image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176281PANDEMIA E HABITUS DE CLASSE: ANÁLISE DE PRÁTICAS SOCIAIS DE AUTOCUIDADO DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19 NA REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFEPANDEMIA Y HABITUS DE CLASE: ANÁLISIS DE LAS PRÁCTICAS DE AUTOCUIDADO SOCIAL DURANTE LA PANDEMIA DE LA COVID-19 EN LA REGIÓN METROPOLITANA DE RECIFEPANDEMIC AND CLASS HABITUS: ANALYSIS OF SOCIAL SELF-CARE PRACTICES DURING THE COVID-19 PANDEMIC IN THE METROPOLITAN REGION OF RECIFEBruno Leonardo FONSECA1RESUMO:Nesteartigo, por meio de etnografias e biografia sociológica realizada com Jiboia um membro das classespopulares brasileira ,apresentamos que diante do contexto pandêmico a utilização de máscaras, realização do isolamento social, vacinação e higienização,não são apenas respaldadas pelas condições objetivas de vida, mas também, pelos condicionantes subjetivos de existência quando estes estão associados à desigualdade existencial.Este último, por vez, se estabelece na desigual alocação de respeito, dignidade e valorização da própria vida.PALAVRAS-CHAVES:Pandemia. Classes populares. Desigualdade. Habitus de classe. Pierre Bourdieu. RESUMEN:En este artículo, a través de etnografías y biografía sociológica realizadas con Jiboia miembro de las clases populares brasileñas, presentamos que, ante el contexto de pandemia, el uso de mascarillas, el aislamiento social, la vacunación y la higiene, no son sólo sustentada en las condiciones objetivas de vida, pero también en las condiciones subjetivas de existencia cuando éstas se asocian a la desigualdad existencial. Este último, a su vez, se establece en la desigual asignación del respeto, la dignidad y el aprecio por la vida misma.PALABRASCLAVE: Pandemia. Clases populares. Desigualdad. Habitus de clase. Pierre Bourdieu.ABSTRACT:In this article, through ethnographies and sociological biography carried out with Jiboiaa member of the Brazilian popular classes , we present that, in the face of the pandemic context, the use of masks, social isolation, vaccination and hygiene, are not only supported by the objective conditions of life, but also by the subjective conditions of existence when these are associated with existential inequality. The latter, in turn, is established in the unequal allocation of respect, dignity and appreciation of life itself.KEYWORDS:Pandemic. Popular classes. Inequality. Class habitus. Pierre Bourdieu.1Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife PE Brasil. Arquiteto e Urbanista,mestrando em Sociologia pelo Programa de Pós Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco (PPGS/UFPE). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7149-857X. E-mail: brunofonsecaln@gmail.com
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176282IntroduçãoAo longo dos últimos três anos de pandemia, as práticas de utilização de máscaras, higienização das mãos, isolamento social, vacinação, busca por atendimento médico quando necessário, tem se tornado práticas cotidianas fundamentais para lidar com os perigos e ameaças advindos do Coronavírus. Tais práticas, nomeadas neste presente artigo de práticas de proteção pandêmica, são atravessadas por questões relativas às desigualdades sociais concernentes à luta de classes e, não estão, sob nenhuma hipótese, acessíveis de modo socialmente justo para todas e todos. Amartya Sen (2001) nos ensina que para formularmos uma dada dimensão a ser analisada de uma desigualdade social qualquer, carecemos da evocação do seguinte questionamento: “desigualdade de que?”, para assim, como estratégia de pesquisa, formularmos os “espaços de avaliação", isto é, a seleção dos critérios relevantes que serão utilizados para analisarmos uma determinada desigualdade social. No caso desta pesquisa, analisamos nos “espaços de avaliações” a reconstrução dos sentidos que os agentes sociais atribuem aos seus atos. A prática de proteção pandêmica aqui analisada a partir das desigualdades sociais que residem entre as condições objetivas de vida e as condicionantes subjetivas de existência. Esta última, posta no sentido bourdiesiano de ethos de classe2, compreendido aqui sob o conceito de Therborn (2011) de desigualdades existenciais -relativo às questões de baixa dignidade, autoestimasocial e valorização da própria vida. Para tanto, utilizamos como metodologia as análises etnográficas e, principalmente, biografias sociológicas fincadas em Bernard Lahire (2004), na qual utilizamos, além dos conceitos que serão apresentados em breve, três roteiros de entrevistas semiestruturados. A pesquisa revela que as práticasde proteção pandêmica não são apenas respaldadas por desigualdades materiais e econômicas. Ao reconstruir os sentidos que os agentes atribuem a tais práticas, inferimos que os condicionantes subjetivos relativos à desigualdadeexistencial são determinantes sociais. Assim, após apreendermos as disposições subjetivas de Jiboia em diversos contextos sociais, diacrônicos e sincrônicos, compreendemos que no contexto pandêmico as questões relativas à baixa valorização da própria vida figuramcomo determinantes para as baixas práticas de proteção pandêmicano caso de Jiboia. 2O conceito bourdieusianode habitusé aqui fragmentado para atender com melhor precisão os interesses desta pesquisa, embora Pierre Bourdieu ao longo da sua trajetória acadêmica tenha abdicado desta fragmentação. Tratamos do conceito de habitusa partir de três partes constitutivas: o eidos, conjunto de esquemas lógicos de avaliação e ação; o hexis relativo à corporificação, no sentido das disposições que se tornaram corpo, posturas, gesto; e o ethos, como um conjunto axiológico e sistemático de disposições da dimensão ética, nas formas de ser e estar no mundo social. Nesta pesquisa utilizamos especialmente habitus e ethos.
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176283As três entrevistas foram realizadas ao longo dos anos de 2021 e 2022, contou com um gravador de áudio e um bloco de papel para tomadas de notas, ambos autorizados por Jiboia. A entrevista ocorreu em sua casa, mais especificamente no espaço destinado para o seu mercadinho, enquanto atendia os poucos clientes. Jiboia foi informado que a pesquisa tratava da vida dos moradores de ocupações urbanas e que os dados colhidos não seriam necessariamente utilizados; além disso, o entrevistado foi informado que qualquer questão que levasse ao reconhecimento de sua verdadeira identidade seria mantidasob sigilo.Desigualdade Existencial e Habitus de classe no BrasilAcerca da disposição na sociologia disposicionalista, de acordo com Pierre Bourdieu (2001, p. 171), após um jogo de palavras heideggeriano, “disposição é exposição”e, isto ocorre, justamente porque o corpo está exposto às exterioridades do espaço social: aos perigos, aos acolhimentos, às complacências ou constrangimentos do mundo social que o cerca, a começar pelas imposições das condições materiais de existência, como por exemplo, os agentes sociais residentes nos bairros populares os quais apresentam os  baixos índices das práticas de proteção pandêmica que carecem de toda uma condição material que os distanciam do cumprimento das recomendações do isolamento social, uso de máscaras, vacinação etc.Assim, é a partir de uma determinada posição objetiva -principalmente através da classe social -ocupada no espaço social que os agentes sociais compreendem o espaço social que os engloba, e assim vão se condicionando a uma classe de habitusque os orientam pelos condicionantes deste mundo social específico. O habitusse encontra ajustado às regularidades da posição no mundo social, funcionando como estrutura estruturante e estrutura estruturada, isso porque as estruturas sociais utilizadas pelos agentes para compreender o mundo são ao mesmo tempo o produto incorporado desse mesmo mundo estruturado e estruturante que o cerca, pois, como se sabe, os agentes sociais apenas compreendem o mundo social que os engloba, engendrando neste sentido“produtos de uma sistematicidade não desejada e inconsciente a si mesma” (BOURDIEU, 2007, p. 45); e que, por vez, estão aptas a orientar os indivíduos por práticas sociais comuns e cotidianas, sendo estas mais ou menos homólogas entre os membros da mesma fração e classe social. Isso significa que os agentes sociais ao tomarem suas decisões acerca das práticas de proteção pandêmicanão escolhem o princípio de suas escolhas, que é o habitus classe.Na praxiologia bourdieusianaa prática éo lugar da dialética entre as posições objetivase disposições subjetivas, cabendo ao primeiro, a exterioridade objetivada das estruturas sociais
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176284que condicionam a percepção e a ação dos agentes sociais, como uma espécie de uma “tabela rigorosa das categorias historicamente constituídas” (BOURDIEU, 2007, p. 436), ou seja, de um espaço socialque se constitui no e pelo sistema de oposições relacionaisdas diferentes posições sociais e das diferentes distribuições das condições de vida; enquanto o segundo, encontra-se abrangido pelo conceito de habitus, definido como o princípio unificador das disposições subjetivasque, embora se formem no decorrer da história coletiva de uma sociedade. Neste sentido, por meio da incorporação no decorrer da história individual dos agentes sociais, de acordo com as diferentes posições objetivas dos agentes em um dado espaço social, que se pré-condicionam as diferentes percepções e as ações destes agentes em cada contexto socializado e socializante, tornando o habitusum produto da aquisição histórica por um legado daslutas históricas entre as diferentes classes sociais.Na obra“Subcidadania brasileira” (2018), o sociólogo reconstrói o modelo bourdieusiano de classe social no Brasil, considerando as diferenças fundamentais entre as sociedades de países centrais e as de países periféricos. Em sua interpretação sociológica das classes sociais brasileiras, a noção burdieusiana de luta de classes e de habitus de classe se soma a noção tayloriana de hierarquiasvalorativas das sociedades modernas, as quais são fundadas em fontes de instituições fortes, como o mercado e o Estado, e que acabam classificando apenas como cidadão os agentes capazes de lidar com as exigências modernas, como a prospecção, produtividade, racionalidade. Esse reconhecimento de cidadania moderna, concedida apenas aos agentes racionais dignamente produtivos, respaldadas pelas “fontes morais” das instituições fortes na modernidade, é definido como habitus primário.Neste sentido, Jessé Souza (2018) argumenta que ohabitus pensado por Pierre Bourdieu não pressupõe uma condição fundamental da sociedade francesa: o reconhecimento socialmente compartilhado, de modo transclassista, na qual todos os franceses são cidadãos franceses. Por outro lado, a ausência dessas mesmas pré-condições sociais caracterizam o conceito de habitus precário, correspondendo ao conjunto das disposições subjetivas interiorizadas -de acordo com as posições e condições objetivadas -que segundo Souza (2018, p. 240) “não atendem às demandas objetivas para que um indivíduo ou um grupo social possa ser reconhecido como produtivo e útil numa sociedade de tipo moderno e competitivo”, sendo assim, reconhecidos socialmente como subprodutores e subcidadãose, portanto, sub-humanos. O resultado é a construção de toda uma gama simbólica de estigmatizações e noções preconceituosas que apresentam correlatos de estruturas cognitivas dos agentes sociais:desqualificando, criminalizando e abolindo o reconhecimento da dignidade social de uma classe
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176285social inteira, inclusive tendo esse reconhecimento pejorativo compartilhado entre as próprias vítimas da violência simbólica exercida.Dito isso, Souza (2018) define as classes populares brasileiras, em sua condição social peculiar de subcidadania, pela produção e reprodução de um habitus precário ao longo do tempo e do espaço, sendo essa a condição peculiar para a produção e reprodução da ralé estrutural brasileira. Neste sentido, na tese central da obra, é explicado que cerca de 1/3 da população brasileira, devido à ausência das pré-condições sociais mínimas para dar conta das exigências da dignidade do “agente racional” moderno, encontra-se na posição de exclusão e desclassificação perante toda a sociedade como “subprodutores” e, portanto, classificados pela hierarquia valorativa moderna como subcidadãos. Cabe ressaltar ainda, que esse enorme contingente de brasileiras e brasileiros foi primeiramente nomeado porFlorestan Fernandes (2008) como primeira ralé urbana e ralé secular, justamentepela ausência das condições psicossociaisnecessáriaspara integrarem a uma sociedade moderna e competitiva. Acerca da baixa dignidade social, da condição de subcidadania, danegação de reconhecimento social como agente produtor e válido que atinge grupos sociais e classes sociais inteiras. O sociólogo Goran Therborn (2011, p. 21-22) propõe perspectivas analíticas entre diferentes tipos de desigualdade. Para o nosso interesse,destacamos a noção de desigualdade existencial, estabelecida nanegação de uma igualdade entre todas as pessoas humanas, por meio das desiguais alocações de respeito, reconhecimento social, dignidade, humilhação, ignorância e marginalização. Deste modo, ao tratarmos do habitus de classe, ou mais precisamente, do ethos de classeda ralé estruturalbrasileira, estamos falando de um ethos precário,ou seja, uma concepção de ser e estar no mundo constituída de modo precarizado; devido à ausência das pré-condições sociais necessárias para obter o reconhecimento social de cidadania moderna e a dignidade social; restando a estes indivíduos e classes sociais inteiramente marginalizadas e estigmatizadas uma ausência do reconhecimento da dignidade humana, resultandoem concepções identitárias de baixa autoestima e dignidade individual e coletiva, assim como, por tantas outras condições que correspondem ao polodeficitário da desigualdade existencial.Entretanto, cabe ressaltar que que o habitus de classe não está posto aqui de maneira mecanizada por coerções externas, e sim de um habitusadaptável, sendo transponível aos diversos contextos sociais das diferentes práticas sociais. Como propõem por Bernard Lahire (2004) ao assumir uma postura sociológica dentro do campodisposicionalista da ação que considera a pluralidade dos diferentes meios sociais sendo rebatido na pluralidade da socialização dos indivíduos, que por fim, desdobra-se na pluralidade disposicional dos agentes
