
a
prática
é
o lugar da dialética entre as
posições objetivas
e
disposições subjetivas,
cabendo ao primeiro, a exterioridade objetivada das estruturas sociais
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que condicionam a percepção e a ação dos agentes sociais, como uma espécie de uma
“tabela
rigorosa das catego
rias historicamente constituídas
” (BOURDIEU, 2007, p. 436), ou seja, de
um
espaço social
que se constitui no e pelo sistema de oposições
relacionais
das diferentes
posições sociais e das diferentes distribuições das condições de vida; enquanto o segundo,
encontra
-
se abrangido pelo conceito de
habitus
, definido como o princípio unificador das
disposições subjetivas
que, embora se formem no decorrer da
história coletiva de uma
sociedade.
Neste sentido, por meio da incorporação no decorrer da história individual dos agentes
sociais, de acordo com as diferentes posições objetivas dos agentes em um dado espaço social,
que se pré
-
condicionam as diferentes p
ercepções e as ações destes agentes em cada contexto
socializado e socializante, tornando o
habitus
um produto da aquisição histórica por um legado
das
lutas históricas
entre as diferentes classes sociais.
Na obra
“Subcidadania brasileira”
(2018), o sociól
ogo reconstrói o modelo
bourdieusiano
de classe social no Brasil, considerando as diferenças fundamentais entre as
sociedades de países centrais e as de países periféricos. Em sua interpretação sociológica das
classes sociais brasileiras, a noção burdieusi
ana de luta de classes e de habitus de classe se soma
a noção
tayloriana de hierarquias
valorativas das sociedades modernas, as quais são fundadas
em fontes de instituições fortes, como o mercado e o Estado, e que acabam classificando apenas
como cidadão o
s agentes capazes de lidar com as exigências modernas, como a prospecção,
produtividade, racionalidade
.
Esse reconhecimento de cidadania moderna, concedida apenas
aos agentes racionais dignamente produtivos, respaldadas pelas “fontes morais” das instituiçõ
es
fortes na modernidade, é definido como
habitus primário
.
Neste sentido, Jessé Souza (2018) argumenta que o
habitus
pensado por Pierre Bourdieu
não pressupõe uma condição fundamental da sociedade francesa: o reconhecimento
socialmente compartilhado, de m
odo transclassista, na qual todos os franceses são cidadãos
franceses. Por outro lado, a ausência dessas mesmas pré
-
condições sociais caracterizam o
conceito de
habitus precário
, correspondendo ao conjunto das disposições subjetivas
interiorizadas
-
de aco
rdo com as posições e condições objetivadas
-
que segundo Souza (2018,
p. 240) “
não atendem às demandas objetivas para que um indivíduo ou um grupo social possa
ser reconhecido como produtivo e útil numa sociedade de tipo moderno e competitivo
”, sendo
assi
m, reconhecidos socialmente como
subprodutores e subcidadãos
e, portanto,
sub
-
humanos
.
O resultado é a construção de toda uma gama simbólica de estigmatizações e noções
preconceituosas que apresentam correlatos de estruturas cognitivas dos agentes sociais:
desqualificando, criminalizando e abolindo o reconhecimento da dignidade social de uma classe
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social inteira, inclusive tendo esse reconhecimento pejorativo compartilhado entre as próprias
vítimas da violência simbólica exercida.
Dito isso, Souza (2018) d
efine as classes populares brasileiras, em sua condição social
peculiar de subcidadania, pela produção e reprodução de um
habitus precário
ao longo do
tempo e do espaço, sendo essa a condição peculiar para a produção e reprodução da
ralé
estrutural
brasile
ira. Neste sentido, na tese central da obra, é explicado que cerca de 1/3 da
população brasileira, devido à ausência das pré
-
condições sociais mínimas para dar conta das
exigências da dignidade do “agente racional” moderno, encontra
-
se na posição de exclus
ão e
desclassificação perante toda a sociedade como “subprodutores” e, portanto, classificados pela
hierarquia valorativa moderna como
subcidadãos.
Cabe ressaltar ainda, que esse enorme
contingente de brasileiras e brasileiros foi primeiramente nomeado por
Florestan Fernandes
(2008) como primeira
ralé urbana
e
ralé secular,
justamente
pela ausência das condições
psicossociais
necessárias
para integrarem a uma sociedade moderna e competitiva.
Acerca da baixa dignidade social, da condição de subcidadania, da
negação de
reconhecimento social como agente produtor e válido que atinge grupos sociais e classes sociais
inteiras. O sociólogo Goran Therborn (2011, p. 21
-
22) propõe perspectivas analíticas entre
diferentes tipos de desigualdade. Para o nosso interesse,
destacamos a noção de
desigualdade
existencial
, estabelecida na
negação de uma igualdade entre todas as pessoas humanas, por meio
das desiguais alocações de respeito, reconhecimento social, dignidade, humilhação, ignorância
e marginalização.
Deste modo,
ao tratarmos do habitus de classe, ou mais precisamente, do
ethos de classe
da
ralé estrutural
brasileira, estamos falando de um
ethos precário,
ou seja, uma concepção de
ser e estar no mundo constituída de modo precarizado; devido à ausência das pré
-
condi
ções
sociais necessárias para obter o reconhecimento social de cidadania moderna e a dignidade
social; restando a estes indivíduos e classes sociais inteiramente marginalizadas e
estigmatizadas uma ausência do reconhecimento da dignidade humana, resultando
em
concepções identitárias de baixa autoestima e dignidade individual e coletiva, assim como, por
tantas outras condições que correspondem ao
polo
deficitário da
desigualdade existencial.
Entretanto, cabe ressaltar que que o habitus de classe não está pos
to aqui de maneira
mecanizada por coerções externas, e sim de um
habitus
adaptável, sendo transponível aos
diversos contextos sociais das diferentes práticas sociais. Como propõem por Bernard Lahire
(2004) ao assumir uma postura sociológica dentro do campo
disposicionalista da ação que
considera a pluralidade dos diferentes meios sociais sendo rebatido na pluralidade da
socialização dos indivíduos, que por fim, desdobra
-
se na pluralidade disposicional dos agentes
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sociais a partir da particularidade de cada
trajetória social. Lahire elabora da obra bourdieusiana
constrói o entendimento de que a heterogeneidade do mundo social está incorporada na
construção social dos indivíduos, ou ainda, que toda ideia de
campo
-
que compõem as múltiplas
externalidades do es
paço social
-
opera também na dimensão individual interiorizada nos
agentes sociais. Assim, nesta biografia sociológica aqui apresentada, utilizamos conceitos
disposicionais como inclinações, pluralidade de disposições, aptidões, variações
intraclasse
,
rup
turas
biográficas etc.
Jiboia
Mais conhecido como Jiboia, Antônio da Silva é um dos moradores mais antigos da
Ocupação Dandara na periferia do Recife. Jiboia tem 62 anos, divorciado diversas vezes, pai
de 18 filhos sem estabelecer relação firme com nenhum. É pedreiro e proprietário de
duas
pequenas “barracas” onde se comercializa produtos higiene, limpeza, alimentos básicos,
bebidas alcoólicas, que funcionam dentro das suas duas casas localizadas em duas ocupações
urbanas.
Proprietário de um patrimônio de capacidades no que diz respeit
o às práticas da
construção civil, Jiboia é reconhecido frequentemente como o “engenheiro da ocupação”,
prestando serviços tanto quando a questão é coletiva, como também na ajuda pontual aos
vizinhos. Jiboia é solidário e suas habilidades de provimento da
vida cotidiana diante de
condições objetivas tão precarizadas estão, por muitas vezes, a serviço da ajuda comunitária.
Apesar das queixas pela falta de reconhecimento por suas ações coletivas e da falta de
colaboração financeira dos demais, Jiboia se orgul
ha dos serviços prestados.
Em sua trajetória como militante por direito à moradia, foi por mais de duas décadas
presidente da associação de moradores de uma famosa comunidade do Recife, conhecida no
campo do direito à cidade pelo histórico de resistência
contra os despejos fundiários.
"Olhe, dos 13 anos pra trás eu sofri demais"
Jiboia é natural da zona rural de Aliança
-
um pequeno município localizado na zona da
mata norte pernambucana. Jiboia nasceu, como costuma dizer,
dentro de um partido de cana,
inclusive,
lugar no qual também sofreu a exploração do trabalho infantil na lav
oura
.
Jiboia
permaneceu neste trabalho relativamente análogo à escravidão até que decidiu fugir para o
Recife
-
"Olhe, dos 13 pra trás eu sofri demais".
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Jiboia é o único filho de seu pai com sua mãe; "
Meu pai era Durval Caetano, chamava
ele de Durval, meu
pai era de Exú. Foi pra usina ficar trabalhando, aí em Aliança mesmo ele
morreu".
Jiboia é órfão por parte materna desde o seu nascimento, a história do que realmente
houve com sua mãe e os motivos de ter sido arrancado dela ainda ao nascer nunca lhe fora
m
revelados. Apesar dos 62 anos, Jiboia ainda hoje não sabe o paradeiro de sua mãe; não sabe o
que aconteceu no seu nascimento; não sabe se seus pais biológicos tiveram alguma relação
conjugal; como também não sabe sequer dar certeza sobre o nome dela. Que
stões tais que lhe
traz ressentimento e tem desdobramentos em sua vida.
Quando Jiboia tinha apenas três anos de idade, Durval se casou com Ruth, a quem
para
ele logo de início é classificada como
muito malvada.
–
"
Tem mãe que não é a mãe da gente,
mãe é
mãe”.
Da união de Durval e Ruth nasceram mais três filhos. Assim sendo, a composição
familiar mais central ficou constituída com Jiboia sendo o filho mais velho da casa.
O período em Aliança, ao longo da sua infância e início da adolescência, traz memória
s
à Jiboia que ele não gosta de recordar. As duras dores do passado que, como nos revela "
Me
vêm na cabeça, mas tento esquecer"
, estão fortemente vinculadas às condições objetivas de
vida, bem como pelas particularidades que as
variações intraclasse
. Como
se sabe, o trabalho
infantil no campo atinge milhares de crianças no nordeste brasileiro; contudo, como
mostraremos nesta pesquisa, cada indivíduo desta posição social se relaciona de modo singular
com o mundo social, seja nas aptidões, inclinações, dispos
ições, particularidade de cada
trajetória.
No trabalho da cana, Jiboia começou a acompanhar o pai tão cedo em sua vida que não
consegue sequer recordar
-
se quando passou a auxiliar o pai nas atividades de trabalho. Aos 8
anos, já dispondo de um
patrimônio d
e capacidades disposicionais
que são exigidas nas
atividades de trabalho da lavoura, incorporada através de uma
socialização indireta
com o
mundo do trabalho do pai, Jiboia foi convidado pelo feitor da usina a trabalhar "formalmente".
Além de ser criança e
ter que enfrentar o árduo trabalho da cana, Jiboia fala com revolta
e ressentimento do período em que trabalhou em sua cidade natal. Principalmente devido à
posição ocupada no espaço familiar e nas relações particulares estabelecidas com sua madrasta;
cab
e destacar ainda que é nas intersecções entre os contextos do mundo do trabalho e do mundo
familiar que as interações estabelecidas com a madrasta
se tornam
ainda mais ardilosas e, até
mesmo, mais desumanas. Ele nos conta, em tom agressivo, que era comum s
ofrer sanções
impostas pela madrasta caso não batesse as metas diárias do trabalho na usina, como por
exemplo, almoçar apenas quando terminasse o serviço; se não conseguisse terminar até o
horário do almoço, era obrigado a cumprir a demanda de trabalho no
período da tarde, sem sua
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principal refeição do dia. As duras sanções impostas, assim como a apropriação de seu salário
por Ruth não ocorriam escondido de Durval; ao contrário, o pai de Jiboia foi bastante omisso
diante do contexto
-
"Eu ficava magoado por
que pai nada dizia".
