Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 1

O DISCURSO POR TRÁS DAS FAKE NEWS: UMA ANÁLISE DA

DESINFORMAÇÃO PROPAGADA CONTRA O PARTIDO DOS

TRABALHADORES (PT)

EL DISCURSO DETRÁS DE LAS NOTICIAS FALSAS: UN ANÁLISIS DE LA

DESINFORMACIÓN PROPAGADA CONTRA EL PARTIDO DE LOS TRABAJADORES

(PT)

THE DISCOURSE BEHIND THE FAKE NEWS: AN ANALYSIS OF

DISINFORMATION PROPAGATED AGAINST THE WORKERS' PARTY (PT)

Miguel QUESSADA1

e-mail: quessada.miguel@gmail.com

Como referenciar este artigo:

QUESSADA, M. O discurso por trás das fake news: Uma análise

da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores

(PT). Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010,

2023. e-ISSN: 1982-4718. DOI:

https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296

| Submetido em: 05/03/2023

| Revisões requeridas em: 22/04/2023

| Aprovado em: 11/05/2023

| Publicado em: 01/08/2023

Editora:

Profa. Dra. Maria Chaves Jardim

Editor Adjunto Executivo:

Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), São Carlos – SP – Brasil. Doutorando em Ciência Política

(UFSCar) e em Comunicação (UFPR). Mestre em Ciência Política (UFSCar).

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 2

RESUMO: O termo “fake news” tornou-se complexo, e a literatura tem preferido o termo

“desinformação” por ser mais abrangente e conseguir compreender todo tipo de conteúdo

veiculado. O presente estudo tem como objetivo investigar o discurso propagado contra o

Partido dos Trabalhadores (PT), propondo uma tipologia das fake news utilizadas, a fim de

entender quais os temas fizeram parte da agenda política, que foram desmentidas pelas

agências/sites de checagem e a análise do seu conteúdo e discurso. As fake news são propostas

por um sujeito interessado em trazer temas específicos para o debate político.

Metodologicamente, o trabalho usa da Análise de Conteúdo e do Discurso Semiolinguístico.

PALAVRAS-CHAVE: Desinformação. Fake news. Análise de discurso. Esquerda. PT.

RESUMEN: El término fakenews se ha vuelto complejo, y la literatura ha preferido el término

desinformación porque es más completo y puede comprender todo tipo de contenido

transmitidos. El presente estudio tiene como objetivo investigar el discurso propagado contra

el Partido de los Trabajadores (PT) y proponer una tipología de las noticias falsas utilizadas

para comprender qué temas formaban parte de la agenda política que fue refutada por las

agencias/sitios de verificación y el análisis de su contenido y discurso. Las fakenews son

sugeridas por un sujeto interesado en traer temas específicos al debate político.

Metodológicamente, el trabajo emplea el análisis de contenido y el discurso semiolinguístico.

PALABRAS CLAVE: Desinformación. Fakenews. Análisis del discurso. Izquierda. PT.

ABSTRACT: The term fake news has become complex and the literature has preferred the term

misinformation because it is more comprehensive and encompasses all kinds of contents. This

study investigates the discourse against the Workers' Party (PT), proposing a fake news

typology to understand which themes were part of the political by cataloging the

misinformation disproved by agencies/verification sites and the analysis of its content and

discourse. Fake news is brought up to introduce specific topics for political debate.

Methodologically, the work adopts Discourse Analysis to understand this phenomenon and

applies Semiolinguistic Analysis as a form of analysis.

KEYWORDS: Misinformation. Fake news. Discourse analysis. Left. PT.

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 3

Introdução

Um partido cria uma igreja evangélica e coloca sua presidenta para ser pastora. Um

vídeo comprova uma urna eletrônica se autocompletando com o número 13. Uma líder petista

defende a instalação da rede Wi-Fi em presídios. Uma condenada por assassinar os pais sairá

candidata pelo PT. Este mesmo partido com outras agremiações de esquerda faz marcha para

Satanás e gritam que Satã é o rei deles. Na área da cultura, esse partido financia a exposição “O

ânus é lindo”, em Salvador-BA.

Os enunciados citados acima, além de causarem indignação ao leitor desavisado, são

exemplos de desinformação emitida contra o Partido dos Trabalhadores (PT) – o maior partido

de esquerda do Brasil

. Alguns são fake news, mas o conceito, de tão complexo, ficou pequeno,

e o termo “desinformação” é o mais novo guarda-chuva que abriga “fake news” e todo tipo de

conteúdo falso.

A pesquisa considerou, para efeito de recorte analítico, o Partido dos Trabalhadores

(PT). Para o estudo desse recorte, o trabalho faz um diálogo com três áreas do conhecimento: a

ciência política, a comunicação e a análise do discurso que, juntas, darão embasamento para

compreensão da temática. Este estudo tem como objetivo analisar o que está por trás do discurso

da desinformação produzido contra o Partido dos Trabalhadores, e quais os temas recorrentes

a que ele está associado. As questões que norteiam esta pesquisa são: Existe um modelo de

desinformação empregado para caracterizar o partido? Esses temas são novos ou apenas uma

nova roupagem daquilo que já foi propagado no passado? O presente trabalho se justifica pela

relevância do tema no discurso político. Embora a mentira sempre se tenha feito presente no

universo político, ela ganhou novos ares com a tecnologia. As fake news pulverizam o debate

eleitoral e sempre ressurgem como se fossem atuais. Compreender esse discurso é imperativo

para entender o funcionamento da comunicação política. Relatório produzido pelo MIDIARS

– Grupo de Pesquisa em Mídia. Discurso e Análise de Redes Sociais – mostra como houve

aumento da desinformação na pandemia da COVID-19, e como os agentes públicos são

responsáveis pela legitimação e propagação da desinformação (RECUERO, 2021).

O presente estudo tem como objetivo investigar o discurso da desinformação propagado

contra o PT, propondo uma tipologia das fake news utilizadas a fim de entender quais os temas

fizeram parte da agenda política no período estudado (2013 a 2021) por meio da catalogação

das desinformações (66 ao todo) que foram desmentidas pelas agências/sites de checagem e a

Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE, 2023). Disponível em: https://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-

eleitorado/filiados. Acesso em: 14 mar. 2023.

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 4

análise do seu conteúdo e discurso. Apesar do esforço em catalogar as fake news produzidas ao

longo de 8 anos, essa lista não é terminativa. As fake news são propostas por um sujeito

interessado em trazer temas específicos para o debate político, impondo uma nova agenda

setting não proposta pela mídia.

A Agenda Setting ou Teoria do Agendamento é um tipo de efeito social dos meios de

comunicação que envolve a seleção, incidência e disposição de notícias sobre temas que a

opinião pública discutirá. Alguns temas serão dispostos mais enfaticamente. McCombs e Shaw

(1972) mostraram que os meios de massa podem não ter êxito em dizer ao público o que pensar,

mas são eficientes em dizer sobre o que pensar. Isso acontece porque os jornalistas atuam como

gatekeeper (porteiros) da informação, escolhendo aquilo que querem ou não publicar. Ao impor

um menu seletivo de informações, a mídia impede que outros temas sejam conhecidos e, por

consequência, comentados. Os temas selecionados muitas vezes atendem aos interesses do

mercado. Com o aumento das redes sociais como Facebook e o Twitter, a agenda setting deixou

de ser prerrogativa dos meios tradicionais (FERREIRA; TEIXEIRA, 2009).