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176286sociais a partir da particularidade de cada trajetória social. Lahire elabora da obra bourdieusiana constrói o entendimento de que a heterogeneidade do mundo social está incorporada na construção social dos indivíduos, ou ainda, que toda ideia de campo -que compõem as múltiplas externalidades do espaço social -opera também na dimensão individual interiorizada nos agentes sociais. Assim, nesta biografia sociológica aqui apresentada, utilizamos conceitos disposicionais como inclinações, pluralidade de disposições, aptidões, variações intraclasse, rupturas biográficas etc.JiboiaMais conhecido como Jiboia, Antônio da Silva é um dos moradores mais antigos da Ocupação Dandara na periferia do Recife. Jiboia tem 62 anos, divorciado diversas vezes, pai de 18 filhos sem estabelecer relação firme com nenhum. É pedreiro e proprietário de duas pequenas “barracas” onde se comercializa produtos higiene, limpeza, alimentos básicos, bebidas alcoólicas, que funcionam dentro das suas duas casas localizadas em duas ocupações urbanas. Proprietário de um patrimônio de capacidades no que diz respeito às práticas da construção civil, Jiboia é reconhecido frequentemente como o “engenheiro da ocupação”, prestando serviços tanto quando a questão é coletiva, como também na ajuda pontual aos vizinhos. Jiboia é solidário e suas habilidades de provimento da vida cotidiana diante de condições objetivas tão precarizadas estão, por muitas vezes, a serviço da ajuda comunitária. Apesar das queixas pela falta de reconhecimento por suas ações coletivas e da falta de colaboração financeira dos demais, Jiboia se orgulha dos serviços prestados. Em sua trajetória como militante por direito à moradia, foi por mais de duas décadas presidente da associação de moradores de uma famosa comunidade do Recife, conhecida no campo do direito à cidade pelo histórico de resistência contra os despejos fundiários."Olhe, dos 13 anos pra trás eu sofri demais"Jiboia é natural da zona rural de Aliança -um pequeno município localizado na zona da mata norte pernambucana. Jiboia nasceu, como costuma dizer, dentro de um partido de cana, inclusive,lugar no qual também sofreu a exploração do trabalho infantil na lavoura. Jiboia permaneceu neste trabalho relativamente análogo à escravidão até que decidiu fugir para o Recife -"Olhe, dos 13 pra trás eu sofri demais".
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176287Jiboia é o único filho de seu pai com sua mãe; "Meu pai era Durval Caetano, chamava ele de Durval, meupai era de Exú. Foi pra usina ficar trabalhando, aí em Aliança mesmo ele morreu". Jiboia é órfão por parte materna desde o seu nascimento, a história do que realmente houve com sua mãe e os motivos de ter sido arrancado dela ainda ao nascer nunca lhe foram revelados. Apesar dos 62 anos, Jiboia ainda hoje não sabe o paradeiro de sua mãe; não sabe o que aconteceu no seu nascimento; não sabe se seus pais biológicos tiveram alguma relação conjugal; como também não sabe sequer dar certeza sobre o nome dela. Questões tais que lhe traz ressentimento e tem desdobramentos em sua vida. Quando Jiboia tinha apenas três anos de idade, Durval se casou com Ruth, a quem para ele logo de início é classificada como muito malvada."Tem mãe que não é a mãe da gente, mãe é mãe”. Da união de Durval e Ruth nasceram mais três filhos. Assim sendo, a composição familiar mais central ficou constituída com Jiboia sendo o filho mais velho da casa. O período em Aliança, ao longo da sua infância e início da adolescência, traz memórias à Jiboia que ele não gosta de recordar. As duras dores do passado que, como nos revela "Me vêm na cabeça, mas tento esquecer", estão fortemente vinculadas às condições objetivas de vida, bem como pelas particularidades que as variações intraclasse. Como se sabe, o trabalho infantil no campo atinge milhares de crianças no nordeste brasileiro; contudo, como mostraremos nesta pesquisa, cada indivíduo desta posição social se relaciona de modo singular com o mundo social, seja nas aptidões, inclinações, disposições, particularidade de cada trajetória.No trabalho da cana, Jiboia começou a acompanhar o pai tão cedo em sua vida que não consegue sequer recordar-se quando passou a auxiliar o pai nas atividades de trabalho. Aos 8 anos, já dispondo de um patrimônio de capacidades disposicionaisque são exigidas nas atividades de trabalho da lavoura, incorporada através de uma socialização indiretacom o mundo do trabalho do pai, Jiboia foi convidado pelo feitor da usina a trabalhar "formalmente".Além de ser criança eter que enfrentar o árduo trabalho da cana, Jiboia fala com revolta e ressentimento do período em que trabalhou em sua cidade natal. Principalmente devido à posição ocupada no espaço familiar e nas relações particulares estabelecidas com sua madrasta; cabe destacar ainda que é nas intersecções entre os contextos do mundo do trabalho e do mundo familiar que as interações estabelecidas com a madrasta se tornamainda mais ardilosas e, até mesmo, mais desumanas. Ele nos conta, em tom agressivo, que era comum sofrer sanções impostas pela madrasta caso não batesse as metas diárias do trabalho na usina, como por exemplo, almoçar apenas quando terminasse o serviço; se não conseguisse terminar até o horário do almoço, era obrigado a cumprir a demanda de trabalho no período da tarde, sem sua
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176288principal refeição do dia. As duras sanções impostas, assim como a apropriação de seu salário por Ruth não ocorriam escondido de Durval; ao contrário, o pai de Jiboia foi bastante omisso diante do contexto -"Eu ficava magoado porque pai nada dizia".Embora seja habilidoso com os números, na construção civil e na administração de suas duas barracas, como orgulha-se em contar, Jiboia é analfabeto. A sua relação com o mundo escolar praticamente inexistiu em sua trajetória de vida: começou aos 9 anos e parou aos 13, quando fugiu para o Recife. Além das várias dificuldades impostas, como a grande distância entre sua casa e o colégio, o horário da escola quase sempre era comprometido pelas obrigações do trabalho, pois, como elealerta, aprioridade era sempre ir ao trabalho. Em entrevistas, Jiboia se culpa por ser analfabeto e se autopenalizapor isso, definindo-se, inclusive, como “uma pessoa neutra”.Outro ponto de sofrimento social que teve sua gênese em sua infância -talvez o mais central -e que cabe aqui ser compreendido como um ethos precárioestabelecido como um condicionante subjetivo a partir de uma posição de ralé estruturalbrasileira é uma certa desestruturação do núcleo familiar, do qual se espera que atue como ambiente fecundo da transmissão afetiva de valores. No caso particular de Jiboia, o tipo de relação específica com a madrasta, a ausência materna ao longo de sua vida, a exploração no trabalho infantil da lavoura da cana, a extrema pobreza, ausência do ambiente escolar e a omissão do pai conformam as particularidades de um ethos precárioengendrados ainda na infância e adolescência. Jiboia, um sujeito solto no mundo, um bezerro rejeitadoEm muitos dos momentos nos quais fala de si, Jiboia expressa uma vida marcada pela solidão, tanto na dimensão familiar, ausência materna, ausência de uma companheira matrimonial, o não reconhecimento como irmão pelos demais irmãos parte de pai -“Me sinto sozinho no mundo porque os outros que eu tenho de lá não liga pra mim, tem dois irmãos nunca vem na minha casa, eu fui lá não sei quantas vezes” -, sem relação próxima com os 18 filhos, como também nas relações de amizade; embora more há quase 50 anos na região metropolitana de Recife, Jiboia não construiu nenhuma amizade duradoura e sólida.Neste sentido, é possível inferir que a vida solitária figura como um elemento importante em sua vida. Ao longo da entrevista e dos eventuais encontros nos quais pude observar e interagir com Jiboia, uma música por ele nomeada de "Bezerro rejeitado" foi, por vezes, trilha sonora dos momentos que estivemos juntos. A música o sensibiliza e o traz um significativo grau de identidade e reconhecimento:
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176289J -Oxe, sofria, é por isso que de vez em quando toca essa música eu fico meio triste[...] Um bezerro rejeitado, um gado quando rejeita um filho você faz o quê? O cara não dá na mamadeira? Porque a mãe não queria dar.... aí fico pensando nisso.Penso muitas vezes, aí depois que saiu essa música, pronto! Aí é que eu penso mesmo… Eu me lembro muito dessa música por mode disso, eu nasci um bezerro rejeitado, não vi mãe, ficava mamando de um, ficava mamando de outro, aí fica no lamentoUma outra questão central na vida solitária de Jiboia é a ausência de uma companheira conjugal fixa, principalmenteem dois pontos. Primeiro, está ligado à divisão sexual do trabalho, a ausência de uma companheira é também a ausência de um alguém que cumpra as atividades domésticas, assim, a dupla jornada de trabalho, que em geral, é comum às mulheres, acaba sendo cumprida cotidianamente por Jiboia. Segundo, a ausência de reconhecimento no amor, cabendo a esta uma ausência de um companheirismo conjugal, como nas atividades de lazer e afeto. Seu pai foi o único parente do núcleo familiar mais central que Jiboia estabeleceu relações familiares mais sólidas. Inclusive, a única herança via transmissão afetiva de valores herdada da família como patrimônio disposicional, advém do pai na forma de uma dada economia moral, no sentido do lidar com as relações conjugais e com as baixas condições objetivas de vida:J -É por isso que hoje em dia, quando meu pai morreu, me chamou, e eu fui lá. Ele disse, “olhe meu filho, tômorrendo” chamou os filhos tudinho. Eu e Luizinho... fui,‘olhe, só tem uma coisa que eu peço a você, você casou-se, não bata na mulher, nem deixe passar fome, se não der pra viver deixe, e não deixe sua geladeira faltar nada dentro de casa’, hoje em dia tá aí, tem quatro [geladeiras], onde você procurar tem um pedaço de carne, graças a deus!As particularidades dos encontros: as rupturas de uma trajetóriaAo longo dos seus 62 anos, Jiboia diz ser grato a apenas duas pessoas em sua vida; ambas estabeleceram relações particulares com Jiboia e foram em si potencialidades transformadoras ao longo do percurso biográfico. As socializações estabelecidas com Paulo e Faixa foram fundamentais no percurso de vida de Jiboia, e como o entrevistado coloca, a vida semeles seria diferente hoje "Paulo e Faixa foi muita coisa pra mim…seria diferente porque eu não teria aprendido as coisas que eu sei.".Faixa é a figura responsável por uma importante ruptura biográficana vida de Jiboia, pois "Faixa quem me tirou da cana, não sei se tá vivo ou se está morto, mas agradeço aonde
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762810ele tiver"", como também, inclusive, foi com Faixa que Jiboia começou a aprender as primeiras competências construtivas: "Ele fazia jarro... tá, aprendi a fazer jarro… mexer com gesso.".Faixa ofereceu-lhe emprego e moradia no Recife e, mesmo que estes fossem bastante precarizados e Jiboia ainda estivesse submetido aos abusos do trabalho infantil, ainda assim, na época, foi o caminho escolhido por ele diante das possibilidades e impossibilidades para seguir sua vida. A vida de Jiboia trabalhando para Faixa não durou muito, após seis meses, Jiboia se indignou com as condições impostas por Faixa e deixou de trabalhar para ele. Na história que Jiboia nos conta sobre sua vidaé fundamental ressaltar que ao longo da cronologia contada por ele há uma lacuna sem informações relativo ao período entre sua saída da casa de Faixa e o momento que ocupou o que é hoje a comunidade do Iraque. Em um período de mais ou menos 10 anos, não sabemos o que aconteceu na vida de Jiboia. Nas ocasiões das três entrevistas, buscamos acessar de muitas formas informações acerca do período, contudo, todas em vão.Enquanto Paulo nos é apresentado como seu grande mestre -A minha vida melhorou por causa dele, porque se não fosse, eu ainda viveria sem leitura e vivia aqui e acolá”. Paulo foi um mestre para além das competênciasna construção civil, ensinou valores importantes à Jiboia, como a dirigir, a trabalhar com serragem e, fundamentalmente, foi a partir das interações estabelecidas com Paulo que Jiboia inculcou disposições subjetivas ascéticas de lidar com dinheiro e também no gerenciamento dos alimentos para que não faltassem, disposições nada comuns para sua fração de classe social.Assim sendo e considerando que a transferibilidade das práticas -como o ascetismo para lidar com o dinheiro -para outros contextos está presente no próprio conceito de habitus, compreendemos sociologicamente queas disposições ascéticas de Jiboia, a partir das interações com Paulo, criaram condições e condicionantes permissivos, capacitando Jiboia no gerenciamento dos seus dois pequenos comércios, bem como em outros contextos da sua vida:J -Aprendi a guardar dinheiro com ele, pegava hoje amanhã já tava liso, pegava dinheiro no final de semana, na segunda já tava pedindo dinheiro emprestado, "mas rapaz, eu paguei tanto a tu, tu vive só, gasta com os outros e hoje já tá pedindo dinheiro… é assim, assim, assim" , eu abaixava a cabeça e dizia ‘tá certo, tá certo’… hoje em dia tenho isso [indicando com os olhos as prateleiras da barraca] por mode dele, para mim foi muita coisa pra mim, entendeu? para mim foi… aí peguei a gostar,e ele dizendo, olhe isso e isso, "você não tem nada se você não guardar”, "você vê, o rico pra comer é um tanto assim, é folha, é mato é essas coisas para ter as coisas, e tem, e ainda quer mais, o mesmo eu digo a você", aí foi onde eu fui botando isso na cabeça, graças a Deus.