Embora seja habilidoso com os números, na construção civil e na administração de suas
duas barracas, como orgulha
-
se em contar, Jiboia é analfabeto. A sua relação com o mundo
escolar praticamente inexistiu em sua trajetória de vida: co
meçou aos 9 anos e parou aos 13,
quando fugiu para o Recife. Além das várias dificuldades impostas, como a grande distância
entre sua casa e o colégio, o horário da escola quase sempre era comprometido pelas obrigações
do trabalho, pois, como
ele
alerta, a
prioridade era sempre ir ao trabalho. Em entrevistas, Jiboia
se culpa por ser analfabeto e se
autopenaliza
por isso, definindo
-
se, inclusive, como “
uma
pessoa neutra”.
Outro ponto de sofrimento social que teve sua gênese em sua infância
-
talvez o mais
c
entral
-
e que cabe aqui ser compreendido como um
ethos precário
estabelecido como um
condicionante subjetivo a partir de uma posição de
ralé estrutural
brasileira é uma certa
desestruturação do núcleo familiar, do qual se espera que atue como ambiente fec
undo da
transmissão afetiva de valores. No caso particular de Jiboia, o tipo de relação específica com a
madrasta, a ausência materna ao longo de sua vida, a exploração no trabalho infantil da lavoura
da cana, a extrema pobreza, ausência do ambiente escola
r e a omissão do pai conformam as
particularidades de um
ethos precário
engendrados ainda na infância e adolescência.
Jiboia, um sujeito solto no mundo, um bezerro rejeitado
Em muitos dos momentos nos quais fala de si, Jiboia expressa uma vida marcada
pela
solidão, tanto na dimensão familiar, ausência materna, ausência de uma companheira
matrimonial, o não reconhecimento como irmão pelos demais irmãos parte de pai
-
“Me sinto
sozinho no mundo porque os outros que eu tenho de lá não liga pra mim, tem doi
s irmãos nunca
vem na minha casa, eu fui lá não sei quantas vezes”
-
,
sem relação próxima com os 18 filhos,
como também nas relações de amizade; embora more há quase 50 anos na região metropolitana
de Recife, Jiboia não construiu nenhuma amizade duradoura
e sólida.
Neste sentido, é possível inferir que a vida solitária figura como um elemento importante
em sua vida. Ao longo da entrevista e dos eventuais encontros nos quais pude observar e
interagir com Jiboia, uma música por ele nomeada de "Bezerro
rejeitado" foi, por vezes, trilha
sonora dos momentos que estivemos juntos. A música o sensibiliza e o traz um significativo
grau de identidade e reconhecimento:
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9
J
-
Oxe, sofria, é por isso que de vez em quando toca essa música eu fico
meio triste
[...]
Um bezerro rejeitado, um gado quando rejeita um filho
você faz o quê? O cara não dá na mamadeira? Porque a mãe não queria
dar.... aí fico pensando nisso.
Penso muitas vezes, aí depois que saiu essa
música, pronto! Aí é que eu penso mesmo… Eu me lembro muit
o dessa
música por mode disso, eu nasci um bezerro rejeitado, não vi mãe
, ficava
mamando de um, ficava mamando de outro,
aí fica no lamento
Uma outra questão central na vida solitária de Jiboia é a ausência de uma companheira
conjugal fixa, principalmente
em dois pontos. Primeiro, está ligado à divisão sexual do trabalho,
a ausência de uma companheira é também a ausência de um alguém que cumpra as atividades
domésticas, assim, a dupla jornada de trabalho, que em geral, é comum às mulheres, acaba
sendo cump
rida cotidianamente por Jiboia. Segundo, a ausência de reconhecimento no amor,
cabendo a esta uma ausência de um companheirismo conjugal, como nas atividades de lazer e
afeto.
Seu pai foi o único parente do núcleo familiar mais central que Jiboia estabele
ceu
relações familiares mais sólidas. Inclusive, a única herança via transmissão afetiva de valores
herdada da família como patrimônio disposicional, advém do pai na forma de uma dada
economia moral
, no sentido do lidar com as relações conjugais e com as b
aixas condições
objetivas de vida:
J
-
É por isso que hoje em dia, quando meu pai morreu, me chamou, e eu fui
lá. Ele disse, “olhe meu filho, tô
morrendo” chamou os filhos tudinho. Eu e
Luizinho... fui,
‘olhe, só tem uma coisa que eu peço a você, você casou
-
se,
não bata na mulher, nem deixe passar fome, se não der pra viver deixe, e
não deixe sua geladeira faltar nada dentro de casa’, hoje em dia
tá aí, tem
quatro [geladeiras], onde você procurar tem um pedaço de carne, graças
a deus!
As particularidades dos encontros: as rupturas de uma trajetória
Ao longo dos seus 62 anos, Jiboia diz ser grato a apenas duas pessoas em sua vida;
ambas estabelec
eram relações particulares com Jiboia e foram em si potencialidades
transformadoras ao longo do percurso biográfico. As socializações estabelecidas com Paulo e
Faixa foram fundamentais no percurso de vida de Jiboia, e como o entrevistado coloca, a vida
sem
eles seria diferente hoje
–
"
Paulo e Faixa foi muita coisa pra mim…
seria diferente porque
eu não teria aprendido as coisas que eu sei.".
Faixa é a figura responsável por uma importante
ruptura biográfica
na vida de Jiboia,
pois
"Faixa quem me tirou da cana, não sei se tá vivo ou se está morto, mas agradeço aonde
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ele tiver"",
como também, inclusive, foi com Faixa que Jiboia começou a aprender as primeiras
competências construtivas: "
Ele fazia jarro... tá, aprendi a fazer jarro… me
xer com gesso.".
Faixa ofereceu
-
lhe emprego e moradia no Recife e, mesmo que estes fossem bastante
precarizados e Jiboia ainda estivesse submetido aos abusos do trabalho infantil, ainda assim, na
época, foi o caminho escolhido por ele diante das possibili
dades e impossibilidades para seguir
sua vida. A vida de Jiboia trabalhando para Faixa não durou muito, após seis meses, Jiboia se
indignou com as condições impostas por Faixa e deixou de trabalhar para ele.
Na história que Jiboia nos conta sobre sua vida
é fundamental ressaltar que ao longo da
cronologia contada por ele há uma lacuna sem informações relativo ao período entre sua saída
da casa de Faixa e o momento que ocupou o que é hoje a comunidade do Iraque. Em um período
de mais ou menos 10 anos, não s
abemos o que aconteceu na vida de Jiboia. Nas ocasiões das
três entrevistas, buscamos acessar de muitas formas informações acerca do período, contudo,
todas em vão.
Enquanto Paulo nos é apresentado como seu grande mestre
-
“
A minha vida melhorou
por causa
dele, porque se não fosse, eu ainda viveria sem leitura e vivia aqui e acolá”.
Paulo
foi um mestre para além das
competências
na construção civil, ensinou valores importantes à
Jiboia, como a dirigir, a trabalhar com serragem e, fundamentalmente, foi a par
tir das interações
estabelecidas com Paulo que Jiboia inculcou disposições subjetivas ascéticas de lidar com
dinheiro e também no gerenciamento dos alimentos para que não faltassem, disposições nada
comuns para sua fração de classe social.
Assim sendo e co
nsiderando que a transferibilidade das práticas
-
como o ascetismo para
lidar com o dinheiro
-
para outros contextos está presente no próprio conceito de
habitus,
compreendemos sociologicamente que
as disposições ascéticas de Jiboia, a partir das interaçõe
s
com Paulo, criaram condições e condicionantes permissivos, capacitando Jiboia no
gerenciamento dos seus dois pequenos comércios, bem como em outros contextos da sua vida:
J
-
Aprendi a guardar dinheiro com ele, pegava hoje amanhã já tava liso,
pegava di
nheiro no final de semana, na segunda já tava pedindo dinheiro
emprestado
, "mas rapaz, eu paguei tanto a tu, tu vive só, gasta com os outros
e hoje já tá pedindo dinheiro… é assim, assim, assim" , eu abaixava a cabeça
e dizia ‘tá certo, tá certo’…
hoje em
dia tenho isso [indicando com os olhos
as prateleiras da barraca] por mode dele, para mim foi muita coisa pra
mim, entendeu? para mim foi… aí peguei a gostar,
e ele dizendo, olhe isso
e isso, "você não tem nada se você não guardar”, "você vê, o rico pra co
mer é
um tanto assim, é folha, é mato é essas coisas para ter as coisas, e tem, e ainda
quer mais, o mesmo eu digo a você",
aí foi onde eu fui botando isso na
cabeça, graças a Deus.
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Na Sociologia disposicionalista as subjetividades dos agentes sociais sã
o, antes de tudo,
sedimentos de práticas historicizadas ao longo da história de vida dos agentes a partir de uma
posição de classe no espaço social. Ao analisar um percurso biográfico, como no caso de Jiboia,
é importante atentarmos que determinadas prátic
as apreendidas em diversos contextos sociais
somente são possíveis devido a condicionantes anteriores. Aqui, cabe ressaltar que as
sociabilidades estabelecidas com Paulo, embora plurais em seus contextos, iniciaram a partir
das relações de trabalho da cons
trução civil, o que só foi possível devido às apreensões de um
conjunto disposicional de capacidades que tiverem seu fulcro estabelecidas em sociabilidades
anteriores com Faixa
–
"
Quando eu cheguei em Paulo, eu já tinha uma experiência de Faixa.".
Deste modo, compreendemos que é a partir de tais interações particulares que Jiboia
passa a dispor de um patrimônio de competências condicionadas que, certamente, são
fundamentais para que ele disponha, atualmente, de uma das melhores condições econômicas
da ocupação, tanto pelas competências na construção civil, bem como por um
ethos
relativamente
ascético
nas dimensões financeira e alimentar.
Condicionantes individuais: as variações objetivas intraclasse
Antes de morar na Dandara, Jiboia morou no Iraqu
e
-
um dos bairros mais pobres do
Recife
-
, onde permaneceu por quase três décadas. A vida de Jiboia no Iraque ocupa um lugar
de destaque em sua trajetória. Foi na comunidade que por mais de duas décadas Jiboia ocupou
o cargo de presidente da associação em
um amplo período marcado por conflitos fundiários.
Acerca desse período, Jiboia faz questão de contar os seus fatos e mostrar suas fotos, que por
sinal, guarda com muito zelo e orgulho
-
“Foi bom demais. Gosto de trabalhar com gente,
quando ia, ia aquela
quantidade de gente pra reunião na prefeitura ‘eita!’, ia tudinho”.
Aqui, como atividade sociológica, nos cabe compreender tamanha particularidade.
Certamente, uma das características pessoais que possibilitaram à Jiboia ocupar durante anos o
cargo de líder comunitário foi o pertinente traço disposicional à
atividade públi
ca
e à
atividade
coletiva
e, alinhado a essas, as
competências disposicionais
de um construtor com alta
especialidade em materiais precarizados, que a cabo, é a especialidade demandada em seu
cotidiano e na dos vizinhos.
