A percepção do corpo feminino e masculino através do olhar das crianças: uma experiência em sala de aula
DOI:
https://doi.org/10.21723/riaee.v10i6.8340Resumo
O ensino fundamental I do nosso sistema educacional brasileiro encontra-se envolto de temas tabus e polêmicos concernente às questões de sexualidade. Os padrões de beleza e as questões de gêneros heteronormativos existentes em nossa sociedade produzem nas crianças modelos comportamentais estereotipados, estimulados pelos mais diversos meios sociais e (in) formativos. O presente estudo tem como objetivo investigar as percepções de crianças com idades entre nove e onze anos, matriculadas em uma escola estadual do interior do estado de São Paulo, acerca dos corpos masculinos e femininos encontrados em revistas diversificadas. Para tanto, a pesquisa consistiu na investigação empírica de caráter analítico-descritivo, por meio da abordagem qualitativa. A coleta dos dados utilizados para análise versou sobre uma proposta de atividade apresentada pela professora, em que consistiu na seleção de imagens masculinas e femininas presentes em revistas diversificadas, cabendo às crianças eleger tais imagens por meio de critérios pessoais. Em linhas gerais, essa atividade possibilitou uma discussão que girou em torno de questões localizadas no campo da sexualidade e das relações de gênero, pois foram concedidos espaços para se ouvir os alunos/as e suas percepções sobre o assunto, mediadas pela intervenção da professora. No entanto, não houve interferência nas respostas crianças no sentido de direcioná-las, mas de conduzir o discurso de maneira respeitosa e ref lexiva. O resultado evidenciou a incorporação dos estereótipos sociais reproduzidos pelas crianças, desde a escolha que fizeram até as características bem definidas e demarcadas entre as imagens e as funções realizadas por homens e mulheres; suas idades, profissões e características físicas, em campos quase sempre opostos. Esta identificação foi evidenciada tanto por meio das imagens selecionadas por elas quanto por suas falas ao justificarem as escolhas realizadas. Dessa forma, consideramos a relevância deste estudo por proporcionar uma reflexão em relação à percepção das crianças no tocante a beleza dos corpos e dos papeis sociais exercidos em nossa sociedade, estimulados e identificados por meio das imagens contidas em revistas generalizadas e pelos discursos construídos em suas expressões. Tais discursos revelaram a naturalização dos papeis binários e desiguais entre as funções atribuídas a homens e mulheres, bem como aos padrões de estereótipos de gêneros ligados a vaidade, consentida para mulheres, mas não para homens. As características físicas também foram identificadas como padrões estereotipados, tanto em relação aos perfis comuns (magro/a, alto/a, loiro/a) quanto aos localizados em campos distintos (cabelos curtos para homens, longo para mulheres). Da mesma forma, as roupas e acessórios se constituíram enquanto objetos observáveis das crianças, distinguidos entre os de uso masculino e feminino. Diante destas evidências, confirmou-se a incorporação de conceitos e preconceitos arraigados historicamente pela sociedade ocidental, dos quais acabam sendo associados à função biológica que difere homem e mulher e que são cristalizados como verdades incontestáveis. A omissão destes debates em sala de aula camufla a necessidade de discuti-los e desconstruí-los, pois ao subjuga-los, cria-se a ilusão de que são irrelevantes e inoportunos em razão do silêncio/proibição que lhes conferem. Em contrapartida, propostas como esta desvelam o quão aparente é esta ideia, constituindo-se numa relação de poder que perpetua as desigualdades de gênero.
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