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762811Na Sociologia disposicionalista as subjetividades dos agentes sociais são, antes de tudo, sedimentos de práticas historicizadas ao longo da história de vida dos agentes a partir de uma posição de classe no espaço social. Ao analisar um percurso biográfico, como no caso de Jiboia, é importante atentarmos que determinadas práticas apreendidas em diversos contextos sociais somente são possíveis devido a condicionantes anteriores. Aqui, cabe ressaltar que as sociabilidades estabelecidas com Paulo, embora plurais em seus contextos, iniciaram a partir das relações de trabalho da construção civil, o que só foi possível devido às apreensões de um conjunto disposicional de capacidades que tiverem seu fulcro estabelecidas em sociabilidades anteriores com Faixa "Quando eu cheguei em Paulo, eu já tinha uma experiência de Faixa.".Deste modo, compreendemos que é a partir de tais interações particulares que Jiboia passa a dispor de um patrimônio de competências condicionadas que, certamente, são fundamentais para que ele disponha, atualmente, de uma das melhores condições econômicas da ocupação, tanto pelas competências na construção civil, bem como por um ethos relativamente ascéticonas dimensões financeira e alimentar.Condicionantes individuais: as variações objetivas intraclasseAntes de morar na Dandara, Jiboia morou no Iraque -um dos bairros mais pobres do Recife -, onde permaneceu por quase três décadas. A vida de Jiboia no Iraque ocupa um lugar de destaque em sua trajetória. Foi na comunidade que por mais de duas décadas Jiboia ocupou o cargo de presidente da associação emum amplo período marcado por conflitos fundiários. Acerca desse período, Jiboia faz questão de contar os seus fatos e mostrar suas fotos, que por sinal, guarda com muito zelo e orgulho -“Foi bom demais. Gosto de trabalhar com gente, quando ia, ia aquela quantidade de gente pra reunião na prefeitura ‘eita!’, ia tudinho”.Aqui, como atividade sociológica, nos cabe compreender tamanha particularidade. Certamente, uma das características pessoais que possibilitaram à Jiboia ocupar durante anos o cargo de líder comunitário foi o pertinente traço disposicional à atividade públicae à atividade coletivae, alinhado a essas, as competências disposicionaisde um construtor com alta especialidade em materiais precarizados, que a cabo, é a especialidade demandada em seu cotidiano e na dos vizinhos. "No Iraque eu fui presidente do conselho.... nunca perdi uma eleição pra ninguém.... porque eu fazia de tudo, como aqui, eu fazia de tudo".Como se sabe, é de longa data a prática política na qual alguns vereadores da cidade do Recife estabelecem relações políticas com líderes comunitáriosvisando capilarizar-se nos territórios populares e assim, angariar mais e mais votos; por muitas vezes, essas práticas se
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762812estabelecem através de “troca de favores”. Em dado momento da conversa, Jiboia nos revela que a maior posição ocupada por ele no mercado de trabalho foi possibilitada por tais práticas com um conhecido vereador da cidade.Neste sentido, é preciso evidenciar que no contexto da época quando conseguiu tal emprego -ressaltando aqui que como membro da ralé brasileira Jiboia não dispunha daspré-condições sociais de adquirir capital econômico e capital cultural certificado do sistema escolar -podemos compreender que tal permissibilidade se deu através do patrimônio disposicional de Jiboia voltado às questões públicas e coletivas somadas ao seu patrimônio de capacidades construtivas, que por vez, possibilitaram uma acumulação de capital político suficiente para tecer relações de troca com o tal vereador, e assim, como elemento de troca, ocupou um emprego de carteira assinada que, por sua vez, o posiciona, diferindo em certo grau, portanto, dos demais vizinhos, ou mais amplamente, dos membros de sua fração de classe.Assim sendo, a partir das análises biográficas e etnográficas aqui postas, é possível reconstruir, em certa medida, como certo patrimônio disposicionalde Jiboia o condicionou a ocupar a sua maior posição no mundo do trabalho. Apesar do habitus precário de Jiboia, uma análise mais aproximada dos meandros do percurso de vida dele nos revela condicionantes subjetivos que compreendemoscomo um orgulho próprio associado ao seus feitos, que o diferem em grau significativo dos demais membros de sua fração de classe. Em geral, duas questões aparecem com certa frequência ao longo da entrevista: a profissão de segurança em um banco público com carteira assinada e o cargo de presidente da associação são momentos que destoam bastante em sua vida. Cidade, favela; respeito, desrespeito; cidadão, cachorroComo se sabe, a grande maioria da massa de pobres do Brasil mora nas ditas favelas urbanas. Nos cabe aqui analisar os agentes sociais não apenas acerca das condições objetivas de vida, mas também dos condicionantes subjetivos de existência impostos pelas primeiras. Torna-se imprescindível aqui, para a compreensão sociológica das práticas cotidianas da raléno período pandêmico, o exercício de revelar a partir dos trabalhos empíricos o sentimento e sentido profundo do que é “ser um favelado” no país. Neste sentido, a sociologia urbana bourdieusiananos oferece alguns valorosos instrumentos: uma dialética entre espaço físico reificado e habitus de classeé um deles. Ao explanar suas visões do mundo social e, em especial, sobre a “favela”, Jiboia logo trata de desnaturalizar a violência simbólica incidida nos bairros populares no que tange às
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762813mazelas sociais atribuídas à violência urbana nestes territórios. Para Jiboia, questões como roubos e homicídios que ocorrem em bairros populares, também ocorrem em "lugares bonitos", como em Boa Viagem-zona sul do Recife e um dos metros quadrados mais caros da cidade "Que é um lugar bonito, beira de praia, tudinho... o povo mata um, aleija um, rouba tudinho... do jeito que é aqui.".Contudo, apesar dos esforços de Jiboia em desnaturalizar que não existe CEP para muitas das mazelas sociais, o senso comum transclassista do efeito de estigmatização incidido sobre “o ser favelado” opera nos condicionantes subjetivos de Jiboia. Embora reforce o gosto que tem pela “favela” e a importância desta em sua vida, ser “favelado” é ser humilhado, como também é ter uma série de direitos negados, por exemplo, a aparentemente simples questão de não receber correspondências em sua residência. De acordo com os entendimentos de Jiboia, tal questão de humilhação por ser “favelado” é a humilhação que os ricos impõem aos pobres:B-Tu se sente como por morar numa favela?J -Eu mesmo me sinto humilhado. Sempre morei em favela, e é na favela que eu tiro a minha bolacha para comer é dentro de favela, eu gosto de morar dentro de favela. Você chega pra comprar uma coisa na loja, quando dá o endereço, diz 'ah, é favela né? Não entrega não'. Tô com cartão de crédito mesmo, dei o endereço e disseram que não chegaria, dei um endereço da casa da mãe de um menino daqui. Isso não é humilhação? O povo humilha muito a favela. O pobre é humilhação dos ricos, olham torto.Os pontos de vista e opiniões de Jiboia sobre as classes sociais brasileiras, bem como as desigualdades, aparecem de imediato ao perguntamos qual dos bairros que morou no Recife lhe agradou mais. Ao ser questionado, uma questão que sobressai como elemento importante para o debate aqui proposto, Jiboia não responde à pergunta apontando um bairro específico e sim, traz uma definição do que seria “um bom lugar” em seu entendimento.Para Jiboia não há lugar ruim e quem faz o lugar é a pessoa, pois, de acordo com ele, a questão central é saber viver. Assim, e ainda mais importante, ao ser questionado sobre o que seria o saber viver no local em que se mora, Jiboia prontamente atribui ao saber respeitar e ser respeitado''.Neste sentido, é importante enfatizar que falando sobre o que seria “um bom lugar” é o único momento das três entrevistas no qual Jiboia rotula o pensamento expresso como uma questão já refletida por ele, ou ainda, na qual se tem convicção e, portanto, Jiboia apresenta seu entendimento de modo imediato, "É isso que vem na minha mente mesmo assim, eu respondo na hora assim porque não tem lugar ruim não". O tema é articulado por ele de forma sucinta e aplicando a exemplos -que por sinal, contribuem para reforçar que se trata de uma opinião já refletida e tomada como convicção.