Dessa forma, os propagadores de fake news funcionam como gatekeepers ao elencarem

a tipologia da desinformação que será disponibilizada ao nicho de público pretendido que, ao

receber a falsa informação, irá polemizá-la devido ao efeito de verdade, podendo repassá-la a

outros e amplificar o poder de alcance da mensagem. Para a Ciência Política, essa informação

é preciosa, uma vez que tais temas acabam monopolizando o debate eleitoral em detrimento das

propostas apresentadas. Metodologicamente, o trabalho usa da Análise do Discurso

Semiolinguística de Patrick Charaudeau como forma de análise, de forma especial o conceito

de imaginários sociodiscursivos.

O contexto brasileiro, a crise da democracia e o populismo

Almeida (2019) explica que os evangélicos foram mobilizados pela pauta de costumes,

pelo medo da ameaça comunista e pela honestidade das pessoas de bem. Aliados a esses fatores,

temas como a crise econômica, a demanda por uma nova política e o antipetismo também

estavam em jogo. Desde 2013, a onda conservadora tem ganhado força no Brasil e ela encontra

respaldo no discurso evangélico, embora nem todos os evangélicos sejam conservadores. O

discurso econômico liberal encontra eco na teologia da prosperidade que prega que possuir e

ascender socialmente são sinais de Deus na vida pessoa. Dessa forma, o discurso da

prosperidade material e de atitude individual empreendedora é valorizado pela ética econômica.

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 5

Já o discurso a favor de um Estado menor é baseado na recusa da corrupção e nos privilégios

do setor público e não nas agendas neoliberais.

Na primeira eleição contra Jair Bolsonaro em 2018, o PT tentou apelar ao mostrar cenas

de tortura, mas não obteve o apoio esperado. Isso talvez pelo fato de que na ditadura (1964-

1985) muitos evangélicos foram omissos ou até apoiadores do regime sob a justificativa bíblica

de que as autoridades devem ser obedecidas e estão ali com a permissão de Deus. Os

protagonistas mais destacados do conservadorismo dos últimos anos representam parcelas dos

evangélicos que saíram em defesa da moralidade púbica “para regulação de corpos,

comportamentos e vínculos familiares (casamento entre pessoas do mesmo sexo e adoção de

crianças por casais gays)”. No caso de Bolsonaro, ele abraçou essas pautas que são consideradas

uma ameaça à família tradicional (ALMEIDA, 2019).

A comunidade bolsonarista é estruturada em um código binário que simplifica a

realidade e ativa sentimentos de alta voltagem como o afeto, o medo e o ódio. Para eles, o

mundo é dividido entre “bem e mal, sagrado e profano, gente de família e indecentes, cidadãos

de bem e bandidos, éticos e corruptos, nacionalistas e globalistas” (ALONSO, 2019, p. 38). O

nacionalismo já foi utilizado no Brasil tanto pela Esquerda (Diretas Já) quanto pela Direita

(Regime Militar). As cores, bandeira e hino são utilizados a fim de reforçar esse nacionalismo.

No binarismo não há estratificação, mas homogeneidade, de modo que o talento e o esforço são

os itens que separam pobres de ricos e brancos de negros. A violência é vista com legitimidade

e as mídias sociais são utilizadas para deslegitimar as reivindicações das minorias, justificar o

golpe de 1964 e a tortura para evitar a ameaça comunista, além de associar a corrupção aos

“petralhas”.

Alonso (2019) mostra que no início do governo Dilma, veio a debate a ética na política

e moralização dos costumes. Os ouvidos conservadores aderiram à luta contra o esquerdismo

comportamental que desconfortou grupos sociais religiosos intolerantes, que se uniram contra

as “imoralidades”, o kit gay, o aborto e a descriminalização das drogas. O discurso bolsonarista

combateu nas searas da moral privada e da moral pública. No primeiro campo, há uma

ostentação da virilidade e um papel de subordinação feminina e contra o feminismo. A família

estaria em risco pela escola doutrinadora e esquerdista que poderia impor valores, crenças,

estilo de vida e orientação sexual diferente daqueles propagados pela família. Na moral pública,

há a defesa da ética na política e a luta contra a corrupção administrativa. O discurso antielitismo

também divide a sociedade entre uma elite esnobe e uma classe “média-média” que representa

os brasileiros. O campo ultraconservador sempre esteve presente desde 1989, com Eneias,

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 6

Garotinho, Eymael, Pastor Everaldo, Levy Fidelix etc. Essa política ultraconservadora e seus

adeptos “veem o patriotismo como um enraizamento, a família tradicional como uma coluna

mestra da vida e a violência como autodefesa. Creem no mérito individual, no trabalho duro e

em Deus” (ALONSO, 2019, p. 51).

Bolsonaro mostrou que não foi preciso tempo de televisão para vencer uma eleição

muito menos um partido político expressivo. Isso, contudo, não é novidade já que candidatos

da extrema direita ganham votos ao capturarem o sentimento de frustração e desesperança,

apresentando discurso de renovação e antissistêmico, transformando a insatisfação em potência

eleitoral. Há o discurso de que os partidos estão na crise do sistema e é construído a partir da

negação. Ele vai além do antipetismo. É também antipartidário e antissistêmico. As ruas, antes

ocupadas por grupos de esquerda, passaram a ser ocupadas por grupos de direita. Os

manifestantes concordavam com discursos de que Bolsa Família financiaria preguiçosos e que

as cotas raciais geram ainda mais racismo. Era uma retórica com traços de antiesquerdismo e

anticomunismo e já com presença de fake news. Aliada à desaprovação da política, surge a

narrativa da meritocracia e do hiperindividualismo com a volta da retórica do perigo vermelho

e do fantasma do comunismo, além de uma negação ao intelectualismo, colocando em dúvida

os professores e os intelectuais. Os adversários vão além da esfera política, mas também nas

esferas religiosa e principalmente moral, tornando a esquerda uma ameaça às crianças. O ataque

ao campo progressista é também um ataque às pautas identitárias que são consideradas

privilegiadas pelo homem branco heterossexual. A extrema direita coloca a emoção no centro

do debate comunicando com os valores da negação, medo, ódio. Surge a política da inimizade

em que o outro é o mal e deve ser exterminado. Nesse sentido, vale tudo para atacar o campo

progressista e acadêmico, principalmente as morais, instrumentalizando as repressões e medos

sexuais. A esquerda seria não apenas uma ameaça para ordem social, mas também para própria

integridade das crianças (GALLEGO ORTELLADO; MORETTO, 2017; SOLANO, 2019).

Outros dois aspectos devem ser considerados para se entender o contexto em que surge

o discurso da desinformação que será analisado: a crise da democracia liberal e a terceira onda

do populismo de direita. Castells (2002) explica que a democracia liberal – que havia se

consolidado nos dois últimos séculos – entrou em colapso gradual. Em diferentes lugares do

globo como Espanha, EUA, Brasil, Coreia do Sul foram registradas diferentes mobilizações

populares contra o atual sistema. Dessa rejeição, surgem lideranças políticas que negam os

partidos e alteram a ordem política nacional e mundial. Nesse contexto, emergem figuras como

Trump, Le Pen, movimentos como Brexit e fazendo um paralelo com o caso brasileiro, aqui

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 7

emergiu a figura de Jair Bolsonaro. Gallego, Ortellado e Moretto (2017) consideram que a crise

na democracia não surpreende ninguém e que a política é apresentada como algo dispensável,

sujo, vergonhoso e deve-se buscar a não profissionalização do político. Como consequência, os

eleitores ficam reféns de uma política tecnocrática ou de uma política demagógica que manipula

medos, raivas e ódio. O caso do ex-juiz Sérgio Moro remete ao processo penal do espetáculo,

com o juiz que assume o papel de militante e salvador da pátria e faz das operações uma forma

de criminalização teatralizada, aumentando o sentimento coletivo de que a política é desprezível

e por isso deve ser negada e combatida (GALLEGO ORTELLADO; MORETTO, 2017).