"No Iraque eu fui presidente do con
selho.... nunca perdi uma
eleição pra ninguém.... porque eu fazia de tudo, como aqui, eu fazia de tudo".
Como se sabe, é de longa data a prática política na qual alguns vereadores da cidade do
Recife estabelecem relações políticas com líderes comunitários
visando capilarizar
-
se nos
territórios populares e assim, angariar mais e mais votos; por muitas vezes, essas práticas se
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estabelecem através de “troca de favores”. Em dado momento da conversa, Jiboia nos revela
que a maior posição ocupada por ele no merc
ado de trabalho foi possibilitada por tais práticas
com um conhecido vereador da cidade.
Neste sentido, é preciso evidenciar que no contexto da época quando conseguiu tal
emprego
-
ressaltando aqui que como membro da
ralé brasileira
Jiboia não dispunha das
pré
-
condições sociais de adquirir capital econômico e capital cultural certificado do sistema escolar
-
podemos compreender que tal permissibilidade se deu através do patrimônio disposicional de
Jiboia voltado às questões públicas e coletivas somadas ao s
eu patrimônio de capacidades
construtivas, que por vez, possibilitaram uma acumulação de capital político suficiente para
tecer relações de troca com o tal vereador, e assim, como elemento de troca, ocupou um
emprego de carteira assinada que, por sua vez,
o posiciona, diferindo em certo grau, portanto,
dos demais vizinhos, ou mais amplamente, dos membros de sua fração de classe.
Assim sendo,
a partir das análises biográficas e etnográficas aqui postas, é possível reconstruir, em certa
medida, como certo
pat
rimônio disposiciona
l
de Jiboia o condicionou a ocupar a sua maior
posição no mundo do trabalho.
Apesar do
habitus precário
de Jiboia, uma análise mais aproximada dos meandros do
percurso de vida dele nos revela condicionantes subjetivos que compreendemos
como um
orgulho próprio associado ao seus feitos, que o diferem em grau significativo dos demais
membros de sua fração de classe. Em geral, duas questões aparecem com certa frequência ao
longo da entrevista: a profissão de segurança em um banco público co
m carteira assinada e o
cargo de presidente da associação são momentos que destoam bastante em sua vida.
Cidade, favela; respeito, desrespeito; cidadão, cachorro
Como se sabe, a grande maioria da massa de pobres do Brasil mora nas ditas favelas
urbanas
. Nos cabe aqui analisar os agentes sociais não apenas acerca das condições objetivas
de vida, mas também dos condicionantes subjetivos de existência impostos pelas primeiras.
Torna
-
se imprescindível aqui, para a compreensão sociológica das práticas cotidi
anas da
ralé
no período pandêmico, o exercício de revelar a partir dos trabalhos empíricos o sentimento e
sentido profundo do que é “ser um favelado” no país. Neste sentido, a sociologia urbana
bourdieusiana
nos oferece alguns valorosos instrumentos: uma d
ialética entre
espaço físico
reificado
e
habitus de classe
é um deles.
Ao explanar suas visões do mundo social e, em especial, sobre a “favela”, Jiboia logo
trata de desnaturalizar a violência simbólica incidida nos bairros populares no que tange às
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mazel
as sociais atribuídas à violência urbana nestes territórios. Para Jiboia, questões como
roubos e homicídios que ocorrem em bairros populares, também ocorrem em "lugares bonitos",
como em Boa Viagem
-
zona sul do Recife e um dos metros quadrados mais caros
da cidade
–
"Que é um lugar bonito, beira de praia, tudinho... o povo mata um, aleija um, rouba tudinho...
do jeito que é aqui.".
Contudo, apesar dos esforços de Jiboia em desnaturalizar que não existe CEP para
muitas das mazelas sociais, o senso comum tra
nsclassista do efeito de estigmatização incidido
sobre “o ser favelado” opera nos condicionantes subjetivos de Jiboia. Embora reforce o gosto
que tem pela “favela” e a importância desta em sua vida, ser “favelado” é ser humilhado, como
também é ter uma sér
ie de direitos negados, por exemplo, a aparentemente simples questão de
não receber correspondências em sua residência. De acordo com os entendimentos de Jiboia,
tal questão de humilhação por ser “favelado” é a humilhação que os ricos impõem aos pobres:
B
-
Tu se sente como por morar numa favela?
J
-
Eu mesmo me sinto humilhado. Sempre morei em favela, e é na favela
que eu tiro a minha bolacha para comer é dentro de favela, eu gosto de
morar dentro de favela
. Você chega pra comprar uma coisa na loja, quando
dá o endereço, diz 'ah, é favela né? Não entrega não'. Tô com cartão de crédito
mesmo, dei o endereço e disseram que não chegaria, dei um endereço da casa
da mãe de um menino daqui.
Isso não é humilhação?
O povo humilha muito
a favela. O pobre é humilhação dos ricos, olham torto.
Os pontos de vista e opiniões de Jiboia sobre as classes sociais brasileiras, bem como as
desigualdades, aparecem de imediato ao perguntamos qual dos bairros que morou no Recife
lhe
agradou mais. Ao ser questionado, uma questão que sobressai como elemento importante para
o debate aqui proposto, Jiboia não responde à pergunta apontando um bairro específico e sim,
traz uma definição do que seria “um bom lugar” em seu entendimento.
P
ara Jiboia não há lugar
ruim e quem faz o lugar é a pessoa, pois, de acordo com ele, a questão central é saber viver.
Assim, e ainda mais importante, ao ser questionado sobre o que seria o saber viver no local em
que se mora, Jiboia prontamente atribui ao
“
saber respeitar e ser respeitado''.
Neste sentido, é
importante enfatizar que falando sobre o que seria “um bom lugar” é o único momento das três
entrevistas no qual Jiboia rotula o pensamento expresso como uma questão já refletida por ele,
ou ainda, na q
ual se tem convicção e, portanto, Jiboia apresenta seu entendimento de modo
imediato,
"É isso que vem na minha mente mesmo assim, eu respondo na hora assim porque
não tem lugar ruim não"
. O tema é articulado por ele de forma sucinta e aplicando a exemplos
-
que por sinal, contribuem para reforçar que se trata de uma opinião já refletida e tomada como
convicção.
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Na compreensão de Jiboia, a
favela
está em oposição à
cidade,
assim como a
nação rica
à
nação pobre.
A relação entre
cidade
e
favela
é fundamental
para os objetivos dessa pesquisa,
isso porque, de acordo com Jiboia, estar numa
cidade
ou
favela
também define o lugar no qual
Jiboia será respeitado como
cidadão
ou, diametralmente oposto a tal posição de
reconhecimento, será tratado como
um cachorro
:
J
-
Aqui respeitam, mas lá na cidade, se eu vou pra lá passear pelo meio
desses povos, ele vai considerar eu como cidadão? É um cachorro!
B
-
Quem?
J
-
Esses ricos!
B
-
Como um
cachorro?
J
-
Eu acho que seja, eu acho que seja... porque tem cinco ou seis
ali, se eu
chegar todo mulambento é a primeira coisa que o cara vai dizer, "ó, que
cachorro!" Só porque está com a roupa melhor, porque tem o dinheirinho
mais que a pessoa, tem uma leitura mais que a pessoa, certo?
Disposições gerais e
ethos
de classe na pandemia
A partir da relação já estabelecida com Jiboia, somado à biografia sociológica realizada
através das entrevistas, é possível tecer algumas compreensões sobre o patrimônio disposicional
de Jiboia e, mais especificamente, acerca do se
u
habitus de classe
. O nosso principal objetivo
é reconstruir os sentidos que os agentes sociais atribuem às suas
práticas de proteção
pandêmica
, sendo a prática intermediada por condições objetivas de vida e condicionantes
subjetivos de existência.
Dito
isto, buscamos dar respaldo às partes integrantes das realidades e das práticas
sociais desiguais levando em conta as condições objetivas da classe social e, fundamentalmente,
acerca dos condicionantes subjetivos de existência em cada contexto particular n
a trajetória de
vida de Jiboia. Assim sendo, compreendemos que na trajetória de vida de Jiboia, questões
sociais como a exploração do trabalho infantil em situação análoga
à
escravidão; ausência de
inúmeros direitos ligados a infância e a adolescência; uma
madrasta desumana; o sentimento
de ser sozinho no mundo, um
bezerro rejeitado;
baixas condições objetivas de vida; ausência
de pré
-
condições sociais para aquisição de capitais econômicos e culturais via certificado
escolar; pobreza extrema em vários momen
tos diacrônicos; falta de reconhecimento na
dimensão do amor; vida solitária de um indivíduo social “solto no mundo”, apesar dos 18 filhos
e várias ex
-
companheiras e o sentimento de ser reconhecido como um cachorro pelo
povo da
cidade
foram/vão impondo dif
erentes condicionantes subjetivos compreendidos aqui sob o
conceito disposicional de
ethos precário.
Tal
ethos
que pôde ser percebido em alguns contextos
sociais, para fins da presente pesquisa foi analisado visando compreender as intermediações
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entre o
et
hos precário
de Jiboia, condições objetivas de vida e as
práticas de proteção
pandêmica
.
Antes de nos aprofundarmos na reconstrução dos sentidos das práticas de Jiboia na
pandemia intermediados pelo
habitus de classe
,
é necessário colocar dois outros conjuntos de
disposições que foram compreendidas aqui como
disposições fortes
e que, a depende
r do
contexto social, incidem de modo decisivo nas práticas cotidianas de Jiboia: disposições
religiosas
-
embora Jiboia não seja de nenhuma religião e faça questão de ratificar por vez que
não é evangélico
-
e o
eidos
acerca dos esquemas lógicos.
Assim, a
s ações cotidianas são intermediadas por crenças religiosas, principalmente
quando a resolução dos perigos, como acerca das
práticas de proteção pandêmica
que são
tomadas de sentido através de intermediações com as
disposições de crença
religiosa.
Entretan
to, cabe ressaltar que as fortes crenças religiosas de Jiboia
,
não são, sob hipótese
nenhuma, tidas como uma disposição geral que define suas práticas e visões do mundo, e sim,
estão postas em uma correlação de forças com as demais disposições, a partir da
peculiaridade
de cada contexto.
Alegando com firmeza que nunca teve medo do coronavírus pois não tem medo da
morte, ao longo dos quase três anos de pandemia foram raras as ações de Jiboia para se proteger
através de máscaras, isolamento social, higieniza
ção correta das mãos e vacinação, ida ao
médico quando
necessário etc.
Aliás, nas poucas vezes que agiu conforme as recomendações
de proteção, o sentido de seus atos não era o de proteger
-
se, estando muito mais associado ao
cumprimento das regras.
Neste se
ntido, é possível inferir que há em Jiboia uma enorme ausência do medo de
morrer como comportamento de um o
pus operandi
para enfrentar tantas ameaças cotidianas
com as quais teve que lidar ao longo dos seus 62 anos, sendo tal comportamento um forte traço
d
isposicional do pouco apego que Jiboia tem por sua própria vida, sedimentado ao longo de
uma dura trajetória na forma de uma
ethos precário
-
no sentido das
desigualdades existenciais.