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762814Na compreensão de Jiboia, a favelaestá em oposição à cidade, assim como a nação ricaà nação pobre. A relação entre cidade e favelaé fundamental para os objetivos dessa pesquisa, isso porque, de acordo com Jiboia, estar numa cidadeou favela também define o lugar no qual Jiboia será respeitado como cidadãoou, diametralmente oposto a tal posição de reconhecimento, será tratado como um cachorro:J -Aqui respeitam, mas lá na cidade, se eu vou pra lá passear pelo meio desses povos, ele vai considerar eu como cidadão? É um cachorro!B -Quem? J -Esses ricos! B -Como umcachorro?J -Eu acho que seja, eu acho que seja... porque tem cinco ou seis ali, se eu chegar todo mulambento é a primeira coisa que o cara vai dizer, "ó, que cachorro!" Só porque está com a roupa melhor, porque tem o dinheirinho mais que a pessoa, tem uma leitura mais que a pessoa, certo? Disposições gerais e ethosde classe na pandemiaA partir da relação já estabelecida com Jiboia, somado à biografia sociológica realizada através das entrevistas, é possível tecer algumas compreensões sobre o patrimônio disposicional de Jiboia e, mais especificamente, acerca do seu habitus de classe. O nosso principal objetivo é reconstruir os sentidos que os agentes sociais atribuem às suas práticas de proteção pandêmica, sendo a prática intermediada por condições objetivas de vida e condicionantes subjetivos de existência. Dito isto, buscamos dar respaldo às partes integrantes das realidades e das práticas sociais desiguais levando em conta as condições objetivas da classe social e, fundamentalmente, acerca dos condicionantes subjetivos de existência em cada contexto particular na trajetória de vida de Jiboia. Assim sendo, compreendemos que na trajetória de vida de Jiboia, questões sociais como a exploração do trabalho infantil em situação análoga àescravidão; ausência de inúmeros direitos ligados a infância e a adolescência; umamadrasta desumana; o sentimento de ser sozinho no mundo, um bezerro rejeitado; baixas condições objetivas de vida; ausência de pré-condições sociais para aquisição de capitais econômicos e culturais via certificado escolar; pobreza extrema em vários momentos diacrônicos; falta de reconhecimento na dimensão do amor; vida solitária de um indivíduo social “solto no mundo”, apesar dos 18 filhos e várias ex-companheiras e o sentimento de ser reconhecido como um cachorro pelo povo da cidadeforam/vão impondo diferentes condicionantes subjetivos compreendidos aqui sob o conceito disposicional de ethos precário.Tal ethosque pôde ser percebido em alguns contextos sociais, para fins da presente pesquisa foi analisado visando compreender as intermediações
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762815entre oethos precáriode Jiboia, condições objetivas de vida e as práticas de proteção pandêmica.Antes de nos aprofundarmos na reconstrução dos sentidos das práticas de Jiboia na pandemia intermediados pelo habitus de classe,é necessário colocar dois outros conjuntos de disposições que foram compreendidas aqui como disposições fortes e que, a depender do contexto social, incidem de modo decisivo nas práticas cotidianas de Jiboia: disposições religiosas -embora Jiboia não seja de nenhuma religião e faça questão de ratificar por vez que não é evangélico -e o eidos acerca dos esquemas lógicos.Assim, as ações cotidianas são intermediadas por crenças religiosas, principalmente quando a resolução dos perigos, como acerca das práticas de proteção pandêmicaque são tomadas de sentido através de intermediações com as disposições de crençareligiosa. Entretanto, cabe ressaltar que as fortes crenças religiosas de Jiboia,não são, sob hipótese nenhuma, tidas como uma disposição geral que define suas práticas e visões do mundo, e sim, estão postas em uma correlação de forças com as demais disposições, a partir dapeculiaridade de cada contexto.Alegando com firmeza que nunca teve medo do coronavírus pois não tem medo da morte, ao longo dos quase três anos de pandemia foram raras as ações de Jiboia para se proteger através de máscaras, isolamento social, higienização correta das mãos e vacinação, ida ao médico quando necessário etc.Aliás, nas poucas vezes que agiu conforme as recomendações de proteção, o sentido de seus atos não era o de proteger-se, estando muito mais associado ao cumprimento das regras.Neste sentido, é possível inferir que há em Jiboia uma enorme ausência do medo de morrer como comportamento de um opus operandipara enfrentar tantas ameaças cotidianas com as quais teve que lidar ao longo dos seus 62 anos, sendo tal comportamento um forte traço disposicional do pouco apego que Jiboia tem por sua própria vida, sedimentado ao longo de uma dura trajetória na forma de uma ethos precário-no sentido das desigualdades existenciais. No atual cenário de severa crise social pela qual passa o país, os medos mais imediatos de Jiboia são outros e as questões que levam à morte também, como a fome:J -Eu tenho medo é do povo morrendo é de fome, eu tovendo é povo morrer de fome, porque mercadoria não tem, serviço não tem, dinheiro não tem... Eu não tenho medo de morrer, não tenho o que perder, o que tinha que fazer eu já fiz na minha vida, já estou velho, e eu vou pensar mais em nada, eu não.
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762816Embora Jiboia possua uma das melhores condições de vida de toda comunidade, no atual contexto o entrevistado teme mais as incertezas de seu futuro do que ser acometido pelo coronavírus. Se por um lado, como salienta constantemente, não há trabalho na construçãocivil; por outro, os mercadinhos que são o único sustento de Jiboia, já não são mais garantias de dinheiro certo, pois o empobrecimento vertiginoso da parcela mais pobre da população impacta diretamente nas vendas de Jiboia.J -[...] O cara só faz aquilo que o cara tem que fazer... é fazer aquela coisa e não ter medo. Não tenho medo dessas doenças... pronto, olha aí, isso que faz medo [referindo-se a um senhor que acabara de pegar fiado uma lata de de cachaça] porque se eu não tirar, como eu vou botar? Éisso... que eu já levei muito fumo aqui... aí tem que botar na cabeça.B -O povo aqui tá sem dinheiro?J -Tudo sem dinheiro né? Que não tem serviço para trabalhar, até para as mulheres mesmo está ruim, que era uma faxina de um lado, faxina em outro, ia para um canto, ia para outro, agora não aparece faxina e nem nada. Vamos ver se melhora agora depois que Lula entrar. Lula... [longa pausa] já estão fazendo guerra com ele de novo.Talvez um dos marcadores mais precisos para dimensionarmos a crise da escassez de trabalho entre a ralé estrutural, seja a constatação de Jiboia sobre a falta de faxinas como atividade de trabalho para as mulheres no contexto pandêmico. Como se sabe, apesar da precarização, o trabalho das funcionárias domésticas é uma das categorias mais disponíveis para as mulheres das classes populares desde seu primeiro fulcro. Sem essa renda, as chefes de família acabam tendo que se virar de outras formas, como podemos constatar nos relatos de Jiboia:J -O povo aqui tá com fome e indo para Ceasa catar lixo... tem lugar para pegar mais doença que na Ceasa?O pessoal saía daqui para catar tomate, cebola... lá é tudo no chão, ali chove, pisa, carro machuca, ai fica ali aquela água preta no chão, aquilo dá uma doença... mas tinha que comer,caçar o que comer, chegar aqui lavar, escaldar para comer porque não tinha dinheiro para comprar, tudo isso é pandemia, entendeu?Um dos maiores temores de Jiboia é se tornar uma pessoa dependente dos outros para sobreviver, sendo tal questão motivo de orgulho próprio. Esse traço disposicional por um lado, é forte, sendo capaz de motivar esforços cotidianos de trabalho duro, mesmo aos 62 anos e tendo um corpo cansado; por outro é frágil, pois através dos depoimentos percebemos que é emocionalmente muito doloroso para Jiboia imaginar que em um futuro breve os mercadinhos possam vir a fechar e ele possa a voltar a posição social já ocupada de pedinte.Outra característica disposicional de Jiboia que cabe ser ressaltada na reconstrução dos sentidos dos seus atos no contexto pandêmico é a particularidade de ter apreendido a lidar com
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762817as baixas condições de vida. Oethos ascéticoquando o assunto é represar comida e dinheiro volta à tona como uma das particularidades que são capazes de conferir a Jiboia uma vantagem social em um cenário de pobreza crescente. Assim sendo, evidenciamos que embora a preocupação de Jiboia seja com o futuro, o medo é de uma dor conhecida, a fome. E não de uma doença desconhecida.Neste sentido, cabe resgatar as compreensões sociológicas do patrimônio disposicionalde Jiboia analisadas no acima no qual compreendemos que as gêneses das disposições, seja por meio de uma economia moral herdada do pai ou de Paulo, são fundamentais para lidar com atual contexto de crise social e sanitária. Precisamente nesse sentido acerca das particularidades, Jiboia sabe que a capacidade pessoal de armazenar comida e dinheiro lhe faz distinto dos demais moradores da ocupação, principalmente diante da atual crise social e sanitária -Toda vida eu gostei de guardar o meu pouquinho, agora foi que ficou pior, tem que guardar ainda mais um pouco, agora na pandemia é que tem que comprar regado mesmo, porque dinheiro não tem.” Cabe ressaltar que para além do ethos de classe, das disposições de crença religiosa e das disposições ascéticas do saber racionar comida e dinheiro, na reconstrução dos sentidos dos atos de Jiboia na pandemia é precisoressaltar como a indústria negacionista da pandemia inculcou percepções subjetivas a Jiboia que incidem diretamente em suas práticas cotidianas. Em diversos momentos, quando questionado sobre certo desvio de suas práticas no período, por meio dos esquemas lógicos do eidos,Jiboia desdenha da pandemia reproduzindo as fake news, questão tal, que lhe encoraja nas ações de práticas desviantes daspráticas de proteção pandêmica.Embora Jiboia seja politicamente de esquerda -como se define -e não goste do atual presidente Jair Bolsonaro, cabe enfatizar que uma série de entendimentos e práticas de Jiboia sobre a pandemia encontram respaldo na posição pública do presidente, como o desinteresse e receio de Jiboia em tomar as vacinas. Um exemplo desse respaldo entre determinadaspráticas de proteção pandêmicase as posições públicas do presidente, pode ser vista nos apontamentos da pesquisa intitulada More than Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior During a Pandemic. A pesquisa demonstra que as palavras e ações de líderes políticos afetam o comportamento das pessoas no que diz respeito ao isolamento social. A pesquisa descobriu que após o presidente Jair Bolsonaro minimizar os riscos da pandemia do SARS-CoV-2 e ter desaconselhado o isolamento social, as localidades que apresentavam os maiores números de pessoas pró-governo -com base na eleição de 2018 -foram os lugares que apresentaram o maior enfraquecimento dos índices de isolamentos social em comparação com as localidades nas quais o presidente não apresenta a mesma popularidade.
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762818Jiboia diz ter medo das consequências de tomar uma vacina que, segundo ele, não é segura. Tal receio de Jiboia é oxigenado pela posição do presidente; contudo, cabe ressaltar que o receio não está associado à figura de Jair Bolsonaro, e sim, à posição que este ocupa, de presidente da república. Essa questão é posta da seguinte forma: "Se o presidente não quer tomar, motivos para isso há… foi o primeiro que não quis tomar".A respeito do uso de máscaras, ainda na primeira entrevista,em tom de humor, Jiboia nos apresenta a vasta coleção de máscaras que tem devido às muitas compras que teve que fazer quando na ocasião foi exigido para que utilizasse a máscara -"Quando alguém reclama, ‘certo, eu vou botar’ quando eu vou no metrô, eu tenho bem umas 40 máscaras aí, eu saio para os cantos e compro... ‘eita, posso entrar não’, ‘quanto é uma?’, ‘É dois’, ‘me dê’". Jiboia não oferece resistência quando exigido o uso da máscara, alegando ter medo da represália popular.O uso de máscara por Jiboia no período pandêmico é plural e, em grande medida, contraditório. Em outro momento, embora não entenda os motivos, Jiboia reconhece a importância do uso da máscara, inclusive, classifica a não utilização e o não isolamento como um “vacilo”. Contudo, como ocorre em quase todas as suas opiniões sobre as práticas dele no período, as disposições de crenças do determinismo religioso e, em maior grau, o ethos precário como conjunto de disposições que, entre outras coisas, estão atribuídas a uma valentia perante osperigos do mundo e da morte, como no caso do contexto da pandemia, uma grande ausência do medo em morrer da doença em questão. Ao longo das três entrevistas, Jiboia afirma com firmeza que nunca ficou em casa e nunca ficará, que nunca teve medo e nemtem medo de morrer. Além do ethos precário, o recorte geracional faz Jiboia ter ainda menos apego com a própria vida. Como podemos observar ao longo da entrevista, a idade mais avançada reverbera em algumas questões na vida de Jiboia, a exemplo da possibilidade de ter um trabalho com carteira assinada "Nessa idade, ninguém vai assinar a minha carteira" -e menores chances em conseguir, de maneira fixa, uma companheira; neste caso, compreendemos que a idade mais avançada torna para Jiboia sua vida ainda menos interessante para si ou até menos valorizada pelo próprio, o que por vez, culmina no menor medo de morrer, inclusive quando o assunto é morrer devido às complicações do coronavírus.