Além de todos esses aspectos, houve a narrativa midiatizada do lavajatismo que

culminou com a prisão do ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva. Na operação, áudios do ex-

presidente com a então presidente Dilma Rousseff foram vazados para a imprensa. O discurso

lavajatista invocava termos morais de modo a superar um passado sóbrio de

patrimonialismo/corrupção e refundar o país pelo papel imprescindível do Judiciário na figura

de heróis e a operação faria uma limpeza e combate à corrupção (BELLO; CAPELLA;

KELLER, 2021). Não à toa, a maior parte das fake news contra a esquerda (o que será analisado

no próximo capítulo) está relacionada com corrupção e fraude nas eleições, o que mostra uma

desinformação mais fácil de ser assimilada pela população devido ao auge da operação no

Brasil.

As falas de Solano (2019) e de Bello, Capela e Keller (2021) remetem à política

informacional de Castells (2002) onde a política do escândalo é a arma da vez. Para atingir a

sociedade, os partidos agem pela mídia. O custo, no entanto, é alto e muitos recorrem ao que o

autor chama de contribuições debaixo do pano. Há um mercado de informações preocupado em

destruir reputações. O judiciário se une à mídia e produz vazamento de informações e muitas

vezes é visto como herói, e depois a figura heroica é rebaixada ao antagonista. Os políticos

reduzem a credibilidade da mídia, convidando a sociedade a encontrar formas alternativas de

expressão e comunicação (web).

Na crise da democracia, o Estado perdeu sua soberania pela dinâmica dos fluxos globais

e das redes de riquezas, informação e poder transorganizacionais. O Estado é incapaz de

cumprir os compromissos com o estado de bem-estar social. Há uma crise de legitimidade

associada à falta de credibilidade do sistema político. O sistema burocrático se tornou um

resquício burocrático destituído de fé pública. Przerworski (2020) corrobora o pensamento ao

elencar três sinais que mostram que uma democracia pode estar vivendo em crise: desgaste dos

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 8

sistemas partidários tradicionais ao passo que houve apoio à direita radical, avanços dos

partidos racistas, xenofóbicos e nacionalistas e o declínio do apoio à democracia.

Além do contexto digital que propiciou a rápida circulação das fake news, também é

possível atrelá-las no contexto político ao surgimento da última onda populista de extrema

direita no mundo. Ambos coincidem com a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos, com

a saída do Reino Unido da União Europeia e com a ascensão da extrema direita em diferentes

países do globo (Rodrigo Duterte nas Filipinas, Viktor Orbán na Hungria, Sebastian Kurz na

Áustria, entre outros). É como se os dois contextos fossem irmãos gêmeos e é difícil precisar

quem ganhou protagonismo primeiro, já que os eventos mundiais são usados para descrever

ambos. O uso da mentira na política é milenar, o surgimento do populismo remonta ao século

retrasado

, mas as fake news e o levante populista da extrema direita nesses últimos anos

dividem o mesmo tempo. Ambos fazem ataques à ciência e à política e dão sustentação um ao

outro. Tormey (2019) explica a relação entre o populismo e a pós-verdade e diz que além de

desafiar os argumentos, o populismo os considera falsos, criando os chamados “fatos

alternativos”, presentes não apenas nas campanhas, mas também nos governos populistas. “O

populismo prospera com o desejo de uma simplificação do mundo, uma redução da

complexidade a algumas tarefas fáceis de resolver, e com a oferta de uma visão, com frequência

nostálgica, de um mundo onde a ordem foi restaurada” (TORMEY, 2019, p. 153). Bernardi e

Costa (2020, p. 386), ao analisarem os líderes populistas de extrema direita eleitos nos EUA,

no Brasil e na Hungria acrescentam “a narrativa do uso de discurso de um inimigo comum,

deslegitimação da oposição, repressão e uso de redes sociais e fake news como instrumentos de

comunicação com o eleitorado, e posteriormente, com os cidadãos”.

Bruzzone (2021) mostra que o discurso populista faz uma combinação do povo, do

inimigo e de um líder. É um discurso que diz o que as pessoas querem ouvir por um sujeito que

não se preocupa com o linguajar utilizado e as mentiras encontram crentes dispostos a ratificá-

las. O populismo foi renovado pela comunicação digital em rede e deu lugar ao neopopulismo

digital ou ciberpopulismo que, impulsionado pela tecnologia digital, atinge uma escala global.

Ele é “capaz de gerar adesões em identidades narrativas fortes, simples e seguras, usando

tecnologias de microssegmentação que somente são possíveis em grande escala com recursos

digitais” (BRUZZONE, 2021 p. 64). O populismo digital garante certezas onde não precisa de

provas, soluções simplistas para problemas complexos, o retorno a tradições ou crenças que nos

O populismo estadunidense teve origem em 1829 e o russo em 1876 (DILUAR, 2020).

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 9

dão conforto. E para sobreviver, bloqueia a possibilidade de diálogo e polariza a política

(BRUZZONE, 2021).

No campo discursivo, como bem salienta Charaudeau (2018), o populismo também

ocorre quando o povo vota mais no político em razão de sua imagem e de frases de efeito do

que no programa de governo. O político molda o seu discurso conforme a opinião pública,

oscilando entre razão e paixão. E no jogo político há o risco da deriva populista, que ocorre

quando as massas podem ser seduzidas por imagens que não estão ligadas diretamente ao

político como a virilidade manifestada por aquele que “não tem papas na língua”, a figura do

sedutor que não esconde as aventuras sexuais porque, a depender dos imaginários sociais, esse

ethos de força, potência e virilidade acaba despertando a veneração ou o temor ao político. E

não por coincidência esse tipo de político encontrou respaldo entre os eleitores brasileiros.

Feito esse retrospecto e contextualização do caso brasileiro, entendido os discursos

desinformativos associados ao populismo que foram moldados nos governos Lula e

consolidado a partir da reeleição da presidenta Dilma, torna-se clara a compreensão das

temáticas envolvendo o PT na produção da desinformação. Fake news relacionadas aos direitos

humanos, à associação da esquerda com a criminalidade, corrupção e fraude nas eleições,

destruição dos valores cristãos e da “família tradicional” com incentivo claro à

homossexualidade e pedofilia, o perigo do comunismo entre outros temas foram associados ao

partido. Os temas não são novos, mas trazem um retorno ao tempo, e suscitam também as

memórias, daqueles que tiveram no currículo a disciplina de Educação Moral e Cívica e viram

no comunismo um perigo real, de modo que revivem aquilo que fora doutrinado no passado e

como forma de defesa partem para o ataque contra políticos e partidos de esquerda. A destruição

da reputação no meio político não é algo novo e Castells (2018) explica que as mensagens

negativas são cinco vezes mais eficazes em sua influência que as positivas. Portanto, trata-se

de inserir negatividade de conteúdos na imagem da pessoa que se quer destruir a fim de eliminar

o vínculo de confiança com os cidadãos, visto que a manipulação e a fabricação de materiais

aumentam o efeito destrutivo.

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 10

Metodologia e análise da pesquisa

A pesquisa que caracteriza este trabalho é de natureza qualiquantitativa e usa uma

abordagem de estudo de caso, à luz da Análise de Conteúdo e Discurso, tomando como base a

Teoria Semiolinguística de Patrick Charaudeau (2016, 2018, 2019). O corpus da pesquisa é

constituído por manchetes e textos das fake news envolvendo o PT entre os anos de 2013 e

2021, que foram desmentidas pelos seguintes sites/agências de checagem: Boatos.org, E-Farsas

e Estadão Verifica.