No atual cenário de severa crise social pela qual passa o país, os medo
s mais imediatos de Jiboia
são outros e as questões que levam à morte também, como a fome:
J
-
Eu tenho medo é do povo morrendo é de fome, eu to
vendo é povo
morrer de fome, porque mercadoria não tem, serviço não tem, dinheiro
não tem
... Eu não tenho medo de morrer, não tenho o que perder, o que tinha
que fazer eu já fiz na minha vida, já estou velho, e eu vou pensar mais em
nada, eu não.
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Embor
a Jiboia possua uma das melhores condições de vida de toda comunidade, no
atual contexto o entrevistado teme mais as incertezas de seu futuro do que ser acometido pelo
coronavírus. Se por um lado, como salienta constantemente, não há trabalho na construção
civil;
por outro, os mercadinhos que são o único sustento de Jiboia, já não são mais garantias de
dinheiro certo, pois o empobrecimento vertiginoso da parcela mais pobre da população impacta
diretamente nas vendas de Jiboia.
J
-
[...] O cara só faz aquil
o que o cara tem que fazer... é fazer aquela coisa e
não ter medo.
Não tenho medo dessas doenças... pronto, olha aí, isso que
faz medo
[referindo
-
se a um senhor que acabara de pegar fiado uma lata de
de cachaça]
porque se eu não tirar, como eu vou botar? É
isso
... que eu já
levei muito fumo aqui... aí tem que botar na cabeça.
B
-
O povo aqui tá sem dinheiro?
J
-
Tudo sem dinheiro né? Que não tem serviço para trabalhar, até para
as mulheres mesmo está ruim, que era uma faxina de um lado, faxina em
outro, ia
para um canto, ia para outro, agora não aparece faxina e nem
nada
. Vamos ver se melhora agora depois que Lula entrar. Lula... [longa
pausa] já estão fazendo guerra com ele de novo.
Talvez um dos marcadores mais precisos para dimensionarmos a crise da esca
ssez de
trabalho entre a
ralé estrutural
, seja a constatação de Jiboia sobre a falta de faxinas como
atividade de trabalho para as mulheres no contexto pandêmico. Como se sabe, apesar da
precarização, o trabalho das funcionárias domésticas é uma das catego
rias mais disponíveis
para as mulheres das classes populares desde seu primeiro fulcro. Sem essa renda, as chefes de
família acabam tendo que se virar de outras formas, como podemos constatar nos relatos de
Jiboia:
J
-
O povo aqui tá com fome e indo
para Ceasa catar lixo... tem lugar para
pegar mais doença que na Ceasa?
O pessoal saía daqui para catar tomate,
cebola... lá é tudo no chão, ali chove, pisa, carro machuca, ai fica ali aquela
água preta no chão, aquilo dá uma doença...
mas tinha que comer,
caçar o
que comer, chegar aqui lavar, escaldar para comer porque não tinha
dinheiro para comprar, tudo isso é pandemia, entendeu?
Um dos maiores temores de Jiboia é se tornar uma pessoa dependente dos outros para
sobreviver, sendo tal questão motivo de orgulho próprio. Esse traço disposicional por um lado,
é forte, sendo capaz de motivar esforços cotidianos de trabalho duro, mesmo ao
s 62 anos e
tendo um corpo cansado; por outro é frágil, pois através dos depoimentos percebemos que é
emocionalmente muito doloroso para Jiboia imaginar que em um futuro breve os mercadinhos
possam vir a fechar e ele possa a voltar a posição social já ocup
ada de pedinte.
Outra característica disposicional de Jiboia que cabe ser ressaltada na reconstrução dos
sentidos dos seus atos no contexto pandêmico é a particularidade de ter apreendido a lidar com
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as baixas condições de vida. O
ethos ascético
quando o a
ssunto é represar comida e dinheiro
volta à tona como uma das particularidades que são capazes de conferir a Jiboia uma vantagem
social em um cenário de pobreza crescente. Assim sendo, evidenciamos que embora a
preocupação de Jiboia seja com o futuro, o me
do é de uma dor conhecida, a fome. E não de
uma doença desconhecida.
Neste sentido, cabe resgatar as compreensões sociológicas do
patrimônio disposicional
de Jiboia analisadas no acima no qual compreendemos que as gêneses das disposições, seja por
meio de
uma economia moral herdada do pai ou de Paulo, são fundamentais para lidar com
atual contexto de crise social e sanitária. Precisamente nesse sentido acerca das particularidades,
Jiboia sabe que a capacidade pessoal de armazenar comida e dinheiro lhe faz d
istinto dos demais
moradores da ocupação, principalmente diante da atual crise social e sanitária
-
“
Toda vida eu
gostei de guardar o meu pouquinho, agora foi que ficou pior, tem que guardar ainda mais um
pouco, agora na pandemia é que tem que comprar rega
do mesmo, porque dinheiro não tem.”
Cabe ressaltar que para além do
ethos de classe,
das
disposições de crença religiosa e
das
disposições ascéticas
do saber racionar comida e dinheiro, na reconstrução dos sentidos dos
atos de Jiboia na pandemia é preciso
ressaltar como a indústria negacionista da pandemia
inculcou percepções subjetivas a Jiboia que incidem diretamente em suas práticas cotidianas.
Em diversos momentos, quando questionado sobre certo desvio de suas práticas no
período, por meio dos esquema
s lógicos do
eidos,
Jiboia desdenha da pandemia reproduzindo
as
fake news
, questão tal, que lhe encoraja nas ações de práticas desviantes das
práticas de
proteção pandêmica
.
Embora Jiboia seja politicamente de esquerda
-
como se define
-
e não
goste do atu
al presidente Jair Bolsonaro, cabe enfatizar que uma série de entendimentos e
práticas de Jiboia sobre a pandemia encontram respaldo na posição pública do presidente, como
o desinteresse e receio de Jiboia em tomar as vacinas.
Um exemplo desse respaldo en
tre determinadas
práticas de proteção pandêmicas
e as
posições públicas do presidente, pode ser vista nos apontamentos da pesquisa intitulada
More
than Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior During a Pandemic
. A pesquisa demonstra
que as palavras e açõe
s de líderes políticos afetam o comportamento das pessoas no que diz
respeito ao isolamento social. A pesquisa descobriu que após o presidente Jair Bolsonaro
minimizar os riscos da pandemia do SARS
-
CoV
-
2 e ter desaconselhado o isolamento social, as
localid
ades que apresentavam os maiores números de pessoas pró
-
governo
-
com base na
eleição de 2018
-
foram os lugares que apresentaram o maior enfraquecimento dos índices de
isolamentos social em comparação com as localidades nas quais o presidente não apresent
a a
mesma popularidade.
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Jiboia diz ter medo das consequências de tomar uma vacina que, segundo ele, não é
segura. Tal receio de Jiboia é oxigenado pela posição do presidente; contudo, cabe ressaltar que
o receio não está associado à figura de Jair Bolsonar
o, e sim, à posição que este ocupa, de
presidente da república. Essa questão é posta da seguinte forma:
"Se o presidente não quer
tomar, motivos para isso há… foi o primeiro que não quis tomar"
.
A respeito do uso de máscaras, ainda na primeira entrevista,
em tom de humor, Jiboia
nos apresenta a vasta coleção de máscaras que tem devido às muitas compras que teve que fazer
quando na ocasião foi exigido para que utilizasse a máscara
-
"Quando alguém reclama, ‘certo,
eu vou botar’ quando eu vou no metrô, eu te
nho bem umas 40 máscaras aí, eu saio para os
cantos e compro... ‘eita, posso entrar não’, ‘quanto é uma?’, ‘É dois’, ‘me dê’".
Jiboia não
oferece resistência quando exigido o uso da máscara, alegando ter medo da represália popular.
O uso de máscara por Jib
oia no período pandêmico é plural e, em grande medida,
contraditório. Em outro momento, embora não entenda os motivos, Jiboia reconhece a
importância do uso da máscara, inclusive, classifica a não utilização e o não isolamento como
um “vacilo”. Contudo, co
mo ocorre em quase todas as suas opiniões sobre as práticas dele no
período, as disposições de crenças do determinismo religioso e, em maior grau, o
ethos precário
como conjunto de disposições que, entre outras coisas, estão atribuídas a uma valentia peran
te
os
perigos do mundo e da morte, como no caso do contexto da pandemia, uma grande ausência
do medo em morrer da doença em questão.
Ao longo das três entrevistas, Jiboia afirma com firmeza que nunca ficou em casa e
nunca ficará, que nunca teve medo e nem
tem medo de morrer. Além do
ethos precário
, o
recorte geracional faz Jiboia ter ainda menos apego com a própria vida. Como podemos
observar ao longo da entrevista, a idade mais avançada reverbera em algumas questões na vida
de Jiboia, a exemplo da possibi
lidade de ter um trabalho com carteira assinada
–
"Nessa idade,
ninguém vai assinar a minha carteira"
-
e menores chances em conseguir, de maneira fixa, uma
companheira; neste caso, compreendemos que a idade mais avançada torna para Jiboia sua vida
ainda m
enos interessante para si ou até menos valorizada pelo próprio, o que por vez, culmina
no menor medo de morrer, inclusive quando o assunto é morrer devido às complicações do
coronavírus.
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Pandemia e habitus de classe:
Análise
de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de
Co
vid
-
19 na região metropolitana do
R
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Rev. Sem Aspas
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Araraquara
, v.
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ISSN
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4238
DOI:
https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.17628
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Considerações finais
Como vimos, as
práticas de proteção pandêmic
a
de Jiboia na pandemia
-
utilização de
máscara, higienização correta das mãos, vacinas e isolamento social
-
, em geral, não se
encontram em conformidade com as recomendações para proteção contra o coronavírus. Jiboia
não utilizou máscaras; fez pouquíssimo
o isolamento social como forma de evitar ser
contaminado; não lava as mãos corretamente com sabão; e somente tomou a vacina por relativa
pressão dos membros da coordenação do movimento social.
Assim sendo, acerca do comportamento de Jiboia na pandemia, a
presente pesquisa
focou na reconstrução dos sentidos dos atos atribuídos pelos próprios agentes sociais. Dito isso,
compreendemos
-
após três longas entrevistas biográficas e análises
-
que o
habitus de classes
;
o conjunto de disposições que conformam o
ethos precário
; as
disposições de crença
religiosa;
e disposições precarizadas dos esquemas lógicos do
eidos,
são características sociológicas de
Jiboia que permitem a reconstrução dos sentidos das práticas no pe
ríodo pandêmico aqui
analisado sendo fortemente intermediado por questões relativas às desigualdades sociais
brasileiras.
Como foi percebido, nas poucas vezes que Jiboia agiu conforme as recomendações, o
que o mobilizou estava muito mais relacionado com o
utras questões do que com a motivação
de proteger
-
se dos perigos que uma possível contaminação; como no caso do uso das vacinas,
que aconteceu quando descobriu que sofreria algumas restrições em relação a carteira de
trabalho, para abrir contas em bancos e
tc., ou ainda no caso das máscaras, que na grande maioria
das vezes Jiboia somente utilizava quando exigido, seja por normas de um determinado local
ou por pressão de populares que exigiam de tal proteção.
Reconstruir os sentidos que estão imbuídos nas práticas é reconstruir as condições
objetivas de vida e os condicionantes subjetivos de existência. Como visto, se por um lado as
condições objetivas determinam uma série de práticas, principalmente em um cená
rio marcado
pelo abrupto aumento da pobreza, da fome, desemprego etc., por outro lado, as disposições
citadas acima enegrecem a compressão das ações de Jiboia no período: a ausência do medo da
morte está imbricada ao
ethos precário de classe
dele, tornando
assim, compreensível do ponto
de vista sociológico as
práticas de proteção pandêmica
s desviante das recomendações.