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762819Considerações finaisComo vimos, as práticas de proteção pandêmicade Jiboia na pandemia -utilização de máscara, higienização correta das mãos, vacinas e isolamento social -, em geral, não se encontram em conformidade com as recomendações para proteção contra o coronavírus. Jiboia não utilizou máscaras; fez pouquíssimoo isolamento social como forma de evitar ser contaminado; não lava as mãos corretamente com sabão; e somente tomou a vacina por relativa pressão dos membros da coordenação do movimento social. Assim sendo, acerca do comportamento de Jiboia na pandemia, apresente pesquisa focou na reconstrução dos sentidos dos atos atribuídos pelos próprios agentes sociais. Dito isso, compreendemos -após três longas entrevistas biográficas e análises -que o habitus de classes; o conjunto de disposições que conformam o ethos precário; as disposições de crençareligiosa; e disposições precarizadas dos esquemas lógicos do eidos, são características sociológicas de Jiboia que permitem a reconstrução dos sentidos das práticas no período pandêmico aqui analisado sendo fortemente intermediado por questões relativas às desigualdades sociais brasileiras. Como foi percebido, nas poucas vezes que Jiboia agiu conforme as recomendações, o que o mobilizou estava muito mais relacionado com outras questões do que com a motivação de proteger-se dos perigos que uma possível contaminação; como no caso do uso das vacinas, que aconteceu quando descobriu que sofreria algumas restrições em relação a carteira de trabalho, para abrir contas em bancos etc., ou ainda no caso das máscaras, que na grande maioria das vezes Jiboia somente utilizava quando exigido, seja por normas de um determinado local ou por pressão de populares que exigiam de tal proteção.Reconstruir os sentidos que estão imbuídos nas práticas é reconstruir as condições objetivas de vida e os condicionantes subjetivos de existência. Como visto, se por um lado as condições objetivas determinam uma série de práticas, principalmente em um cenário marcado pelo abrupto aumento da pobreza, da fome, desemprego etc., por outro lado, as disposições citadas acima enegrecem a compressão das ações de Jiboia no período: a ausência do medo da morte está imbricada ao ethos precário de classe dele, tornandoassim, compreensível do ponto de vista sociológico as práticas de proteção pandêmicas desviante das recomendações.Dito isso, não nos resta dúvida de que a desigualdade existencial-compreendida aqui sob a forma disposicionalista de ethos precário-é umelemento social central na reconstrução dos sentidos das práticas de proteção pandêmicaque não estão em conformidade com as recomendações no período. A baixa autoestima, baixa dignidade social, sentimento de ser um
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762820cachorropara outras classes sociais, afalta de reconhecimento no amor conjugal ou familiar, as dores que carrega pelo fardo de ser um favelado, são questões que fazem com que não só a sociedade, mas também o próprio Jiboia acabe por valorar sua vida como algo sem muita importância, resultando, portanto, em baixas práticas de proteção pandêmicas.REFERÊNCIAAJZENMAN, N; CAVALCANTI, T.; DAMATA, D. More Than Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior during a Pandemic (April 22, 2020). DOI:http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3582908.BOURDIEU, P. A distinção:Crítica social do julgamento.São Paulo: Editora Zouk/Edusp, 2007.BOURDIEU, P.Meditações pascalianas.Pierre Bourdieu. Tradução Sergio Miceli. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2001.FERNANDES, F. A integração do negro na sociedade de classes. 5. ed. São Paulo: Editora Globo, 2008. LAHIRE B. Retratos sociológicos:Disposiçõese variações individuais.Trad. Patrícia Chittoni Ramos Reuillard e Didier Martin. Porto Alegre: Artmed, 2004.SEN, A.K.Desigualdade reexaminada.Tradução e apresentação de Ricardo Doninelli Mendes.Rio de Janeiro: Record, 2001.SOUZA, J. Subcidadania brasileira:Para entender o país além do jeitinho.Rio de Janeiro: LeYa, 2018. 288 p.THERBORN, G. Inequalities and Latin America. From the Enlightenment to the 21st Century, desigualdades.net Working Paper Series.Berlin: desiguALdades.net Research Network on Interdependent Inequalities in Latin America,2011.
image/svg+xmlPandemia e habitus de classe: Análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762821Como referenciar este artigoFONSECA, B. L. Pandemia e habitus de classe: análise de práticas sociais de autocuidado durante a pandemia de Covid-19 na região metropolitana do Recife.Rev. Sem Aspas, Araraquara, v.11, n.esp.1, e022024,2022. e-ISSN: 2358-4238.DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.17628Submetido em:15/08/2022Revisões requeridasem:19/09/2022Aprovado em:11/11/2022Publicado em:26/12/2022Processamento e edição: Editora Ibero-Americana de Educação.Correção, formatação, normalização e tradução.
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176281PANDEMIC AND CLASS HABITUS: ANALYSIS OF SOCIAL SELF-CARE PRACTICES DURING THE COVID-19 PANDEMIC IN THE METROPOLITAN REGION OF RECIFEPANDEMIA E HABITUS DE CLASSE: ANÁLISE DE PRÁTICAS SOCIAIS DE AUTOCUIDADO DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19 NA REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFEPANDEMIA Y HABITUS DE CLASE: ANÁLISIS DE LAS PRÁCTICAS DE AUTOCUIDADO SOCIAL DURANTE LA PANDEMIA DE LA COVID-19 EN LA REGIÓN METROPOLITANA DE RECIFEBruno Leonardo FONSECA1RESUMO:Nesteartigo, por meio de etnografias e biografia sociológica realizada com Jiboia um membro das classes populares brasileira ,apresentamos que diante do contexto pandêmico a utilização de máscaras, realização do isolamento social, vacinação e higienização,não são apenas respaldadas pelas condições objetivas de vida, mas também, pelos condicionantes subjetivos de existência quando estes estão associados à desigualdade existencial.Este último, por vez, se estabelece na desigual alocação de respeito, dignidade e valorização da própria vida.PALAVRAS-CHAVES:Pandemia. Classes populares. Desigualdade. Habitus de classe. Pierre Bourdieu. RESUMEN:En este artículo, a través de etnografías y biografía sociológica realizadas con Jiboia miembro de las clases populares brasileñas, presentamos que, ante el contexto de pandemia, el uso de mascarillas, el aislamiento social, la vacunación y la higiene, no son sólo sustentada en las condiciones objetivas de vida, pero también en las condiciones subjetivas de existencia cuando éstas se asocian a la desigualdad existencial. Este último, a su vez, se establece en la desigual asignación del respeto, la dignidad y el aprecio por la vida misma.PALABRASCLAVE: Pandemia. Clases populares. Desigualdad. Habitus de clase. Pierre Bourdieu.1Federal University ofPernambuco (UFPE), Recife PE Brazil. Architect and Urban Planner, Master's student in Sociology at the Postgraduate Program in Sociology at the Federal University of Pernambuco (PPGS/UFPE). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-7149-857X. E-mail: brunofonsecaln@gmail.com
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176282ABSTRACT:In this article, through ethnographies and so.ciological biography carried out with Jiboia a member of the Brazilian popular classes , we present that, in the face of the pandemic context, the use of masks, social isolation, vaccination and hygiene, are not only supported by the objective conditions of life, but also by the subjective conditions of existence when these are associated with existential inequality. The latter, in turn, is established in the unequal allocation of respect, dignity and appreciation of life itself.KEYWORDS:Pandemic. Popular classes. Inequality. Class habitus. Pierre Bourdieu.IntroductionOver the last three years of the pandemic, the practices of using masks, hand hygiene, social isolation, vaccination, seeking medical attention when necessary, have become fundamental daily practices to deal with the dangers and threats arising from the Coronavirus. Such practices, named in this present article as pandemic protection practices, are crossed by questions related to social inequalities concerning the class struggle and are, under no circumstances, accessible in a socially fair way for all.Amartya Sen (2001) teaches us that in order to formulate a given dimension of any social inequality to be analyzed, we need to evoke the following question: “inequality of what?”, so that, as a research strategy, we formulate the “evaluation spaces", that is,the selection of the relevant criteria that will be used to analyze a certain social inequality.In the case of this research, we analyzed the reconstruction of the meanings that social agents attribute to their actions in the “evaluation spaces”. The practice of pandemic protectionanalyzed here from the social inequalities that reside between the objective conditions of lifeand the subjective conditions of existence. The latter, put in the Bourdiesian sense of class ethos2, understood here under Therborn's (2011) concept of existential inequalities-related to issues of low dignity, social self-esteem and valuing life itself.To do so, we used ethnographic analyzes as a methodology and, mainly, sociological biographies rooted in Bernard Lahire (2004), in which we used, in addition to the concepts that will be presented shortly, three semi-structured interview scripts. The research reveals that pandemic protection practices are not only supported by material and economic inequalities. By reconstructing the meanings that the agents attribute to such practices, we infer that the 2The Bourdieusian concept of habitusis fragmented here to better serve the interests of this research, although Pierre Bourdieu, throughout his academic career, has abdicated this fragmentation. We deal with the concept of habitusfrom three constituent parts: the eidos, a set of logical evaluation and action schemes; the hexisrelated to embodiment, in the sense of dispositions that became body, postures, gesture; and the ethos, as an axiological and systematic set of dispositions of the ethical dimension, in the ways of being in the socialworld. In this research we used especially habitusand ethos.