Considerando que as fake news imitam as notícias e com elas se assemelham, a análise

adotada seguiu o padrão do que é feito no estudo das mídias impressas. Para a análise, o trabalho

não se restringiu à definição restrita de fake news, mas foi além e englobou tudo aquilo que está

no campo da desinformação. Só foram coletadas desinformações que foram desmentidas por

sites e agências de fact-checking, a saber: Aos Fatos, Boatos.org. E-farsas, Lupa e Estadão

Verifica. É possível que haja outras fake news além do quadro apresentado, mas talvez pela

circulação restrita não foram desmentidas pelas agências consultadas. A data que aparece no

quadro das fact-checking remonta ao período em que a desinformação foi desmentida e não

quando ela surgiu pela primeira vez. Algumas sobreviveram a uma década de existência e

ganham vida proximamente ao período eleitoral.

As análises pretendidas foram realizadas com o auxílio do programa Iramuteq, versão

0.7 alpha 2, o qual se volta às análises de palavras, tendo como base a forma de aparição e a

repetição dos termos, dentro dos textos, facilitando assim, a identificação de relações de

proximidade e similaridade entre as palavras. No caso dos resultados pretendidos, esse modelo

de análise permitiu categorizar e elencar os termos ligados à propagação das notícias falsas,

associados à imagem dos atores e partidos políticos analisados.

Para fins de classificação, os assuntos foram divididos em seis grandes temas:

i. CA (Cultura e Artes): nesse arcabouço estão relacionados os boatos que

envolvem artistas e temas culturais – sempre de forma pejorativa – associados aos políticos e

partidos de esquerda;

ii. CFE (Corrupção e Fraude nas Eleições): nesse conjunto de temática estão as

desinformações que envolvem a esquerda com práticas de corrupção e fraude nas eleições;

iii. COMUNISMO: nessa temática estão os temas que vinculam a esquerda ao

comunismo;

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 11

iv. DHCAT (Direitos Humanos e Associação ao Crime e ao Tráfico): nesse guarda-

chuva de temas estão os assuntos que associam a esquerda a ações que a liguem a traficantes e

outros tipos de criminosos, além daqueles que associam de forma negativa o tema Direitos

Humanos à agenda esquerdista;

v. IROFF (IPIH) (Intolerância Religiosa e Ofensa à Fé e à Família Cristã: Ideologia

de Gênero, Pedofilia, Incesto e Homossexualidade): nesse arcabouço estão vários temas

agregados que dialogam entre si e tratam de temas tabus que supostamente ofendem a religião

e a família tradicional, além da falsa associação a temas como incesto e pedofilia;

vi. OUTROS: aqui estão todas as desinformações que não se encaixaram nos temas

acima e possuem as mais diversas vertentes.

A seguir estão as fake news analisadas, os gráficos produzidos e as análises realizadas.

Quadro 1 – Notícia (fake news), página, data postada e tema delimitado

Fake News

Agência que desmentiu

Tema

PT vai organizar falso atentado contra Haddad a

três dias das eleições

Boatos.org (21/10/2018)

CFE

Hackers mundiais divulgam fraudes da urna

eletrônica e democracia hackeada pelo PT

Boatos.org. (03/08/2021)

CFE

Protógenes Queiroz teve que fugir para Suíça

porque descobriu fraude do PT nas urnas

eletrônicas

Boatos.org. (02/08/2021)

CFE

Lázaro Barbosa aparece em foto com Lula e é

filiado ao PT

Boatos.org (18/06/2021)

DHACT

Joesley Batista escreve carta de agradecimento

ao PT após Friboi virar JBS Foods Internacional

Boatos.org (24/04/2021)

CFE

Cidade Alerta Sergipe denuncia áudio de

membro do PT contra igrejas

Boatos.org (20/03/2021)

IROFF (IPIH)

Maria Flor ganhou R$ 10 milhões da Lei

Rouanet na era do PT

Boatos.org (30/01/2021)

Estrategista do PT revela que José Dirceu

manda no STF e no Brasil

Boatos.org (09/01/2021)

CFE

Militantes do PT têm número 13 marcado a

ferro

Boatos.org (05/12/2020)

OUTROS

PT está em segundo lugar no ranking das

maiores organizações criminosas da história

Boatos.org (29/09/2020)

E-farsas (28/05/2017)

DHACT

PT e PSOL entraram na Justiça para impedir

que PRF combata tráfico de drogas e pirataria

Boatos.org (01/08/2020)

Estadão Verifica (17/08/20)

DHACT

PT entra na Justiça para evitar que Bolsonaro

acabe com a seca no Nordeste

Boatos.org (26/07/2020)

OUTROS

Foto mostra exposição em Salvador chamada “O

cu é lindo” e financiada pelo PT

Boatos.org (11/07/2020)

STF atende pedido de PT, PSOL, PCdoB,

DEM e PSDB e proíbe hospitais militares de

atenderem pacientes com Covid-19

Boatos.org (18/05/2020)

OUTROS

Caixa-preta do BNDES revela R$ 576 bilhões

desviados durante o governo do PT

Boatos.org (10/05/2020)

CFE

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 12

PT manda enterrar caixões vazios para dar golpe

em Bolsonaro

Boatos.org (25/04/2020)

OUTROS

Antropólogo que foi preso em terra indígena era

da esquerda e do PT

Boatos.org (18/02/2020)

DHACT

Bolsonaro descobriu R$ 23 bilhões do

PIS/PASEP escondidos por Lula e o PT

Boatos.org (21/12/2019)

CFE

Governos e prefeituras do PT do Nordeste

contrataram máquina para destruir asfalto feito

pelo Exército

Boatos.org (13/11/2019)

OUTROS

PT prepara festa em Curitiba para comemorar

soltura de Lula pelo STF

Boatos.org (05/112019)

OUTROS

Serginho Groisman pede Lula Livre e incentiva

terrorismo da esquerda em comício do PT

Boatos.org (03/11/2019)

Vice-diretora do PT de Porto Alegre, Mara

Jaqueline, é flagrada roubando celular

Boatos.org (16/10/2019)

DHACT

Assessor do PT que ganhou na Mega-Sena

comprou carro de luxo antes de resultado do

sorteio

Boatos.org (19/09/2019)

E-farsas.org (19/09/2019)

CFE

PRF apreende caminhão com milhões de dólares

do PT e outros partidos

Boatos.org (08/09/2019)

CFE

PCC divulga nota de repúdio após PF citar

ligação entre PT e facção

Boatos.org (11/08/2019)

DHACT

PT e esquerda estão abrindo buracos em

estradas no Nordeste para conseguir verbas

Boatos.org (06/08/2019)

CFE

PT entra com ação no STF para impedir que

Bolsonaro reduza preço do gás de cozinha

Boatos.org (06/08/2019)

E-farsas.org (06/08/2019)

OUTROS

Sargento Manoel Silva Rodrigues, preso com

cocaína na Espanha, é filiado ao PT

Boatos.org (27/06/2019)

E-farsas.org (27/06/2019)

DHACT

Gleisi revela, em vídeo, que PT quer o

desemprego em massa no Brasil

Boatos.org (30/05/2019)

OUTROS

PT, PSOL e PCdoB transformaram Praia

Vermelha (Urca) em praia de nudismo

Boatos.org (30/04/2019)

IROFF (IPIH)

Marcelo Odebrecht diz que governo do PT deu

dinheiro a traficantes do Rio e as Farc

Boatos.org (21/04/2019)

DHACT

PT acaba de criar uma igreja evangélica com

Gleisi de pastora

Boatos.org (16/04/2019)

IROFF (IPIH)