Dito isso, não nos resta dúvida de que a
desigualdade existencial
-
compreendida aqui
sob a forma disposicionalista de
ethos precário
-
é um
elemento social central na reconstrução
dos sentidos das
práticas de proteção pandêmica
que não estão em conformidade com as
recomendações no período. A baixa autoestima, baixa dignidade social, sentimento de ser
um
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FONSECA
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cachorro
para outras classes sociais, a
falta de reconhecimento no amor conjugal ou familiar,
as dores que carrega pelo fardo de ser um favelado, são questões que fazem com que não só a
sociedade, mas também o próprio Jiboia acabe por valorar sua vida como algo sem muita
importância, resultando
, portanto, em baixas
práticas de proteção pandêmicas
.
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Pandemia e habitus de classe:
Análise
de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de
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Pandemia e habitus de classe: análise de práticas sociais de autocuidado
durante a pandemia de Covid
-
19 na região metropolitana do Recife
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022024
,
2022. e
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ISSN: 2358
-
4238.
DOI:
https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.17628
Submetido em
:
15/08/2022
Revisões requeridas
em
:
19/09/2022
Aprovado em
:
11/11/2022
Publicado em
:
26/12/2022
Processamento e edição: Editora Ibero
-
Americana de
Educação.
Correção, formatação, normalização e tradução.
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Pandemic and
class habitus
:
Analysis
of social self
-
care practices during the
Covid
-
19 pandemic in the metropolitan region of Recife
Rev. Sem Aspas
,
Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.
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ISSN 2358
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PANDEMIC AND CLASS HABITUS: ANALYSIS OF SOCIAL SELF
-
CARE
PRACTICES DURING THE COVID
-
19 PANDEMIC IN THE METROPOLITAN
REGION OF RECIFE
PANDEMIA E HABITUS DE CLASSE: ANÁLISE DE PRÁTICAS SOCIAIS DE
AUTOCUIDADO DURANTE A PANDEMIA DE
COVID
-
19 NA REGIÃO
METROPOLITANA DO RECIFE
PANDEMIA Y HABITUS DE CLASE: ANÁLISIS DE LAS PRÁCTICAS DE
AUTOCUIDADO SOCIAL DURANTE LA PANDEMIA DE LA COVID
-
19 EN LA
REGIÓN METROPOLITANA DE RECIFE
Bruno Leonardo
FONSECA
1
RESUMO
:
Neste
artigo, por meio de etnografias e biografia sociológica realizada com Jiboia
–
um membro das classes populares brasileira
–
,
apresentamos que diante do contexto
pandêmico a utilização de máscaras, realização do isolamento social, vacinação e higienização,
não são apenas respaldadas pelas condições objetivas de vida, mas também, pelos
condicionantes subjetivos de existência quando estes estão associados à
desigualdade
existencial.
Este último, por vez, se estabelece na desigual alocação de respeito, dignida
de e
valorização da própria vida.
PALAVRAS
-
CHAVES
:
Pandemia.
C
lasses populares.
D
esigualdade.
H
abitus de classe.
Pierre Bourdieu.
RESUMEN
:
En este artículo, a través de etnografías y biografía sociológica realizadas con
Jiboia
–
miembro de las
clases populares brasileñas
–
, presentamos que, ante el contexto de
pandemia, el uso de mascarillas, el aislamiento social, la vacunación y la higiene, no son sólo
sustentada en las condiciones objetivas de vida, pero también en las condiciones subjetivas d
e
existencia cuando éstas se asocian a la desigualdad existencial. Este último, a su vez, se
establece en la desigual asignación del respeto, la dignidad y el aprecio por la vida misma.
PALABRAS
CLAVE
: Pandemia. Clases populares. Desigualdad. Habitus de c
lase. Pierre
Bourdieu.
1
Federal University of
Pernambuco (UFPE)
, Recife
–
PE
–
Brazil
.
Architect and Urban Planner, Master's student
in Sociology at the Postgraduate Program in Sociology at the Federal University of Pernambuco
(PPGS/UFPE).
ORCID
:
https://orcid.org/0000
-
0001
-
7149
-
857X
.
E
-
mail: brunofonsecaln@gmail.com
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2
ABSTRACT
:
In this article, through ethnographies and so
.
ciological biography carried out
with Jiboia
–
a member of the Brazilian popular classes
–
, we present that, in the face of the
pandemic context, the use of masks, social iso
lation, vaccination and hygiene, are not only
supported by the objective conditions of life, but also by the subjective conditions of existence
when these are associated with existential inequality. The latter, in turn, is established in the
unequal alloca
tion of respect, dignity and appreciation of life itself.
KEYWORDS
:
Pandemic. Popular classes. Inequality.
Class habitus. Pierre Bourdieu
.
Introduction
Over the last three years of the pandemic, the practices of using masks, hand hygiene,
social isolation, vaccination, seeking medical attention when necessary, have become
fundamental daily practices to deal with the dangers and threats arising from the Co
ronavirus.
Such practices, named in this present article as
pandemic protection practices
, are crossed by
questions related to social inequalities concerning the class struggle and are, under no
circumstances, accessible in a socially fair way for all.
Ama
rtya Sen (2001) teaches us that in order to formulate a given dimension of any social
inequality to be analyzed, we need to evoke the following question: “
inequality of what?
”, so
that, as a research strategy, we formulate the “evaluation spaces", that is,
the selection of the
relevant criteria that will be used to analyze a certain social inequality.
In the case of this research, we analyzed the reconstruction of the meanings that social
agents attribute to their actions in the “evaluation spaces”. The
practice of pandemic protection
analyzed here from the social inequalities that reside between the
objective conditions of life
and the
subjective conditions of existence
. The latter, put in the Bourdiesian sense of
class
ethos
2
, understood here under The
rborn's (2011) concept of
existential inequalities
-
related to
issues of low dignity, social self
-
esteem and valuing life itself.
To do so, we used ethnographic analyzes as a methodology and, mainly, sociological
biographies rooted in Bernard Lahire (2004
), in which we used, in addition to the concepts that
will be presented shortly, three semi
-
structured interview scripts. The research reveals that
pandemic protection practices are not only supported by material and economic inequalities.
By reconstructin
g the meanings that the agents attribute to such practices, we infer that the
2
The Bourdieusian concept of
habitus
is fragmented here to better serve the interests of this research, although
Pierre Bourdieu, throughout his academic career, has abdicated this fragmentation. We deal with the concept of
habitus
from three constituent parts: the
eidos
, a set of logical ev
aluation and action schemes; the
hexis
related to
embodiment, in the sense of dispositions that became body, postures, gesture; and the
ethos
, as an axiological and
systematic set of dispositions of the ethical dimension, in the ways of being in the social
world. In this research
we used especially
habitus
and
ethos
.
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Pandemic and
class habitus
:
Analysis
of social self
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care practices during the
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19 pandemic in the metropolitan region of Recife
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subjective constraints related to existential inequality are social determinants. Thus, after
apprehending Jiboia's subjective dispositions in various social, diachronic and sync
hronic
contexts, we understand that in the pandemic context, issues related to the low valuation of life
itself figure as determinants for low pandemic protection practices in the case of Jiboia.
The three interviews were carried out over the years 2021 and 2022, with an audio
recorder and a pad of paper for taking notes, both authorized by Jiboia. The interview took place
at her home, more specifically in the space intended for her grocery store,
while she attended
to the few customers. Jiboia was informed that the research dealt with the lives of residents of
urban occupations and that the collected data would not necessarily be used; in addition, the
interviewee was informed that any question tha
t led to the recognition of his true identity would
be kept confidential.
Existential Inequality and Class
Habitus
in Brazil
About disposition in dispositionalist sociology, according to Pierre Bourdieu (2001, p.
171), after a play on
Heideggerian words
, “disposition is exposure”
and, this occurs, precisely
because the body is exposed to the exteriorities of the social space: to the dangers, reception,
complacency or constraints of the social world that surrounds it, starting with the impositions
of material conditions of existenc
e, such as, for example, social agents residing in popular
neighborhoods
–
which have low rates of pandemic protection practices
–
who lack a whole
material condition that distances them from complying with the recommendations of social
isolation, use of m
asks, vaccination, etc.
Thus, it is from a certain
objective position
-
mainly through the social class
-
occupied
in the social space that social agents understand the social space that encompasses them, and
thus they are conditioned to a class of
habitus
that guide them by the conditions of this world
specific social. The
habitus
is adjusted to the regularities of the position in the social world,
functioning as a structuring structure and a structured structure, because the social structures
used by the
agents to understand the world are, at the same time, the incorporated product of
that same structured and structuring world that surrounds it, because, as is known, social agents
only understand the social world that encompasses them, engendering in this
sense “
products
of an unwanted and unconscious systematicity
” (BOURDIEU, 2007, p. 45, our translation); and
which, at the same time, are able to guide individuals through common and everyday social
practices, which are more or less homologous among members
of the same fraction and social
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class. This means that social agents, when making their decisions about pandemic protection
practices, do not choose the principle of their choices, which is the
class habitus
.
In Bourdieusian praxeology, practice is the pl
ace of the dialectic between objective
positions and subjective dispositions, with the first being the objectified exteriority of social
structures that condition the perception and action of social agents, as a kind of “rigorous table
of categories histor
ically constituted” (BOURDIEU, 2007, p. 436, our translation), that is, of a
social space that is constituted in and through the system of relational oppositions of different
social positions and different distributions of living conditions; while the seco
nd is covered by
the concept of
habitus
, defined as the unifying principle of subjective dispositions that, although
they are formed in the course of the collective history of a society.
In this sense, through the incorporation in the course of the individ
ual history of social
agents, according to the different objective positions of agents in a given social space, which
precondition the different perceptions and actions of these agents in each socialized and
socializing context, making
habitus
a product of
historical acquisition by a legacy of historical
struggles between different social classes.
In the work “
Subcidadania Brasileira
” (2018), the sociologist reconstructs the
Bourdieusian model of social class in Brazil, considering the fundamental differenc
es between
societies in central countries and those in peripheral countries. In his sociological interpretation
of Brazilian social classes, the Bourdieusian notion of class struggle and
class habitus
is added
to the Taylorian notion of value hierarchies o
f modern societies, which are founded on sources
of strong institutions, such as the market and the State, and that end up classifying as citizens
only those agents capable of dealing with modern requirements, such as prospecting,
productivity, rationality
. This recognition of modern citizenship, granted only to dignified
productive rational agents, supported by the “moral sources” of strong institutions in modernity,
is defined as primary
habitus
.
In this sense, Jessé Souza (2018) argues that the
habitus
t
hought by Pierre Bourdieu
does not presuppose a fundamental condition of French society: socially shared recognition, in
a transclassist way, in which all French people are French citizens. On the other hand, the
absence of these same social preconditions
characterize the concept of precarious
habitus
,
corresponding to the set of internalized subjective dispositions
-
according to the objectified
positions and conditions
-
which, according to Souza (2018, p. 240, our translation) “do not
meet the objective
demands so that an individual or a social group can be recognized as
productive and useful in a modern and competitive society”, thus being socially recognized as
sub
-
producers and sub
-
citizens and, therefore, sub
-
humans. The result is the construction of
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whole symbolic range of stigmatizations and prejudiced notions that present correlates of
cognitive structures of social agents: disqualifying, criminalizing and abolishing the recognition
of the social dignity of an entire social class, including having
this pejorative recognition shared
among the classes themselves. victims of the symbolic violence exercised.