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176283subjective constraints related to existential inequality are social determinants. Thus, after apprehending Jiboia's subjective dispositions in various social, diachronic and synchronic contexts, we understand that in the pandemic context, issues related to the low valuation of life itself figure as determinants for low pandemic protection practices in the case of Jiboia.The three interviews were carried out over the years 2021 and 2022, with an audio recorder and a pad of paper for taking notes, both authorized by Jiboia. The interview took place at her home, more specifically in the space intended for her grocery store, while she attended to the few customers. Jiboia was informed that the research dealt with the lives of residents of urban occupations and that the collected data would not necessarily be used; in addition, the interviewee was informed that any question that led to the recognition of his true identity would be kept confidential.Existential Inequality and Class Habitusin BrazilAbout disposition in dispositionalist sociology, according to Pierre Bourdieu (2001, p. 171), after a play on Heideggerian words, “disposition is exposure”and, this occurs, precisely because the body is exposed to the exteriorities of the social space: to the dangers, reception, complacency or constraints of the social world that surrounds it, starting with the impositions of material conditions of existence, such as, for example, social agents residing in popular neighborhoods which have low rates of pandemic protection practices who lack a whole material condition that distances them from complying with the recommendations of social isolation, use of masks, vaccination, etc.Thus, it is from a certain objective position-mainly through the social class -occupied in the social space that social agents understand the social space that encompasses them, and thus they are conditioned to a class of habitusthat guide them by the conditions of this world specific social. The habitusis adjusted to the regularities of the position in the social world, functioning as a structuring structure and a structured structure, because the social structures used by the agents to understand the world are, at the same time, the incorporated product of that same structured and structuring world that surrounds it, because, as is known, social agents only understand the social world that encompasses them, engendering in this sense “products of an unwanted and unconscious systematicity” (BOURDIEU, 2007, p. 45, our translation); and which, at the same time, are able to guide individuals through common and everyday social practices, which are more or less homologous among membersof the same fraction and social
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176284class. This means that social agents, when making their decisions about pandemic protection practices, do not choose the principle of their choices, which is the class habitus.In Bourdieusian praxeology, practice is the place of the dialectic between objective positions and subjective dispositions, with the first being the objectified exteriority of social structures that condition the perception and action of social agents, as a kind of “rigorous table of categories historically constituted” (BOURDIEU, 2007, p. 436, our translation), that is, of a social space that is constituted in and through the system of relational oppositions of different social positions and different distributions of living conditions; while the second is covered by the concept of habitus, defined as the unifying principle of subjective dispositions that, although they are formed in the course of the collective history of a society.In this sense, through the incorporation in the course of the individual history of social agents, according to the different objective positions of agents in a given social space, which precondition the different perceptions and actions of these agents in each socialized and socializing context, making habitusa product ofhistorical acquisition by a legacy of historical struggles between different social classes.In the work “Subcidadania Brasileira” (2018), the sociologist reconstructs the Bourdieusian model of social class in Brazil, considering the fundamental differences between societies in central countries and those in peripheral countries. In his sociological interpretation of Brazilian social classes, the Bourdieusian notion of class struggle and class habitusis added to the Taylorian notion of value hierarchies of modern societies, which are founded on sources of strong institutions, such as the market and the State, and that end up classifying as citizens only those agents capable of dealing with modern requirements, such as prospecting, productivity, rationality. This recognition of modern citizenship, granted only to dignified productive rational agents, supported by the “moral sources” of strong institutions in modernity, is defined as primary habitus.In this sense, Jessé Souza (2018) argues that the habitusthought by Pierre Bourdieu does not presuppose a fundamental condition of French society: socially shared recognition, in a transclassist way, in which all French people are French citizens. On the other hand, the absence of these same social preconditions characterize the concept of precarious habitus, corresponding to the set of internalized subjective dispositions -according to the objectified positions and conditions -which, according to Souza (2018, p. 240, our translation) “do not meet the objective demands so that an individual or a social group can be recognized as productive and useful in a modern and competitive society”, thus being socially recognized as sub-producers and sub-citizens and, therefore, sub-humans. The result is the construction of a
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176285whole symbolic range of stigmatizations and prejudiced notions that present correlates of cognitive structures of social agents: disqualifying, criminalizing and abolishing the recognition of the social dignity of an entire social class, including havingthis pejorative recognition shared among the classes themselves. victims of the symbolic violence exercised.That said, Souza (2018) defines the Brazilian popular classes, in their peculiar social condition of sub-citizenship, by the production and reproduction of a precarious habitusover time and space, this being the peculiar condition for the production and reproduction of the structural rabble Brazilian. In this sense, in the central thesis of the work, it is explained that about 1/3 of the Brazilian population, due to the absence of the minimum social pre-conditions to handle the demands of the dignity of the modern “rational agent”, is in the position of exclusion and disqualification before the whole society as “sub-producers” and, therefore, classified by the modern value hierarchy as sub-citizens. It should also be noted that this huge contingent of Brazilian men and women was first named by Florestan Fernandes (2008) as the first urban rabble and secular rabble, precisely because of the absence ofthe necessary psychosocial conditions to integrate into a modern and competitive society.About the low social dignity, the condition of sub-citizenship, the denial of social recognition as a productive and valid agent that affects social groups and entire social classes. Sociologist Goran Therborn (2011, p. 21-22) proposes analytical perspectives between different types of inequality. For our interest, we highlight the notion of existential inequality, established in the denial of equality among all humanbeings, through the unequal allocations of respect, social recognition, dignity, humiliation, ignorance and marginalization.Thus, when dealing with class habitus, or more precisely, with the class ethosof the Brazilian structural rabble, we are talking about a precarious ethos, that is, a precarious conception of being in the world; due to the absence of the necessary social preconditions to obtain the social recognition of modern citizenship and social dignity; leaving these completely marginalized and stigmatized individuals and social classes with an absence of recognition of human dignity, resulting in identity conceptions of low self-esteem and individual and collective dignity, as well as many other conditions that correspond to the deficient pole of existential inequality.However, it should be noted that the class habitusis not mechanized here by external constraints, but an adaptable habitus, being transposable to the different social contexts of different social practices. As proposed by BernardLahire (2004) when assuming a sociological stance within the dispositionalist field of action that considers the plurality of different social environments being reflected in the plurality of the socialization of individuals, which
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176286ultimately unfolds in the dispositional plurality of social agents to from the particularity of each social trajectory. Lahire elaborates from the Bourdieusian work, builds the understanding that the heterogeneity of the social world is incorporated in the social construction ofindividuals, or even, that every idea of field -which make up the multiple externalities of the social space -also operates in the individual dimension internalized in social agents. Thus, in this sociological biography presented here, we use dispositional concepts such as inclinations, plurality of dispositions, aptitudes, intraclass variations, biographical ruptures, etc.JiboiaBetter known as Jiboia, Antônio da Silva is one of the oldest residents of the Dandara Occupation on the outskirts of Recife. Jiboia is 62 years old, divorced several times, father of 18 children without establishing a firm relationship with any. He is a bricklayer and owner oftwo small “stalls” selling hygiene, cleaning, basic foodstuffs, alcoholic beverages, which operate inside his two houses located in two urban occupations.Owner of a heritage of skills regarding civil construction practices, Jiboia is often recognized as the “occupation engineer”, providing services both when the issue is collective, as well as in timely help to neighbors. Jiboia is supportive and his skills in providing for everyday life in the face of such precarious objective conditions are often at theservice of community help. Despite complaints about the lack of recognition for its collective actions and the lack of financial collaboration from others, Jiboia is proud of the services provided.In his career as a militant for the right to housing, he was for more than two decades president of the residents' association of a famous community in Recife, known in the field of the right to the city for its history of resistance against land evictions."Look, from 13 years ago I suffered a lot"Jiboia is a native of the rural area of Aliança -a small municipality located in the northern forest area of Pernambuco. Jiboia was born, as he usually says, within a sugarcane crack, a place where he also suffered the exploitation of child labor in the fields. Jiboia remained in this work that is relatively analogous to slavery until he decided to flee to Recife -"Look, from 13 onwards I suffered a lot".Jiboia is the only child of his father with his mother; "My father was Durval Caetano, he was called Durval, my father was from Exú. He went to the mill to work, then right there in
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176287Aliança he died". Jiboia has been an orphan on his mother's side since birth, the story of what really happened to his mother and the reasons why he was taken from her at birth were never revealed to him. Despite being 62 years old, Jiboia still does not know the whereabouts of his mother; he does not know what happened at his birth; he does not know if his birth parents had any marital relationship; as he also does not even know for sure her name. Issues such as resentment and repercussions in your life.When Jiboia was only three years old, Durval married Ruth, whom he initially classified as very evil "There are mothers who are not mothers to people, mothers are mothers". From the union of Durval and Ruth, three more children were born. Thus, the most central family composition was constituted with Jiboia being the eldest son of the house.The period in Aliança, throughout his childhood and early adolescence, brings memoriesto Jiboia that he does not like to remember. The hard pains of the past that, as revealed by "They come to mind, but I try to forget", are strongly linked to the objective conditions of life, as well as the particularities that intraclass variations. As is known, child labor in the countryside affects thousands of children in northeastern Brazil; however, as we will show in this research, each individual of this social position relates in a unique way with the social world, be it in aptitudes, inclinations, dispositions, particularity of each trajectory.In sugarcane work, Jiboia began to accompany his father so early in his life that he cannot even remember when he started to help his father with work activities. At the age of 8, already having a wealth ofdispositional capacities that are required in work activities on the farm, incorporated through an indirect socialization with his father's world of work, Jiboia was invited by the factory manager to work "formally".In addition to being a child and having to face the hard work of sugarcane, Jiboia speaks with anger and resentment about the period in which he worked in his hometown. Mainly due to the position occupied in the family space and the particular relationships established with her stepmother; it should also be noted that it is at the intersections between the contexts of the world of work and the world of family that the interactions established with the stepmother become even more cunning and even more inhumane. He tells us, in an aggressive tone, that it was common to suffer sanctions imposed by his stepmother if he did not meet the daily goals of work at the plant, such as, for example, having lunch only when the job was finished; if he could not finish by lunchtime, he was obliged to fulfill the work demand in the afternoon, without his main meal of the day. The harsh sanctions imposed, as well as the appropriation of his salary by Ruth, did not occur hidden from Durval; on the contrary, Jiboia's father was quite oblivious to the context -"I was hurt because my father said nothing".