PT entrou na Justiça para acabar com o 13º

salário para o Bolsa Família

Boatos.org (12/04/2019)

OUTROS

Ataques no Ceará são caos planejado por Lula,

José Dirceu e PT em Curitiba

Boatos.org (15/01/2019)

DHACT

João de Deus é filiado ao PT há 20 anos e dá R$

40 mil/mês ao partido

Boatos.org (23/12/2018)

E-farsas (26/12/2018)

DHACT

Atirador de Campinas, Euler Fernando

Grandolpho, era filiado ao PT

Boatos.org (12/12/2018)

DHACT

Site Avaaz é porta-voz do PT no Brasil e

financiado por George Soros

Boatos.org (19/11/2018)

OUTROS

Ipsemg tem 540 conselheiros do PT que ganham

mais de R$ 10 mil

Boatos.org (11/11/2018)

CFE

TCU descobre rombo de R$ 20 bilhões no FIES

causados por Haddad e PT

Boatos.org (07/11/2018)

CFE

Garota da resistência vende a virgindade para

pagar dívida do PT

Boatos.org (05/11/2018)

IROFF (IPIH)

Empresa responsável pela apuração das eleições

tem ligação com PT

Boatos.org (26/10/2018)

CFE

Gerson Florindo, do PT, fingiu ser eleitor de

Bolsonaro e xingou Haddad

Boatos.org (19/10/2019)

OUTROS

Roberto Carlos apoia Bolsonaro e diz que PT

não pode voltar ao poder

Boatos.org (13/10/2018)

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 13

Palocci denuncia fraude nas urnas eletrônicas

feita pelo PT em 2014

Boatos.org (05/10/2018)

CFE

PT, PCdoB, PSOL e REDE fazem marcha para

Satanás e gritam satã é nosso rei

Boatos.org (11/09/2018)

IROFF (IPIH)

Homem que tentou matar Bolsonaro recebeu R$

350 mil do PT, diz PF

Boatos.org (07/09/2018)

DHACT

Adélio Bispo de Oliveira, homem que tentou

matar Bolsonaro, é filiado ao PT

Boatos.org (06/09/2018)

DHACT

Jornalista diz que atentado a tiros contra ônibus

de Lula e PT “foi armação”

Boatos.org (28/03/2018)

DHACT

Suzane Von Richthofen vai se candidatar a

deputada federal pelo PT

Boatos.org (07/03/2018)

DHACT

Vídeo mostra Lula falando que o PT é fascismo,

nazismo, menos democracia

Boatos.org (28/09/2017)

COMUNISMO

Delação da JBS foi divulgada para eleger Lula e

o PT

Boatos.org (19/05/2017)

CFE

Chefe da Abin denuncia plano de Lula e PT para

derrubar avião de Teori

Boatos.org (20/01/2017)

DHACT

Camila Pitanga empurrou Domingos Montagner

na água para ajudar Lula e o PT

Boatos.org (21/09/2016)

Fátima Bezerra, do PT, quer instalar Wi-Fi em

presídios

Boatos.org (13/06/2016)

DHACT

PT divulga plano de dominação comunista

Boatos.org (19/05/2016)

COMUNISMO

PT paga R$ 100,00 por pessoa em protesto de

31/03 em Brasília

Boatos.org (30/03/2016)

OUTROS

90% dos aprovados em concursos públicos são

do PT

Boatos.org (03/02/2016)

CFE

Vídeo falso: PT manda prender pastor por

homofobia em São Paulo

Boatos.org (09/11/2014)

IROFF (IPIH)

PT usa software livre para fraudar urnas

eletrônicas, diz hoax

Boatos.org (05/11/2014)

CFE

Hoax: PT comprou e violou as urnas eletrônicas

nas eleições 2014

Boatos.org (03/11/2014)

CFE

Notícia falsa: presidente do PT sugere fim do

Bolsa Família em 2017

Boatos.org (29/10/2014)

OUTROS

Informação falsa: PT trouxe 50 mil haitianos

para votar em Dilma nas eleições

Boatos.org (01/07/2014)

E-farsas.org (17/05/2014)

CFE

Hoax: ex-petista-jornalista revela os podres de

Lula e do PT

Boatos.org (20/09/2013)

CFE

Vídeo mostra urna autocompletando com o

número 13! Será verdade?

E-farsas.org (07/10/2018)

CFE

João Figueiredo previu que o PT ia tentar

instituir o comunismo?

E-farsas.org (24/03/2021)

COMUNISMO

Boato exagera salários recebidos por petistas

com recursos do fundo partidário

Estadão Verifica

(20/06/2020)

CFE

Fonte: Elaborado pelo autor

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 14

Análise das fake news sobre o PT

Esta seção analisará as notícias falsas, encontradas em distintas páginas da internet,

ligadas ao PT. O partido foi fundado em 1980, sendo visto como ligado à própria história e ao

amadurecimento político do país. De acordo com a página oficial do partido, “o PT surgiu como

agente promotor de mudanças na vida de trabalhadores da cidade e do campo, militantes de

esquerda, intelectuais e artistas. Foi oficializado partido político em 10 de fevereiro de 1980,

pelo Tribunal Superior de Justiça Eleitoral” (PT, 2023). Foram realizadas alterações no corpus,

em vias de favorecer na interpretação dos dados e resultados levantados pelo programa

Iramuteq. Também se alterou a escrita do termo “petista”, que surge no singular em apenas um

texto: em todos os outros, aparece como “petistas” (sendo três casos; dois em um mesmo texto,

e um isolado, em outro), tendo todos sido alterados para a forma singular. O Partido dos

Trabalhadores também apareceu em forma abreviada, “PT”, e na sua forma extensa, havendo

quatro casos em um só texto (denotando o tamanho considerável dos textos deste corpus) e

cinco casos, espalhados entre textos diferentes, em que se escreveu o título do partido por

extenso. Outras variações de termos ligados à descrição do partido ou dos seus membros foram

mantidas, tal qual “petralha” e “petezada”, ambos termos com poucas aparições. Ao longo do

corpus, em todas as menções a Jair Bolsonaro, optou-se por “Bolsonaro”, tido que grande parte

dos textos investigados nas outras análises mencionavam apenas o seu sobrenome.

Quadro 2 – Resumo de média, número de textos, ocorrências, formas e hápax

sobre o PT

Número de textos

Número de ocorrências

8482

Número de formas

2024

Número de hápax

1177 (13,88% das ocorrências, 58,15% das formas)

Média de ocorrências por texto

94,24

Fonte: Elaboração própria a partir de dados analisados pelo software Iramuteq

O corpus voltado às fake news acerca do PT contou com 90 textos, o que também pode

ser visto ao se considerar as frequências de aparições para os termos. O termo “pt” surgiu 125

vezes, seguido de “não”, com 66 aparições repetidas, “lula”, com 64, além de “ao”, com 53,

“brasil”, 38, “presidente”, 36 e “bolsonaro”, 35. Outros termos de relevância às análises devem

ser enfatizados, nesta lista: “partido”, com 26 repetições, “brasileiro”, “dinheiro” e “governo”,

Palavra que aparece somente uma vez ao longo do texto.

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 15

com 25 aparições cada, “federal” e “país”, com 21 repetições, “petista”, com 20, além de

“ministro”, 19 e “eleição”, com 17 aparições.