That said, Souza (2018) defines the Brazilian popular classes, in their peculiar social
condition of sub
-
citizenship, by the production and reprod
uction of a precarious
habitus
over
time and space, this being the peculiar condition for the production and reproduction of the
structural rabble Brazilian. In this sense, in the central thesis of the work, it is explained that
about 1/3 of the Brazilian
population, due to the absence of the minimum social pre
-
conditions
to handle the demands of the dignity of the modern “rational agent”, is in the position of
exclusion and disqualification before the whole society as “sub
-
producers” and, therefore,
classi
fied by the modern value hierarchy as sub
-
citizens. It should also be noted that this huge
contingent of Brazilian men and women was first named by Florestan Fernandes (2008) as the
first urban rabble and secular rabble, precisely because of the absence of
the necessary
psychosocial conditions to integrate into a modern and competitive society.
About the low social dignity, the condition of sub
-
citizenship, the denial of social
recognition as a productive and valid agent that affects social groups and entir
e social classes.
Sociologist Goran Therborn (2011, p. 21
-
22) proposes analytical perspectives between different
types of inequality. For our interest, we highlight the notion of existential inequality, established
in the denial of equality among all human
beings, through the unequal allocations of respect,
social recognition, dignity, humiliation, ignorance and marginalization.
Thus, when dealing with
class habitus
, or more precisely, with the class
ethos
of the
Brazilian structural rabble, we are talking
about a
precarious ethos
, that is, a precarious
conception of being in the world; due to the absence of the necessary social preconditions to
obtain the social recognition of modern citizenship and social dignity; leaving these completely
marginalized and
stigmatized individuals and social classes with an absence of recognition of
human dignity, resulting in identity conceptions of low self
-
esteem and individual and
collective dignity, as well as many other conditions that correspond to the deficient pole o
f
existential inequality.
However, it should be noted that the
class habitus
is not mechanized here by external
constraints, but an adaptable
habitus
, being transposable to the different social contexts of
different social practices. As proposed by Bernard
Lahire (2004) when assuming a sociological
stance within the dispositionalist field of action that considers the plurality of different social
environments being reflected in the plurality of the socialization of individuals, which
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ultimately unfolds in t
he dispositional plurality of social agents to from the particularity of each
social trajectory. Lahire elaborates from the Bourdieusian work, builds the understanding that
the heterogeneity of the social world is incorporated in the social construction of
individuals,
or even, that every idea of field
-
which make up the multiple externalities of the social space
-
also operates in the individual dimension internalized in social agents. Thus, in this sociological
biography presented here, we use dispositio
nal concepts such as inclinations, plurality of
dispositions, aptitudes, intraclass variations, biographical ruptures, etc.
Jiboia
Better known as Jiboia
, Antônio da Silva is one of the oldest residents of the Dandara
Occupation on the outskirts of Recife. Jiboia is 62 years old, divorced several times, father of
18 children without establishing a firm relationship with any. He is a bricklayer and owner of
two small “stalls” selling hygiene, cleaning, basic foodstuffs, alcoholic beverages, which
operate inside his two houses located in two urban occupations.
Owner of a heritage of skills regarding civil construction practices, Jiboia is often
recognized as
the “occupation engineer”, providing services both when the issue is collective,
as well as in timely help to neighbors. Jiboia is supportive and his skills in providing for
everyday life in the face of such precarious objective conditions are often at the
service of
community help. Despite complaints about the lack of recognition for its collective actions and
the lack of financial collaboration from others, Jiboia is proud of the services provided.
In his career as a militant for the right to housing, he
was for more than two decades
president of the residents' association of a famous community in Recife, known in the field of
the right to the city for its history of resistance against land evictions.
"
Look, from 13 years ago I suffered a lot
"
Jiboia is a native of the rural area of Aliança
-
a small municipality located in the
northern forest area of Pernambuco. Jiboia was born, as he usually says,
within a sugarcane
crack
, a place where he also suffered the exploitation of child labor in the f
ields. Jiboia remained
in this work that is relatively analogous to slavery until he decided to flee to Recife
-
"
Look,
from 13 onwards I suffered a lot
".
Jiboia is the only child of his father with his mother; "
My father was Durval Caetano,
he was called
Durval, my father was from Exú. He went to the mill to work, then right there in
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Aliança he died
". Jiboia has been an orphan on his mother's side since birth, the story of what
really happened to his mother and the reasons why he was taken from her at birt
h were never
revealed to him. Despite being 62 years old, Jiboia still does not know the whereabouts of his
mother; he does not know what happened at his birth; he does not know if his birth parents had
any marital relationship; as he also does not even kn
ow for sure her name. Issues such as
resentment and repercussions in your life.
When Jiboia was only three years old, Durval married Ruth, whom he initially classified
as very evil
–
"
There are mothers who are not mothers to people, mothers are mothers
". F
rom
the union of Durval and Ruth, three more children were born. Thus, the most central family
composition was constituted with Jiboia being the eldest son of the house.
The period in Aliança, throughout his childhood and early adolescence, brings memories
to Jiboia that he does not like to remember. The hard pains of the past that, as revealed by "
They
come to mind, but I try to forget
", are strongly linked to the objective conditions of life, as well
as the particularities that intraclass variations. As i
s known, child labor in the countryside affects
thousands of children in northeastern Brazil; however, as we will show in this research, each
individual of this social position relates in a unique way with the social world, be it in aptitudes,
inclinations
, dispositions, particularity of each trajectory.
In sugarcane work, Jiboia began to accompany his father so early in his life that he
cannot even remember when he started to help his father with work activities. At the age of 8,
already having a wealth of
dispositional capacities that are required in work activities on the
farm, incorporated through an indirect socialization with his father's world of work, Jiboia was
invited by the factory manager to work "formally".
In addition to being a child and having to face the hard work of sugarcane, Jiboia speaks
with anger and resentment about the period in which he worked in his hometown. Mainly due
to the position occupied in the family space and the particular relationship
s established with her
stepmother; it should also be noted that it is at the intersections between the contexts of the
world of work and the world of family that the interactions established with the stepmother
become even more cunning and even more inhuma
ne. He tells us, in an aggressive tone, that it
was common to suffer sanctions imposed by his stepmother if he did not meet the daily goals
of work at the plant, such as, for example, having lunch only when the job was finished; if he
could not finish by l
unchtime, he was obliged to fulfill the work demand in the afternoon,
without his main meal of the day. The harsh sanctions imposed, as well as the appropriation of
his salary by Ruth, did not occur hidden from Durval; on the contrary, Jiboia's father was
quite
oblivious to the context
-
"
I was hurt because my father said nothing
".
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Rev.
Sem Aspas
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Although he is skilled with numbers, civil construction and managing his two stalls, as
he is proud to say, Jiboia is illiterate. His relationship with the world of school practi
cally did
not exist in his life: he started at age 9 and stopped at 13, when he fled to Recife. In addition to
the various difficulties imposed, such as the great distance between his home and school, school
hours were almost always compromised by work obl
igations, since, as he warns, the priority
was always going to work. In interviews, Jiboia blames himself for being illiterate and penalizes
himself for it, even defining himself as “
a neutral person
”.
Another point of social suffering that had its genesis
in his childhood
-
perhaps the most
central one
-
and which must be understood here as a
precarious ethos
established as a
subjective condition from a position of the Brazilian structural rabble is a certain disruption of
the family nucleus, which is expe
cted to act as a fruitful environment for the affective
transmission of values. In the particular case of Jiboia, the specific type of relationship with the
stepmother, the maternal absence throughout her life, exploitation in child labor in the
sugarcane
field, extreme poverty, absence of the school environment and the omission of the
father conform the particularities of a
precarious ethos
engendered in childhood and
adolescence.
Jiboia, a subject loose in the world, a rejected calf
In many of the mome
nts in which he talks about himself, Jiboia expresses a life marked
by loneliness, both in the family dimension, maternal absence, absence of a marriage partner,
the non
-
recognition as a brother by the other brothers from his father
-
“
I feel alone in the
world
because the others I have don't care about me, there are two brothers who never come to my
house, I went there I don't know how many times
”
-
, without a close relationship with the 18
children, as well as in friendship relationships; although he has
lived in the metropolitan area
of Recife for almost 50 years, Jiboia has not built any lasting and solid friendships.
In this sense, it is possible to infer that solitary life figures as an important element in
his life. Throughout the interview and the oc
casional encounters in which I was able to observe
and interact with Jiboia, a song he named "Bezerro rejected" was sometimes the soundtrack of
the moments we were together. Music sensitizes him and brings him a significant degree of
identity and recogniti
on:
J
-
Oxe, I suffered, that's why from time to time this song plays and I get
a little sad [...] A rejected calf, a cattle when it rejects a child, what do you
do? The guy doesn't give the bottle? Because the mother didn't want to
give it.... then I kee
p thinking about it. I often think, then after this song
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Pandemic and
class habitus
:
Analysis
of social self
-
care practices during the
Covid
-
19 pandemic in the metropolitan region of Recife
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came out, that's it! That's when I really think... I remember that song a
lot because of that, I was born a rejected calf, I didn't see a mother
,
I was
suckling from one, I was suck
l
ing from
another
,
there is the regret
Another central issue in Jiboia's
solitary life is the absence of a steady marital partner,
mainly at two points. First, it is linked to the sexual division of labor, the absence of a partner
is also the absence of someone to carry out the domestic activities, thus, the double shift of
wo
rk, which in general is common to women, ends up being carried out daily by Jiboia. Second,
the absence of recognition in love, which corresponds to the absence of marital companionship,
as in leisure and affection activities.
His father was the only relat
ive of the most central family nucleus that Jiboia established
more solid family relationships. Including, the only inheritance via affective transmission of
values inherited from the family as a dispositional heritage, comes from the father in the form
of
a given moral economy, in the sense of dealing with marital relations and with the low
objective conditions of life:
J
-
That's why nowadays, when my father died, he called me, and I went there.
He said, “look my son, I'm dying” he called the allchildren
. Luizinho and I...
went
,
‘
look, there's only one thing I ask of you, you got married, don't hit
your wife, don't let her starve, if you can't live it, leave it, and don't let
your fridge run out of anything in the house', nowadays, there are four
[fridges
], where you look for a piece of meat, thank god!
The particularities of the encounters: the ruptures of a trajectory
Throughout his 62 years, Jiboia
says he is grateful to only two people in his life; both
established particular relationships with Jiboia and were in themselves transformative
potentialities along the biographical path. The socializations established with Paulo and Faixa
were fundamenta
l in Jiboia's life path, and as the interviewee puts it, life without them would
be different today
–
"
Paulo and Faixa meant a lot to me... it would be different because I
wouldn't have learned the things I know
".
Faixa is the figure responsible for an imp
ortant biographical break in Jiboia's life,
because "
Faixa is who took me out of the cane field, I don't know if he's alive or if he's dead,
but I thank him wherever he is"
", as it was also with Banda that Jiboia began to learn his first
constructive skill
s: "
He made pottery... ok, I learned to make porttery... work with plaster
".
Banda offered him a job and housing in Recife and, even though these were very
precarious and Jiboia was still subjected to the abuses of child labor, even so, at the time, it was
the path he chose in the face of the possibilities and impossibilities to follow his life. Jiboia's
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life working for Faixa did not last long, after six months, Jiboia became indignant with the
conditions imposed by Faixa and stopped working for him.