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176288Although he is skilled with numbers, civil construction and managing his two stalls, as he is proud to say, Jiboia is illiterate. His relationship with the world of school practically did not exist in his life: he started at age 9 and stopped at 13, when he fled to Recife. In addition to the various difficulties imposed, such as the great distance between his home and school, school hours were almost always compromised by work obligations, since, as he warns, the priority was always going to work. In interviews, Jiboia blames himself for being illiterate and penalizes himself for it, even defining himself as “a neutral person”.Another point of social suffering that had its genesisin his childhood -perhaps the most central one -and which must be understood here as a precarious ethosestablished as a subjective condition from a position of the Brazilian structural rabble is a certain disruption of the family nucleus, which is expected to act as a fruitful environment for the affective transmission of values. In the particular case of Jiboia, the specific type of relationship with the stepmother, the maternal absence throughout her life, exploitation in child labor in the sugarcane field, extreme poverty, absence of the school environment and the omission of the father conform the particularities of a precarious ethosengendered in childhood and adolescence.Jiboia, a subject loose in the world, a rejected calfIn many of the moments in which he talks about himself, Jiboia expresses a life marked by loneliness, both in the family dimension, maternal absence, absence of a marriage partner, the non-recognition as a brother by the other brothers from his father -I feel alone in the world because the others I have don't care about me, there are two brothers who never come to my house, I went there I don't know how many times-, without a close relationship with the 18 children, as well as in friendship relationships; although he has lived in the metropolitan area of Recife for almost 50 years, Jiboia has not built any lasting and solid friendships.In this sense, it is possible to infer that solitary life figures as an important element in his life. Throughout the interview and the occasional encounters in which I was able to observe and interact with Jiboia, a song he named "Bezerro rejected" was sometimes the soundtrack of the moments we were together. Music sensitizes him and brings him a significant degree of identity and recognition:J -Oxe, I suffered, that's why from time to time this song plays and I get a little sad [...] A rejected calf, a cattle when it rejects a child, what do you do? The guy doesn't give the bottle? Because the mother didn't want to give it.... then I keep thinking about it. I often think, then after this song
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.176289came out, that's it! That's when I really think... I remember that song a lot because of that, I was born a rejected calf, I didn't see a mother, I was suckling from one, I was suckling from another, there is the regretAnother central issue in Jiboia'ssolitary life is the absence of a steady marital partner, mainly at two points. First, it is linked to the sexual division of labor, the absence of a partner is also the absence of someone to carry out the domestic activities, thus, the double shift of work, which in general is common to women, ends up being carried out daily by Jiboia. Second, the absence of recognition in love, which corresponds to the absence of marital companionship, as in leisure and affection activities.His father was the only relative of the most central family nucleus that Jiboia established more solid family relationships. Including, the only inheritance via affective transmission of values inherited from the family as a dispositional heritage, comes from the father in the form ofa given moral economy, in the sense of dealing with marital relations and with the low objective conditions of life:J -That's why nowadays, when my father died, he called me, and I went there. He said, “look my son, I'm dying” he called the allchildren. Luizinho and I... went,look, there's only one thing I ask of you, you got married, don't hit your wife, don't let her starve, if you can't live it, leave it, and don't let your fridge run out of anything in the house', nowadays, there are four [fridges], where you look for a piece of meat, thank god!The particularities of the encounters: the ruptures of a trajectoryThroughout his 62 years, Jiboiasays he is grateful to only two people in his life; both established particular relationships with Jiboia and were in themselves transformative potentialities along the biographical path. The socializations established with Paulo and Faixa were fundamental in Jiboia's life path, and as the interviewee puts it, life without them would be different today "Paulo and Faixa meant a lot to me... it would be different because I wouldn't have learned the things I know".Faixa is the figure responsible for an important biographical break in Jiboia's life, because "Faixa is who took me out of the cane field, I don't know if he's alive or if he's dead, but I thank him wherever he is"", as it was also with Banda that Jiboia began to learn his first constructive skills: "He made pottery... ok, I learned to make porttery... work with plaster".Banda offered him a job and housing in Recife and, even though these were very precarious and Jiboia was still subjected to the abuses of child labor, even so, at the time, it wasthe path he chose in the face of the possibilities and impossibilities to follow his life. Jiboia's
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762810life working for Faixa did not last long, after six months, Jiboia became indignant with the conditions imposed by Faixa and stopped working for him.In the story that Jiboia tells us about his life, it is essential to point out that throughout the chronology told by him there is a gap without information regarding the period between his departure from the house in Faixa and the moment he occupied what is today the Iraque community. In a period of more or less 10 years, we don't know what happened in Jiboia's life. On the occasions of the three interviews, we tried to access information about the period in many ways, however, all in vain.While Paulo is presented to us as his great teacher -"My life improved because of him, because if it weren't for him, I would still live without reading and I lived here and there". Paulo was a master beyond his skills in civil construction, he taught Jiboia important values, such as driving, working with sawdust and, fundamentally, it was from the interactions established with Paulo that Jiboia instilled ascetic subjective dispositions to deal with money and also in food management so that there was no shortage of provisionsthat were not common for his social class fraction.Therefore, and considering that the transferability of practices -such as asceticism in dealing with money -to other contexts is present in the very concept of habitus, we sociologically understand that Jiboia's ascetic dispositions, based on interactions with Paulo, created conditions and conditions permissive, enabling Jiboia to manage his two small businesses, as well as in other contexts of his life:J -I learned to save money with him, I would take money today, tomorrow it was broke, I took money at the weekend, on Monday I was already borrowing money, "but man, I paid you so much, you live alone, spend it on others and today you're already asking for money... it's like..., like..., like...", I would lower my head and say 'okay, alright'nowadays I have this [indicating with his eyes the shelves of the tent] because of him, for me it was a lot for me, you know? for me it was... then I started to like it,and he said, look at this and that, "you have nothing if you don't keep it", "you see, the rich to eat is a bit like that, it's leaves, it's bush and these things to have things, and they have it, and still want more, the same I tell you", that's where I got it into my head, thank God.Indispositional sociology, the subjectivities of social agents are, above all, sediments of historicized practices throughout the agents' life history from a class position in the social space. When analyzing a biographical journey, as in the case of Jiboia, it is important to note that certain practices learned in different social contexts are only possible due to previous conditions. Here, it should be noted that the sociabilities established with Paulo, although plural in their contexts, started from the work relations of civil construction, which was only possible
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762811due to the apprehensions of a dispositional set of capacities that had their fulcrum established in previous sociabilities with Faixa "When I arrived in Paulo, I already had experience with Faixa".In this way, we understand that it is from such particular interactions that Jiboiacomes to have a patrimony of conditioned competences that, certainly, are fundamental for him to have, currently, one of the best economic conditions of the occupation, both for the competences in construction civil society, as well as a relatively ascetic ethosin the financial and food dimensions.Individual constraints: intraclass objective variationsBefore moving to Dandara, Jiboia lived in Iraque -one of the poorest neighborhoods in Recife -, where he stayed for almost three decades. Jiboia's life in Iraque occupies a prominent place in his trajectory. It was in the community that Jiboia held the position of president of the association for more than two decades during a long period marked by land conflicts. About that period, Jiboia makes a pointof telling his facts and showing his photos, which, by the way, he keeps with great zeal and pride -It was too good. I like working with people, when I went there, that number of people went to the meeting at the city hall, 'hey!', they all went”.Here,as a sociological activity, it is up to us to understand such particularity. Certainly, one of the personal characteristics that made it possible for Jiboia to occupy the position of community leader for years was the dispositional trait pertinent to public activity and collective activity and, aligned with these, the dispositional competences of a builder with high expertise in precarious materials, who in the end, it is the specialty demanded in their daily lives and that of their neighbors. "In Iraque Iwas president of the council.... I never lost an election to anyone.... because I did everything, like here, I did everything".As is known, it is a long-standing political practice in which some councilors in the city of Recife establish political relationships with community leaders in order to spread out in popular territories and thus collect more and more votes; many times, these practices are established through “exchange of favors”. At one point in the conversation, Jiboia reveals that the highest position he occupied in the job market was made possible by such practices with a well-known city councilor.In this sense, it is necessary to highlight that in the context of the time when he got that job -emphasizing here that as a member of the Brazilian rabble Jiboia did not have the social preconditions to acquire economic capital and certified cultural capital of the school system -
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762812we can understand that such permissibility was gave through Jiboia's dispositional patrimony focused on public and collective issues added to his patrimony of constructive capacities, which in turn, enabled an accumulation of sufficient political capital to weave exchange relations with that councilor, and thus, as an exchange element, he held a formal job which, in turn, positions him, differing to a certain degree, therefore, from the other neighbors, or more broadly, from the members of his class fraction. Therefore, based on the biographical and ethnographic analyzes presented here, it is possible to reconstruct, to a certain extent, how a certain dispositional heritage of Jiboia conditioned him to occupy his highest position in the world of work.Despite Jiboia's precarious habitus, a closer analysis of the intricacies of his life path reveals subjective conditions that we understand as a pride associated with his accomplishments, which significantly differs him from the other members of his class fraction. In general, two questions appear with some frequency throughout the interview: the profession of security in a public bank with a formal contract and the position of president of the association are moments that are very different in his life.City, favela; respect, disrespect; citizen, dogAs is known, the vast majority of the mass of poor people in Brazil live in the so-called urban slums. It is up to us here to analyze the social agents not only about the objective conditions of life, but also about the subjective conditions of existence imposed by the former. It becomes essential here, for the sociological understanding of the daily practices of the rabble in the pandemic period, the exercise of revealing from empirical works the feeling and deep meaning of what it is to “be a slum dweller” in the country. In this sense, Bourdieusian urban sociology offers us some valuable instruments: a dialectic between reified physical space and class habitusis one of them.By explaining his visions of the social world and, in particular, about the “favela”, Jiboia soon tries to denaturalize the symbolic violence in popular neighborhoods in terms of the social ills attributed to urban violence in these territories. For Jiboia, issues such as robberies and homicides that occur in popular neighborhoods also occur in "beautiful places", such as Boa Viagem -south of Recife and one of the most expensive square meters in the city -"Which is a beautiful place, on the edge of beach, all... the people kill one, cripple one, steal everything... the way it is here".
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762813However, despite Jiboia's efforts to denaturalize the fact that there is no formal address for many of the social ills, the transclassist common sense of the stigmatization effect focused on “being from the favela” operates in Jiboia's subjective conditions. Although it reinforces his liking for the “favela” and its importance in his life, being “favelado” is being humiliated, as well as being denied a series of rights, for example, the apparently simple matter of not receiving correspondence at home. According to Jiboia’s understandings, such a question of humiliation for being “from the favela” is the humiliation that the rich impose on the poor:B -How do you feel like for living in a favela?J -I feel humiliated. I've always lived in the favela, and it's in the favela that I get my biscuits to eat, it's inside the favela, I like living in the favela.You arrive to buy something at the store, when you give the address, you say 'ah, it's a favela, right? We don't deliver no'. I have a creditcard anyway, I gave the address and they said it wouldn't arrive, I gave an address to the house of the mother of a boy from here.Is this not humiliation? The people humiliate the favela a lot. The poor is humiliation of the rich, they look crookedto us.Jiboia's points of view and opinions about Brazilian social classes, as well as inequalities, appear immediately when asked which of the neighborhoods he lived in Recife liked the most. When questioned, a question that stands out as an important element for the debate proposed here, Jiboia does not answer the question by pointing to a specific neighborhood but brings a definition of what would be “a good place” in his understanding. For Jiboia there is no bad place and it is the person who makes the place, because, according to him, the central issue is knowing how to live. Thus, and even more importantly, when asked about what knowing how to live in the place where one lives would be, Jiboia readily attributes it to knowing how to respect and be respected''. In this sense, it is important to emphasize that talking about what would be “a good place” is the only moment in the three interviews in which Jiboia labels the thought expressed as an issue already reflected by him, or even, in which one has conviction and, therefore, Jiboia immediately presents his understanding, "That's what comes to my mind anyway, I answer right away because there is no bad place, no". The theme is articulated by him succinctly and applied to examples -which, by the way, contribute to reinforce that it is an opinion already reflected and taken as a conviction.In Jiboia's understanding, the favela is in opposition to the city, as well as the rich nation to the poor nation. The relationship between city and favela is fundamentalfor the purposes of this research, because, according to Jiboia, being in a city or favela also defines the place where Jiboia will be respected as a citizen or, diametrically opposed to such a position of recognition, will be treated like a dog:
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762814J -Here they respect it, but in the city, if I go there and walk among these peoples, will they consider me a citizen? No,a dog!B -Who? J Those rich! B Like a dog?J -I think it is, I think it is... because there are five or six of them there, if I arrive all bedraggled, the first thing the guy will say is, "Look, what a dog!" Just because you have the best clothes, because you have more money than the person, you read more than the person, right?General provisions and class ethosin the pandemicFrom the relationship already established with Jiboia, added to the sociological biography carried out through the interviews, it is possible to weave some understandings about Jiboia's dispositional heritage and, more specifically, about his class habitus. Our main objective is to reconstruct the meanings that social agents attribute to their pandemic protection practices, the practice being intermediated by objective living conditions and subjective conditions of existence.That said, we seek to support the integral parts of unequal social realities and practices, considering the objective conditions of social class and, fundamentally, about the subjective conditions of existence in each particular context in Jiboia's life trajectory. Therefore, we understand that in Jiboia's life trajectory, social issues such as the exploitation of child labor in a situation analogous to slavery; absence of numerous rights related to childhood and adolescence; an inhumanstepmother; the feeling of being alone in the world, a rejected calf; low objective living conditions; absence of social pre-conditions for the acquisition of economic and cultural capital via school certificate; extreme poverty in several diachronic moments; lack of recognition in the dimension of love; solitary life of a social individual “loose in the world”, despite having 18 children and several ex-partners and the feeling of being recognized as a dog by the people of the city were/are imposing different subjective conditions understood here under the dispositional concept of precarious ethos. Such an ethosthat could be perceived in some social contexts, for the purposes of this research, was analyzed in order to understand the intermediations betweenJiboia's precarious ethos, objective living conditions and pandemic protection practices.Before delving into the reconstruction of the meanings of Jiboia's practices in the pandemic mediated by the class habitus, it is necessary to place two other sets of dispositions that were understood here as strong dispositions and that, depending on the social context, decisively affect practices Jiboia's daily activities: religious dispositions -although Jiboia is not
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762815of any religion and insists on ratifying it since he is not evangelical -and the eidosabout logical schemes.Thus, everyday actions are mediated by religious beliefs, especially when resolving dangers, such as about pandemic protection practices that are made sense of through intermediations with provisions of religious belief. However, it should be noted that Jiboia's strong religious beliefs are not, under any circumstances, taken as a general disposition that defines his practices and visions of the world, but are placed in a correlation of forceswith the other dispositions, from the peculiarity of each context.Firmly claiming that he was never afraid of the coronavirus because he is not afraid of death, over the almost three years of the pandemic, Jiboia'sactions to protect himself through masks, social isolation, correct hand hygiene and vaccination, going to the doctor were rare, when necessary etc. As a matter of fact, on the few occasions that he acted according to the protection recommendations, the purpose of his actions was not to protect himself, being much more associated with compliance with the rules.In this sense, it is possible to infer that there is in Jiboia an enormous absence of fear of dying as a behavior of a modus operandi to face so many daily threats with which he had to deal throughout his 62 years, such behavior being a strong dispositional trait of the little attachment that Jiboia has for his own life, sedimented along a hard trajectory in the form of a precarious ethos-in the sense of existential inequalities. In the current scenario of severe social crisis that the country is going through, Jiboia's most immediate fears are others and the issues that lead to death too, such as hunger:J -I am afraid of people dying of hunger, I see people dying of hunger, because there are no goods, no services, no money... I'm not afraid of dying, I have nothing to lose, I've already done what I had to do in my life, I'm already old, and I'll think about nothing else, I don't.Although Jiboia has one of the best living conditions in the entire community, in the current context, the interviewee fears the uncertainties of his future more than being affected by the coronavirus. If, on the one hand, as he constantly points out, there is no work in civil construction; on the other hand, the small markets that are Jiboia's only livelihood are no longer guarantees of steady money, as the vertiginous impoverishment of the poorest part of the population directly impacts Jiboia's sales.J -[...] The guy just does what the guy has to do... is to do that thing and not be afraid. I'm not afraid of these diseases...well, look, that's what makes you afraid[referring to an old man who had just caught a can of cachaça on
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762816credit] because if I don't takeit off, how am I going to put it on? That's it... that I already took a lot of shade here... then you have to put it in your head.B -Are the people here short of money?J -Everyone without money, right? That there is no service to work on, even for women it is bad, there was cleaning on one side, cleaning on the other, going to one place, going to another, now there is no cleaning or anything.Let's see if it improves now after Lula joins. Lula... [long pause] they're already making war with him again.Perhaps one of the most accurate markers for us to measure the crisis of labor shortages among the structural rabble is Jiboia'sfinding about the lack of cleaning as a work activity for women in the pandemic context. As is known, despite the precariousness, the work of domestic servants is one of the most available categories for women from the popular classes since its first fulcrum. Without this income, the heads of household end up having to make ends meet in other ways, as we can see in Jiboia's reports:J -The people here are hungry and going to Ceasa to pick up garbage... is there a place to catch more diseases than Ceasa?People would leave here to pick tomatoes, onions... there it's all on the ground, there it rains, you step on it, the car hurts it, then there's that black water on the ground, that causes a disease...but I had to eat, hunt for something to eat, get here to wash it, scald it to eat it because I didn't have money to buy it, all this is a pandemic, you know?One of the biggest fears of Jiboia is becoming a person dependent on others to survive, which is a matter of pride. This dispositional trait, on the one hand, is strong, being able to motivate daily efforts of hard work, even at 62 years old and having a tired body; on the other hand, it is fragile, because through the testimonies we realize that it is emotionally very painful for Jiboia to imagine that in the near future the markets may close and he may return to the social position he already occupied as a beggar.Another dispositional characteristic of Jiboia that should be highlighted in the reconstruction of the meanings of his actions in the pandemic context is the particularity of having learned to deal with low living conditions. The ascetic ethoswhen it comes to holding back food and money comes back to the fore as one of the particularities that are capable of giving the Jiboia a social advantage in a scenario of growing poverty. Therefore, we show that although Jiboia's concern is with the future, the fear is of a known pain, hunger. And not from an unknown disease.In this sense, it is worth rescuing the sociological understandings of Jiboia's dispositional heritage analyzed in the above, in which we understand that the genesis of dispositions, either through a moral economy inherited from his father or from Paulo, are
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762817fundamental to deal with the current context of social crisis and sanitary. Precisely in this sense regarding the particularities, Jiboia knows that the personal capacity to store food and money makes him different from the other residents of the occupation, mainly in the face of the current social and health crisis -“All my lifeI've liked to save my little bit, now it's got worse, you have to save even a little more, now in the pandemic you have to buy really carefully, because there's no money.”It should be noted that in addition to the class ethos, the provisions of religious belief and the ascetic dispositions of knowing how to ration food and money, in the reconstruction of the meanings of Jiboia's acts during the pandemic, it is necessary to emphasize how the pandemic-denying industry instilled subjective perceptions in Jiboia that directly affect their daily practices.At different times, when asked about a certain deviation from his practices in the period, through the logical schemes of eidos, Jiboia disdains the pandemic by reproducing fake news, an issue that encourages him in actions of practices that deviate from pandemic protection practices. Although Jiboia is politically left-wing -as he defines himself -and does not like the current president Jair Bolsonaro, it is worth emphasizing that a series of Jiboia's understandings and practices regarding the pandemic find support in the president's public position, such as Jiboia's lack of interest and fear in take the vaccines.An example of this support between certain pandemic protection practices and the public positions of the president can be seen in the notes of the research entitled More than Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior During a Pandemic. Research demonstrates that the words and actions of political leaders affect people's behavior regarding social isolation. The research found that after President Jair Bolsonaro minimized the risks of the SARS-CoV-2 pandemic and advised against social isolation, the locations that had the highest numbers of pro-government people -based on the 2018 election -were the places which showed the greatest weakening of social isolation indices compared to the locations where the president does not have the same popularity.Jiboia says he is afraid of the consequences of taking a vaccine that, according to him, is not safe. Such fear of Jiboia is oxygenated by the president's position; however, it should be noted that the fear is not associated with the figure of Jair Bolsonaro, but with the position he occupies, as president of the republic. This question is posed as follows: "If the president does not want to take it, there are reasons for that... he was the first person who did not want to take it".
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762818Regarding the use of masks, still in the first interview, in a humorous tone, Jiboia presents us with the vast collection of masks that he has due to the many purchases he had to make when he was required to use the mask on the occasion -"When someone complains , 'Okay, I'll put it on' when I go on the subway, I have about 40 masks there, I go out everywhere and buy... 'Hey, I can't get in', 'How much is one?', 'That's two reais', 'give me one'". Jiboia offers no resistance when required to wear a mask, claiming to be afraid of popular reprisal.The use of a mask by Jiboia in the pandemic period is plural and, to a large extent, contradictory. At another time, although he does not understand the reasons, Jiboia recognizes the importance of wearing a mask, even classifying non-use and non-isolation as a “failure”. However, as occurs in almost all of his opinions about his practices in the period, the beliefs dispositions of religious determinism and, to a greater degree, the precarious ethosas a set of dispositions that, among other things, are attributed to a courage before the dangers of the world and death, as in the context of the pandemic, a great absence of fear of dying from the disease in question.Throughout the three interviews, Jiboia firmly states that he never stayed at home and never will, that he was never afraid and is not afraid of dying. In addition to the precarious ethos, the generational cut makes Jiboia even less attached to life itself. As we can observe throughout the interview, the more advanced age reverberates in some issues in Jiboia's life, such as the possibility of having a job with a formal contract -"At that age, no one will sign me for a formal job" -and less chances of getting it , in a fixed way, a companion; in this case, we understand that older age makes life even less interesting for Jiboia or even less valued, whichin turn leads to less fear of dying, even when it comes to dying due to complications from the coronavirus.Final considerationsAs we have seen, the practices of Pandemic protection of Jiboiain the pandemic -use of mask, correct hand hygiene, vaccines and social isolation -, in general, are not in accordance with the recommendations for protection against the coronavirus. Jiboia did not use masks; did very little social isolation as a way toavoid being contaminated; does not wash hands properly with soap; and only took the vaccine due to relative pressure from members of the social movement coordination.Therefore, regarding the behavior of Jiboia in the pandemic, the present research focused on the reconstruction of the meanings of the acts attributed by the social agents
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762819themselves. That said, we understand -after three long biographical interviews and analysis -that the class habitus; the set of provisions that make up the precarious ethos; provisions of religious belief; and precarious dispositions of the logical schemes of the eidos, are sociological characteristics of Jiboia that allow the reconstruction of the meanings of the practices in the pandemic period analyzed here, being strongly mediated by issues related to Brazilian social inequalities.As it was noticed, in the few times that Jiboia acted according to the recommendations, what mobilized him was much more related to other issues than the motivation to protect himself from dangers than possible contamination; as in the case of the use of vaccines, which happened when he discovered that he would suffer some restrictions in relation to his work card, to open bank accounts etc., or even in the case of masks, which in the vast majority of times Jiboia only used when required, either by norms of a certain place or by pressure from the people who demanded such protection.To reconstruct the meanings that are imbued in the practices is to reconstruct the objective conditions of life and the subjective conditions of existence. As seen, if on the one hand the objective conditions determine a series of practices, mainly in a scenario marked by the abrupt increase in poverty, hunger, unemployment, etc., on the other hand, the provisions mentioned above darken the compression of Jiboia's actions in the period: the absence of fear of death is intertwined with his precarious class ethos, thus making pandemic protection practices that deviate from recommendations understandable from a sociological point of view.That said, there is no doubt that existential inequality -understood here in the dispositionalist form of precarious ethos-is a central social element in the reconstruction of the meanings of pandemic protection practices that do not comply with the recommendations in the period. Low self-esteem, low social dignity, the feeling of being a dog for other social classes, the lack of recognition in marital or family love, the pains one carries because of the burden of being a favela dweller, are issues that make not only society, but also the Jiboia itself ends up valuing its life as something of little importance, resulting, therefore, in low pandemic protection practices.
image/svg+xmlBruno Leonardo FONSECARev. Sem Aspas,Araraquara, v.11, n.esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762820REFERENCEAJZENMAN, N; CAVALCANTI, T.; DAMATA, D. More Than Words: Leaders’ Speech and Risky Behavior during a Pandemic (April 22, 2020). DOI:http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3582908.BOURDIEU, P. A distinção:Crítica social do julgamento.São Paulo: Editora Zouk/Edusp, 2007.BOURDIEU, P.Meditações pascalianas.Pierre Bourdieu. Tradução Sergio Miceli. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2001.FERNANDES, F. A integração do negro na sociedade de classes. 5. ed. São Paulo: Editora Globo, 2008. LAHIRE B. Retratos sociológicos:Disposiçõese variações individuais.Trad. Patrícia Chittoni Ramos Reuillarde Didier Martin. Porto Alegre: Artmed, 2004.SEN, A.K.Desigualdade reexaminada.Tradução e apresentação de Ricardo Doninelli Mendes.Rio de Janeiro: Record, 2001.SOUZA, J. Subcidadania brasileira:Para entender o país além do jeitinho.Rio de Janeiro: LeYa, 2018. 288 p.THERBORN, G. Inequalities and Latin America. From the Enlightenment to the 21st Century, desigualdades.net Working Paper Series.Berlin: desiguALdades.net Research Network on Interdependent Inequalities in Latin America,2011.
image/svg+xmlPandemic and class habitus: Analysis of social self-care practices during the Covid-19 pandemic in the metropolitan region of RecifeRev. Sem Aspas,Araraquara, v. 11, n. esp. 1, e022024, 2022.e-ISSN 2358-4238DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.1762821How to reference this articleFONSECA, B. L. Pandemic and class habitus: analysis of social self-care practices during the covid-19 pandemic in the metropolitan region of Recife.Rev. Sem Aspas, Araraquara, v.11, n. esp.1, e022024,2022. e-ISSN: 2358-4238.DOI:https://doi.org/10.29373/sas.v11iesp.1.17628Submitted:15/08/2022Required revisions:19/09/2022Approved:11/11/2022Published:26/12/2022Processing and Editing: Editora Ibero-Americana de Educação.Correction, formatting, normalization and translation.