Quadro 3 – Termos repetidos ao longo dos textos investigados acerca do PT

Termo

Frequência de

aparições (repetições)

Termo

Frequência de

aparições (repetições)

125

dinheiro

Não

governo

Lula

federal

Brasil

país

presidente

petista

bolsonaro

ministro

mais

ano

como

eleição

partido

já

tudo

aí

brasileiro

dar

dinheiro

dia

governo

Maior

Vídeo

federal

Fonte: Elaboração própria a partir de dados analisados pelo software Iramuteq

A nuvem de termos permite observar a grande quantidade de palavras que surgiram ao

longo do corpus. A quantidade de palavras, notadamente superior às de outras análises aqui

apresentadas, pode ser entendida por conta da existência de um grande número de textos e de

termos. O termo central, “pt”, mostra-se com grande aproximação ao termo “lula”. Isso pode

denotar a proximidade de citações feitas sobre Lula, ex-presidente, dentro dos textos que se

voltam ao PT. Percebe-se, a importância da figura de Lula para a imagem do partido construída

nas fake news, observando-se a existência de muitas notícias que o mencionam, entre as fake

news investigadas. Assim, o nome “lula”, palavra que teve 64 menções ao longo do corpus,

surge em 28 textos diferentes, o que reforça para a tentativa de atrelar os dois conceitos (“pt” e

“lula”), em vias de, possivelmente, desvalorizar a imagem de ambos. Deve ter-se em mente que

essas notícias são construídas para confundir e para desvalorizar a imagem do partido político

Há uma importante consideração metodológica: deve reforçar-se que alguns textos

possuem uma quantidade muito superior de termos e sentenças em relação aos demais. Isso

pode ter influenciado os resultados que indicam tal aproximação entre “pt” e “lula”, dado que

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 16

em um dos textos de fake news analisados, notou-se 24 menções a este líder político, número

que representa 37,5% do total de 64 menções a ele, ao longo do corpus. Essa repetição também

é vista em outras fake news. Ou seja, um dos textos foi responsável por grande parte das citações

sobre Lula. Uma pequena parte do conteúdo desta fake news está citada a seguir:

Enquanto milhares de brasileiros passam fome e não têm emprego, e a frota

de ônibus dos nossos grandes centros urbanos está sucateada, Lula mandou o

BNDES dar dinheiro ao ditador cubano Fidel Castro para a compra de

milhares de ônibus novos produzidos na China para eles! Todos sabemos que

nunca mais veremos a cor desse dinheiro e que ele poderia ter sido muito

melhor utilizado no financiamento de ônibus para as cidades daqui no Brasil,

afinal, o dinheiro é nosso, comprando veículos produzidos aqui mesmo,

ativando a indústria automobilística nacional, talvez assim não haveria aqui

milhares de metalúrgicos sendo demitidos todos os dias, gerando crescimento,

emprego e renda, que é o que o povo precisa!

Mas Lula está enganando o povo com uma esmola chamada Bolsa Família,

que não chega à maior parte dos brasileiros necessitados, ficando nas mãos de

intermediários corruptos (LIRA, 2020, n.p.).

Pelo exemplo citado, observa-se a intenção em construir texto que possui formato de

noticiário ou de página virtual voltada ao jornalismo profissional. Apesar disso, o conteúdo da

notícia falsa é confuso e possui claramente um viés político e tece oposição às figuras da

esquerda. Pode afirmar-se que essa tendência unilateral, que defende um lado e critica o outro,

não é encontrada, com essa mesma intensidade, quanto à construção de críticas, na maior parte

dos textos jornalísticos encontrados na rede, em páginas oficiais e que possuem alguma

credibilidade. Nestas, geralmente, encontram-se conteúdos que buscam pela neutralidade, ou

ao menos, que se esmeram em informar sobre perspectivas políticas, o que definitivamente

difere do que fora encontrado ao longo deste corpus. Ainda que se argumente que alguns

veículos deixem transparecer o seu viés político e teçam críticas a determinados políticos, isso

não é feito com a mesma intensidade e linguagem emprega pelas fake news.

Outras palavras se destacam na nuvem. Os termos “presidente” e “bolsonaro”, apesar

de possuírem diferente grau de proximidade com o termo central “pt” (sendo que “bolsonaro”

está mais próximo de “lula”, e “presidente” se aproxima diretamente ao “pt”) parecem ter

grande relevância às notícias investigadas, como também “brasil”, “dinheiro”, “governo” e

“partido”. A quantidade de termos permite identificar um número de ideias que se atrelam, de

diversas formas, às fake news sobre o PT. Ao se analisar os termos, é possível notar o intuito

de desvalorizar o PT e seus atores. Termos como “primeiro comando da capital”, famosa facção

criminosa nacional, “joão de deus”, espírita que foi condenado por estupro e abuso, além de

termos como “droga”, “máfia”, “traficante” ou “narcotraficante”, menções a Suzane Von

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 17

Richthofen, condenada e presa por envolvimento no assassinato dos próprios pais, entre outros

que ainda fazem parte da memória coletiva da população. Assim, confirma-se a intenção de

desvalorizar a imagem do partido e de suas figuras, por meio de informações falsas que são

atreladas aos textos compartilhados pelas redes.

Figura 1 – Nuvem de termos repetidos sobre o PT

Fonte: Elaboração própria a partir de dados analisados pelo software Iramuteq

O gráfico de similitude, a seguir, expõe os termos mais associados ao “pt”. A fim de

facilitar as análises, foram tomadas algumas medidas e estratégias para reduzir a quantidade de

termos que seriam analisados pelo Iramuteq. Assim, para esta investigação, após a realização

de uma pré-análise para conhecimento da base de dados e suas especificidades, preferiu-se

retirar os verbos, advérbios e adjetivos, para evitar um excesso de informações e poluição das

análises. A partir do nome “pt” surgem outras linhas que levam a outros termos. Primeiro,

observa-se a relação entre “pt” e “bolsonaro”, que se segue a outros termos: “governo”, “ação”,

“valor”, “milhão”. A proximidade entre os dois pode ser confirmada pelo grande número de

aparições de “bolsonaro”, ao longo dos textos do corpus: apareceu em 23 textos diferentes, do

total de 90, sendo mencionado 35 vezes. Outra linha que pode ser vista nesta análise liga “pt”

a “presidente”, que se liga a “ministro” e “dilma”.

Por fim, se pode analisar a linha que liga “pt” a “lula” e parte em duas direções

principais. Em uma das linhas, segue-se a partir de “dinheiro”, “bndes” e “bi”, em outra, fala-

se em “globo” e “rede”. A aproximação entre “globo” e “pt” pode ser vista ao longo do corpus.

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 18

Também foram notadas outras fake news, nos outros corpora analisados, que mencionam a

Globo, fazendo críticas e tentando atrelar as supostas mazelas ligadas ao PT e aos seus atores

políticos à rede de TV. Neste corpus, a Globo foi citada 15 vezes: em três destas, foi citada

como “Globolixo”, em crítica. Assim, em alguns textos observa-se a tentativa de aproximar os

termos, ou conceitos.

Figura 2 – Gráfico de similitude de palavras das fake news sobre o PT

Fonte: Elaboração própria a partir de dados analisados pelo software Iramuteq

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 19

Figura 3 – Fake news sobre o PT de acordo com os temas

Fonte: Elaborada pelo autor

Um terço das fake news referem-se à Corrupção e Fraude Eleitoral. As fake news

envolvendo corrupção reverberam porque o partido já esteve envolvido no passado, no

escândalo do Mensalão. Há uma retomada do que é dito em outro lugar para apoiar e deslocar

o sentido, de modo a trazer à memória do leitor elementos que darão suporte à sua crença.