In th
e story that Jiboia tells us about his life, it is essential to point out that throughout
the chronology told by him there is a gap without information regarding the period between his
departure from the house in Faixa and the moment he occupied what is to
day the Iraque
community. In a period of more or less 10 years, we don't know what happened in Jiboia's life.
On the occasions of the three interviews, we tried to access information about the period in
many ways, however, all in vain.
While Paulo is prese
nted to us as his great teacher
-
"
My life improved because of him,
because if it weren't for him, I would still live without reading and I lived here and there
". Paulo
was a master beyond his skills in civil construction, he taught Jiboia important values
, such as
driving, working with sawdust and, fundamentally, it was from the interactions established with
Paulo that Jiboia instilled ascetic subjective dispositions to deal with money and also in food
management so that there was no shortage of provisions
that were not common for his social
class fraction.
Therefore, and considering that the transferability of practices
-
such as asceticism in
dealing with money
-
to other contexts is present in the very concept of
habitus
, we
sociologically understand tha
t Jiboia's ascetic dispositions, based on interactions with Paulo,
created conditions and conditions permissive, enabling Jiboia to manage his two small
businesses, as well as in other contexts of his life:
J
-
I learned to save money with him, I
would take money today, tomorrow
it was broke, I took money at the weekend, on Monday I was already
borrowing money
, "
but man, I paid you so much, you live alone, spend it on
others and today you're already asking for money... it's like..., like..., like.
..", I
would lower my head and say 'okay, alright'
…
nowadays I have this
[indicating with his eyes the shelves of the tent] because of him, for me it
was a lot for me, you know? for me it was... then I started to like it
,
and
he said, look at this and that
, "you have nothing if you don't keep it", "you see,
the rich to eat is a bit like that, it's leaves, it's bush and these things to have
things, and they have it, and still want more, the same I tell you"
,
that's where
I got it into my head, thank God.
In
dispositional sociology, the subjectivities of social agents are, above all, sediments
of historicized practices throughout the agents' life history from a class position in the social
space. When analyzing a biographical journey, as in the case of Jiboia
, it is important to note
that certain practices learned in different social contexts are only possible due to previous
conditions. Here, it should be noted that the sociabilities established with Paulo, although plural
in their contexts, started from the
work relations of civil construction, which was only possible
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Analysis
of social self
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care practices during the
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19 pandemic in the metropolitan region of Recife
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due to the apprehensions of a dispositional set of capacities that had their fulcrum established
in previous sociabilities with Faixa
–
"
When I arrived in Paulo, I already had experience with
Fa
ixa
".
In this way, we understand that it is from such particular interactions that Jiboia
comes
to have a patrimony of conditioned competences that, certainly, are fundamental for him to
have, currently, one of the best economic conditions of the occupation, both for the
competences in construction civil society, as well as a relatively asceti
c
ethos
in the financial
and food dimensions.
Individual constraints: intraclass objective variations
Before moving to Dandara, Jiboia lived in Iraque
-
one of the poorest neighborhoods in
Recife
-
, where he stayed for almost three decades. Jiboia's lif
e in Iraque occupies a prominent
place in his trajectory. It was in the community that Jiboia held the position of president of the
association for more than two decades during a long period marked by land conflicts. About
that period, Jiboia makes a point
of telling his facts and showing his photos, which, by the way,
he keeps with great zeal and pride
-
“
It was too good. I like working with people, when I went
there, that number of people went to the meeting at the city hall, 'hey!', they all went
”.
Here,
as a sociological activity, it is up to us to understand such particularity. Certainly,
one of the personal characteristics that made it possible for Jiboia to occupy the position of
community leader for years was the dispositional trait pertinent to publ
ic activity and collective
activity and, aligned with these, the dispositional competences of a builder with high expertise
in precarious materials, who in the end, it is the specialty demanded in their daily lives and that
of their neighbors. "
In Iraque I
was president of the council.... I never lost an election to
anyone.... because I did everything, like here, I did everything
".
As is known, it is a long
-
standing political practice in which some councilors in the city
of Recife establish political relati
onships with community leaders in order to spread out in
popular territories and thus collect more and more votes; many times, these practices are
established through “exchange of favors”. At one point in the conversation, Jiboia reveals that
the highest p
osition he occupied in the job market was made possible by such practices with a
well
-
known city councilor.
In this sense, it is necessary to highlight that in the context of the time when he got that
job
-
emphasizing here that as a member of the Brazilia
n rabble Jiboia did not have the social
preconditions to acquire economic capital and certified cultural capital of the school system
-
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we can understand that such permissibility was gave through Jiboia's dispositional patrimony
focused on public and colle
ctive issues added to his patrimony of constructive capacities, which
in turn, enabled an accumulation of sufficient political capital to weave exchange relations with
that councilor, and thus, as an exchange element, he held a formal job which, in turn, p
ositions
him, differing to a certain degree, therefore, from the other neighbors, or more broadly, from
the members of his class fraction. Therefore, based on the biographical and ethnographic
analyzes presented here, it is possible to reconstruct, to a ce
rtain extent, how a certain
dispositional heritage of Jiboia conditioned him to occupy his highest position in the world of
work.
Despite Jiboia's precarious
habitus
, a closer analysis of the intricacies of his life path
reveals subjective conditions that
we understand as a pride associated with his
accomplishments, which significantly differs him from the other members of his class fraction.
In general, two questions appear with some frequency throughout the interview: the profession
of security in a publi
c bank with a formal contract and the position of president of the
association are moments that are very different in his life.
City, favela; respect, disrespect; citizen, dog
As is known, the vast majority of the mass of poor people in Brazil live in the so
-
called
urban slums. It is up to us here to analyze the social agents not only about the objective
conditions of life, but also about the subjective conditions of existence i
mposed by the former.
It becomes essential here, for the sociological understanding of the daily practices of the rabble
in the pandemic period, the exercise of revealing from empirical works the feeling and deep
meaning of what it is to “be a slum dweller
” in the country. In this sense, Bourdieusian urban
sociology offers us some valuable instruments: a dialectic between reified physical space and
class habitus
is one of them.
By explaining his visions of the social world and, in particular, about the “fav
ela”, Jiboia
soon tries to denaturalize the symbolic violence in popular neighborhoods in terms of the social
ills attributed to urban violence in these territories. For Jiboia, issues such as robberies and
homicides that occur in popular neighborhoods als
o occur in "beautiful places", such as Boa
Viagem
-
south of Recife and one of the most expensive square meters in the city
-
"
Which is a
beautiful place, on the edge of beach, all... the people kill one, cripple one, steal everything...
the way it is here
".
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However, despite Jiboia's efforts to denaturalize the fact that there is no formal address
for many of the social ills, the transclassist common sense of the stigmatization effect focused
on “being from the favela” operates in Jiboia's subjective condit
ions. Although it reinforces his
liking for the “favela” and its importance in his life, being “favelado” is being humiliated, as
well as being denied a series of rights, for example, the apparently simple matter of not
receiving correspondence at home. Ac
cording to Jiboia’s understandings, such a question of
humiliation for being “from the favela” is the humiliation that the rich impose on the poor:
B
-
How do you feel like for living in a favela?
J
-
I feel humiliated. I've always lived in the
favela, and it's in the favela
that I get my biscuits to eat, it's inside the favela, I like living in the favela.
You arrive to buy something at the store, when you give the address, you say
'ah, it's a favela, right? We don't deliver no'. I have a credit
card anyway, I
gave the address and they said it wouldn't arrive, I gave an address to the house
of the mother of a boy from here.
Is this not humiliation? The people
humiliate the favela a lot. The poor is humiliation of the rich, they look
crooked
to us
.
Jiboia's points of view and opinions about Brazilian social classes, as well as
inequalities, appear immediately when asked which of the neighborhoods he lived in Recife
liked the most. When questioned, a question that stands out as an important elemen
t for the
debate proposed here, Jiboia does not answer the question by pointing to a specific
neighborhood but brings a definition of what would be “a good place” in his understanding. For
Jiboia there is no bad place and it is the person who makes the pla
ce, because, according to him,
the central issue is knowing how to live. Thus, and even more importantly, when asked about
what knowing how to live in the place where one lives would be, Jiboia readily attributes it to
“
knowing how to respect and be respec
ted'
'. In this sense, it is important to emphasize that
talking about what would be “a good place” is the only moment in the three interviews in which
Jiboia labels the thought expressed as an issue already reflected by him, or even, in which one
has convi
ction and, therefore, Jiboia immediately presents his understanding, "
That's what
comes to my mind anyway, I answer right away because there is no bad place, no
". The theme
is articulated by him succinctly and applied to examples
-
which, by the way, contr
ibute to
reinforce that it is an opinion already reflected and taken as a conviction.
In Jiboia's understanding, the favela is in opposition to the city, as well as the rich nation
to the poor nation. The relationship between city and favela is fundamental
for the purposes of
this research, because, according to Jiboia, being in a city or favela also defines the place where
Jiboia will be respected as a citizen or, diametrically opposed to such a position of recognition,
will be treated like a dog:
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J
-
Here they respect it, but in the city, if I go there and walk among these
peoples, will they consider me a citizen?
No,
a dog!
B
-
Who
?
J
–
Those rich
!
B
–
Like a dog
?
J
-
I think it is, I think it is... because there are five or six of them there, if
I arrive all bedraggled, the first thing the guy will say is, "Look, what a
dog!" Just because you have the best clothes, because you have more
money than the person, you read more than the person, right?
General provisions and class
ethos
in the pandemic
From the relationship already established with Jiboia, added to the sociological
biography carried out through the interviews, it is possible to weave some understandings about
Jiboia's dispositional heri
tage and, more specifically, about his
class habitus
. Our main
objective is to reconstruct the meanings that social agents attribute to their pandemic protection
practices, the practice being intermediated by objective living conditions and subjective
cond
itions of existence.
That said, we seek to support the integral parts of unequal social realities and practices,
considering the objective conditions of social class and, fundamentally, about the subjective
conditions of existence in each particular contex
t in Jiboia's life trajectory. Therefore, we
understand that in Jiboia's life trajectory, social issues such as the exploitation of child labor in
a situation analogous to slavery; absence of numerous rights related to childhood and
adolescence; an inhuman
stepmother; the feeling of being alone in the world,
a rejected calf
;
low objective living conditions; absence of social pre
-
conditions for the acquisition of economic
and cultural capital via school certificate; extreme poverty in several diachronic mome
nts; lack
of recognition in the dimension of love; solitary life of a social individual “loose in the world”,
despite having 18 children and several ex
-
partners and the feeling of being recognized as a dog
by the people of the city were/are imposing differ
ent subjective conditions understood here
under the dispositional concept of
precarious ethos
. Such an
ethos
that could be perceived in
some social contexts, for the purposes of this research, was analyzed in order to understand the
intermediations between
Jiboia's
precarious ethos
, objective living conditions and pandemic
protection practices.
Before delving into the reconstruction of the meanings of Jiboia's practices in the
pandemic mediated by the
class habitus
, it is necessary to place two other sets o
f dispositions
that were understood here as strong dispositions and that, depending on the social context,
decisively affect practices Jiboia's daily activities: religious dispositions
-
although Jiboia is not
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of any religion and insists on ratifying it si
nce he is not evangelical
-
and the
eidos
about logical
schemes.