A noção de imaginário sociodiscursivo de Charaudeau (2019) ajuda a compreender o

porquê de um terço das fake news estarem relacionadas à corrupção e fraude eleitoral. Um

imaginário bem presente e agravado pela Lava Jato e pelo antipetismo é que a corrupção é algo

exclusivo da Esquerda e principalmente do PT. Embora a Lava Jato tenha atingido outras

agremiações partidárias, o PT foi o foco do ex-juiz Sérgio Moro (SCHREIBER, 2022). Logo,

pessoas do bem não votam nem pertencem a essa agremiação partidária. Assim, toda falsa

notícia que ligue o partido a um ato de corrupção encontra eco em parte do imaginário dos

eleitores. O outro tema recorrente na desinformação contra o PT refere-se à associação dos

Direitos Humanos ligado ao tráfico e ao crime (25.8%). Conforme visto no gráfico e no quadro,

existe um imaginário falsamente construído que supõe que os Direitos Humanos estão a serviço

dos bandidos. Também está presente no imaginário que foi construído que o PT é um partido

associado ao crime. E mais uma vez aqui, cabe bem a figura do bode expiatório a fim de

satanizar um culpado. O PT no caso seria o que existe de pior na política e para tanto precisaria

ser extirpado. Por isso, discursos como o de Jair Bolsonaro, que prega a eliminação da esquerda,

são comemorados por uma parcela do eleitorado. O que seria um absurdo em uma democracia,

ganha contorno de aceitável e uma visada de credibilidade.

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 20

À guisa de conclusão

Fake news são um problema que afeta diretamente a democracia, e passa

obrigatoriamente pelas lentes da Ciência Política, da Comunicação e outras áreas. É preciso

compreender que, politicamente, as fake news estão atreladas à emergência do populismo de

direita, a uma crise no sistema democrático e que no Brasil elas emergem com a saída da

chamada direita envergonhada (SOUZA, 1988) do armário e potencializa com o sentimento de

antipetismo.

O regime democrático – em crise cada vez mais acentuada– deve conviver com as fake

news ainda por um bom tempo. Embora tenha surgido em um contexto político bem específico,

as fake news devem ter vida longa no mundo e no Brasil.

Rego e Barbosa (2020) apontam para uma construção intencional da ignorância. A

desinformação não é mais algo somente para desconstruir a imagem do adversário, mas uma

ameaça à ciência, à vida. O maior exemplo de desinformação nesse aspecto esteve relacionado

à pandemia. A COVID-19 foi tratada com uma simples gripe, as vacinas desvalorizadas e as

medidas sanitárias tratadas como um ataque à classe trabalhadora. Antes, a informação falsa

poderia ser facilmente desmentida pela mídia e pela ciência. Agora, os políticos se aproveitam

desse cenário da pós-verdade potencializado pela comunicação digital para negar a ciência e

atacar a imprensa nomeando de fake news tudo aquilo que desagrada aos seus ouvidos.

A arquitetura do discurso por trás das fake news contra o Partido dos Trabalhadores

mostrou algo engendrado, bem orquestrado e com temas muito bem selecionados. Não foram

simples boatos, mas mentiras friamente calculadas e/ou histórias descontextualizadas para dar

o efeito de verdade esperado. Essa estruturação temática mostra o nível de organização dos

produtores de fake news: além de organizada, a temática também é muito bem pensada, pois

traz assuntos que despertam a atenção dos usuários e promovem um efeito de

compartilhamento.

Boatos antigos são ressuscitados como se fossem novos e são amplamente

compartilhados pelas redes sociais. O ápice das fake news no Brasil ocorre sempre no período

eleitoral. Embora as fake news ocorram em qualquer época do ano, elas voltam a circular com

força com a proximidade de cada pleito. Grandes temas do processo eleitoral ficaram ofuscados

pela avalanche de desinformação propagada. Ainda que houvesse por parte da mídia a

preocupação em tratar de temas de interesse público como reforma da previdência, trabalhista,

tributária, o interesse do público se voltava mais para os temas do campo moral-religioso,

muitas vezes ignorados ou não tratados com a mesma importância pela imprensa.

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 21

O discurso contra a esquerda encontra respaldo no discurso religioso, conservador,

moralista e tocam em temas sensíveis da população brasileira. A catalogação das fake news

permitiu descobrir que setenta por cento (70%) da desinformação propagada restringiu-se a três

grandes temas: Direitos Humanos e Associação ao Crime e ao Tráfico, Corrupção e Fraude

Eleitoral e Intolerância Religiosa e Ofensa à Fé Cristã. Esses temas transformam o PT em um

perigoso inimigo, em um mal que precisa ser combatido. É a satanização por meio de um bode

expiatório apontado por Charaudeau (2016).

Logo, o discurso por trás da desinformação mostra que votar ou ser de esquerda é tomar

uma posição que vai de encontro ao cristianismo e à família brasileira. Esse não é um discurso

que apenas circula nas fake news, ele acaba por elas sendo legitimado. Esse mesmo discurso

também é visto no púlpito de igrejas, tertúlias, enfim, ele sempre existiu, além de ter sido

divulgado também pela imprensa (MARIANI, 1998).

Se por um lado o caminho das fake news parece sem volta por outro a democracia vai

encontrando alternativas para conviver com elas. A imprensa, ainda que sob ataque,

desenvolveu mecanismos de fact-checking que confrontam o discurso da desinformação. As

redes sociais passaram a bloquear conteúdos falsos e suspender usuários propagadores de fake

news. Há quem aposte na educação nas escolas e universidades, como é caso de Charaudeau

(2019), como instituições capazes de fornecer ferramentas intelectuais que possibilitem que as

pessoas compreendam e identifiquem as fake news.

O discurso da desinformação precisa ser entendido à semelhança do que ocorre com o

político e o midiático. Assim como no político, o discurso da desinformação apresenta o mal

(adversário político) e aquele que pode vencer o mal (político), para isso usa as estratégias de

desqualificação do adversário, além usar frases curtas e de fácil entendimento, produzindo

assim condições de veracidade. O discurso da desinformação assim como o midiático usa o

sensacionalismo para vender e, muitas vezes, usa líderes políticos ou religiosos como fiadores

para dar respaldo ao discurso.

Quanto a esse ponto, o trabalho apresentou como é estruturado o discurso da

desinformação analisando o PT. O discurso de corrupção e a pauta moral também ganharam

notoriedade como reflexo do pensamento da extrema direita que defende a família patriarcal e

heteronormativa, o ressurgimento do nacionalismo e traz para o centro da agenda política temas

como aborto, identidade de gênero e políticas LGBTQIA.

A Ciência Política ao se debruçar sobre as fake news consegue entender o contexto do

seu surgimento e as razões da sua expansão, sempre associadas à descrença das instituições, da

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 22

mídia, enfim um reflexo da crise da democracia. O populismo flerta melhor com a crise e

oferece respostas simples aos problemas complexos. Nesse contexto, explica Charaudeau

(2018), o político molda o seu discurso em consonância com a opinião pública e é comum votar

em alguém tendo como base a sua imagem de político no lugar do seu programa de governo.

Referente à Análise de Discurso de Charaudeau (2018) utilizada como suporte

metodológico deste trabalho, ela foi importante por servir como base para formulação do

discurso da desinformação, fornecendo conceitos importantes dos discursos de mídia e político,

além de trazer o conceito de propósitos (temas) e de como a existência e a credibilidade deles

não são importantes, mas sim os efeitos de verdade que trazem, que dependem das

representações sociais e imaginários de cada pessoa. O imaginário de tradição, em especial,

utiliza discursos fóbicos (quase que regra nos discursos de desinformação) para se justificar.