Thus, everyday actions are mediated by religious beliefs, especially when resolving
dangers, such as about pandemic protection practices that are made sense of through
intermediations with pr
ovisions of religious belief. However, it should be noted that Jiboia's
strong religious beliefs are not, under any circumstances, taken as a general disposition that
defines his practices and visions of the world, but are placed in a correlation of forces
with the
other dispositions, from the peculiarity of each context.
Firmly claiming that he was never afraid of the coronavirus because he is not afraid of
death, over the almost three years of the pandemic, Jiboia's
actions to protect himself through
masks, social isolation, correct hand hygiene and vaccination, going to the doctor were rare,
when necessary etc. As a matter of fact, on the few occasions that he acted according to the
protection recommendations, the p
urpose of his actions was not to protect himself, being much
more associated with compliance with the rules.
In this sense, it is possible to infer that there is in Jiboia an enormous absence of fear of
dying as a behavior of a modus operandi to face so ma
ny daily threats with which he had to
deal throughout his 62 years, such behavior being a strong dispositional trait of the little
attachment that Jiboia has for his own life, sedimented along a hard trajectory in the form of a
precarious ethos
-
in the se
nse of existential inequalities. In the current scenario of severe social
crisis that the country is going through, Jiboia's most immediate fears are others and the issues
that lead to death too, such as hunger:
J
-
I am afraid of people dying of hunger,
I see people dying of hunger,
because there are no goods, no services, no money
...
I'm not afraid of dying,
I have nothing to lose, I've already done what I had to do in my life, I'm already
old, and I'll think about nothing else, I don't.
Although Jiboi
a has one of the best living conditions in the entire community, in the
current context, the interviewee fears the uncertainties of his future more than being affected
by the coronavirus. If, on the one hand, as he constantly points out, there is no work i
n civil
construction; on the other hand, the small markets that are Jiboia's only livelihood are no longer
guarantees of steady money, as the vertiginous impoverishment of the poorest part of the
population directly impacts Jiboia's sales.
J
-
[...]
The guy just does what the guy has to do... is to do that thing and
not be afraid. I'm not afraid of these diseases...
well, look, that's what makes
you afraid
[
referring to a
n old man
who had just caught a can of cachaça on
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credit
]
because if I don't take
it off, how am I going to put it on? That's
it
...
that I already took a lot of shade here... then you have to put it in your
head
.
B
-
Are the people here short of money?
J
-
Everyone without money, right? That there is no service to work on,
even for wom
en it is bad, there was cleaning on one side, cleaning on the
other, going to one place, going to another, now there is no cleaning or
anything.
Let's see if it improves now after Lula joins. Lula... [long pause]
they're already making war with him
again.
Perhaps one of the most accurate markers for us to measure the crisis of labor shortages
among the structural rabble is Jiboia's
finding about the lack of cleaning as a work activity for
women in the pandemic context. As is known, despite the precariousness, the work of domestic
servants is one of the most available categories for women from the popular classes since its
first fulc
rum. Without this income, the heads of household end up having to make ends meet in
other ways, as we can see in Jiboia's reports:
J
-
The people here are hungry and going to Ceasa to pick up garbage...
is there a place to catch more diseases than Ceasa?
People would leave
here to pick tomatoes, onions... there it's all on the ground, there it rains, you
step on it, the car hurts it, then there's that black water on the ground, that
causes a disease...
but I had to eat, hunt for something to eat, get here
to
wash it, scald it to eat it because I didn't have money to buy it, all this is
a pandemic, you know?
One of the biggest fears of Jiboia is becoming a person dependent on others to survive,
which is a matter of pride. This dispositional trait, on the on
e hand, is strong, being able to
motivate daily efforts of hard work, even at 62 years old and having a tired body; on the other
hand, it is fragile, because through the testimonies we realize that it is emotionally very painful
for Jiboia to imagine that
in the near future the markets may close and he may return to the
social position he already occupied as a beggar.
Another dispositional characteristic of Jiboia that should be highlighted in the
reconstruction of the meanings of his actions in the pandemi
c context is the particularity of
having learned to deal with low living conditions. The ascetic
ethos
when it comes to holding
back food and money comes back to the fore as one of the particularities that are capable of
giving the Jiboia a social advantag
e in a scenario of growing poverty. Therefore, we show that
although Jiboia's concern is with the future, the fear is of a known pain, hunger. And not from
an unknown disease.
In this sense, it is worth rescuing the sociological understandings of Jiboia's
dispositional heritage analyzed in the above, in which we understand that the genesis of
dispositions, either through a moral economy inherited from his father or from Paulo, are
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Pandemic and
class habitus
:
Analysis
of social self
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care practices during the
Covid
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19 pandemic in the metropolitan region of Recife
Rev. Sem Aspas
,
Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.
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fundamental to deal with the current context of social crisis and sanitary. P
recisely in this sense
regarding the particularities, Jiboia knows that the personal capacity to store food and money
makes him different from the other residents of the occupation, mainly in the face of the current
social and health crisis
-
“
“All my life
I've liked to save my little bit, now it's got worse, you
have to save even a little more, now in the pandemic you have to buy really carefully, because
there's no money
.”
It should be noted that in addition to the class
ethos
, the provisions of religious belief
and the ascetic dispositions of knowing how to ration food and money, in the reconstruction of
the meanings of Jiboia's acts during the pandemic, it is necessary to emphasize how the
pandemic
-
denying industry instilled
subjective perceptions in Jiboia that directly affect their
daily practices.
At different times, when asked about a certain deviation from his practices in the period,
through the logical schemes of
eidos
, Jiboia disdains the pandemic by reproducing fake n
ews,
an issue that encourages him in actions of practices that deviate from pandemic protection
practices. Although Jiboia is politically left
-
wing
-
as he defines himself
-
and does not like the
current president Jair Bolsonaro, it is worth emphasizing th
at a series of Jiboia's understandings
and practices regarding the pandemic find support in the president's public position, such as
Jiboia's lack of interest and fear in take the vaccines.
An example of this support between certain pandemic protection pra
ctices and the
public positions of the president can be seen in the notes of the research entitled
More than
Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior During a Pandemic
. Research demonstrates that
the words and actions of political leaders affect people's
behavior regarding social isolation.
The research found that after President Jair Bolsonaro minimized the risks of the SARS
-
CoV
-
2 pandemic and advised against social isolation, the locations that had the highest numbers of
pro
-
government people
-
based on
the 2018 election
-
were the places which showed the greatest
weakening of social isolation indices compared to the locations where the president does not
have the same popularity.
Jiboia says he is afraid of the consequences of taking a vaccine that, acco
rding to him,
is not safe. Such fear of Jiboia is oxygenated by the president's position; however, it should be
noted that the fear is not associated with the figure of Jair Bolsonaro, but with the position he
occupies, as president of the republic. This q
uestion is posed as follows: "
If the president does
not want to take it, there are reasons for that... he was the first person who did not want to take
it
".
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Bruno Leonardo
FONSECA
Rev.
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,
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Regarding the use of masks, still in the first interview, in a humorous tone, Jiboia
presents us wi
th the vast collection of masks that he has due to the many purchases he had to
make when he was required to use the mask on the occasion
-
"
When someone complains ,
'Okay, I'll put it on' when I go on the subway, I have about 40 masks there, I go out ever
ywhere
and buy... 'Hey, I can't get in', 'How much is one?', 'That's two reais', 'give me one'
". Jiboia
offers no resistance when required to wear a mask, claiming to be afraid of popular reprisal.
The use of a mask by Jiboia in the pandemic period is plur
al and, to a large extent,
contradictory. At another time, although he does not understand the reasons, Jiboia recognizes
the importance of wearing a mask, even classifying non
-
use and non
-
isolation as a “failure”.
However, as occurs in almost all of his o
pinions about his practices in the period, the beliefs
dispositions of religious determinism and, to a greater degree, the
precarious ethos
as a set of
dispositions that, among other things, are attributed to a courage before the dangers of the world
and d
eath, as in the context of the pandemic, a great absence of fear of dying from the disease
in question.
Throughout the three interviews, Jiboia firmly states that he never stayed at home and
never will, that he was never afraid and is not afraid of dying.
In addition to the
precarious
ethos
, the generational cut makes Jiboia even less attached to life itself. As we can observe
throughout the interview, the more advanced age reverberates in some issues in Jiboia's life,
such as the possibility of having a jo
b with a formal contract
-
"At that age, no one will sign me
for a formal job"
-
and less chances of getting it , in a fixed way, a companion; in this case, we
understand that older age makes life even less interesting for Jiboia or even less valued, which
in turn leads to less fear of dying, even when it comes to dying due to complications from the
coronavirus.
Final considerations
As we have seen, the practices of Pandemic protection of Jiboia
in the pandemic
-
use
of mask, correct hand hygiene, vaccines and social isolation
-
, in general, are not in accordance
with the recommendations for protection against the coronavirus. Jiboia did not use masks; did
very little social isolation as a way to
avoid being contaminated; does not wash hands properly
with soap; and only took the vaccine due to relative pressure from members of the social
movement coordination.
Therefore, regarding the behavior of Jiboia in the pandemic, the present research
focuse
d on the reconstruction of the meanings of the acts attributed by the social agents
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class habitus
:
Analysis
of social self
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care practices during the
Covid
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19 pandemic in the metropolitan region of Recife
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themselves. That said, we understand
-
after three long biographical interviews and analysis
-
that the
class habitus
; the set of provisions that make up the
precarious eth
os
; provisions of
religious belief; and precarious dispositions of the logical schemes of the
eidos
, are sociological
characteristics of Jiboia that allow the reconstruction of the meanings of the practices in the
pandemic period analyzed here, being stron
gly mediated by issues related to Brazilian social
inequalities.
As it was noticed, in the few times that Jiboia acted according to the recommendations,
what mobilized him was much more related to other issues than the motivation to protect
himself from da
ngers than possible contamination; as in the case of the use of vaccines, which
happened when he discovered that he would suffer some restrictions in relation to his work
card, to open bank accounts etc., or even in the case of masks, which in the vast maj
ority of
times Jiboia only used when required, either by norms of a certain place or by pressure from
the people who demanded such protection.
To reconstruct the meanings that are imbued in the practices is to reconstruct the
objective conditions of life a
nd the subjective conditions of existence. As seen, if on the one
hand the objective conditions determine a series of practices, mainly in a scenario marked by
the abrupt increase in poverty, hunger, unemployment, etc., on the other hand, the provisions
me
ntioned above darken the compression of Jiboia's actions in the period: the absence of fear
of death is intertwined with his
precarious class ethos
, thus making pandemic protection
practices that deviate from recommendations understandable from a sociologi
cal point of view.
That said, there is no doubt that existential inequality
-
understood here in the
dispositionalist form of
precarious ethos
-
is a central social element in the reconstruction of
the meanings of pandemic protection practices that do not
comply with the recommendations
in the period. Low self
-
esteem, low social dignity, the feeling of being a dog for other social
classes, the lack of recognition in marital or family love, the pains one carries because of the
burden of being a favela dwelle
r, are issues that make not only society, but also the Jiboia itself
ends up valuing its life as something of little importance, resulting, therefore, in low pandemic
protection practices.
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Bruno Leonardo
FONSECA
Rev.
Sem Aspas
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Submitted
:
15/08/2022
Required revisions
:
19/09/2022
Approved
:
11/11/2022
Published
:
26/12/2022
Processing and Editing
: Editora
Ibero
-
Americana de Educação.
Correction, formatting, normalization and translation
.