O trabalho conseguiu sistematizar como é o padrão das fake news produzidas contra o

PT, criando inclusive categorias de análises dos temas envolvidos. Com a eleição do presidente

Lula (PT) para o seu terceiro mandato (2023-2026), novas fake news serão criadas, mas

independente do assunto a ser tratado, o artigo permitirá base para enquadrá-las nas categorias

desenvolvidas e análise de como elas trabalham no imaginário das pessoas.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, R. Deus acima de Todos. In: ABRANCHES, S. et al. Democracia em Risco? 22

ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

ALONSO, A. A comunidade moral bolsonarista? In: ABRANCHES, S. et al. Democracia

em Risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

BELLO, E.; CAPELA, G.; KELLER, R. Operação Lava Jato: ideologia, narrativa e

(re)articulação da hegemonia. Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, v. 12, n. 3, p. 1645-1678,

2021. Disponível em: https://www.e-

publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/53884. Acesso em: 17 fev. 2022.

BERNARDI, A. J.; COSTA, A. Populismo e fake news na era da pós-verdade: comparações

entre Estados Unidos, Hungria e Brasil. Cadernos de Campo, Araraquara, n. 28, p. 385-412,

2020. Disponível em: https://periodicos.fclar.unesp.br/cadernos/article/view/13690. Acesso

em: 20 nov. 2022.

BRUZZONE, A. Ciberpopulismo: política e democracia no mundo digital. São Paulo:

Contexto, 2021.

CASTELLS, M. O poder da identidade. 3. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.

Miguel QUESSADA

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 23

CASTELLS, M. Ruptura: A crise da democracia liberal. São Paulo: Zahar, 2018.

CHARAUDEAU, P. A conquista da opinião pública: como o discurso manipula as escolhas

políticas. São Paulo: Contexto, 2016.

CHARAUDEAU, P. Discurso das Mídias. São Paulo: Contexto, 2018.

CHARAUDEAU, P. Discurso Político. São Paulo: Contexto, 2019.

DILUAR, M. A complexidade do conceito do populismo: o populismo clássico latino-

americano e os debates atuais sobre o conceito. Orientador: Prof. Dr. Marcelo Santos. 2020.

101 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Faculdade de Ciências e Letras,

Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2020.

FERREIRA, W.; TEIXEIRA, A. P. Agenda setting. In: MARCONDES FILHO, C.

Dicionário da comunicação. São Paulo: Paulus, 2009.

GALLEGO, E.; ORTELLADO, P.; MORETTO, M. Guerras culturais e populismo antipetista

nas manifestações por apoio à operação Lava Jato e contra a reforma de previdência. Em

Debate: Periódico de Opinião Pública e Conjuntura Política, Belo Horizonte, ano 9, n. 2, p.

35-45, 2017.

LIRA, C. Caixa-preta do BNDES revela R$ 576 bilhões desviados durante o governo do PT.

Boatos.org, 2020. Disponível em: https://www.boatos.org/politica/caixa-preta-bndes-576-

bilhoes-desviados-pt.html. Acesso em: 22 ago. 2021.

MARIANI, B. S. C. O PCB e imprensa: os Comunistas no imaginário dos jornais (1922-

1989). Rio de Janeiro: Revan; Campinas, SP: UNICAMP, 1998.

MCCOMBS, M.; SHAW, D. The agenda-setting function of mass media. Public Opinion

Quaterly, v. 36, n. 2, p.176-182, 1972. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/2747787.

Acesso em: 10 out. 2022.

PRZERWORSKI, A. Crises da Democracia. Rio de Janeiro: Zahar, 2020.

PT. Partido dos Trabalhadores. Nossa História. 2023. Disponível em: https://pt.org.br/nossa-

historia/. Acesso em: 14 mar. 2023.

RECUERO, R. Desinformação, mídia social e COVID-19 no Brasil: relatório, resultados e

estratégias de combate. Pelotas: MIDIARS - Grupo de Pesquisa em Mídia Discurso e Análise

de Redes Sociais, 2021.

RÊGO, A. R.; BARBOSA, M. A construção intencional da Ignorância. Rio de Janeiro:

MAUAD, 2020.

SCHREIBER, M. Lava Jato atingiu partidos de forma proporcional, mas PT foi foco de Moro,

aponta estudo. BBC, 2022. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-

62990375. Acesso em: 05 nov. 2022.

O discurso por trás das fake news: Uma análise da desinformação propagada contra o Partido dos Trabalhadores (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 24

SOLANO, E. A bolsonarização do Brasil. In: ABRANCHES, S. et al. Democracia em

Risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.

SOUZA, M. C. C. A Nova República sobre a espada de Dâmocles. In: STEPAN, A.

Democratizando o Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 1988.

TORMEY, S. Populismo: uma breve introdução. São Paulo: Cultrix, 2019.

TSE. Tribunal Superior Eleitoral. Estatísticas do eleitorado – Eleitores filiados. Brasília, DF:

TSE, 2023. Disponível em: https://www.tse.jus.br/eleitor/estatisticas-de-eleitorado/filiados.

Acesso em: 14 mar. 2023.

CRediT Author Statement

 Reconhecimentos: Agradeço à UFSCar o suporte acadêmico e ao professor e orientador

Thales Haddad Novaes de Andrade.

 Financiamento: Não aplicável.

 Conflitos de interesse: Não há conflitos de interesse.

 Aprovação ética: A natureza do trabalho, que envolveu dados, dispensou o comitê de ética

visto que de acordo com o CEP da UFSCar pesquisam que utilizam bases de dados

secundários (já coletados e disponíveis) estão dispensados do CEP.

 Disponibilidade de dados e material: Os dados brutos e materiais utilizados na pesquisa

estão disponíveis na dissertação: QUESSADA, Miguel. Desinformação e Esquerda

Brasileira: O discurso por trás das fake news. 2022. 256 f. Dissertação (Mestrado em

Ciência Política) – Universidade Federal de São Carlos, São Paulo, 2022.

 Contribuições dos autores: Miguel QUESSADA é responsável pela pesquisa, análise e

redação do artigo.

Processamento e editoração: Editora Ibero-Americana de Educação.

Revisão, formatação, normalização e tradução.

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 1

THE DISCOURSE BEHIND THE FAKE NEWS: AN ANALYSIS OF

DISINFORMATION PROPAGATED AGAINST THE WORKERS' PARTY (PT)

O DISCURSO POR TRÁS DAS FAKE NEWS: UMA ANÁLISE DA DESINFORMAÇÃO

PROPAGADA CONTRA O PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT)

EL DISCURSO DETRÁS DE LAS NOTICIAS FALSAS: UN ANÁLISIS DE LA

DESINFORMACIÓN PROPAGADA CONTRA EL PARTIDO DE LOS TRABAJADORES

(PT)

Miguel QUESSADA1

e-mail: quessada.miguel@gmail.com

How to reference this article:

QUESSADA, M. The discourse behind the fake news: An analysis

of disinformation propagated against the workers' party (PT).

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023.

e-ISSN: 1982-4718. DOI:

https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296

| Submitted: 05/03/2023

| Revisions required: 22/04/2023

| Approved: 11/05/2023

| Published: 01/08/2023

Editor:

Prof. Dr. Maria Chaves Jardim

Deputy Executive Editor:

Prof. Dr. José Anderson Santos Cruz

Federal University of São Carlos (UFSCar), São Carlos – SP – Brazil. PhD student in Political Science (UFSCar)

and in Communication (UFPR). Master in Political Science (UFSCar).

The discourse behind the fake news: An analysis of disinformation propagated against the workers' party (PT)

Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 28, n. esp. 1, e023010, 2023. e-ISSN: 1982-4718

DOI: https://doi.org/10.52780/res.v28iesp.1.17296 2

ABSTRACT: The term fake news has become complex and the literature has preferred the

term misinformation because it is more comprehensive and encompasses all kinds of contents.

This study investigates the discourse against the Workers' Party (PT), proposing a fake news